FRASE

"Quem escolhe a desonra a fim de evitar o confronto, a conseguirá de pronto, e terá o confronto na sequência."
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quarta-feira, 19 de agosto de 2020

A Luta pelas Colinas do Golan *200

 

Morashá
 
A monotonia do Yom Kippur foi quebrada por fortes explosões provenientes de um pesado bombardeio aéreo e de artilharia por volta das 14:00 horas do dia 06 de outubro de 1973, sobre posições israelenses ali estacionadas em guarnição ao longo da fronteira com a Síria. Começara as luta pelas Colinas do Golã. Não era possível imaginar a ferocidade dos combates que se seguiriam, e as condições nas quais foram travados, tampouco o desgaste físico e mental a que foram submetidos os soldados israelenses. Em apenas 18 dias de luta, 772 deles morreram e 2.453 ficaram feridos, muitos dos quais gravemente.
 
O Golã era, sem dúvida alguma, a frente mais preocupante naquela que seria a mais difícil guerra travada por Israel. Apesar de não ser tão forte quanto o egípcio, o exército sírio representava a maior ameaça. Enquanto que os egípcios teriam que atravessar quase 240 km de deserto antes de chegar a uma área pouco povoada no extremo sul do território israelense, os sírios estavam a apenas 32 km da Galileia.
 
O plano da Síria era tomar as estratégicas colinas que dividiam os 2 países num único dia, saturando a limitada defesa israelense ali presente. 2 divisões da infantaria síria atacariam simultaneamente toda a extensão dos 65 km da “Linha Roxa”, a linha de cessar-fogo após a Guerra de 1967. O plano previa tomar os postos de observação e os 10 pontos altamente fortificados que Israel mantinha ao longo da fronteira. Com a construção de um sistema de obstáculos e fortificações no extremo Leste do platô e uma trincheira antitanque ao longo de toda a extensão da “Linha Roxa”. Logo atrás desta trincheira, construíram postos de observação (POs) e bunkers de concreto para ter uma contínua observação de qualquer força que se aproximasse pelo Leste. Os pontos fortes e de observação localizados no Norte estavam a cargo da Brigada Golani, e os do Sul, do 50º Batalhão de Paraquedistas. As fortificações e defesas israelenses nas Colinas eram formidáveis, quando totalmente guarnecidas com o número adequado de infantaria e tanques – só que esse não foi o caso em outubro de 1973. Em cada ponto forte Israel tinha entre 10 a 20 soldados da infantaria, e a dotação de armamento ali existente, bem como de munição era insuficiente para fazer frente a um ataque mais pesado.
 
A estratégia síria contava com a assustadora disparidade que havia entre as forças israelenses e sírias até a chegada dos reservistas ao Golã: 200 soldados da infantaria israelense teriam que enfrentar 40 mil sírios e 177 tanques israelenses, 1.400 sírios. Não fosse pela chegada da 7ª Brigada de Blindados do General Ben-Gal, a proporção de tanques não teria sido de 8 para 1, mas de 18 para 1. A estimativa síria era que levaria ao menos 24 horas para que os reservistas israelenses chegassem à frente com o domínio da posição antes disso.


 
As Primeiras Horas do Dia 6 de Outubro
 
No Golã, ao contrário do ocorrido na Península do Sinai, onde uma mensagem interceptada de um posto de observação da ONU alertara as forças israelenses sobre o iminente ataque da artilharia egípcia, não houve aviso algum. O bombardeio iniciado às 14:00 horas, simultaneamente ao ataque ao Canal de Suez pelos egípcios, durou 50 minutos. Logo em seguida, uma densa coluna de tanques sírios e de VBTPs (veículos blindados para transporte de pessoal) começou a avançar. Os sírios acreditavam que, ao alvorecer, menos de 16 horas após o início das hostilidades, o Golã estaria em suas mãos.
 
Enquanto as primeiras explosões sacudiam a região, 4 helicópteros sírios decolaram em direção à posição israelense, no Monte Hermon. Seu topo, ocupado por Israel durante a Guerra dos 6 Dias, era um dos principais alvos sírios. Israel construíra no alto da montanha uma plataforma super-avançada de Inteligência. Às 14:45 horas os atacantes chegaram à plataforma. Dos 55 israelenses estacionados no Hermon, apenas 12, pertencentes à Brigada Golani, eram encarregados da defesa. Os demais eram elementos da Inteligência militar e técnicos. Em sua primeira tentativa de investir contra a posição em um ataque frontal, os sírios sofreram 50 baixas. Reagruparam-se e voltaram a atacar. Os israelenses, em inferioridade numérica, foram dominados: 13 israelenses morreram e 31 foram aprisionados, com 11 conseguindo fugir pelas encostas da montanha. A captura do Monte Hermon foi um revés potencialmente fatal para as IDF. Além de sua importância simbólica como “Os olhos de Israel”, os modernos equipamentos eletrônicos lá instalados monitoravam toda a atividade ao longo da fronteira e também em áreas tão distantes como a capital síria, a uns 25 quilômetros à Leste.
 
Nas primeiras e extremamente críticas horas da guerra, o General Yitzhak Hofi, Comandante Geral do Comando Norte, o segundo no comando e os comandantes de divisão estavam reunidos em Tel Aviv com o Estado Maior. Até o Gen Hofi retornar ao centro de comando em Nafach – por volta das 16:30h – o Tenente Coronel Uri Simhon tomou decisões estratégicas. Sua decisão de deslocar 3 batalhões de blindados para o Setor Norte e dois para o Sul, sem deixar nada na reserva, determinaram o rumo da batalha que viria a seguir, para o melhor ou para o pior. Sua decisão foi em parte tomada porque o Comando Norte acreditava que caso houvesse um ataque sírio, este ocorreria no Norte, pois caso conseguissem penetrar, os sírios poderiam rapidamente alcançar Nafach – a principal base de comando israelense no Golã – e a ponte de B’not Yaacov, que era a principal passagem entre o Golã e Israel, propriamente dito.  De volta a Nafach, Hofi dividiu a frente de batalha: a Sétima Brigada do Coronel Ben-Gal seria responsável pelo Norte do Golã e a 188a Brigada de Blindados e a Brigada Barak, do Cel. Yitzhak Ben-Shoham, pelo Sul.
 
Após cruzar a “Linha Roxa”, as forças sírias enfrentaram forte resistência israelense. Ao longo de toda a fronteira, as tropas de Israel lutaram uma batalha desesperada com coragem e determinação, sabendo o que estava em jogo. Atos de extraordinária bravura foram registrados. Nos pontos fortes, apesar de não estarem preparados para enfrentar um ataque mais pesado, os soldados da infantaria repeliram o inimigo. Apenas o Monte Hermon caíra. O profissionalismo das tripulações de blindados e suas táticas, sua pontaria apurada e seu curtíssimo tempo de reação, comparados com as equipagens sírias, contrabalançaram a disparidade das forças e o choque sofrido com a surpresa do ataque. Mas isso nem sempre bastou; em muitos casos, os israelenses foram vencidos pela mera superioridade numérica dos sírios.
 
Acima do campo de batalha, barreiras de mísseis SAM-6 impediam aos A-4 Skyhawks da Força Aérea de Israel realizar com êxito missões de suporte para deter o ataque sírio. Posteriormente, alguns observadores da ONU estacionados ao longo da “Linha Roxa” relataram que os primeiros aviões da IDF apareceram sobre o Golã poucos minutos após o irromper da guerra. 4 Skyhawks voaram baixo em torno do Hermon, mas antes de poderem atingir qualquer alvo sírio, dois deles explodiram nos céus atingidos pelos SAMs. Ao entardecer, parecia que a determinação israelense conseguira desacelerar a ofensiva síria. Um grande número de blindados inimigos havia sido destruído e, no Norte, a situação estava sob controle. As informações tranquilizadoras recebidas pelo Comando Central, no entanto, provaram ser temporárias.


 
Madrugada de 6 para 7 de Outubro – Maciça Infiltração Síria
 
Independente da resistência encontrada e das baixas sofridas, os sírios continuavam a pressionar. Antes do anoitecer, 2 de suas brigadas atacaram o Setor Norte e 4, o Sul, onde uma brigada israelense, com um pequeno número de tanques, teve que enfrentar 600 blindados sírios. Durante toda a noite de 6 para 7, tanques sírios começam a se infiltrar maciçamente entre os pontos fortes. Pelotões israelenses tiveram que enfrentar batalhões inteiros do exército sírio. E, assim que escureceu, os israelenses perceberam que teriam que lutar em grande desvantagem. Seus tanques Centurion não tinham visão noturna – como os tanques soviéticos equipados com faróis e projetores infravermelhos, que podiam iluminar os alvos sem que os israelenses sequer tivessem ideia de que estavam sendo iluminados. Os israelenses podiam contar apenas com um escasso número de artifícios de iluminação e alguns binóculos infravermelhos de uns poucos comandantes de tanques. Isto significava que, à noite, as forças de Israel estavam “cegas” para o que acontecia além de sua frente imediata. Lutaram, no entanto, com garra, contornando a falta de visão noturna com táticas criativas.
 
Ao perceber que a linha de defesa no Sul era mais “porosa” que no Norte, os sírios intensificaram o ataque no Sul, cabendo ao pequeno contingente de tanques israelenses que havia na área um enfrentamento bem maior de tanques sírios. A luta travada no Sul testemunharia a garra e coragem dos soldados e dos comandantes de campo israelenses. Enquanto o desânimo e a falta de coordenação havia tomado conta do Comando Geral, pequenos e isolados grupos de soldados guiados por sua perícia e motivação pessoal continuaram a combater.
 
A capacidade do exército israelense de rapidamente se reagrupar e formar novas unidades de combate, conforme a necessidade, e de seus homens se adaptarem a novas circunstâncias, foram essenciais na luta contra o inimigo. Após o fim da guerra, um líder de pelotão de tanques afirmou: “Logo na primeira hora de combate ficou claro que a batalha ficara nas mãos dos comandantes de companhia e de pelotão, e dos comandantes de blindados, individualmente (...). Para quem lutava, havia apenas duas opções: sucumbir ao choque ou se tornar um tigre feroz e continuar lutando”.
 
Pouco mais de 12 horas após o início da contenda, as forças sírias tinham-se infiltrado maciçamente entre os pontos fortes e já havia forças inimigas no interior do Golã, pelas estradas que levavam ao Lago Kineret (Mar da Galileia). Uma brigada síria chegara ao assentamento religioso de Ramat Magshimim menos de uma hora depois que os estudantes de uma Yeshivá tinham sido evacuados. Exceto por um pequeno contingente que estava a alguns quilômetros, não havia nada para impedi-los de chegar ao Vale do Jordão, ou de descer para as margens do Lago Kineret. Este, no entanto, não era o plano de Damasco, cujo principal objetivo era Nafach – onde estava o Comando Central do Norte, e a Ponte B’not Yaacov.


