terça-feira, 27 de março de 2018

Ações Estratégicas *144



Ações Estratégicas

Um governo, ao conduzir uma situação de crise deve seguir uma escala de percepções e ações que permita reagir aos acontecimentos sempre na medida adequada, evitando-se o uso desnecessário de medidas retaliatórias, que possam radicalizar a crise ou mostrar uma reação insuficiente, que demonstre fraqueza e omissão, encorajando a escalada dos fatores adversos. Os analistas dos serviços de inteligência devem estar atentos a fim de recomendarem aos seus “tomadores de decisão”, quais as medidas mais adequadas a serem adotadas em cada tipo de crise, evitando-se a surpresa estratégica.

O planejamento de emprego das expressões do poder de uma nação deve ser constantemente revisto em face a evolução da tecnologia existente e a disponível, a capacidade industrial e seu nível de aprestamento, e a configuração de ameaças possíveis, prováveis e eminentes. A situação política internacional que afete a nação, com suas alianças e antagonismos deve servir de norte a este planejamento.

As medidas a serem adotadas em situação de crise deverão ser diretamente proporcionais a discrepância do poder relativo entre os antagonistas e a importância do objetivo a ser perseguido, bem como a liberdade de ação de cada um. Empreender uma ação militar contra a Coréia do Norte por parte dos EUA, por exemplo, é totalmente diferente de tomar tal atitude em relação a Cuba, primeiro porque a primeira é supostamente uma potência nuclear, e segundo porque está sob a esfera de influência da China. Quando o Iraque invadiu o Kwait a resposta se deu prontamente, porém quando a Rússia invadiu a Criméia a reação foi bem diferente.

Nos cenários de grande liberdade de ação pode-se optar pela ação militar diretamente, resolvendo a crise rapidamente. Quando o poder militar inimigo é considerável, geralmente opta-se pelas retaliações e ações militares mais comedidas e de pequena envergadura. Neste caso podem ocorrer atritos localizados, porém evita-se um engajamento total, principalmente se houver a posse de armas nucleares pelo inimigo.

Estratégias Gerais

Estratégia da Dissuasão 

A estratégia da dissuasão é muito usada quando a capacidade de retaliação contra o inimigo é grande, e este evita o confronto, ou quando ambos são fortes e o confronto resultaria em grandes prejuízos a ambos. Esta estratégia foi muito usada na Guerra Fria e sua filosofia baseava-se na certeza da destruição mútua, pois as capacidades nucleares de ambos eram muitas vezes superiores às realmente necessárias. Ambos os lados sabiam que não haveria vencedores, o que garantia, desta forma que ninguém desse o primeiro tiro. Quando se trata de armas nucleares é uma estratégia perigosa e um pequeno erro ou acidente pode resultar em consequências severas. A dissuasão também é usada pelo mais forte contra o mais fraco, pois a simples ameaça de uso de um poder avassalador pode fazer este a aceitar as condições impostas.

Estratégias de Pressão

Quando o objetivo não é vital e o poder militar não é supremo, procura-se intimidar através de estratégias de pressão. Neste caso também evita-se o confronto direto mesmo o poder militar sendo muito superior, se a liberdade de ação for pequena. A crise dos mísseis cubanos é um exemplo de pressão, pois apesar da URSS ser dona de grande poder militar, recuou seus navios diante de um adversário igualmente poderoso cuidando de seu “quintal”. Neste caso ações no campo diplomático e da propaganda são mais eficientes, como as demonstrações de força e os desdobramentos e retóricas das chancelarias.

Estratégia da Resistência

Os conflitos propriamente ditos são usados quando o objetivo tende a ser muito importante, e mesmo o poder militar estando aquém do desejável, ele preocupa o inimigo.  Neste caso países poderosos aplicam poder militar avassalador como os EUA em sua invasão ao Iraque e os Nazistas em sua invasão a Polônia, com conflitos sendo decididos em tempos reduzidos. Conflitos de longa duração são desgastantes e muito caros, e tendem a ser evitados na atualidade, porém se o objetivo for muito importante e o poder militar fraco, de ambos os lados, estes tendem a acontecer. As guerras do Oriente Médio, ainda não resolvidas, são um exemplo destes conflitos de desgaste. Este tipo de conflito é geralmente norteado pela estratégia da resistência. Esta estratégia visa degradar moralmente um inimigo mais poderoso, inflingindo-lhes baixas não decisivas, mas que gradativamente diminuem sua vontade de lutar. A FNLV (Viet Cong) e o EVN usaram esta estratégia no conflito do Vietnam, e apesar da inferioridade militar, venceram o conflito.

