FRASE

"Quem escolhe a desonra a fim de evitar o confronto, a conseguirá de pronto, e terá o confronto na sequência."
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quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

Reconhecimento Aéreo *212

 

O reconhecimento aéreo é um dos principais meios de coleta de inteligência e avaliação de resultados nas operações militares para fins táticos ou estratégicos, que é conduzido com aeronaves ou sistemas satelitais, e pode cumprir uma variedade de requisitos, incluindo a localização de artilharia e sistemas de lançamento, a observação de movimentos e dispositivos terrestres e navais, instalações militares e desenvolvimento de novos equipamentos, entre outros. Consiste na coleta de imagens no espectro visível, infravermelho e de radar, e dados de inteligência eletrônica. Os sistemas de reconhecimento aéreo modernos devem ser precisos, coletarem dados relevantes, estarem integrados aos demais sistemas afins e fornecerem as informações em tempo real. Requerem a existência de superioridade aérea para sistemas não satelitais, incluindo os sistemas de AAAé e SAMs e sua supressão, capacidade dos sensores e plataformas de acordo com a demanda requerida, condições meteorológicas dentro da capacidade dos sensores e plataformas, e flexibilidade no seu controle.

 


O Reconhecimento e os Níveis da Guerra

O reconhecimento aéreo estratégico fornece informações de inteligência necessários a subsidiar o planejamento operacional, políticas governamentais e contraponto de ameaças potenciais. Como operações estratégicas de reconhecimento aéreo temos a localização dos centros de gravidade das ameaças e alvos estratégicos, o aviso sobre intenções e ações hostis, a avaliação de danos a alvos ameaçadores e amigos, a determinação da estrutura e força das ameaças, a Identificação da ordem de batalha eletrônica da ameaça (EOB) e as indicações e avisos de ameaças potenciais. 

No nível operacional o reconhecimento aéreo realizado fornece informações que são cruciais para o planejamento e execução de operações em todo o teatro e ajudam a cumprir os objetivos traçados. Operações de reconhecimento aéreo operacional visam fornecer as informações de inteligência cruciais para a compreensão das fraquezas do inimigo, a fim de desenvolver linhas de ação adequadas, ajudar a definir as suas vulnerabilidades críticas, fornecer informações sobre o terreno; clima; e a dimensão da força a ser combatida, seus movimentos e situação tática-operacional. Fornece ainda a avaliação do tipo de ameaça e ajuda a identificar alvos. 

No nível tático, as operações de reconhecimento aéreo permitem a identificação de ameaças táticas, o planejamento das missões operacionais táticas, a avaliação do combate, a avaliação da ameaça tática, fornece informações dos alvos, apoia a direção e ajuste do tiro de artilharia naval e de campanha, a observação de áreas de batalha terrestre e os alvos ou setores do espaço aéreo.

 

Os Satélites de Reconhecimento

Os satélites são uma componente dos recursos de reconhecimento militares disponíveis. Eles fornecem informações sobre o clima, imagens multiespectrais e informações de reconhecimento eletrônico para aprimorar a capacidade de planejamento de missão de um comandante. A principal vantagem de um satélite é sua capacidade de fornecer no mundo todo cobertura de áreas de interesse, especialmente áreas remotas ou hostis onde poucos ou nenhum dado pode ser obtido por fontes convencionais. Outras vantagens incluem a longevidade da missão, a relativa imunidade a interceptação, informações detalhadas sobre o terreno e suas particularidades, a retransmissão de dados gerados por outros sistemas de reconhecimento, e o fornecimento de informações de posicionamento para veículos, armas e sistemas de sensores. As limitações de um satélite incluem os mesmos distúrbios atmosféricos e climáticos que afetam a maioria dos outros sistemas de imagens. Além disso, a trajetória do satélite é previsível, e vulnerável à práticas de ocultação e atividades de controle de assinatura, como por exemplo o controle de emissões quando de sua passagem.