 
Não Haverá Retirada de Ramat HaGolan
 
Apesar da ferocidade do ataque sírio desde as primeiras horas do conflito, sua dimensão só ficou clara para o Gen Hofi depois da meia-noite. A situação no Sul era crítica. As forças engajadas na batalha poderiam contar com a chegada de um número significativo de reservistas somente à tarde e ele não sabia se seus homens aguentariam até lá.Preocupado, ele alertara o Estado Maior, o Gen Elazar e a Moshé Dayan que havia a possibilidade das tropas não conseguirem manter o controle sobre as Colinas. Logo na manhã do dia 7 de outubro, Dayan fora à sede do Comando do Norte para se reunir com Hofi para ver “se Israel perderia o Golã”. Deprimido com a situação de suas tropas, Hofi repetiu sua preocupação. A resposta de Dayan foi uma frase que ele iria repetir inúmeras vezes nos dias seguintes: “Não haverá retirada de Ramat HaGolan”.
 
Apesar de suas palavras, Dayan sabia que a situação era crítica. Ele contata então o General Benjamin Peled, comandante da IAF, e, ao saber que estava sendo preparado para aquele dia um ataque aéreo para eliminar as plataformas de SAMs egípcias estacionadas no Canal de Suez, disse-lhe: “Esqueça, há apenas areia no Sinai e o Canal do Suez está a quase 240 quilômetros de Tel Aviv. O Terceiro Templo (metáfora que Dayan utilizava ao se referir ao Estado de Israel) está em extremo perigo. Os tanques sírios romperam as linhas das Colinas do Golã e estão avançando rumo ao Vale do Jordão. Precisam ser detidos. Se nossos aviões não atacarem até o meio-dia, os sírios poderão chegar ao Vale do Jordão”.
 
A decisão de cancelar o ataque aéreo no Sinai e transferir os aviões para o Golã iria afetar o curso da Guerra de Yom Kipur. A maioria do staff de Peled se opôs à decisão, argumentando que não fazia sentido suspender um ataque que havia sido cuidadosamente planejado e que poderia desestabilizar as forças egípcias. Ademais, não haveria tempo útil para preparar uma investida no Golã. Os helicópteros, com equipamentos eletrônicos que seriam utilizados para “despistar” os radares dos SAMS, estavam no Sinai, além do que era impossível realizar uma missão fotográfica para confirmar se as baterias SAM-6 ainda estavam onde haviam sido fotografadas na tarde anterior. No final da manhã do dia 7 de outubro, 60 Phantoms executaram voos rasantes sobre as Colinas do Golã, investindo contra a concentração de blindados sírios e as baterias SAM. A operação foi um fracasso.
 
Apesar dessa primeira investida não ter tido êxito, os pesados sacrifícios feitos pela IAF nos 2 primeiros dias da guerra tiveram um importante papel na luta pelo Golã. Os persistentes ataques da aviação israelense mantiveram as forças sírias ocupadas com a defesa de seu espaço aéreo. Os céus de Israel foram mantidos a salvo de aviões hostis, permitindo aos reservistas chegar às frentes de combate sem interferência inimiga. Estes sucessos, no entanto, não aliviavam a angústia das tropas engajadas na batalha que olhavam para o céu se perguntando: “Onde estava a força áerea?”. A IAF controlava os céus sobre toda a Síria e todo o Egito, exceto na estreita faixa sobre as zonas de batalha dominadas pelos SAMs. Mas era ali que a Guerra de Yom Kipur seria vencida ou perdida.


 
A Chegada dos Reservistas
 
No início do segundo dia de combate o alto comando sírio recebeu a informação de que os reservistas israelenses haviam chegado ao Golã, em um prazo bem menor do que o estimado. Se os israelenses estavam adiantados pelo cronograma dos sírios, estes estavam bem atrasados, pois não haviam conseguido pressionar e romper as linhas de defesa de Israel quando ainda estavam em posição de vantagem.
 
Diferentemente da Guerra dos 6 Dias, quando os reservistas israelenses haviam tido 3 semanas de treinamento, dessa vez estavam indo para a guerra sem nenhum preparo adicional. Ao subir em direção às Colinas, muitos eram ainda civis em uniforme; mas, quando chegaram ao topo, eram soldados prontos para a luta. Mesmo após a chegada dos reservistas, o Comando do Norte havia iniciado os preparativos para uma eventual evacuação, caso as defesas falhassem. Entre outras providências, os engenheiros estavam preparando uma barreira de minas antitanques à margem sul do Lago Kineret, e os bulldozers estavam prontos a interromper as estradas que desciam das Colinas.
 
Combates pesados continuaram ao longo do dia 7 com muitas perdas de ambos os lados. O Gen Elazar pediu a Hofi que formasse uma segunda linha. “É vital manter a presença no Golã até a chegada da Divisão de Reserva do General Moussa Peled”. Hofi respondeu que não tinha certeza se poderia fazê-lo.
Ao anoitecer, o General Dan Laner e o General Raful Eitan chegaram a um acordo para divisão de comando no Golã. A linha divisória foi estabelecida aproximadamente a um quilômetro ao Sul da estrada B’not Yaacov-Kuneitra. Eitan comandaria as forças israelenses ao Norte daquela linha inclusive, e Laner ao Sul.
 
Batalha do Vale das Lágrimas
 
Uma das mais sangrentas batalhas foi travada na área ao Norte de Kuneitra, entre o Monte Hermonit e uma cadeia de montanhas ao Sul, chamada de “Booster”, em Israel, ou Tel el Mekhafi, em árabe. No primeiro dia de guerra, uma Divisão síria atacou a Brigada Barak. Era o início de uma amarga batalha por território vital, ao qual os israelenses posteriormente chamariam de “Vale das Lágrimas”, em hebraico, Emek Ha-Beka’a, em virtude do grande número de tanques queimados e destroçados que foram abandonados no local.
 
Um dos heróis dessa batalha foi o Tenente-coronel Avigdor Kahalani. Na tarde do dia 6 ele deslocou sua unidade, sob forte fogo de artilharia e ataque aéreo, para posições de bloqueio no Booster e rapidamente entrou em ação. A disparidade entre as forças sírias e israelenses era enorme: cerca de 500 tanques sírios contra 40, sob o comando de Kahalani.
 
A luta no Vale do Beka’a durou vários dias e foi implacável. Os israelenses repeliram os ataques dos blindados sírios, um atrás do outro. Ainda que suas baixas fossem pesadas, os sírios continuavam determinados – se conseguissem se juntar à infantaria no setor El Rom, não haveria nada que se interpusesse entre eles e Kiryat Shmona, no Norte de Israel.
 
Os israelenses também tinham sofrido baixas do intenso fogo de artilharia inimiga. No quarto dia, Ben-Gal comunicou-se por rádio com o Gen Eitan, informando que não acreditava que a Sétima Brigada fosse aguentar muito mais. Eitan prometeu que logo receberiam reforços. Os sírios, percebendo a possibilidade de uma iminente vitória, estavam tentando penetrar para além da linha das rampas de blindados israelenses abandonados. Quando só restavam às forças israelenses apenas 12 tanques e praticamente nenhuma munição, uma nova unidade de reserva – a do Tenente-coronel Yossi Ben-Hanan, que voltara de sua lua-de-mel direto para os campos de batalha – juntou-se à luta.
 
De repente, os israelenses recebem de um ponto forte a informação de que as colunas de suprimentos sírias estavam batendo em retirada. A batalha pelo Booster estava terminada e Israel saíra vencedora. O General Eitan, que observava a batalha do alto de um espigão na montanha, fala pelo rádio com Ben-Gal e seus homens : “Vocês salvaram Israel”. Os sobreviventes da Sétima Brigada de Blindados estavam sem dormir há 80 horas e tinham lutado, sem parar, durante mais de 50 horas. Só tinham restado 12 de seus tanques; contudo, eles derrubaram 260 tanques sírios e 500 outros veículos.


 
Batalha de Nafach
 
Um dos principais alvos da ofensiva síria era Nafach. Caso conseguissem tomá-la, além de capturar o Centro de Comando do Golã, poderiam facilmente tomar a ponte B’not Yaacov no rio Jordão. Se Nafach caísse em mãos inimigas, Israel perderia o controle da Região Norte e Central do Golã. Na noite de sábado, 6 de outubro, o Tenente Zwi ‘Zwicka’ Greengold, com um único tanque, conseguira bloquear o avanço sírio pela Tapline1. Mas, no início da tarde seguinte havia blindados sírios às portas de Nafach. Apesar do Gen Hofi e outros oficiais já terem deixado o local para estabelecer o Comando Central numa localidade mais ao Norte, o Gen Eitan ainda permanecia no bunker do Comando. Através de uma enigmática mensagem – pois não podia deixar que o inimigo soubesse que o comandante de uma Divisão israelense estava preso em Nafach – o Gen Eitan alertou o Cel. Ori Orr, comandante do 679º Batalhão da Reserva. Ori, que estava a alguns quilômetros de distância, e equipes de blindados que haviam ouvido a mensagem de Eitan, dirigiram-se imediatamente para Nafach, atingindo o perímetro com os sírios já nos portões. Abriram fogo até que não houvesse mais em quem atirar.
 
O Gen ‘Raful’ Eitan não costumava bater em retirada perante o inimigo. Posteriormente Eitan confessaria que tinha resolvido por conta própria que, acontecesse o que acontecesse, ele não se retiraria do Golã. Mas, claramente, a base não era segura para servir de posto de Comando de Divisão e transferiu seu QG para o Norte. Brigadas de Blindados dos 2 países enfrentam-se numa dura batalha. Unidades de blindados israelenses que convergiam de direções distintas passaram a preencher o vazio pelo qual a Divisão Síria havia conseguido penetrar e, ao cair da noite, Orr tinha garantido o domínio sobre Nafach. O Comando Norte foi informado de que “não havia tanques sírios em funcionamento” nas proximidades imediatas da cidade. Em seu livro, Chaim Sabbato, que lutou como franco-atirador no Batalhão sob o comando de Orr, relata suas palavras aos jovens soldados prestes a lutar: “Perdemos muitos tanques... Mas venceremos. Não temos escolha”.
 
A luta por Nafach é um exemplo das características que permitiram às forças israelenses recuperar seu equilíbrio e vencer o inimigo. Pequenos grupos, operando de forma independente com guarnições reunidas aleatoriamente, não hesitavam em se arremeter contra um inimigo bem mais numeroso, com coragem, motivação e profissionalismo exemplares. Naquela mesma noite, Orr conseguiu estabelecer uma linha de defesa estreita, de 6 km de comprimento, em terreno elevado que corria paralelo à estrada Nafach–Kuneitra – a primeira no Golã Central desde o início da guerra.
 
