sexta-feira, 19 de julho de 2024

O Sistema Artilharia de Campanha *153


A Artilharia de Campanha é um sistema relativamente complexo, que ao contrário de um grupo de combate de infantaria (GC) ou um pelotão de carros de combate (tropa de cavalaria) que pode combater de forma isolada, necessita de pelo menos 3 operadores sem os quais não tem como realizar o tiro.

São estes a linha de fogo (LF), o observador avançado (OA) e a central de tiro (CTir). A Artilharia age em seu emprego padrão em proveito das armas-base, e posiciona-se à retaguarda desta, pronta para atender seus pedidos de fogo, embora possa também atuar em missões de aprofundamento do combate atendendo a pedidos de fogo do escalão superior. Esta distância depende do alcance do material disponível, que não é empregado no seu limite quando do posicionamento das baterias, pois esta prática sacrificaria a flexibilidade do tiro que tem como uma de suas características a capacidade de ser transportado rapidamente de um ponto a outro sem que os obuses tenham que trocar de posição. Vale lembrar que sempre que existir o risco de fogo de contrabateria deve-se trocar de posição imediatamente após a missão de tiro ter sido concluída.


Uma bateria de Artilharia posiciona-se alguns quilômetros à retaguarda da tropa apoiada, geralmente protegida por uma massa de cobertura (elevação) quando esta existir, e dispara seus projéteis em trajetória balística nos alvos que lhes forem designados, muitas vezes por cima das cabeças dos combatentes que estão em contato direto com o inimigo, em proveito destes.

Devido a esta distância, é impraticável que as baterias possam visualizar seus alvos, cabendo esta função ao observador avançado (OA). Este acompanha ou não os pelotões da tropa apoiada e em contato com seus comandantes, elabora os pedidos de tiro com base nas necessidades táticas destes. Estes pedidos são transmitidos à central de tiro (CTir), que os transforma em elementos de tiro (deriva e elevação), que por sua vez são alimentados nos aparelhos de pontaria das baterias para que as missões de tiro possam ser desencadeadas. Estes pedidos de tiro são transmitidos tradicionalmente via rádio ou telefone, e mais recentemente via link de dados, o que denota a importância de um eficiente sistema de comunicações que apoie o trabalho dos operadores do tiro. Podemos considerar estas ligações de direção de tiro (comunicações) como um quarto operador do sistema de artilharia de campanha.

Uma missão de tiro inicia-se com um pedido de tiro vindo do OA, de um componente da arma-base, da artilharia divisionária, do comando do escalão superior ou outro ator que necessite de apoio de fogo. São repassados neste pedido as coordenadas do alvo no caso de outros "clientes", e em se tratando do OA, cuja posição no terreno é conhecida pela CTir, do ângulo do alvo em relação ao norte partindo da sua posição e a distância que o alvo encontra-se deste. Utilizando-se de meios modernos esta posição pode ser determinada automaticamente por dados de GPS transmitidos via data-link, e o pedido é inserido automaticamente no computador do coordenador de fogos, seja da artilharia divisionária ou de exército (central de tiro de alto escalão cuja função é administrar a distribuição às diversas linhas de fogo, os pedidos de tiro vindo de inúmeras fontes) ou do próprio grupo de artilharia, dependendo da vinculação operacional em que se esteja inserido.


De posse das coordenadas do alvo, informadas ou calculadas a partir da posição do OA, a CTir mede a distância do alvo ao centro de bateria obtendo o alcance a ser utilizado, e consultando tabelas de tiro pré-calculadas para cada alcance obtém a alça (ângulo de tiro) a ser alimentando na peça de artilharia, assim como determina a carga necessária (quantidade de carga de projeção - pólvora a ser utilizada). Mede também o ângulo horizontal (deriva) em relação ao ponto de referência que está sendo utilizado para a pontaria da bateria. Calcula ainda o ângulo de sítio que é negativo se a bateria estiver em um plano mais alto que o alvo e positivo em caso contrário. Podemos visualizar o ângulo de sítio imaginando um triângulo-retângulo no plano vertical e cujas extremidades da hipotenusa sejas as posições do alvo e do centro de bateria. O ângulo formado pela hipotenusa e o plano horizontal é o ângulo de sítio. Este ângulo de sítio é somado a alça anteriormente calculada pela tabela de tiro, resultando na elevação a ser alimentada nos aparelhos de pontaria das peças.


Este elementos de tiro (elevação e deriva) são informados ao comandante de linha de fogo (CLF) que os utiliza para efetuar a pontaria das peças. Utilizando-se de meios modernos todo este processo pode ser automático, visto que as peças, o alvo e o OA tem suas posições determinadas por GPS e são de conhecimento do computador balístico. Este pode apontar a peça ou auxiliar na sua pontaria. O OA informa ainda as características do alvo para que a CTir determine a modalidade de tiro e o tipo de munição a ser usada, bem como a especificação da espoleta para aquela missão, e o número de disparos a ser desencadeado por cada peça.



O CLF após apontar sua bateria e comandar que as peças sejam carregadas autoriza o disparo de acordo com a modalidade de tiro. O tiro, após cumprir sua trajetória balística e ser informado ao OA seu desencadeamento, impacta na área do alvo, é observado pelo OA que comanda a C Tir sua correção, para a esquerda ou direita, mais longo ou mais curto até que satisfaça as especificações de letalidade e precisão, quando é desencadeado na sua forma final de eficácia.

Todo este processo pode se dar por comandos manuais ou de forma altamente automatizada, dependendo da tecnologia disponível. Modernamente utiliza-se localizadores GPS, binóculos com telêmetros eletrônicos para a determinação de distâncias, computadores de coordenação de fogos e balísticos que calculam de forma rápida e precisa os elementos de tiro, tudo interligado por enlaces de dados (NCW). Os alvos são alimentados a partir de uma infinidade de fontes nos computadores de coordenação de fogos, selecionados e priorizados em centrais especialmente dedicadas como as centrais das artilharias divisionárias e de exército, e autorizados conforme sua prioridade.

Uma vez que a linha de fogo (LF) está sob a comando do CLF (oficial que atua como auxiliar do comandante de bateria, e este, além do emprego tático se ocupa de tarefas administrativas), cabe ao comandante da bateria a tarefa de reconhecimento de rotas e posições de troca, de forma que a bateria conta com um plano de emprego constantemente atualizado. Neste reconhecimento o oficial comandante leva em consideração as facilidades de acesso e espaço para desdobramento, resistência do terreno e sua capacidade de suportar o desdobramento da bateria, cobertura e ocultação, contaminação, distâncias e tempo para as percorrer, obstáculos e forças inimigas. Uma equipe, que pode contar com o CLF, pode chegar a nova posição e apontar a bateria, mesmo ela não estando lá ainda.

Um sistema completo de artilharia de campanha envolve ainda elementos de busca de alvos mais sofisticados que podem incluir meios aéreos como drones, operadores de topografia e meteorologia, componentes logísticos e de comando e controle tático. Se houver tempo de realizar um trabalho de topografia, as baterias contarão com elementos de tiro bem mais precisos. Esta descrição procura apenas explicitar de forma simplificada o funcionamento do sistema de observação e fogo, que são o mínimo para que o tiro se realize.



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