O Reconhecimento Aéreo

Ao estudar os meios de guerra modernos e a história dos conflitos, frequentemente nos deparamos com caças, bombardeiros e outras aeronaves de combate que, por serem mais populares e visíveis, e responsáveis pelos resultados finais, povoam as inúmeras publicações sobre o tema. Aeronaves de coleta de informações, como as que praticam o reconhecimento de combate e estratégico, através de câmeras óticas e outros sensores como radares de diversos tipos e de sensoriamento infravermelho (IR), e também aeronaves de guerra eletrônica (EW) nas modalidades de “Elint” (inteligência eletrônica) e “Comint” (inteligência de comunicações) passam desapercebidas aos leitores menos atentos ao “bojo” das operações.

Pelo fato de não portarem canhões ou mísseis, estas aeronaves frequentemente aparentam terem um papel secundário. Porém na realidade do teatro de guerra, uma única surtida dessas aeronaves pode desempenhar um papel crucial ao desfecho das operações, e pode selar o destino da própria campanha ou batalha. Na guerra, a informação é tudo, e sem ela as tomadas de decisão são meros exercícios de adivinhação, de consequências temerárias e não raras fadadas ao fracasso. A “inteligência”, termo genérico usado nos meios militares e estratégicos para designar o conjunto de informações sobre o inimigo, é absolutamente fundamental para a concepção de armamentos e meios, estratégias, políticas, decisões táticas e operacionais, elaboração de planos de ação e qualquer outra postura militar.

Coletada ao longo do tempo por agentes em campo, através de elementos infiltrados ou agentes de resistência, leitura de jornais e outros meios de informação disponíveis, a informação de combate coletada de “cima para baixo” através da observação multiespectral desempenhada pelas aeronaves de reconhecimento, adquiriu importância crescente desde a Primeira Guerra Mundial até os dias atuais. Quanto mais alta uma aeronave estiver, maior seu campo de visão e também maior será a necessidade de sofisticação de seus sensores. Satélites orbitando a 160 km de altura capazes de ler um manuscrito na superfície, requerem câmeras de alto desempenho. Os sensores usados pela primeira vez na Primeira Guerra Mundial na forma de câmeras óticas de resolução sofrível, operadas manualmente de aeronaves frágeis e limitadas evoluíram até os dias de hoje para sensores multiespectrais, capazes de altíssima resolução nos comprimentos de onda da luz visível, da radiação infravermelha (IR) e das ondas milimétricas e centimétricas (radar). Esta radiação se desloca em linha reta, podendo ser refratadas ou atenuadas pela densidade atmosférica e umidade do ar, e parte dela podendo deslocar-se pelo solo ou refletidas pela ionosfera, potencializando seu alcance e atingindo distâncias muito grandes. Para os propósitos gerais, no entanto, a linha reta é a consideração a ser feita. Comumente chamada de linha de visão ou visada (LOS).

Aeronaves modernas podem percorrer distâncias muito grandes, porém é muito comum haver a limitação de onde elas podem voar, cumprindo sua missão tendo que evitar cruzar algumas fronteiras em particular. Com estas limitações as distâncias LOS se tornam importantes. Devido a curvatura da terra a distância máxima que nossa que nossa visão alcança, na hipótese de se estar em um oceano calmo e ignorando a refração atmosférica é de d= raiz(1,5h), onde d é a distância em km e h a altura acima do nível do mar em m. Logo um homem de 1,83 m em pé nestas condições pode ver até 5 km aproximadamente. Em um helicóptero à altura de 20 m pode-se observar até um horizonte de 16 km. Uma aeronave orbitando à 11 km tem um campo de visada de aproximadamente 370 km. Um satélite de reconhecimento orbitando a 160 km pode “ver” até aproximadamente 1430 km.

A primeira observação feita por aeronave em combate foi em 1794 na Batalha de Fleurus, quando um observador francês em balão cativo teve desempenho vital na derrota de forças inimigas numericamente mais fortes. Aeronaves mais pesadas que o ar foram usadas nesta função pela primeira vez em 1911 por um oficial italiano em seu Blériot tomando notas das posições turcas entre Azízia e Trípoli. Em 1912 o mesmo piloto fez a primeira surtida usando uma câmera, levada no colo e de manuseio incômodo (não era muito pequena). Antes da “Grande Guerra” o reconhecimento era a única missão a ser efetuada por aeronaves. Algumas pessoas aventaram a possibilidade do combate ar-ar quando 2 aeronaves em missão de reconhecimento se encontrassem, mas foi taxada como uma fantasia ridícula. Esta fantasia logo se tornou realidade, e em 1918 o reconhecimento aéreo se dava em tempo integral e envolvia mais de 90 mil pessoas em todas as frentes, produzindo cerca de 12 mil chapas fotográficas por dia, com uma qualidade sequer imaginada 4 anos antes. No final da guerra câmeras manuais e as maiores afixadas vertical e obliquamente para frente e para o lado.