Os israelenses sabiam que precisavam deter os sírios até que suas formações de reserva chegassem à frente, caso contrário a Galileia do Norte seria devastada pelos blindados sírios. Mas a situação das IDF era muito difícil; a escassez de munição estava tão premente que os jipes voavam de um destroço de tanque a outro para resgatar os cartuchos ainda intactos. Na tarde do dia 7 de outubro, enquanto as batalhas no Sul e no Norte estavam sendo travadas, o Alto Comando da Síria realizava uma fatídica reunião em Katana, seu QG de campo. O eixo Norte, pelo qual eles tinham contado com a tomada rápida da jugular do Golã – Nafach e a Ponte B’not Yaacov – estava bloqueado e a batalha ainda corria solta. Mas, no Setor Sul, apesar da forte resistência que retardou seu cronograma durante horas e destroçou vários batalhões, ainda assim os sírios tinham conseguido infiltrar centenas de tanques capazes de alcançar as pontes do Jordão praticamente sem oposição. Uma brigada síria estava a 1.200 m da El Al, e outra, na Yehudia Road, a menos de 10 km do Lago Kineret. Contudo, tinham sofrido pesadas baixas, particularmente quando se aventuraram para além de seu guarda-chuva de SAMs e dessa forma oferecendo alvos fáceis à IAF. A reunião chegou a uma decisão de importância crucial: as forças sírias no Sul do Golã teriam que suspender o combate às 17:00h. Quando os sírios decidiram retomar seu avanço, suas chances de alcançar o Rio Jordão “já eram”...
 
Apesar de os israelenses ainda estarem em situação muito difícil, nas batalhas os sírios já haviam mostrado falhas táticas e de comando, e suas forças, ao contrário das israelenses, não tinham grande flexibilidade tática no campo de batalha. Ao anoitecer de 7 de outubro, um novo ânimo desponta nas tropas de Israel, após a chegada ao Golã da Divisão de Reserva do General Moshe Peled (Moussa). As IDF decidem lançar um grande contra-ataque pouco mais de 36 horas após o início da ofensiva síria.


 
O contra-ataque de Israel
 
As IDF iniciaram o contra-ataque às 08:00h do dia 8. Por volta do meio-dia, após enfrentar uma pesada luta, o Gen Moussa Peled alcança Tel Faris. À noite, o Cel. Orr toma Tel Ramtania, um espigão altamente fortificado nos montes Khushniyah. A Divisão do Gen Laner conseguia, também, gradualmente, ir empurrando os sírios em direção ao Sul.Na terça-feira, 9 de outubro, e na quarta, em um esforço conjunto – coordenado, ao Norte, por Laner e, ao Sul, por Peled, os israelenses encurralaram as forças sírias em Khushniya. Após um feroz embate, 2 brigadas da Primeira Divisão Blindada síria haviam sido destruídas. Os remanescentes do Exército Sírio bateram em retirada, grandes contingentes atravessando a Linha de Cessar Fogo. À noite, não havia uma única unidade síria em território à Leste da “Linha Roxa”.
 
No platô do Golã, os sírios haviam deixado atrás de si quase 900 tanques, muitos dos quais T-62s, centenas de metralhadoras e de VBTPs, milhares de veículos e quantidades enormes de equipamentos. A ofensiva lançada em 6 de outubro terminara em uma esmagadora derrota e os sírios estavam de volta no ponto de partida, e Israel estava prestes a lançar forte contra-ataque em território sírio.
 
A eficiente reação da IAF foi de grande importância nessa fase da guerra. Em 8 de outubro, aviões israelenses bombardearam as bases aéreas sírias. Dentro de uma semana, praticamente todas estavam inoperantes. No dia 9, em resposta ao ataque sírio de uns 10 mísseis sobre alvos israelenses, a IAF lançou uma ofensiva estratégica contra a Síria, que incluiu um raid aéreo bem sucedido, com 8 Phantoms, que atingiram o QG da Força Aérea síria, em Damasco.Nos dias seguintes, a FAI passou a bombardear a Síria infligindo pesados danos táticos e estratégicos sobre sua infraestrutura, inclusive sobre o sistema gerador de força e a indústria de petróleo. Até o final da primeira semana de guerra, com o sistema de mísseis SAMs praticamente destruído, os aviões israelenses atingiam Damasco e outras cidades sírias, e portos do Mediterrâneo. Israel sabia que para reduzir sua vulnerabilidade, seus inimigos tinham que levar intensos golpes, cujas consequências econômicas seriam sentidas por muitos anos.
 
A Contraofensiva Israelense
 
Na noite de 10 de outubro, o gabinete israelense, orientado por seu Chefe do Estado Maior, Gen Elazar, tinha que decidir, se explorava seu sucesso contra a Síria ou concentrar-se-ia no Egito. As recomendações do Estado Maior, transmitidas por Moshé Dayan a Golda Meir, eram para que se avançasse através da “Linha Roxa” para penetrar 20 km. Desta forma, colocariam Damasco na mira da artilharia de longo alcance. Esperava-se, assim, infligir uma fragorosa derrota aos sírios, sem, no entanto, provocar a intervenção soviética. Golda Meir deu seu consentimento e o planejamento se desenrolou de imediato. A intenção de Hofi era não dar tempo aos sírios de se recuperarem, mas isso também significava atacar com forças que tinham pouco ou nenhum tempo para se reorganizar, após exaustivos combates. O plano israelense se baseava na economia de esforço no Centro e no Sul do país, de modo a concentrar as forças no Norte, ameaçando a capital síria. O eixo do avanço centrava-se na rota mais curta para Damasco.
 
A Hora H foi fixada para as 11:00 horas de 11 de outubro. O Exército sírio estava, então, perante um inimigo revigorado, pronto para entrar em seu território. Na noite anterior, Ben-Gal reunira seus comandantes e lhes dissera que sua entrada na Síria lhes permitiria vingar a morte de seus camaradas tombados na desesperada defesa de seu país. O grosso das tropas sírias estavam concentradas nos arredores de Damasco, ao passo que os aliados árabes que haviam se juntado à luta – marroquinos, sauditas, iraquianos e jordanianos – recebiam a tarefa de retardar a investida israelense.Na sexta-feira, dia 12, as forças israelenses já estavam dentro do território sírio rumo a Damasco, encontrando maciça resistência. À medida que a divisão comandada por Laner ampliava sua penetração, unidades iraquianas passam a lutar ao lado dos sírios. O ataque iraquiano foi facilmente repelido. Os israelenses continuaram a avançar, atingindo a região próxima a Kfars Shams. No dia seguinte, paraquedistas capturaram o estratégico monte de Tel Shams, com um saldo de apenas 4 feridos. No domingo, 14, as IDF suspenderam a ofensiva e consolidaram suas posições dentro da Síria com Damasco sob mira de sua artilharia. Forças árabes tentaram frear o contra-ataque israelense, mas as IDF já haviam estabelecido uma forte linha defensiva, difícil de ser rompida.
 
No dia seguinte, os israelenses transferem a prioridade dos suprimentos e do poder aéreo militar para o Deserto do Sinai, contra os egípcios. 2 dias depois, com as forças israelenses com suas posições já consolidadas dentro da Síria, a artilharia de longo alcance continua bombardeando os arredores de Damasco. Durante os 4 dias que seguem, as tropas sírias, iraquianas e jordanianas montam ataques descoordenados e ineficazes contra posições israelenses. O Monte Hermon foi reconquistado no dia 22 de outubro. Israel conseguiu encerrar a guerra recuperando o controle de seus estratégicos “Olhos sobre o Sinai”, que permitiam o domínio de todas as áreas de combate e colocavam a capital síria ao alcance de sua artilharia. Este era o cenário quando Damasco aceitou o cessar-fogo em 22 de outubro. Durante a luta, os sírios perderam mais de 3.500 homens.
 
A brilhante defesa travada pela Sétima Brigada e Brigada Barak nos primeiros dias da guerra continua sendo um dos feitos militares mais extraordinários do século 20, e entrou para a História como uma das grandes batalhas defensivas de todos os tempos, igual à batalha do Somme na 1ª Guerra Mundial ou a de Monte Cassino, na 2ª Guerra.
 
A natureza defensiva da batalha, no entanto, expôs as IDF à plena fúria da artilharia síria, que cobrou um preço punitivo e pesado principalmente sobre os comandantes dos tanques, que representaram quase 2 terços das vítimas israelenses no Golã.


terça-feira, 27 de agosto de 2019

O Raid Aéreo Israelense na Guerra dos 6 Dias *174




Roy Reis Friede

Guerra dos 6 dias, 1967. Israel executa uma impressionante operação de bombardeio contra as bases aéreas egípcias e destrói em menos de 3 horas, em uma das mais espetaculares ações militares já vistas, a quase totalidade da força aérea daquele país ainda no solo.

Às 07:45 h da manhã de segunda-feira. 5 de junho, houve o primeiro ataque aéreo israelense. Foi dirigido contra 10 aeroportos, dos quais 9 foram atingidos, precisamente ao mesmo tempo. O décimo, foi atacado poucos minutos mais tarde, pois ainda estava semi-encoberto pela neblina matinal sobre o canal.

Os aparelhos tinham levantado voo a intervalos cuidadosamente cronometrados, a fim de atingirem o alvo ao mesmo tempo, tirando assim, partido de um máximo de surpresa.

Cada ataque foi levado a cabo por 4 aeronaves voando aos pares, os quais chegaram aos seus objetivos e executaram suas missões exatamente de acordo com as instruções e todas as bombas explodiram. Os 10 aeroportos atacados foram: El Arish, Gebel Lbni, Bir Gifgafa, Bir Thamada, Abu Sueir, Kabrit, Inchas, Cairo Oeste, Beni Sueif e Fayid.

A maior parte da Força Aérea Egípcia foi surpreendida no solo, com exceção de 4 aeronaves que, no momento do ataque compunham uma esquadrilha em treinamento desarmadas, pilotados por 1 instrutor e 3 alunos.

