Generalidades
O planejamento militar é o conjunto de percepções e intenções que surgem quando um problema militar tem que ser resolvido, entendendo como problema militar uma situação em que forças antagônicas de naturezas diversas estão predispostas a impedir que a intenção do comando, seja ela qual for, seja cumprida. Cabe ao Estado Maior (EM) das forças encarregadas de resolver o problema, executar o planejamento que deve resultar em um plano de ação factível, realista e que traga as mínimas consequências colaterais possíveis, sempre buscando poupar vidas e integridade ambientais e das estruturas. A solução do problema militar é o restabelecimento de uma condição anterior ou a criação de uma nova condição desejável, e é de responsabilidade do comandante designado, que deverá emitir as diretrizes de um plano de ação e orientar seu planejamento, durante o detalhamento pelo EM, que identificará as particularidades deste plano e encaminhará a solução de seus problemas.
Uma ação militar envolve a movimentação de tropas e meios militares, seja com ou sem resistência, que deverá contar com todo o apoio necessário, dentro de um envelope de segurança aceitável com riscos calculados, devidamente coordenado e com seus efeitos avaliados, e se necessário com a implementação de ações complementares que visem aproximar estes efeitos da condição desejada, visando cumprir os objetivos traçados, sempre buscando a eficiência máxima.
O comandante e seu EM planejarão sua ação e transmitirão ordens operativas, que devem ser claras e objetivas (vide Princípios de Guerra). Este planejamento dar-se-á em todos os escalões de comando, envolvendo militares de diversas patentes, sendo atribuição dos oficiais, porém poderá envolver praças se aqueles não estiverem disponíveis e a situação assim o exigir, pois na guerra nem sempre os meios que se tem são os desejáveis.
Uma ação militar bem executada é aquela que cumpre seu objetivo preservando a integridade material e pessoal dos fatores envolvidos ao máximo, preservando a vida de civis e soldados, bem como a integridade das estruturas e atingindo a condição política desejável. A habilidade dos planejadores é o primeiro passo para se alcançar este objetivo.
O Processo de Planejamento Militar (PPM) é a ferramenta que os oficiais planejadores utilizam para conduzirem sua atividade. O PPM não desenvolve no comandante e em seus oficiais, habilidades individuais ou criatividade e perspicácia, mas se vale das ideias e capacidade de resolver problemas dos que já possuem estas habilidades, não se prestando a criá-las.
A complexidade da guerra moderna decorrente de toda a estrutura tecnológica de que é dependente, torna impeditiva a condução de uma operação militar unicamente pelo comandante, mesmo que brilhante, tão complexos os problemas que se apresentam. A volatilidade das situações e mesmo a possibilidade do comandante estar impedido por qualquer razão de exercer sua autoridade, além da necessidades de coleta de inteligência, análise e síntese, requer a presença de uma assessoria na forma do EM, afinal um grupo trabalha melhor que a soma de cada um de seus integrantes isoladamente.
Consciência Situacional
Decisões oportunas e eficazes são a base de um plano bem arquitetado, tomadas com base no julgamento preciso dos conhecimentos e das informações disponíveis. Desenvolver a mais apurada consciência situacional possível é um fator essencial para que um comandante e seu EM possam conduzir um planejamento eficaz, avaliando ações com precisão e tomando decisões adequadas à situação, para se chegar à planos de ação eficazes.
Consciência situacional consiste na percepção precisa e permanentemente atualizada do quadro de situação no qual o comandante ou qualquer outro militar se encontra ou tem que enfrentar. A integração de diversas fontes de conhecimentos, inteligência e da experiência profissional dos planejadores e operadores contribui para uma melhor percepção do ambiente operacional. A capacidade de agregar na percepção do quadro de situação, cada elemento que possa ter influência em relação à missão atribuída, contribui para que esta condição seja atingida da forma mais abrangente. A menor distância entre a situação percebida e a situação real é a condição mais desejada e contribui significativamente para um processo decisório mais pragmático.