Menção especial deve ser feita a Sidney Cotton, um piloto australiano RNAS na Primeira Guerra Mundial, que nos anos 30 se tornou um dos dirigentes da companhia Dufaycolor, uma das pioneiras do filme colorido. Ele era a pessoa ideal para executar missões de fotorreconhecimento clandestino, por causa de sua habilidade de voo e de seu grande conhecimento de câmera e filmes. Primeiramente ele serviu os franceses, que equiparam seu Lockheed 12A com câmeras de reconhecimento gigantes, mas depois se recusaram a deixa-lo ver os resultados porque eram secretos. Ele se saiu melhor trabalhando para os britânicos e sua aeronave, pintada em cores alegres, logo se tornou uma visão familiar do Reino Unido até o Mar vermelho. Não somente tinha um leque triplo de grandes câmeras F24, mas levava na parte externa das asas 2 pequenas câmeras Leica de 35 mm, não detectáveis com as comportas de revestimento fechadas. Durante julho e agosto de 1939 ele sobrevoou tranquilamente a Alemanha, levando a bordo, em algumas ocasiões, convidados alemães de alta patente, enquanto colhia uma farta série de fotos de alta qualidade de aeroportos, fábricas e fortificações da linha Siegfried. Além disso, embora a RAF tenha tentado tirar boas fotografias de alvos alemães desde o primeiro dia da Segunda Guerra e falhado seguidamente por várias razões, Cotton calmamente saiu no seu Lockheed civil, em 16 de setembro, e trouxe de volta a cobertura completa e nítida da frota alemã. Ele montou em seguida a Unidade de Desenvolvimento Fotográfico (PRU), em Heston, a qual veio a se tornar a famosa PRU que revelou não somente milhões de filme, mas desenvolveu também novas técnicas e aeronaves dedicadas. O azul PRU, oficialmente azul cerúleo, era uma cor de baixa visibilidade similar ao padrão todo cinza usado nos caças. Ele era aplicado tanto nas aeronaves designadas para voar em maiores altitudes como também em uma espécie completamente nova de aeronaves de reconhecimento de voo baixo, baseados em caças rápidos com seu armamento substituído por combustível e velocidade extra, e com câmeras montadas atrás da cabine voltadas para os lados. Estas fotografias de baixa altitude e alta velocidade tornaram-se uma técnica padrão  a partir do final de 1940, logo acompanhada por fotografias automáticas tiradas por bombardeiros no exato momento em que suas grandes bombas fotoflash e sua carga de bombas principal estavam todas explodindo no alvo (ou fora dele). Um dos primeiros alvos de uma surtida fotográfica de baixa altitude da RAF, senão o primeiro de fato, foi um sistema de radar inimigo. Graças a ela, este mesmo radar logo tornou-se o objetivo de um ousado ataque de paraquedistas britânicos que trouxeram de volta partes vitais deste para a Inglaterra. Desse modo, os “boffins” (termo britânico para designar os “cientistas de porão” dos quais a guerra estava se tornando dependente) foram capazes de descobrir os parâmetros básicos daquele equipamento. Armados com esse conhecimento, foram capazes de inventar meios de bloquear radares inimigos do mesmo tipo, abrindo um capítulo inteiramente novo na guerra.