A Escolha do Horário

4 razões fizeram que este horário (07:45- hora de Israel) fosse escolhido:

  1. O estado de alerta do Egito estava em nível máximo. Era fácil presumir que desde que os egípcios iniciaram sua concentração de tropas no Sinai, há 3 semanas, haviam várias esquadrilhas de Migs-21 esperando na cabeceira da pista prontos para decolar em 5 minutos, todas as manhãs. 1 ou 2 patrulhas provavelmente estariam no ar àquela hora, propícia a um ataque inimigo, porém seria pouco provável que a prontidão fosse mantida indefinidamente. Ao constatar que nenhum ataque ocorrera dentro de 2 ou 3 horas após a alvorada, o estado de alerta foi relaxado desligando alguns de seus radares. Os israelenses estimaram em 07:30 h (08:30 no Cairo) para esta condição.
  2. Ataques aéreos são feitos ao alvorecer. Como os pilotos tem que estar prontos 3 horas antes da decolagem, significa que precisam levantar-se por volta da meia-noite, ou simplesmente não dormirem. Ao anoitecer do primeiro dia de guerra eles teriam estado de vigília durante 36 horas, com toda a noite e possivelmente o dia seguinte de ação a sua frente. Efetuando o ataque às 07:45 eles poderiam dormir até perto das 4 horas.
  3. Nesse período do ano, uma neblina matinal cobre o Nilo, o Delta e o Canal de Suez. Por volta das 07:30 h ela geralmente se dispersa e, às 08:00 h o tempo costuma estar ótimo e a visibilidade atinge o máximo, devido ao âgulo do sol, o ar fica parado, fator importante para a pontaria dos bombardeiros sobre as pistas-alvo.
  4. 07:45 (hora de Israel) equivale às 08:45 no Cairo. Por que 07:45 em vez de 08:45? Os egípcios começam a trabalhar às 09:00. Um ataque 15 minutos antes surpreenderia os generais e comandantes da Força Aérea Egípcia a caminho dos seus gabinetes,e os pilotos e o pessoal de terra dirigindo-se para seus cursos de treinamento e outras atividades.
O General Hod estava em seu QG quando a última patrulha matinal egípcia levantou voo e mostrou-se nos radares israelenses. Olhou para seu cronômetro. Sabia perfeitamente quanto tempo eles permaneceriam no ar. Às 07:45 as patrulhas estariam quase sem combustível e preparando-se para aterrizar.




Os Migs em voo

Os objetivos principais do primeiro ataque eram tornar as pistas inutilizáveis e destruir o maior número de Migs-21 possível, pois eram os únicos caças egípcios que poderiam frustar os planos da aviação israelense de destruir a forças de bombardeiros egípcios de longo alcance, maior ameaça a população civil de israel. 8 formações de Migs-21 foram destruídas quando estavam rolando  à extremidades das pistas.

Antigamente os israelenses tinha conseguido persuadir os egípcios a remover 20 dos seus caças de primeira linha, 12 Migs-21 e 8 Migs-19 da área ao redor do Cairo e do Canal de Suez (onde estão concentradas as principais bases egípcias) para Hurghada, mais ao sul, onde estavam praticamente fora de combate.

Os israelenses tinham conseguido isso alguns dias antes, enviando aeronaves de reconhecimento para sobrevoar o Golfo de Ácaba, fazendo-os pensar que o ataque seria a leste, na extremidade da península do Sinai ao invés de um envolvimento pelo oeste vindo do mediterrâneo. Em Hurghada eles ficaram efetivamente afastados das áreas de atuação da aviação israelense. Após o ataque, estas aeronaves não mais se dirigiram para o sul rumo a Luxor e outras bases no Egito Superior, às quais lhes dariam proteção, dirigiram-se para o norte, para as bases próximas ao Canal, onde constataram que suas pistas estavam destruídas e caíram em mãos inimigas.

Além destes, apenas 2 esquadrilhas de 4 Migs-21 puderam levantar voo, e conseguiram abater 2 caças israelenses, os quais posteriormente foram abatidos.


O Ataque

A aviação israelense, em esquadrilhas de 4 aeronaves, avançou por diversas rotas, algumas por uma curta rota circular a direita por sobre o mar, rumo às bases ao redor do Cairo, do Canal e do Sinai. Outras avançaram diretamente para as bases no Egito Superior. Voando extremamente baixo, não mais que 10 metros da superfície, mantiveram-se fora das telas dos radares egípcios. Os israelenses também não queriam aparecer nas telas dos radares russos, ingleses e americanos que também estavam presentes e monitoravam a situação.

O uso do radar já era intenso àquela época. Os egípcios tinham 16 unidades só no Sinai, e outros países também queriam saber o que se passava. Haviam navio russos ancorados na área e a Sexta Frota americana fazia voar suas patrulhas-radar baseadas em porta-aviões, além de seus radares de superfície e do navio de elint USS Liberty. Os ingleses possuiam um radar baseado em Chipre, no alto do monte Trudos.

Os sistemas de ECM vinham sendo aperfeiçoados desde a II Guerra, a fim de interromper, confundir ou despistar por meio de artimanhas eletrônicas, os radares inimigos. Os israelenses não estavam alheios a estas práticas, nem tampouco eram novatos nela. Durante a II Guerra os ingleses utilizaram-se de  transmissores-rádio de alta potência, com controladores de fala alemã, para transmitir informações falsas aos pilotos do Reich, nas frequências que se sabia que utilizavam. Eram todos recrutados entre judeus que haviam fugido da Alemanha antes da eclosão da guerra. Os israelense estavam na vanguarda da utilização destes sistemas, atividades ECM e similares.

Embora 23 estações-radar egípcias tivessem sido postas foram de ação, dentre elas as 16 do Sinai, iso não foi feito antes da tarde de segunda-feira. As ECM não foram usadas antes 07:45 h  para não alertar os egípcios de algo estava para acontecer. Mas não ha dúvidas de que depois disso os israelenses  interferiram pesadamente não só contra os radares egípcios, mas também contra os observadores indesejados.

Quando a primeira vaga atingiam seus alvos, a segunda já estava a caminho e a terceira acabava de levantar voo, com partidas a intervalos de 10 minutos. Cada esquadrilhas de 4 aeronaves tinham 7 minutos para atingir seus alvos, o bastante para 3 ou 4 passagens. Mais 3 minutos foram acrescentados para compensar erros de navegação ou outra passagem sobre o alvo. Os israelenses operavam com incrível rapidez. O tempo de rotação concedido às aeronaves atacantes era o seguinte:

  • tempo até o alvo: aprox 22 1/2 minutos
  • tempo sobre o alvo: aprox 7 1/2 minutos
  • tempo para regresso: aprox 20 minutos
  • tempo de reabastecimento: aprox 7 1/2 minutos
Isto quer dizer que as aeronaves podiam sobrevoar seus alvos pela segunda vez a menos de 1 horado ataque inicial.

Para defender Israel e suas bases a Força Aérea Israelense deixou apenas 12 caças. 8 voando em cobertura e 4 em alerta na extremidade da pista. Israel jogou alto. Era ganhar ou perder, mas os riscos haviam sido cuidadosamente calculados e os planejadores israelense jogaram com confiança e decisão.




Discutindo o bombardeio dos aeroportos egípcios, o Gen Weizmann disse: " Nós podíamos ter sobrevoado os objetivos apenas 1 vez, mas os nossos rapazes não são de poupar esforços". Os pilotos atacantes sobrevoaram várias vezes seus alvos para conseguir melhor pontaria e consequentemente  inflingir maiores danos. Utilizaram-se em grande escala e com máxima eficiência o bombardeio de mergulho. "É por isso que não nos interessam os bombardeiros estratégicos. não temos interesse de atacar a população civil. Para destruir aeroportos e aparelhos os nossos caças são mais que eficientes" comentou Weizmann.


As bombas Israelenses

A quase total destruição da aviação egípcia em terra não se deveu apenas à surpresa, mas em parte também a uma bomba que os israelenses desenvolveram e aperfeiçoaram especificamente para destruir pistas. Assim que a bomba deixa seu vetor, um foguete de retroação é disparado e fim de deter-lhe o impulso, diminuindo sua velocidade. A seguir um foguete propulsor a acelera em direção a pista. Mal ela penetra no concreto uma espoleta de tempo a detona, podendo ser instantaneamente ou de ação retardada. Normalmente as pistas são fáceis de consertar, mas a situação se complica se  as bombas continuam a explodir.

O objetivo dessa bomba especial é permitir que os caças atinjam as pistas em voo rasante  em alta velocidade. Uma bomba comum, lançada desta maneira, rebateria e causaria danos superficiais. O engenho israelense afasta a necessidade de voar até junto às bocas da antiaérea inimiga num taque de mergulho. Nem todos os caças atacantes possuíam estas bombas, e muitos valeram-se de bombas comuns de 200 e 500 kg, lançados em mergulho de 2000 metros de altura. Os caças egípcios, tanto em terra quanto no ar, foram quase todos destruídos por fogo de canhão.




A Antiaérea Egípcia

O fogo antiaéreo egípcio foi bem mais leve que os israelenses esperavam, e não muito certeiro. Embora os egípcios lançassem vários dos seus SA-2 da fabricação soviética nem um só aparelho israelense foi atingido por eles. A altitude em que os israelenses os operavam, provaram ser totalmente ineficazes. Demoram muito para adquirir velocidade, sendo inúteis abaixo dos 1500 m de altitude. Em certo momento um piloto israelense viu o que parecia ser outra aeronave aproximando-se calmamente, como se para juntar-se ao dele em formação. Tornou a olhar e percebeu que se tratava de um míssil. Voava na mesma direção que sua aeronave e aproximava-se dele pelo lado. O piloto chegou-se para ele e deixou-o passar por baixo. O míssil continuou a voar até perder-se de vista. Estes mísseis foram por muito tempo a principal arma de defesa russa. Sua inutilidade, além do fato de vários deles caírem em mãos ocidentais foi de muita preocupação para os planejadores soviéticos.

A Artilharia Balística Egípcia

Havia bastante apreensão por parte da população civil israelense quanto aos tão apregoados mísseis superfície-superfície que Nasser proclamara poderem alcançar Tel-Aviv. Havia anos que sabia=se que uma equipe de cientistas alemães e da Europa Oriental trabalhavam num centro de pesquisas, criado por Nasser nos arredores do Cairo e que os mísseis haviam sido os astros das paradas comemorativas do dia da revolução, na capital egípcia. Mas este tipo de míssil não foi utilizado, e pareceu que não passava de um mito. A aviação israelense não aproveitou a oportunidade que teve de destruir este centro de pesquisas, provavelmente responsável pela fabricação do gás venenoso que as tropas egípcias usaram no Iemem. Lamentou um oficial da Força Aérea Israelense: "Acho que ainda vamos nos arrepender de não termos tomado essa decisão".

O ataque continua

Durante 80 minutos sem trégua, a Força Aérea Israelense, castigou os aeroportos egípcios, seguindo-se após 10 minutos de intervalo 80 minutos de ataques. Nessas 2 horas e 50 minutos, os israelenses destruíram o potencial ofensivo da aviação egípcia, arrasando-a como força de combate.

Ao todo, 19 aeroportos egípcios foram atingidos no primeiro dia de guerra. Além dos 10 anteriores mencionados mais Mansura, Helwan, El Minya, Almaza,  Luxor, Deversoir, Hurghada, Ras Banas e Cairo Internacional foram também atacados nessa manhã.

a Força Aérea Israelense calculou que nesses 170 minutos destruiu 300 das 340 aeronaves de combate egípcias, inclusive todos os 30 bombardeiros TU-16 de longo alcance.