A estratégia da resistência consiste em manter-se operacional, mesmo com meios limitados, estrategicamente manter-se na defensiva evitando-se o dispêndio de recursos que não existem em ações de grande vulto e taticamente na ofensiva com constante fustigação das fileiras inimigas através de ações de guerrilha. Isto obriga o inimigo a dispersas forças e facilita a ação dos atacantes.

Estratégia das Ações Sucessivas

Quando o objetivo é importante e os meios limitados, bem como a liberdade de ação pequena, adota-se a estratégia das ações sucessivas, onde uma série de ações em todos os campos de atuação possíveis complementam-se, buscando-se um objetivo final e importante a partir da conquista de objetivos menores e aparentemente não muito importantes. Ações políticas, diplomáticas, psicológicas e militares, aplicadas sucessivamente, em intensidades diferentes, servem de apoio umas às outras. A busca de objetivos aparentemente não importantes, não despertará no inimigo um grande empenho em sua retomada; ações militares pontuais, rápidas e violentas consolidarão estes objetivos que servirão de trampolim para o objetivo final. Esta estratégia combina a ação direta (militar), o conflito violento, a pressão indireta, e a estratégia de resistência. As ações políticas, de natureza diplomática e psicológicas se mostrarão dominantes nesta modalidade estratégica. Esta forma tende a ser a mais usada na gestão de crises que envolvam o confronto direto entre forças não hegemônicas, sendo uma empreitada longa, e vence aquele que tiver maior resiliência.

Planejamento Militar de Guerra

A estrutura de defesa deve adotar a concepção de emprego conjunto de todas suas forças e agências, incluído forças policiais e órgãos da administração civil. Um preparo coordenado e integrado das forças

terrestre, naval, aeroespacial e outras instituições deve permitir o seu emprego em situação de interoperabilidade, não se admitindo mais que cada força trave sua guerra particular como aconteceu em vários conflitos no passado.

A preparação deve ser realizada desde os tempos de paz, por meio da implementação de uma estrutura de fácil transição das atividades destes tempos para um quadro operacional de guerra, incluídos as forças armadas e a sociedade civil. Ações estratégicas devem ser previstas, planejadas e implementadas para que se possa atingir rapidamente uma capacidade operacional capaz de responder a altura de qualquer situação que venha a surgir. A mobilização, seja da infraestrutura como da indústria, bem como dos reservistas, deve se dar de forma natural e rápida, de forma em que os efetivos e capacidades possam atingir uma condição operacional plena para qualquer conflito e para a manutenção do pós-guerra. 



sábado, 17 de março de 2018

Estado-Maior e Ordens #143


O comandante militar é o responsável pela operação. É dele que partem todas as ordens para que as forças combatentes e de apoio cumpram a missão. Ele planeja e controla todas as ações, corrige rumos e disponibiliza apoio logístico para que cada ator exerça seu papel no momento e local oportuno, com a segurança adequada e devidamente abastecidos.

Esta atividade é comumente designada no meio militar como “Comando e Controle” (C2) e é a alma de qualquer operação. Unidades militares sem C2 são apenas um grupo bem disciplinado de indivíduos armados sem saber o que fazer. Cabe ao comando providenciar para que cada unidade ou indivíduo esteja no local de sua missão no horário previsto, com o equipamento adequado e devidamente instruídos de sua parte, inteirados da situação como um todo e com o suprimento necessário.

Uma operação militar é tanto mais complexa quanto maior for o escalão envolvido. Uma missão atribuída a um GC demanda alguma munição, alguma comida e talvez uma ou duas viaturas para transportá-lo, um objetivo simples que provavelmente será atingido em poucas horas; enquanto que uma missão a cargo de uma força-tarefa, divisão ou corpo de exército demanda recursos para manter em combate milhares de militares com milhares de equipamentos diferentes, com seus consumos de combustível, munição e alimentos, demandas médicas e de manutenção, além de um sem número de manobras e escaramuças envolvendo forças diversas de terra, unidades aéreas e navais. Tudo tem que ser coordenado e seu desfecho conferido, para que uma próxima fase possa ser implementada. Pode durar dias ou meses e serão necessárias milhares de decisões e ordens.