Hoje a EW (guerra eletrônica) é tão importante quanto aquela feita pelas bocas de fogo, bombas e mísseis. A batalha silenciosa tornou-se tão equilibrada que muitos dos físicos, engenheiros eletrônicos e tripulações sentiram que seria bom abandonar tudo e voltar atrás para o “globo ocular humano Mark I”. Fazer isso, entretanto, iria certamente causar dificuldades porque as aeronaves modernas carregadas de dispositivos eletrônicos anunciam sua presença tão atrevidamente como se estivessem enfeitadas com luzes de natal. As aeronaves silenciosas, ou passivas, podem carecer de uma porção de dispositivos úteis, mas apresentam imensos problemas para o inimigo. Uma estória frequente contada por um piloto da Luftwaff era de que, em 1944, foi enviado para oeste a fim de ajudar a deter o ataque violento da RAF e da USAAF. Vindo da frente oriental, ele recebeu alegremente a mudança: “Você vê”, disse ele, “os russos estão tão atrasados que eles não tem radar, e isto torna-se muito difícil para nós”. Em outras palavras, cada assombrosa invenção para ganhar a guerra acarreta uma contra-invenção, e ocasionalmente a nova invenção torna a situação pior do que antes. A EW cresceu muito rapidamente para dominar a campanha noturna contra a Alemanha, montada pelo comando de bombardeiros da RAF, na Segunda Guerra Mundial. Hoje, as forças aéreas do mundo todo tem enfrentado problemas tecnológicos e financeiros na sua tentativa de atingir o mesmo nível relativo de eficiência daquele tempo, embora todos saibam da importância da EW e da impossibilidade de vencer sem ela.

Embora não se trate aqui especificamente do tema EW, nos referimos ao TR-1, que está relacionado com diversas formas de EW. Isso se deve ao fato de ser esta aeronave uma derivação do U-2, uma das aeronaves mais notórias da história. O U-2 foi a primeira aeronave a ser projetada especificamente para reconhecimento clandestino através de sobrevoos anônimos ou sem permissão em território estrangeiro, a fim de tirar fotografias de instalações militares ou estrategicamente relevantes. Por volta de 1960, tais aviões deixaram de ser uma proposta válida, devido ao desenvolvimento dos SAMs capazes de alcançar bem mais alto que estas aeronaves poderiam voar. O U-2 foi, entretanto, seguido por uma segunda geração de aviões de reconhecimento capazes de voar não somente mais alto, como aproximadamente 5 x mais rápidos do que seus antecessores, como o SR-71, já aposentado. Essa máquina extremamente custosa, hoje provavelmente não penetraria em espaço aéreo defendido, e esta função ficou a cargo dos satélites de reconhecimento fotográfico, mais inacessíveis a interceptação. Está em estudos o conceito de uma aeronave conhecida como SR-72, um UAV hipersônico com as mesmas funções, e com a capacidade adicional de disparar mísseis hipersônicos.

Sistemas de Reconhecimento

No final de 1914 o Real Corpo de Voo produziu a primeira câmera de reconhecimento aéreo, especialmente projetada com uma lente de distância fixa, focalizada em uma placa fotográfica de vidro. O pessoal de PR (foto-reconhecimento) moderno ficaria surpreendido ao saber que, para tirar a primeira fotografia, o observador, com a câmera segura nas mãos e inclinando-se ao vento cortante, tinha de executar 11 operações diferentes, com seus dedos congelados, sendo que cada exposição subsequente era mais fácil, exigindo somente 10 operações. Desde então, as câmeras tem se tornado melhores. De câmeras grandes do passado, hoje temos, graças a miniaturização da eletrônica, modelos bem menores que podem ser usadas em pequenos UAVs. Outras são extraordinariamente caras, como aquelas usadas em altitudes extremas como as operadas por satélites, capazes de ler jornais a distâncias em torno de 160 km.

As câmeras podem apontar em qualquer direção desejada (vertical, frontal, oblíqua ou sob comando manual em bases suspensas). As configurações modernas frequentemente incluem câmeras panorâmicas capazes de cobrir 360 graus. Comparadas com os recursos de uma vertical e 2 oblíquas da Segunda Guerra Mundial e do advento da tecnologia digital, temos a economia de muito tempo no manejo do filme que antes era feito, ao tentar combinar 3 conjuntos de cópias, pois cada foto é uma faixa de horizonte a horizonte.

A câmera panorâmica é corretamente ajustada para igualar a razão V/h (velocidade e altura da aeronave). Obviamente que uma caça voando a 1.500 km/h e a 90 m, precisará de um ajuste diferente que outra aeronave voando em grandes altitudes e a velocidades menores. Os modernos TRFs (radares seguidores do terreno) auxiliam a evitar imagens obscurecidas ao manter uma distância razoavelmente uniforme da aeronave até o solo, mesmo em regiões montanhosas e acidentadas.