O grande aeroporto de El Arish, no Sinai, foi a única das bases atacadas cujas pistas não foram postas fora de ação, já que os planos israelenses eram de utilizá-lo como base de abastecimento e evacuação de baixas. Na terça-feira ã noite ele já estava sendo utilizado para esse fim.

Em mais de uma das bases egípcias a aviação israelense destruiu todas as aeronaves, ma deixou intactos os falsos aparelhos, sob a sua cobertura de camuflagem. Quando lhe perguntaram se isso se devia a má imitação ou ã capacidade da inteligência israelense, um oficial respondeu que a ambos, acrescentando porém que em Abu Sueir, perto de Ismaília, tinham feito também explodir algumas contrafações, além de atingir todos os aviões de verdade. Disse que nos aeroportos do Sinai, em que a inteligência israelense funcionou ainda melhor do que nos principais aeroportos egípcios, não houve tais enganos.




A resposta da comunidade árabe

Assim como os israelenses haviam calculado não terem as aeronaves soviéticas no Mediterrâneo ligação direta com o alto comando egípcio e serem capazes de transmitir informações do seu radar aos egípcios, no espaço de 10 minutos, igualmente o General Hod contava ter um avanço de umas 2 horas para lidar com a Força Aérea Egípcia, antes da intervenção síria e jordaniana. Na realidade teve 4 horas. Só ao meio-dia é que os sírios e jordanianos envolveram-se no combate. A esta altura os israelenses já haviam destruído a maior parte das aeronaves inimigas e podiam voltar-se contra os novos adversários. "Podemos ter de enfrentar a Síria e a Jordânia em 25 minutos", comentou Hod laconicamente.

Pouco antes do meio-dia da segunda-feira, a Força Aérea Síria lançou suas bombas perto da refinaria de petróleo da baía de Haifa e atacou o aeroporto de Megido, onde destruíram alguma aeronaves de imitação. Os Israelenses reagiram atacando uma base síria perto de damasco.

Após um ataque jordaniano ao meio dia contra a base de satélites israelense de Kefer Sirkin, em que destruiu no solo uma aeronave de transporte Noratlas, a aviação israelense bombardeou os aeroportos de Mafraq e Amã, na Jordânia,  pondo-os fora de ação, e a instalação de radar de Ajlun.


Antes do anoitecer da segunda-feira os israelenses fizeram novas incursões a maioria dos 23 aeroportos que haviam atacado no decorrer do dia. Além de utilizar bombas comuns, empregaram as de ação retardada pra que explodissem periodicamente durante a noite, impedindo qualquer tentativa de reparar as pistas.Como se isso não bastasse, prosseguiram ainda com seus ataques contra estas bases durante a maior parte da noite.

Quando na manhã seguinte, a Força Aérea Iraquiana atacou a cidade de Natanya, os israelense imediatamente revidaram atacando a base aérea H3, a mais ocidental do Iraque, próxima da fronteira com a Jordânia.

Após fazer uma demonstração um pouco ao norte do mar da Galiléia, com um par de caças Hawk, um dos quais foi abatido, os libaneses retiraram-se honrosamente da guerra.

O saldo das ações

Até o cair da noite do segundo dia da guerra, os israelense haviam destruídos 416 aeronaves, sendo 393 em terra. Haviam feito mais de 1000 incursões, sendo que alguns pilotos participaram de 8 por dia. Ao anoitecer da terça-feira  um total de 26 caças israelenses haviam sido abatidos, incluindo 6 Fouga Magister de treinamento, equipados com foguetes de 68/80 mm de ação anticarro. 

Foram perdidos 21 pilotos, sendo cerca da metade feitas prisioneiros da Síria e do Egito. O Iraque devolveu 2 aviadores, assim como a Jordânia. Um piloto foi dado como linchado no Egito, e outro voltou a salvo para Israel. Houveram negociações para devolução de 2 outros prisioneiros dos egípcios. Pelo menos 2 dos pilotos atingidos sobre a Síria, preferiram não observar a orientação de seus comandos e se lançar de paraquedas, optando por estatelar-se com suas aeronaves a cair em mãos sírias.

Os danos contra a Força Aérea Egípcia, foram calculados nesses dois dias em cerca de 500 milhões de Dólares, perdendo-se não somente aeronaves, mas também equipamentos de solo, incluindo 23 estações de radar, além de vários parques de lançamento de mísseis superfície-superfície, sendo 16 deles no Sinai.

Porém o equipamento não é tudo e talvez sejam precisos muitos anos para restaurar o moral e o espírito da Força Aérea Egípcia. Calcula-se que cerca de 100 de seus 350 pilotos tenham perecido nos ataques. Em vista da grande quantidade de Migs-21 destruídos rolando pela pista, este números provavelmente incluem uma grande proporção dos mais experientes profissionais da caça egípcia.

Nasser sabia perfeitamente que, pelo menos pelos padrões egípcios, o israelenses não tinham uma grande força aérea. Possuíam um total de cerca de 300 aeronaves, dos quais 50 ou 60 Fouga Magister de treinamento, equipados com foguetes anticarro. Entretando tinha-lhe chegado a noticia de leva após leva de elementos israelenses atacando 19 de suas bases aéreas, a intervalo de 10 minutos, durante 2 horas e 50 minutos, quase ininterruptamente.

No seu discurso de renúncia, a 9 de junho, Nasser declarou: "Se agora dissemos que o golpe foi muito mais forte do que esperávamos, devemos também dizer, ao mesmo tempo e com certeza, que ele foi muito mais forte do que os seus recursos permitiam... O inimigo atacou de uma só vez todos os aeroportos civis e militares da República Árabe Unida. Isso significa que Israel contava com algo mais do que a sua força normal para proteger seus céus de qualquer revide de nossa parte... Pode-se dizer, sem medo de exagerar, que o inimigo contava com uma força aérea 3 vezes mais potente do que a sua normal".


Esta referência de uma força 3 vezes superior é significativa. Sem dúvida ele se baseou no tempo de reabastecimento de sua própria aviação. Os israelense ficaram sabendo, através de planos secretos da Força Aérea Egípcia, apreendidos em El Arish, que os egípcios baseavam seus planos no fato de suas aeronaves voltarem a sobrevoar os alvos de 3 em 3 horas, em vez de em 1 hora ou menos, como neste ataque. E isso, apesar de muitas das aeronaves egípcias terem um distância muito menor a percorrer, para alcançar as principais bases israelenses desde os seus aeroporto no Sinai, do que os israelense para chegar as bases ao redor do Cairo e do Canal de Suez. Comparando com o tempo de abastecimento, que é de 7 a 10 minutos para os israelenses, o dos egípcios era superior a duas horas.

Enquanto os egípcios calculavam 2 incursões diárias para cada aparelho, muitos dos pilotos israelenses fizeram 8 e alguns até mais, na segunda-feira da guerra.

A disparidade destes números fala por si e nela, sem dúvida, reside a principal causa da vitória de Israel.

Pensa-se que Nasser imaginava uma grande batalha de confronto a maneira britânica na península do Sinai, entre suas forças aéreas centrada em duelos aéreos a maneira antiga. Mas mesmo supondo que os israelenses não tivessem dado o golpe decisivo, pegando quase todas as aeronaves egípcias em terra, há poucas razoes pra crer que o resultado final fosse outro. Segundo os israelenses, em 64 lutas de aparelho contra aparelho, 50 Migs egípcios foram abatidos, contra nenhum Mirage israelense. Até mesmo os subsônicos Vautours e Mysteres puderam derrubar os Migs-21.

As aeronaves israelenses destruídas foram atingidas por fogo antiaéreo nos deslocamentos ou quando efetuavam os ataques. O General Hod foi conclusivo: "Em combates entre aparelhos, o escore foi de 50 x 0. Abatemos 50 Migs sem nenhuma perda".

As razões do sucesso

Como conseguiram obter um sucesso tão absoluto em tão pouco tempo? Eis as razões apresentadas pelo General Hod:


  1. 16 anos de planejamento estavam por trás desses 80 minutos iniciais. "Vivíamos com o plano, dormíamos com o plano, comíamos o plano. Estávamos sempre a aperfeiçoá-lo".
  2. Conhecimento dos movimentos e atividades do inimigo e da situação e dos pormenores  das suas bases aéreas: da concentração de suas aeronaves, da localização de seus radares e mísseis antiaéreos.
  3. O controle operacional: capacidade de absorver e integrar nos planos existentes as novas informações que vão chegando e transmiti-las aos pilotos no ar, desempenhou papel vital para o sucesso da operação.
  4. A execução do plano pelo pilotos (cuja idade média era de 23 anos) foi o quarto elo vital para o sucesso. Refletiu anos de treino de voo, de navegação e de precisão de bombardeio. "Normalmente esperamos que os resultados na guerra sejam cerca de 25% inferiores aos dos exercícios em tempo de paz, devido a excitação e ao fogo antiaéreo. Na realidade porém,  os resultados foram ainda melhores que os dos exercícios, talvez porquê os pilotos estavam tensos e procurando concentrar todos seus esforços em obter um máximo de precisão e eficiência. Talvez também por não terem de observar os regulamentos de segurança aérea vigentes em tempos de paz. Ficaríamos satisfeitos se cada aeronave destruísse 1 aparelho inimigo em cada missão. Na realidade os números foram muito superiores". Numa ocasião, 2 aeronaves israelenses destruíram 16 bombardeiros egípcios em terra, num espaço de 4 minutos.
Há anos que os israelenses vinham praticando esse tipo de ataque. No Neguev Meridional há 4 ou 5 alvos várias vezes atingidos por milhares de bombas, em exercícios de ataque. Pelo menos uma vez por ano são efetuados ataques a estes alvos e, assim, nenhuma aeronave deixou de atingir o objetivo no momento exato, embora navegando apenas com base na estimativa.




A boa qualidade humana e o alto nível de treino não desempenharam seu papel apenas nos ares. Foram igualmente importantes em terra. Abastecer modernas aeronaves de combate em 7 ou 10 minutos e conservar uma força aérea que faz mais de 500 incursões diárias, requer enorme capacidade e coordenação. Observou o General Hod após o término da guerra:

"Às 07:45 h da manhã de segunda-feira a disponibilidade das nossas aeronaves era superior a 99% e mantivemos esse nível durante toda a semana de operações. Embora possa ter levado 1 hora remendando buracos em 1 ou 2 aparelhos, nunca nenhum dos nossos caças ficou fora de combate, excluindo os que perdemos. Jamais tivemos pilotos à espera de aeronaves".