A Intenção do Comandante
Ao receber uma
missão do escalão superior, um comandante militar inicial seu ciclo de
planejamento. De forma totalmente mental ele procura entender o problema
militar a ser solucionado e visualiza genericamente como enfrentá-lo. Da mesma
forma, se a missão for primeiramente recebida pelo seu EM. este pode também
mentalmente, absorver sua essência e ao encaminhar a designação recebida ao seu
comandante, sugerir possíveis formas de abordagem. A absorção de um problema
militar requer que o comandante e seu EM lancem mão de seus conhecimentos
acadêmicos, suas experiências tanto no campo do planejamento como da execução,
das características do ambiente operacional e das forças envolvidas; além é
claro de pragmatismo, bom senso e capacidade empreendedora.
Todas as
circunstâncias que envolvem a situação serão posteriormente avaliadas durante o
PPM. Para que o comandante possa mentalizar o entendimento do ambiente
operacional presente e do problema militar que lhes foi confiado, deve fazê-lo
com seus conhecimentos já adquiridos e informações conhecidas, deixando para o
PPM a busca de informações completas, detalhadas e oportunas. Um planejamento
conceitual inicial ajudará o comandante a obter uma compreensão do ambiente operacional e do problema, permitindo, conceber uma ideia base para a confecção
de sua diretriz inicial ou carta de instrução e chegar até a linha de ação mais adequada mais à
frente.
Uma vez alcançada
a compreensão inicial quanto ao ambiente operacional e ao problema militar designado,
parte-se para a visualização da situação final desejada e das possíveis
alternativas possíveis para sua resolução. Este processo mental definirá a
visão do comandante, que poderá ser refinada através de troca de ideias com seu
EM e comandantes subordinados, e fornecerá a base para a diretriz citada. A sequência
deste primeiro entendimento será descrita ao EM e aos comandantes subordinados,
caso ainda não tenham este conhecimento, a fim de nivelar o entendimento da
missão por todos antes do início do PPM propriamente dito. É importante que
todos compreendam o problema, antes de iniciar o planejamento. Este
entendimento deverá gerar uma diretriz inicial, expressa de forma escrita e
também oral se desejar, que será usada como base para o início do PPM, e deve
ser clara e de fácil memorização, de forma a poder ser distribuída aos escalões
inferiores.
Deverá conter a
intenção do comandante, a diretriz de planejamento e os elementos essenciais de
inteligência. A intenção do comandante deverá expressar a finalidade da
operação e o resultado final desejado. Proporcionará foco para o trabalho do EM
e auxiliará os comandantes subordinados e elementos de apoio a agirem para a
busca dos resultados desejados sem a necessidade de novas ordens, mesmo quando
a operação não se desenvolver como foi planejada. Durante o planejamento, a
intenção do comandante direciona o desenvolvimento das linhas de ação; durante
a execução, permite a aplicação da iniciativa dos subordinados diante de
situações imprevistas ou no combate de ameaças. A diretriz de planejamento
transmitirá ao EM a essência da visão do comandante, descrevendo de forma geral
– O QUE, O QUANDO, O ONDE e O COMO (opcional) – o comando pretende empregar o
seu poder de combate para cumprir a missão. Incluirá uma abordagem operativa,
que se constituirá na base do conceito da operação. Descreverá também as
lacunas existentes em sua visualização, indicando quais são os elementos
essenciais de inteligência a serem buscados e quais informações devem ser
protegidas, que se obtidas por força oponente, podem comprometer o cumprimento
da missão.
Etapas do PPM
O PPM se dá em 3 etapas: Primeiro a análise da situação com a inserção da missão no cenário existente e a coleta de inteligência para subsidiar esta primeira etapa, elencando os desafios e obstáculos para se chegar ao objetivo; depois se parte para a coleta de inteligência para verificar a exequibilidade das ideias e hipóteses iniciais, com o desenvolvimento do plano de ação e emissão das ordens de execução subsequentes; e finalmente, já durante o curso da operação, o seu controle e avaliação dos resultados em tempo real.