 


As câmeras de composição tiram uma sequência de fotos individuais, cada uma sobrepondo a próxima, em uma porção selecionada pelo operador. Invariavelmente a abertura da lente é ajustada automaticamente de acordo com a intensidade da luz ambiente, assim como outras variáveis. Algumas configurações são ajustadas para tirar uma única foto, ou sequência rápida tão logo a noite seja iluminada por flares lançados do próprio avião, ou em equipamentos mais sofisticados sem a necessidade deles. Estes flares são cronometrados para sair no exato momento em que a câmera está apontada para seu alvo, que pode ser atacado na mesma corrida de alta velocidade pela própria aeronave. As câmeras em missão de ataque podem tirar fotos únicas ou em sequência, cronometradas para mostrar os resultados do ataque, ou ainda numa faixa panorâmica ao longo da rota da aeronave. Em contraste, as faixas de reconhecimento são invariavelmente trilhadas em cruz, para que quando todas as faixas forem alinhadas formem uma foto gigante de uma área maior que, a grande altitude, pode se estender do centenas ou milhares de quilômetros. Obviamente que nas extremidades a abertura fica prejudicada, em parte devido à distância e, em parte, devido ao “ângulo rasante”, quase horizontal que, usualmente, é muito menos informativo do que a cobertura quase vertical.

Não somente as câmeras foram muito alteradas, como também o filme foi aperfeiçoado e mais recentemente as imagens passaram a ser digitalizadas em tempo real. É certo que um comandante militar precisa de boas fotos. Em 1917 um observador, segurando uma câmera a 4.500 m, era incapaz de fazer uma foto que mostrasse algo além de traços grosseiros de trincheiras, caminhos ou trilhas bem usadas, edifícios e talvez veículos grandes. A camuflagem podia ser extremamente eficiente. Assim, o operador do filme tinha de se utilizar de outros recursos, como aumentar a estrutura de grão fino do filme, para mostrar detalhes com maior nitidez, e encontrar um meio de anular a camuflagem. Hoje as câmeras evoluíram e foram incrementadas com uma quantidade de outros dispositivos que não nos permite mais chama-las de câmeras e sim de sensores. Utiliza-se comprimento de onda de luz visível, de micro-ondas para os radares como os de abertura sintética (SAR) e ondas de infravermelho (IR e IIR) nos sensores. Cada um destes dispositivos tem suas próprias vantagens e desvantagens.

 


As câmeras óticas dos anos 80 podiam ser carregadas com filmes com uma sensibilidade tal e pequeno tamanho de grão que era possível ler a placa de um carro ou as insígnias de um oficial a uma altura de 160 km, que é a altitude nominal do satélite mais baixo. Quanto a camuflagem, na Guerra da Coréia, o filme colorido já estava imprimindo a vegetação viva em verde, e outros objetos em tons de rosa ou outras cores contrastantes. Portanto, arbustos ou galhos empilhados em um tanque rapidamente morreriam e apareceriam não como verde, mas em um rosa revelador. No começo dos anos 50, o então chamado filme de cor falsa, exposto através de um filtro amarelo opaco, realmente anulava qualquer camuflagem simples. Tornar as coisas invisíveis ao olho humano já não é mais satisfatório, e instalações como grandes redes de camuflagem podem ser apenas elevadores de moral, dependendo é claro da tecnologia disponível ao inimigo, a menos que elas sejam extremamente sofisticas e caras.

 