E o General Weizmann recordou: "3 ou 4 meses antes da guerra, um grande contingente de americanos provenientes de escolas de estado-maior da aeronáutica, visitou Israel. Tinham estado no Cairo e ficaram impressionados com o que haviam visto. O mesmo aconteceu na Jordânia, em face do que Hussein lhes dissera. Quando me competiu falar-lhes tive a impressão de que achavam que estávamos fritos. Contei-lhes o que costumávamos dizer durante a II Guerra Mundial: Os alemães voltaram a cercar-nos , pobres-diabos! Pareceu-me que eles nos achavam muito pretenciosos. Não se enganavam, mas tínhamos boas razões para isso".

Às 10:35 h (hora de Israel) da manhã de segunda-feira, a Força Aérea do Egito fora destruída. Não mais constituía uma força de combate ativa e não podia dar cobertura ou apoio ao seu exército no Sinai.

O tempo agora era vital para os israelenses. A maioria do gabinete estava apavorada ante a perspectiva de um cessar-fogo premturo. Tinham recordações desagradáveis vividas em  1956, quando a pressão dos EUA levara a ignominia e a derrota a ingleses, franceses com a vitória já à vista. Todo o plano israelense fora concebido pensando-se que haveria pouco tempo e que a vitória teria de ser a mais rápida e decisiva possível. Seu plano era ousado. Alguns diriam mesmo que arriscado. Mas ao contrário dos ingleses e franceses, no seu ridículo fiasco de 1956, os israelenses possuíam uma ideia precisa do inimigo e da sua capacidade. Esse seria o segredo do seu sucesso.

48 horas era tudo precisavam para desmoralizar o exército de 100.000 homens que Nasser tinha no Sinai. Teriam também que alcançar o Canal de Suez, capturar Sharm El Sheikh e tomar Jerusalém e a maior parte da margem ocidental do Jordão. Mas dispunham dessas 48 horas? Dayan estava ansioso. Se Nasser tivesse sido informado pelos comandantes da sua força aérea da verdadeira situação dessa força e considerasse, acima de tudo, os interesses do seu povo, poderia ter exigido uma sessão de emergência do Conselho de Segurança e pedido um imediato e incondicional cessar-fogo. Se Nasser tivesse feito isso, Israel ficaria numa posição difícil. Foi por esse motivo que Dayan exortou os comandantes israelenses a avançarem com o máximo de velocidade, mas poucos precisavam ser exortados.

sexta-feira, 3 de maio de 2019

Batalha de Latakia: Nova Fronteira na Guerra Eletrônica *166




CC NILSON AUGUSTUS GONÇALVES DE SOUZA

Poucas batalhas navais mudaram o rumo da guerra no mar. Entre aquelas que conseguiram, um grupo muito seleto tornou-se reconhecido. Ou essas batalhas alteraram a balança do poder no mundo, como ocorreu em Trafalgar, ou esses feitos testemunharam a introdução de um conceito totalmente novo na condução da Guerra Naval, como o ocorrido em Midway.

A Batalha de Latakia, cidade Síria cuja importância estratégica deve-se à posse do único porto bem protegido da sua costa, logrou contemplar as duas situações, provando ao mundo que a Marinha Israelense estava no mesmo nível das demais forças singulares. Destacou-se por ser a primeira batalha naval na História em que foram empregados os mísseis e a tática do jamming, Medida de Ataque Eletrônico (ESMs) que visa inserir no receptor radar inimigo um sinal de interferência, de forma a despistá-lo. Essa batalha demonstrou o poder de um ataque realizado com rapidez e a efetividade das técnicas evasivas contra mísseis.

O pequeno combate, ocorrido em sete de outubro de 1973, na costa da Síria, durante os primeiros momentos da Guerra do Yom Kippur, travada entre Israel e uma coalizão de países árabes, durante o feriado judeu  que leva o mesmo nome, foi um sinal de como se deu a evolução na Guerra Naval e da mudança na tática de engajamento de Forças Navais.

Durante o primeiro dia das hostilidades, a Força-Tarefa Israelense foi enviada com a tarefa de atrair os navios-patrulha sírios, de modo a afastá-los do porto e, então, engajá-los. Vários acontecimentos concorreram para tornar difícil esta tarefa. Os mísseis superfície-superfície (MSS) subsônicos Gabriel, com alcance de 11 milhas náuticas (MN) e guiagem semi-ativa, que equipavam os navios israelenses, ainda não haviam sido empregados contra alvos reais e, por isso, não tinham sua eficácia conhecida. Além disso, eles possuíam aproximadamente a metade do alcance do MSS SS-N-2 Styx sírio, de fabricação soviética, que, em 21 de outubro de 1967, durante a Guerra dos Seis Dias, havia afundado o Destróier Eilat, também israelense, quando foi lançado de um navio-patulha rápido egípcio da classe Komar, marcando a primeira ocorrência de afundamento de um navio por míssil.

As defesas israelenses contra o  Styx consistiam de ESMs, que, até aquele momento, também não haviam sido empregadas. Esses desafios, contudo, foram enfrentados pela Força-Tarefa Israelense operando em duas colunas paralelas de três navios-patrulha, na direção do porto sírio da Latakia. Naquela ocasião, foi detectado pelos radares um contato de superfície ao norte da posição em que se encontravam. Sem terem o quadro tático completamente compilado, os israelenses fizeram fogo com seus canhões de 76 mm, e,  rapidamente, foram respondidos por salvas de canhões de 40 mm sírios. O contato havia sido estabelecido. 

O oficial em comando tático da força-tarefa israelense, Almirante Michael Barkai, ordenou ao Hanit destacar-se da coluna e engajar o navio-patrulha sírio, nesse momento, já identificado. O navio foi facilmente afundado, atingido no alcance máximo do canhão do Hanit. Sem saber se o navio-patrulha sírio havia denunciado a posição da Força-Tarefa, os israelenses apressaram-se em fechar distância de terra.

Com a aproximação de terra da força-tarefa israelense, um novo contato radar surgiu, dessa vez a 12 MN a nordeste de sua posição. Um dos navios lançou um míssil Gabriel, mas, como o contato estava fora do alcance, o armamento foi perdido na água. A perseguição continuou até entrar no alcance do armamento do Navio Patrulha Reshef, da coluna de boreste, que disparou outro MSS Gabriel a 9 MN, afundando um navio varredor sírio de 560 toneladas. 

Os israelenses sabiam que o verdadeiro desafio eram os Styx e mantiveram o rumo até as proximidades do porto sírio de Latakia. Três contatos surgiram nos seus radares, próximos à costa. Eram navios-patrulha sírios, um da classe Osa 3 e dois Komars, que lançaram mísseis a uma distância superior ao alcance dos Gabriel. Contudo, os israelenses lançaram despistadores chaff e usaram jamming para enviar sinais falsos contra os mísseis, numa tentativa de confundir seus radares.

Cabe destacar que a tecnologia e os procedimentos supracitados, desenvolvidos pelos próprios israelenses, apesar de terem sido usados em combate pela primeira vez, tiveram logo constatada suas validades. Os mísseis foram desviados com sucesso, perdendo-se no mar. Os israelenses continuaram a aproximação, confiantes na sua tática, até então inovadora, que empregava uma forma furtiva de aproximação, levando seus oponentes a lançarem seu armamento no alcance máximo, combinada com a utilização de chaff  e jamming. Somente um dos navios sírios ainda possuía mísseis – o Osa.



Os israelenses fecharam distância em velocidade máxima, lançaram uma salva devastadora de mísseis Gabriel e efetuaram jamming contra outros dois mísseis Styx, logrando mais uma vez êxito na tática empregada. Os 150 kg da cabeça de combate dos MSS Gabriel foram mais do que suficiente para garantir a destruição dos navios-patrulha sírios, que afundaram rapidamente. Após os engajamentos de Latakia, a Marinha Síria foi contida em seus portos. O combate encerrou-se com um total de cinco unidades de superfície sírias afundadas. 

As perdas israelenses nesse episódio foram nulas. Chegou-se a um ponto decisivo na guerra naval. As inovações introduzidas pelo uso do chaff e jamming forjaram os procedimentos evasivos básicos empregados até hoje. De fato, até as marinhas dos países árabes atualmente empregam a mesma tática que a Marinha Israelense tornou conhecida em Latakia.

O míssil Gabriel atuou com perfeição, sendo capaz de detectar alvos de pequeno porte e, apesar de seu limitado alcance, angariou fama nos anais da Guerra Naval. Atualmente, ele é também empregado pelas Marinhas do Chile, Equador, Quênia, Taiwan, Singapura, África do Sul e Tailândia. 

O desenvolvimento  tecnológico alcançado pelos israelenses na construção do equipamento de ESM, bem como as informações de inteligência sobre o míssil Styx, que muito pouco tempo antes havia afundado o destróier Eilat, demonstra a importância do aprestamento de sua Força Naval. Tendo sido testada e aprovada, com sucesso, no mar, contribuiu na imposição de uma derrota de caráter tático e moral ao seu inimigo.




domingo, 24 de maio de 2015

Operação Ópera/Babilônia #101



O Ataque a Usina Nuclear de Saddam

Original: http://aeromagazine.uol.com.br/artigo/ataque-cirurgico-a-usina-nuclear-de-saddam_854.html#ixzz3b4el0b8Q

Eu estava nadando na piscina quando ouvi explosões e vi fumaça subindo do outro lado do rio. E o inferno explodiu, com cada canhão da cidade atirando. Mas era tarde demais”, relembrou o britânico Duncan Kirby, em 2006, à BBC News. Era 7 de junho de 1981 e Kirby, aos 21 anos, foi um dos trabalhadores ocidentais que testemunharam o ataque aéreo israelense que arrasou a usina nuclear de Osirak, em Bagdá. Ali se encerrava a possibilidade do regime de Saddam Hussein produzir uma bomba atômica. Quase na mesma hora em que o jovem percebia que algo de excepcional estava acontecendo, a tensão se dissipava entre os pilotos que sobrevoavam o leito do rio Tigre com pós-combustores acionados. 

Ao ouvir a chamada hesitante: “Eshkol Quatro... Quatro, tudo em ordem”, o comandante da esquadrilha Ze’ev Raz, a bordo de seu F-16A Fighting Falcon, informou aliviado ao comando: “Charlie completo”. Em código, era a melhor notícia possível: “Missão cumprida sem baixas”. O resultado final, os oito pilotos só saberiam depois de pousar na base de Etzion, no deserto do Sinai, então ocupado por Israel.

Maioria dos pilotos reunidos em Etzion, logo após o pouso do ataque ao reator planejado em minúcias e executado com precisão quase absoluta, o ataque entrou para a história da aviação pela ousadia, marcando a primeira grande operação do caça General Dynamics F-16 Fighting Falcon – a estreia ocorrera dois meses antes, também com Israel, no abate a tiros de canhão de um helicóptero Mil Mi-8 sírio, no Vale do Bekaa. 