Comandar um GC ou pelotão pode ficar a cargo de um sargento ou oficial, mas a medida que o escalão aumenta se faz necessário a descentralização das atividades, com a segmentação das atividades operacionais e logísticas. A partir do nível subunidade (companhia) os comandantes militares contam com algum “staff”, um colegiado de oficiais que o auxiliam na divisão da complexa tarefa que é administrar uma operação militar. A este “staff” denomina-se no meio militar de Estado-Maior. O Estado-Maior possibilita ao comandante a descentralização da atividade de C2, poupando-lhe de se preocupar com detalhes operacionais e possibilitando-lhe que se concentre nas decisões mais importantes. Assim temos oficiais encarregados da produção de inteligência, de logística, de pormenores administrativos como o recompletamento de pessoal, de ligação com outras unidades, no planejamento e pormenorização das decisões táticas e operacionais tomadas, na segurança e vigilância e na avaliação de resultados, além de outras atividades consideradas necessárias.

O trabalho do Estado-Maior consiste em buscar soluções para os problemas e desafios que se apresentem, colher inteligência a respeito destas situações, analisá-los à luz da inteligência disponível e propor a solução destes ao comandante, considerando todas as linhas de ação possíveis e elencando a mais adequada, justificando causas e conseqüências de cada uma, vantagens e desvantagens, sempre fazendo contato prévio com todas as unidades envolvidas. A sugestão por um ataque aéreo deverá ser precedida por uma consulta de disponibilidade da unidade aérea que realizará o ataque, por exemplo. Ao comandante deverão chegar as sugestões de forma objetiva sem documentação volumosa, com conclusões claras e concisas, para que ele possa escolher, aplicando a solução se necessário, sua experiência e conhecimento pessoal, e uma vez tomada a decisão que ela siga na forma de ordem para pronto cumprimento. Ordens secundárias ou de menor importância deverão ser prontamente despachadas pelos oficiais do Estado-Maior e seus auxiliares, poupando desta forma o comandante dos detalhes operativos.




A estrutura de um Estado-Maior varia de acordo com a força a que serve e a situação que deverá ser enfrentada. Esta estrutura será composta por um chefe de estado maior, que poderá ser o sub-comandante da unidade ou não, e as diversas seções operativas, cada qual comandada por um oficial dedicado, que por sua vez será assessorado pelos oficiais adjuntos em funções específicas. No Exército Brasileiro, por exemplo, um Estado-Maior típico ou geral consiste em 5 seções, sendo a 1ª Seção encarregada da organização e administração de pessoal, a 2ª Seção ocupa-se da produção de inteligência, a 3ª Seção é a de operações e responsável pelas linhas de ação da unidade e adestramento de pessoal, a 4ª Seção encarrega-se do apoio logístico e a 5ª Seção cuida da comunicação social e dos assuntos civis. Outras estruturas podem ser implementadas.

Os oficiais adjuntos ou auxiliares constituem o Estado-Maior especial e cada um cuida de uma subseção específica, subordinados aos oficiais do Estado-Maior geral e atuando por exemplo, nas áreas de defesa antiaérea, apoio de fogo, guerra química e biológica, ambiente nuclear, engenharia de construção e combate, controle de tráfego aéreo, polícia, guerra eletrônica, comunicações, força aérea, aviação do exército, forças aeronavais, forças navais, prisioneiros de guerra, justiça militar, ajudância geral, segurança de área,  controle de aeródromo, controle de terminal portuário e tráfego aquático, propaganda, ações diversionárias, defesa anticarro, forças especiais, ligação com outras unidades, saúde e apoio médico, transporte e controle de tráfego terrestre, agências externas, e outras áreas que se façam necessárias.

O advento da tecnologia digital e da NCW permitiu a automatização de muitas tarefas desempenhadas pelos estados-maiores e postos de comando, agilizando muitas das decisões. Por exemplo a execução de uma missão de tiro pela artilharia, alimentada em um sistema informatizado pode demandar o ressuprimento de munição de uma área remota sem qualquer intervenção humana, dependendo dos sistemas disponíveis.

Os estados-maiores compõem os postos de comando da unidades e grandes-unidades e juntamente com o comandante são a parte operativa dos mesmos, que funcionam em uma estrutura física provida pelas subunidades de comando e serviços desta unidades. São alvos prioritários das forças inimigas e a neutralização dos estados-maiores e seus postos de comando poderá acarretar na inoperância tática de seus comandados, total ou temporária, por falta de ordens.