A primeira etapa é a base do processo. Reconhece-se o problema militar, analisa-se minuciosamente a missão, e se coaduna as conclusões iniciais com as características da área de operações e seus fatores. Considera-se o tempo e forças disponíveis, as distâncias envolvidas, condições meteorológicas e do terreno. Analisa-se também as possibilidades de reação do inimigo, identificando linhas de ação prováveis e decide-se qual a melhor estratégia a adotar, demandando os serviços de inteligência necessários a tomada de decisão.
Na segunda etapa, baseada na linha de ação adotada, parte-se para a elaboração de um plano detalhado, tão detalhado quanto a situação o exigir, e expedição de ordens aos diversos operadores deste plano. Novamente serviços de inteligência necessários ao detalhamento do plano serão demandados.
Na terceira etapa acompanha-se em tempo real o desenrolar da operação, efetuando correções onde se fizerem necessárias, com avaliação dos resultados.
Características do PPM
O PMM é flexível, cíclico e contínuo. Flexível porque pode ser usado na solução de qualquer problema militar, simples ou complexo, operacional ou tático, não sendo suas etapas rígidas, podendo ser desenvolvidas ou mesmo eliminadas. O método (PPM) é que deve adaptar-se ao problema, e não o contrário. Cíclico porque pode-se desenvolver partes já desenvolvidas tantas vezes quanto for necessário, a luz de novos fatos ou melhor análise. Contínuo porque o planejamento só cessa com a resolução do problema ou seja, o cumprimento da missão.
Um PMM deve ser conduzido à luz de preceitos fundamentais. Primeiro que somente se aceite como verdadeiro aquilo que se apresentar claro e indiscutível. Segundo deve ser analisado em partes, tantas quanto necessárias, a fim de simplificar cada ponto a facilitar sua análise e encaminhamento. Terceiro que cada decisão em particular deve ser somada às outras a fim de partir do simples para o complexo. Quarto que todos os fatos e conclusões devem ser enumerados, permitindo que tantas revisões quanto necessárias sejam efetuadas, eliminando a possibilidade de se desconsiderar aspectos relevantes.
Os planejadores devem sempre ter em mente que estão planejando uma "operação militar", que por natureza é perigosa e com grandes chances de "dar errado", que ariscarão a vida de pessoas, utilizarão equipamento caro e muitas vezes difícil de obter ou repor, onde cada detalhe pode ser vital no sucesso ou fracasso da missão.
A sistematização do PPM confere confiança a quem o executa, reduz a subjetividade das conclusões e traz mais confiabilidade ao plano.
Ao empreender um PPM os oficiais planejadores concluem suas sínteses e análises elencando o que as forças devem fazer, na forma de ordens que na prática são a missão de cada uma das tropas ou atores envolvidos. Um quadro sistemático será elaborado com as tarefas serem realizadas e os efeitos que se deseja de cada uma, sendo a soma destes efeitos a condição que se espera, que culminará no cumprimento da missão.
A Emissão de Ordens
As ordens podem ser emitidas determinando qual tarefa a se cumprir, ou qual o resultado que se espera, ou ambos. Por exemplo, o comandante do batalhão pode determinar que a 1ª Cia Fuzileiros domine uma “cabeça de ponte” sobre um determinado rio (tarefa a ser realizada), ou determinar que seja garantida a transposição deste rio para que uma coluna mecanizada possa transpô-lo sem problemas, sem dizer como (efeito desejado), ou ambos.
É importante que os operadores da missão se concentrem em seu objetivo principal (transpor o rio ou dominar a ponte) não perdendo tempo e recursos com objetivos não relacionados a missão. Objetivos eventuais, por exemplo um comboio logístico inimigo casualmente encontrado, podem ser atacados desde que não coloque em risco o cumprimento do objetivo principal. No filme “O Resgate do Soldado Ryan” o Capitão Miller ordenou o ataque a uma posição alemã casualmente encontrada. Seu argumento foi que o objetivo era vencer a guerra e qualquer ação contra os alemães somava. No entanto se seu ataque resultasse na inoperância de seu grupo, sua busca pelo paraquedista perdido não seria levada a efeito, ou seja, sua missão (objetivo principal) não seria cumprida. Além do objetivo principal podem ser designados objetivos secundários, tarefas que podem ser cumpridas se possível, mas não tem a importância do objetivo principal (se der execute, se não deixa pra lá). Por exemplo, no caminho para a ponte tem um transformador de alta tensão que supre uma instalação inimiga e deve ser neutralizado, destruam-no se possível (se der coloquem explosivos nele, senão depois mandamos alguém fazer isso). Desta forma deverá estar claro aos operadores qual é o objetivo da missão (vide Princípios de Guerra).
