FRASE

"Quem escolhe a desonra a fim de evitar o confronto, a conseguirá de pronto, e terá o confronto na sequência."

sexta-feira, 3 de maio de 2019

Batalha de Latakia: Nova Fronteira na Guerra Eletrônica *166




CC NILSON AUGUSTUS GONÇALVES DE SOUZA

Poucas batalhas navais mudaram o rumo da guerra no mar. Entre aquelas que conseguiram, um grupo muito seleto tornou-se reconhecido. Ou essas batalhas alteraram a balança do poder no mundo, como ocorreu em Trafalgar, ou esses feitos testemunharam a introdução de um conceito totalmente novo na condução da Guerra Naval, como o ocorrido em Midway.

A Batalha de Latakia, cidade Síria cuja importância estratégica deve-se à posse do único porto bem protegido da sua costa, logrou contemplar as duas situações, provando ao mundo que a Marinha Israelense estava no mesmo nível das demais forças singulares. Destacou-se por ser a primeira batalha naval na História em que foram empregados os mísseis e a tática do jamming, Medida de Ataque Eletrônico (ESMs) que visa inserir no receptor radar inimigo um sinal de interferência, de forma a despistá-lo. Essa batalha demonstrou o poder de um ataque realizado com rapidez e a efetividade das técnicas evasivas contra mísseis.

O pequeno combate, ocorrido em sete de outubro de 1973, na costa da Síria, durante os primeiros momentos da Guerra do Yom Kippur, travada entre Israel e uma coalizão de países árabes, durante o feriado judeu  que leva o mesmo nome, foi um sinal de como se deu a evolução na Guerra Naval e da mudança na tática de engajamento de Forças Navais.

Durante o primeiro dia das hostilidades, a Força-Tarefa Israelense foi enviada com a tarefa de atrair os navios-patrulha sírios, de modo a afastá-los do porto e, então, engajá-los. Vários acontecimentos concorreram para tornar difícil esta tarefa. Os mísseis superfície-superfície (MSS) subsônicos Gabriel, com alcance de 11 milhas náuticas (MN) e guiagem semi-ativa, que equipavam os navios israelenses, ainda não haviam sido empregados contra alvos reais e, por isso, não tinham sua eficácia conhecida. Além disso, eles possuíam aproximadamente a metade do alcance do MSS SS-N-2 Styx sírio, de fabricação soviética, que, em 21 de outubro de 1967, durante a Guerra dos Seis Dias, havia afundado o Destróier Eilat, também israelense, quando foi lançado de um navio-patulha rápido egípcio da classe Komar, marcando a primeira ocorrência de afundamento de um navio por míssil.

As defesas israelenses contra o  Styx consistiam de ESMs, que, até aquele momento, também não haviam sido empregadas. Esses desafios, contudo, foram enfrentados pela Força-Tarefa Israelense operando em duas colunas paralelas de três navios-patrulha, na direção do porto sírio da Latakia. Naquela ocasião, foi detectado pelos radares um contato de superfície ao norte da posição em que se encontravam. Sem terem o quadro tático completamente compilado, os israelenses fizeram fogo com seus canhões de 76 mm, e,  rapidamente, foram respondidos por salvas de canhões de 40 mm sírios. O contato havia sido estabelecido. 

O oficial em comando tático da força-tarefa israelense, Almirante Michael Barkai, ordenou ao Hanit destacar-se da coluna e engajar o navio-patrulha sírio, nesse momento, já identificado. O navio foi facilmente afundado, atingido no alcance máximo do canhão do Hanit. Sem saber se o navio-patrulha sírio havia denunciado a posição da Força-Tarefa, os israelenses apressaram-se em fechar distância de terra.

Com a aproximação de terra da força-tarefa israelense, um novo contato radar surgiu, dessa vez a 12 MN a nordeste de sua posição. Um dos navios lançou um míssil Gabriel, mas, como o contato estava fora do alcance, o armamento foi perdido na água. A perseguição continuou até entrar no alcance do armamento do Navio Patrulha Reshef, da coluna de boreste, que disparou outro MSS Gabriel a 9 MN, afundando um navio varredor sírio de 560 toneladas. 

Os israelenses sabiam que o verdadeiro desafio eram os Styx e mantiveram o rumo até as proximidades do porto sírio de Latakia. Três contatos surgiram nos seus radares, próximos à costa. Eram navios-patrulha sírios, um da classe Osa 3 e dois Komars, que lançaram mísseis a uma distância superior ao alcance dos Gabriel. Contudo, os israelenses lançaram despistadores chaff e usaram jamming para enviar sinais falsos contra os mísseis, numa tentativa de confundir seus radares.

Cabe destacar que a tecnologia e os procedimentos supracitados, desenvolvidos pelos próprios israelenses, apesar de terem sido usados em combate pela primeira vez, tiveram logo constatada suas validades. Os mísseis foram desviados com sucesso, perdendo-se no mar. Os israelenses continuaram a aproximação, confiantes na sua tática, até então inovadora, que empregava uma forma furtiva de aproximação, levando seus oponentes a lançarem seu armamento no alcance máximo, combinada com a utilização de chaff  e jamming. Somente um dos navios sírios ainda possuía mísseis – o Osa.



Os israelenses fecharam distância em velocidade máxima, lançaram uma salva devastadora de mísseis Gabriel e efetuaram jamming contra outros dois mísseis Styx, logrando mais uma vez êxito na tática empregada. Os 150 kg da cabeça de combate dos MSS Gabriel foram mais do que suficiente para garantir a destruição dos navios-patrulha sírios, que afundaram rapidamente. Após os engajamentos de Latakia, a Marinha Síria foi contida em seus portos. O combate encerrou-se com um total de cinco unidades de superfície sírias afundadas. 

As perdas israelenses nesse episódio foram nulas. Chegou-se a um ponto decisivo na guerra naval. As inovações introduzidas pelo uso do chaff e jamming forjaram os procedimentos evasivos básicos empregados até hoje. De fato, até as marinhas dos países árabes atualmente empregam a mesma tática que a Marinha Israelense tornou conhecida em Latakia.

O míssil Gabriel atuou com perfeição, sendo capaz de detectar alvos de pequeno porte e, apesar de seu limitado alcance, angariou fama nos anais da Guerra Naval. Atualmente, ele é também empregado pelas Marinhas do Chile, Equador, Quênia, Taiwan, Singapura, África do Sul e Tailândia. 

O desenvolvimento  tecnológico alcançado pelos israelenses na construção do equipamento de ESM, bem como as informações de inteligência sobre o míssil Styx, que muito pouco tempo antes havia afundado o destróier Eilat, demonstra a importância do aprestamento de sua Força Naval. Tendo sido testada e aprovada, com sucesso, no mar, contribuiu na imposição de uma derrota de caráter tático e moral ao seu inimigo.




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