Duramente criticado pelas Nações Unidas, o bombardeio cirúrgico surpreendeu o mundo. Conhecido como Operação Ópera ou Operação Babilônia, a ação volta à memória três décadas depois, enquanto crescem as tensões no Oriente Médio em meio a informações, ainda desencontradas, de que Israel teria promovido um ataque aéreo em território sírio, além da desconfiança de que o programa atômico do Irã esconde o desenvolvimento de ogivas nucleares a serem lançadas por mísseis capazes de atingir Tel-Aviv.



ESCOLHAS

Os obstáculos para a operação eram imensos: a distância (mais de 2.000 km entre ida e volta), a necessidade de sobrevoar território hostil (Jordânia ou Arábia Saudita) e um alvo bem defendido. Além dos MiG-23 iraquianos, o reator era defendido por baterias antiaéreas quádruplas (ZSU-23-4 Shilka) de 23 mm, duplas de 57 mm (ZSU-57-2 Obyekt500) e cinco baterias com 60 mísseis terra-ar SA-6, capazes de abater um avião entre 30 e 12.000 m de altitude.

Antes da definição pelo F-16A Netz (Falcão, em hebraico), a Hel Ha-Avir, a Força Aérea de Israel, examinou com cuidado as aeronaves de seu inventário, o tipo mais adequado de armamento e os parâmetros da missão. Os caça- -bombardeiros mais numerosos eram o pequeno e leve McDonnell Douglas A-4 Skyhawk, veterano do Vietnã, e o IAF Kfir, uma evolução local do Mirage III. Ambos não possuíam alcance suficiente e seus radares e visores estavam ultrapassados. Os candidatos naturais eram o McDonnell Douglas F-15 Eagle e o McDonnell Douglas F-4E Phanton II. O F-15 Eagle era então o caça mais moderno do mundo. Além de possuir capacidade ar-solo, seu radar doppler não sofria interferência do solo em voos ultrabaixos.

Porém, os EUA não haviam fornecido tanques suplementares de combustível e a confiança em seus dois motores em uma missão de longa duração não empolgava. O Phantom parecia ser o eleito. Modernizado e capaz de lançar bombas guiadas, à seu desfavor tinha o alto consumo de combustível e os dois tripulantes, o que dificultaria ainda mais uma eventual operação de resgate. Havia restado o F-16, recém-incorporado, nunca testado em combate intenso e com apenas um motor, uma desvantagem em caso de avaria por fogo inimigo. A seu favor, tinha o pequeno tamanho, grande agilidade e aviônica avançada.

Ao final, a escolha se deu mais em função do tipo de armamento: bombas de queda livre Mk.84 de 2.039 lb (925 kg). Ainda que a Hel Ha-Avir possuísse em seu arsenal bombas guiadas laser, naquele tempo a confiança nelas não era grande. A opção por bombas “burras” se deu por mera precaução. Os pilotos estavam acostumados com elas e a suíte eletrônica avançada do F-16 se “encarregaria” de indicar o melhor momento para o lançamento – se os parâmetros (velocidade, altitude e ângulo de ataque) inseridos no computador fossem seguidos. As estimativas indicavam que apenas oito bombas dariam conta do recado. Por precaução, o comando optou por oito caças carregando duas bombas cada um. Seis F-15 Eagle fariam a escolta.



FALCÃO HEBREU

O F-16 havia caído do céu para Israel. Encomendados pelo Irã no final do regime do xá Reza Pahlevi, deixaram de ser entregues quando os aiatolás assumiram o poder, em 1979. Encalhados, os 75 caças pintados no padrão camuflagem de deserto acabaram oferecidos pelos americanos ao brigadeiro David Ivri, então comandante da Hel Ha-Avir, durante uma visita à base americana de Edwards. Impressionados com o desempenho do F-16A nos dogfights simulados, os novos caças chegaram à base de Ramat Davi, perto da fronteira com a Síria, em julho de 1980, onde formaram três esquadrões.

Menos de um mês depois, as equipagens foram transferidas para ensaios no deserto do Negev. Em outubro, quando o ataque foi decidido, o perfil da missão já estava delineado. Até uma réplica em escala reduzida do reator foi construída, a fim de adestrar pilotos. Uma série de teste indicou que, apesar da chegada em voo rasante, as bombas deveriam ser lançadas de ângulos entre 30 e 40 graus para que pudessem penetrar a espessa cúpula de concreto do reator. As espoletas foram preparadas para detonar após a passagem do último avião, o que possibilitaria a filmagem do alvo e evitaria que os últimos a passar fossem atingidos por destroços.



Os pilotos escolhidos foram o coronel Ze’ev Raz (no comando da esquadrilha), Amir Nachumi (comandante de outro dos esquadrões de F-16), Amós Yadlin, Dubi Yoffe, Hagay Katz, Israel Shapir, Iftach Spector (o piloto mais velho, de 41 anos) e Ilan Ramon (tenente, o único com posto abaixo de major, seguindo o critério israelense de sempre levar um novato. Em 2003, como coronel, Ramon foi o primeiro astronauta do país, morrendo no acidente com o ônibus espacial Columbia).

Cercados de sigilo, os F-16 decolaram de Etzion às 15h55 (12h55 pelo horário de Greenwich) excedendo em mais de 1.100 quilos o peso máximo de decolagem (16.100 quilos) recomendado. Nem em testes do fabricante o F-16 voou tão pesado. Cada avião carregava, além do par de bombas sob as asas, dois mísseis Sidewinder nas pontas das asas, dois tanques subalares de combustível de 370 galões, um tanque ventral de 300 galões e lançadores de chaff e flare na fuselagem.


Após a ignição das turbinas e o acerto nos sistemas de navegação, houve um novo abastecimento com motores ligados para complementar os cerca de 140 litros de combustível gastos em solo. Em condições normais, os F-16A tiravam as rodas do chão após uma corrida de meros 600 metros. De tão pesados, os caças tiveram que usar os 1.700 metros de extensão da pista de Etzion. A esquadrilha se dividiu em dois grupos distantes 4.000 metros entre si, com espaçamento lateral de 600 metros. Dois F-15 acompanhavam a formação, cobrindo a retaguarda, enquanto duas duplas de F-15 cobriam os flancos, prontos para intervir contra os MiG-23 iraquianos ou até os F-15 da Arábia Saudita. 

Um sétimo F-15 biplace sobrevoava a Arábia servindo como piquete de rádio. No ar também estavam um avião-radar Northrop Grumman Hawkeye E-2C, um Boeing 707 monitorando as comunicações na região, um Lockheed Hércules KC-130 de reabastecimento e helicópteros Sikorsky CH-53 de resgate. Os CH-53 decolaram uma hora antes para que pudessem estar próximos de Bagdá no momento do ataque. O tempo estava claro, mas acima de 30.000 pés (9.000 metros) esteiras de condensação denunciariam a esquadrilha. Entre os pilotos, a expectativa era de duas baixas entre os F-16.



OS BASTIDORES DO ATAQUE

Acordo de cooperação nuclear assinado com a França desencadeou a ação. Em 1981, o Iraque estava formalmente em guerra com Israel há 33 anos, ou seja, desde 1948, quando o estado judeu foi criado. Porém, com a Guerra dos Seis Dias, em 1967, as atenções da Hel Ha-Avir ficam centradas nos adversários fronteiriços: Egito, Síria, Líbano e Jordânia. Distante mais de 1.000 km, a capital Bagdá só voltou a ser um alvo potencial a partir de 1976, quando um acordo de cooperação nuclear assinado com a França incluiu a construção de um reator nuclear classe Osiris – para supostos fins pacíficos – e a venda de urânio enriquecido. O reator foi batizado de Osirak pelos franceses (da junção das palavras Osiris e Irak) e de Tammuz 1 pelos iraquianos – havia um reator menor, o Tammuz 2.

Com ajuda dos Estados Unidos, o governo de Israel ainda tentou convencer a França de que o cancelamento do programa de cooperação nuclear seria a melhor opção. Um ataque ao reator começou a ser cogitado em 1979. O alto comando israelense acreditava que a ação deveria ocorrer antes da entrada em operação do reator. Caso contrário, haveria o risco de uma contaminação radiativa colocar em risco milhares de vidas civis.



O Mossad informou ao primeiro-ministro Menachem Begin que o reator deveria entrar em operação entre julho e setembro de 1981. Em junho de 1980, o físico egípcio Yehia El-Mashad, responsável pelo programa iraquiano, foi encontrado morto a pauladas em Paris. Explosões danificaram as instalações de empresas italianas e francesas suspeitas de participação no programa. Em seguida, cartas com ameaças foram enviadas para técnicos e fornecedores. Mesmo assim, as obras prosseguiram.

A esperança estava nas eleições francesas, caso o governo que sucedesse Valéry Giscard d’Estaing mudasse de ideia e cancelasse o acordo. Ao assumir a presidência, em 1981, François Mitterrand desapontou os israelenses ao anunciar que novas transferências de tecnologia nuclear deixariam de ocorrer, mas que os contratos vigentes seriam respeitados. Era o sinal para o ataque.

Como se os obstáculos não fossem enormes, em setembro de 1980, o regime de Saddam Hussein cancelou os acordos que delimitavam a fronteira com o Irã, na região do Shat-El-Arab, provocando a Guerra Irã-Iraque (1980-1988). Se houvesse um ataque israelense, ocorreria diante de barreiras antiaéreas e interceptadores.



Em 30 de setembro, dois McDonnell Douglas F-4E Phanton II iranianos carregando bombas e foguetes praticam o primeiro ataque aéreo da história a um reator nuclear. Apesar do pânico, só prédios próximos foram atingidos. Logo as defesas foram melhoradas e as paredes das instalações, reforçadas. Para Israel, não havia tempo a perder. O primeiro carregamento de 12,5 kg de urânio enriquecido já estava estocado no Iraque.

Fotos de satélite obtidas dos americanos indicavam que o reator deveria começar a funcionar em junho de 1981 (mais tarde franceses afirmaram que Osirak só entraria em funcionamento no final daquele ano). Após sucessivos adiamentos e hesitações – havia opositores ao ataque na cúpula do governo –, a data escolhida foi 7 de junho de 1981, um domingo, quando os trabalhadores franceses e italianos estariam de folga, o que se revelou um engano. No Iraque, trabalhadores ocidentais folgavam às sextas-feiras, de acordo com a tradição muçulmana. Dez soldados iraquianos morreram no ataque, junto com o técnico francês Damien Chaussepied, de 25 anos.