Assim podemos definir missão como sendo o binômio “tarefa a cumprir + propósito” unidos pela expressão “a fim de”. Dizer “o que fazer” e “porque fazer” é a função do enunciado da missão. Por exemplo, a missão da 1ª Cia de Fuzileiros poderia ser de “Estabelecer o controle sobre a ponte sobre o Rio Diamante a fim de garantir que a FT Blindada Azul possa transpô-lo imediatamente”. Uma missão poderá conter mais de uma tarefa e mais de um propósito, mas deverão estar sempre unidos por esta expressão, uma única vez. Uma missão poderá ser imposta pelo escalão superior ou empreendida por iniciativa do próprio comandante, sendo que esta deverá estar dentro dos propósitos dos objetivos perseguidos e ser plenamente factível, não sendo admitidas aventuras duvidosas.
A Diretiva é o nome do documento que contém a missão, e é composta, normalmente, por 5 títulos principais e numerados como segue (modelo sugerido, existem outros):
1. Situação
4. Logística
5. Comando, Controle e Comunicações
6. Outros (administração e assuntos civis por exemplo)
Cada comandante subordinado deverá retirar da diretiva vinda do escalão superior a tarefa que deve empreender (sua missão designada – item 3.2), sendo seu propósito a decisão de seu superior (item 3.1), para elaborar sua própria diretiva. No título “3. Execução” cada parágrafo refere-se a uma força componente a cada comandante deverá identificar o seu.
Quando a decisão da diretiva superior (ítem 3.1) for igual ao propósito (ítem 2.2) da diretiva do comandante subordinado, este propósito deverá ser retirado diretamente da missão (item 2.1) da diretiva superior, pois cabe a este comandante desenvolver o esforço principal. Se o comandante não estiver sozinho no empenho do esforço principal ou estiver em missão de apoio/proteção, seu propósito sempre se iniciará com a expressão “contribuir para”.
Por exemplo: a 10ª Bda Inf Bld expede uma ordem de operações cuja missão é "Desdobrar meios para transposição do Rio dos Remédios pela rodovia 880, a fim de permitir que as forças designadas possam fincar posição ao norte deste, entre as cotas 678 e 780". No título Execução diz:
- O 101º Btl Eng Cmb Bld desdobrará seus meios de transposição de curso d'agua a fim de permitir às forças designadas a transposição do Rio dos Remédios na rota 670 em D+3,
- O 110º Btl Inf Bld ocupará a área de transposição designada pelo 101º Btl Eng Cmb Bld a fim de contribuir para a segurança da transposição do Rio dos Remédios pelas forças designadas,
- A 120º Bia AAAé proverá segurança antiaérea à transposição desde o início dos trabalhos de desdobramento de meios, a fim de contribuir para a segurança antiaérea da transposição do Rio dos Remédios pelas forças designadas.
No seguimento o comandante do 101ª Btl Eng Cmb emite sua diretiva: Desdobrar meios para transposição do Rio dos Remédios em D+3 a fim de permitir que as forças designadas possam fincar posição ao norte deste, entre as cotas 678 e 780; e o 110ª Btl Inf Bld a sua: Prover segurança a área de transposição a fim de contribuir para que as forças designadas possam fincar posição ao norte deste, entre as cotas 678 e 780.
Outras formas de diretivas são possíveis e poderão apresentar-se em formatos rígido ou não, cabendo neste caso aos comandantes subordinados extraírem suas tarefas do local onde estiverem dispostas.
MUITO OBRIGADO PORQUE FOI MUITO UTIL A ASPECTOS QUE NÃO DOMINAVA AGORA DOMINO.
ResponderExcluirValeu por essa excelente aula. Parabéns.
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