ATAQUES CONTRA TUNÍSIA E SÍRIA

Menos famosas, outras operações cirúrgicas da Hel Ha-Avir serviram para mostrar que Israel não tolera provocações dos inimigos. Em 1º de outubro de 1985, o quartel-general da Organização para Libertação da Palestina (OLP), nas proximidades de Túnis, capital da Tunísia, foi atacado com bombas guiadas. Foi uma resposta a um atentado da OLP no Chipre, seis dias antes, que resultou em três turistas israelenses executados.

Batizada de Operação Perna de Pau, a ação foi conduzida por oito F-15 Eagle que voaram baixo sobre o Mediterrâneo por mais de 4.600 quilômetros, entre ida e volta. Um 707 reabasteceu os caças sobre o mar. Como resultado, 56 militantes palestinos e 15 civis tunisianos foram mortos. O líder da OLP, Yasser Arafat escapou por pouco. Ele estava em sua caminhada matinal. O ataque durou seis minutos e arrasou as instalações palestinas, situadas em um conjunto de prédios próximos da praia.

Bem mais ousada e complexa, a Operação Pomar (Orchard) ainda está repleta de lacunas. No amanhecer de 6 de setembro de 2007, oito F-15I Ra’am (Trovão) guiados por GPS e sistemas Lantirn (Low Altitude Navigation and Targeting Infrared for Night) despejaram mísseis Maverick e bombas guiadas Paveway, de 500 libras, contra instalações na região síria de Deir ez-Zor, no noroeste do país. Aprimoramento local do F-15E Strike Eagle, os F-15I desta vez foram escoltados por F-16, sobrevoando o Mediterrâneo até a costa da Turquia, onde viraram para leste ao longo da fronteira, voltando para o sul em direção ao alvo. Uma aeronave de contramedidas eletrônicas embaralhou as comunicações das defesas aéreas para evitar uma reação, enquanto um radar sírio era destruído preliminarmente. Um helicóptero CH-53 foi acionado para cuidar de eventuais resgates.

Dias depois, autoridades turcas encontraram tanques subalares sem identificação alijados sobre as províncias de Hatay e Gazeantep. As bombas Paveway teriam sido orientadas do solo por uma unidade de reconhecimento (Sayeret Shaldag) do exército israelense equipada com designadores laser. Os soldados estavam infiltrados no interior da Síria há dias. As instalações bombardeadas estariam estocando material nuclear ou mísseis de longo alcance, porém até hoje os detalhes e as razões não foram oficialmente revelados.

LONGO RASANTE

A partir de Etzion, a rota foi traçada para aproveitar as elevações do terreno, a fim de evitar radares jordanianos e árabes. Em caso de falha de motor, os 14 pilotos deveriam fazer uma subida brusca até 150 metros para a ejeção. Caso fosse captado pelo radar antes de cair, o caça apareceria só uma vez nas telas árabes e passaria apenas como um eco. O silêncio de rádio era total. Curva lenta ao sul, a esquadrilha se agrupa e segue a 90 metros do solo até o Golfo de Ácaba. Ali, com a proteção dos morros circundantes, evitam os radares. Sobre o mar, reza a lenda que sobrevoaram o iate do rei Hussein, da Jordânia, antes de entrar no espaço aéreo saudita. O trajeto incluía passar por 40 quilômetros de desfiladeiros, em um zigue-zague arriscado de sete minutos até o deserto. Naquele trecho, o perigo estava em uma interceptação por caças sauditas da base aérea de Tabuk.

A velocidade de 360 nós (667 km/h) tinha de ser mantida por economia. Com o combustível baixando, após a passagem pela rodovia entre Tabuk e a Jordânia, os tanques das asas (110 quilos cada) foram descartados ao longo dos 60 quilômetros seguintes. Ainda nos testes, os pilotos descobriram que nem os americanos descartavam os tanques em voo enquanto carregavam bombas. Havia o temor, logo descartado, de que o esforço comprometesse a estrutura das asas.



DOIS MINUTOS EM BAGDÁ

Ao cruzar a fronteira iraquiana, o coronel Ze’ev Raz lança o código: “Zebra”. A 10 minutos do alvo, a chamada “Duna Amarela” indicava o sobrevoo do lago salgado Bahr al-Milh, próximo do rio Eufrates. Chuvas recentes haviam inundado uma ilhota que serviria de ponto de referência, o que criou algum nervosismo. A velocidade aumenta para 390 nós (722 km/h) e os radares são acionados. Os F-16 se agrupam em quatro elementos. A velocidade sobe para 480 nós (889 km/h). Os F-15 acionam os pós-combustores, sobem para 6.600 metros em três patrulhas de combate. Uma dupla passa a vigiar as decolagens nas bases de Al-Taqaddum e Habbaniya, ao norte, outra fica com Ubaydah Bin Al Jarrah, a beira do rio Tigre, e a última fica acima dos F-16, de olho nas bases de Rasheed, Muthenna e no aeroporto internacional de Bagdá, mais próximas do reator.

A investida começa a cerca de 20 quilômetros do alvo, às 18h35, no rumo sul-norte, quando o domo de concreto já pode ser avistado no horizonte. Os pilotos acionam os pós-combustores, sobem vertiginosamente a 2.100 metros. “Eu olhava à direita e via Bagdá, à esquerda, o reator”, contou à BBC, em 2006, o então coronel da reserva Ze’ev Raz. A seguir, Raz reduziu o manete de potência e, girando em torno do eixo, mergulhou em ângulo de 35 graus a cerca de 1.100 quilômetros por hora, com o Osirak na mira. Entre 1.300 e 1.100 metros de altitude os F-16 lançam sua Mk 84 com intervalos de cinco segundos cada. As câmeras e a fonia captam o esforço físico dos pilotos na recuperação do mergulho para o voo nivelado. Tiros esparsos de antiaérea surgem na frente do último elemento, mas não há uma reação organizada, muito menos SA-6 e MiGs. A IFF (Identificação Amigo-Inimigo) é ligada para não confundir os F-15. A ação inteira dura cerca de dois minutos.

Das dezesseis bombas, oito abrem rombos na cúpula do reator, outras atingem o pátio e instalações próximas. Duas erram o alvo, sendo que uma não explode. Veterano da esquadrilha e cauda da formação, Iftach Spector revelou em sua autobiografia que sofreu um blecaute provocado pela força G durante a subida brusca, “despertando” tarde demais: “Vi Tammuz à minha frente, mas fora de alcance, e joguei as bombas em cima do que podia, no pátio do reator atômico”. Mais tarde foi descoberto que, meia hora antes, os soldados da guarnição antiaérea do reator haviam desligado o radar e abandonado os postos para um lanche no final do dia. Alguns relatos afirmam que o Mossad, o serviço secreto israelense, instalou uma baliza de navegação nas proximidades para auxiliar os jatos.

A volta é uma corrida cuidadosa com pouco combustível. Ainda no Iraque a esquadrilha abre a formação e sobe a 40.000 pés (12.000 metros), onde enfrenta vento de proa. Com combustível suficiente, os F-15 sobem a 41.000 pés para garantir a cobertura. Para evitar o vento, os F-16 arriscam descer a 38.000 pés (11.500 metros), onde deixam esteiras de condensação. Com todos inteiros, o pouso em Etzion é uma celebração. Cada F-16 contava com apenas 1.000 libras (450 quilos) de combustível. “Ninguém pensou que todos iriam retornar”, afirmou Ze’ev Raz. “Estávamos maravilhados por todos termos pousado sem um arranhão sequer”. Qualquer possibilidade de uma bomba nuclear iraquiana havia se transformado em escombros.

AS AERONAVES DA OPERAÇÃO ÓPERA



F-16A “NETZ”
  • Aeronave Air Force F-16A Netz ‘243’ pilotada pelo coronel Ilan Ramon durante a Operação Ópera
  • Fabricante: General Dynamics (hoje, Lockheed Martin)
  • Tipo: multifunção (caça e caça-bombardeiro)
  • Primeiro voo: 20 de janeiro de 1974 (protótipo YF-16)
  • Entrada em serviço operacional (F-16A): em 22 de janeiro de 1979, na 388ª Ala de Caças Táticos (388th TFW), na base aérea de Hill, em Utah
  • Dimensões: envergadura: 10,01 m, com mísseis nas pontas das asas; comprimento: 14,52 m; altura: 5,01 m; área alar, 27,87 m²
  • Pesos: 6.733 kg, vazio; 14.969 kg, total
  • Propulsão: um Pratt & Whitney F100-PW-200 com 10.885 kg de empuxo
  • Desempenho: 1.445 km/h (Mach 1,2) ao nível do mar; razão inicial de subida, 18.288 m/min.; teto operacional 18.300 m
  • Alcance: 3.890 km, alcance máximo em missão interceptação, com combustível externo; 1.200 km, alcance máximo em missão interceptação só sem combustível interno; 546 km, com seis bombas Mk 82 de 500 libras (227 kg)
  • Radar: Westinghouse AN/APG-66 de pulso doppler, com cerca de 150 km de alcance
  • Armamento: um canhão de seis canos M61 Vulcan de 20 mm, com 511 projéteis, no lado esquerdo da fuselagem, próximo da raiz da asa, e nove cabides para até 6.895 kg de bombas, mísseis (Sidewinder), tanques combustível e casulos de interferência eletrônica



GENERAL DYNAMICS F-16A FIGHTING FALCON

  • Função: voar baixo sobre o deserto, a partir de uma base no Sinai, atravessando a Arábia Saudita, evitando os radares jordanianos e sauditas
  • Armamento empregado: mísseis guiados por calor Sidewinder de curto alcance nas pontas das asas, para autodefesa, e duas bombas 2.000 libras (907 quilos)


MCDONNELL DOUGLAS F-15 EAGLE

  • Função: escoltar a esquadrilha de F-16 durante o trajeto. A maior preocupação eram os caças soviéticos MiG-23 do Iraque
  • Armamento: mísseis Shafrir guiados por calor e Sparrow, por radar semiativo


SIKORSKY CH-53

  • Função: resgatar no solo qualquer piloto que fosse abatido ou tivesse que ejetar devido a problemas técnicos. Com grande alcance e capazes de transportar equipagens numerosas, supõe-se que levava equipes de combate e médicos militares
  • Armamento: metralhadoras leves instaladas nas portas e janelas


BOEING 707

  • Função: monitorar as comunicações entre os caças, os eventuais interceptadores inimigos e o tráfego aéreo



LOCKHEED HERCULES KC-130

  • Função: avião de reabastecimento que ficou no ar de prontidão, caso faltasse combustível, o que não ocorreu



NORTHROP GRUMMAN HAWKEYE E-2C

  • Função: oferecer cobertura de radar durante a volta de Bagdá, alertando os F-15 sobre inimigos, fossem eles iraquianos, sauditas ou jordanianos
  • Um Sikorsky CH-53 israelense. Aeronave voou infiltrada até próximo de Bagdá, onde entraria em ação para resgatar pilotos abatidos