Atualmente há muitos outros fatores que afetam o reconhecimento aéreo, mas primeiro é necessário dar uma olhada nos modernos sensores em lugar das câmeras óticas. O primeiro a ser desenvolvido historicamente foi o radar, que em 1939 já estava sendo usado pela Inglaterra para gerar uma PPI (indicação de posição de plano), utilizando-se de feixe que orbitava ao redor de um eixo vertical, sob o avião. Os primeiros radares de mapeamento em série foram usados para fixar a posição do avião ou achar alvos de superfície, incluindo navios, mas, durante a Guerra da Coréia, os radares de reconhecimento estavam permitindo, que fotografias do tipo radar fossem obtidas dando uma impressão de “cópia dura” que poderia ser trazida de volta para análise. O próximo passo era alterar o comprimento de onda e arranjo das antenas a fim de produzir um feixe mais conveniente, voltado para um lado da rota do avião. Este SLAR (radar aerotransportado de varredura lateral) compreende uma fonte de potência que gera sinais de micro-ondas intensos, alimentados ao longo de um guia de onda que, caso se pretenda mapear à esquerda ou à direita, canaliza metade da energia para cada uma de suas 2 antenas. Ele compreende emissores fásicos de multielementos que enviam um feixe muito estreito em forma de folha para a esquerda e para a direita e inclinando para baixo a fim de atingir a superfície. Assim o SLAR varre o solo, abaixo da aeronave, e para fora, de um ou ambos os lados de sua rota. Os sinais de retorno são usados para gerar uma imagem (foto) do solo que pode ser armazenada em filme fotográfico ou (mais recentemente) digitalmente, ou ainda transformada em sinal de vídeo o qual pode ser transmitido analógica ou digitalmente em tempo real, dependendo da tecnologia empregada.

 


O SLAR deve ter um arranjo de antenas o qual é estabilizado em cabeceio, guinada e rotação para que seja possível apontar o dispositivo independentemente do movimento da aeronave. Em equipamentos com tecnologia AESA não há necessidade de estabilização física das antenas, sendo esta feita eletronicamente. Obviamente há limites para o movimento angular, pois manobras violentas da aeronave impediriam varreduras apropriadas. A fim de manter a MTI (indicação de alvo móvel) e imagens de alvos fixos, é essencial manter as diferenças Doppler corretas de frequência entre os sinais enviados de volta pelo chão como o de uma edificação e um carro de combate em movimento. Portanto como é impossível para o piloto manter um curso (ou velocidade) absolutamente constante, ou evitar voar através de rajadas de vento (especialmente a baixa altitude), os equipamentos contam com módulos especiais para compensar todas as variações de velocidade e direção da aeronave e assim permitir ao SLAR identificar alvos no solo que realmente estejam em movimento.

O radar APD-10 que equipava os RF-4 Phantom podia transmitir imagens em vídeo diretamente para aeronaves amigas ou estações em terra na área de alcance LOS (linha de visada), e ao contrário de uma câmera normal (cuja escala é distorcida pela inclinação) sua escala era constante em todas as direções e distâncias. A distância ao longo da rota em faixas sucessivas, é ditada pela velocidade da aeronave para que seja possível medir exatamente a distância entre, por exemplo, 2 árvores. As distâncias laterais podem ser distâncias oblíquas ou podem ser facilmente convertidas em distâncias medidas no solo. Em uma corrida de baixa altitude a diferença é muito pequena. Nestes equipamentos SLAR as imagens são interrompidas a determinadas distâncias(8 km por exemplo) para a inserção automática de um bloco de dados resumido, com informações como a identidade da aeronave, sua missão, localização geográfica (imputados por INS, GPS ou outra fonte), data e horário.


A imagens geradas na atualidade, seja por radar, câmeras óticas ou outro meio, são de alto padrão, digitais e transmitidas em tempo real, o que permite que sejam processadas rapidamente, seja pelos analistas ou por meios eletrônicos; Devido a alta qualidade dos sensores e das capacidades de processamento de imagens nos dias atuais, temos imagens muito nítidas e mostrando detalhes sequer imaginados no passado. O radar que equipava os F-15A, o APG-63 que era um radar de caça e não um SAR já gerava imagens 10 x melhor que o APD-10. O SAR torna homogêneos os sinais transmitidos e recebidos, de tal modo que eles parecem vir não em uma série, de uma única pequena antena, movendo-se através do espaço aéreo, mas em pulsos gigantes únicos, de uma antena enorme de meio quilômetro ou mais de comprimento, disposta ao longo da rota da aeronave. Uma antena de tais dimensões poderia fazer uma foto de alta definição, sendo o único óbice que os fragmentos de imagem não são coletados exatamente no mesmo momento.

Os radares possuem capacidades mais interessantes pois operam na faixa de ondas milimétricas. Com comprimentos de ondas ainda mais curtos temos os sensores infravermelhos (IR) numa faixa imediatamente inferior à luz visível. As ondas IR mais longas operam na faixa de 1000 microns (1 mm) até próximo a 0,7 microns que é onde já podemos visualizar a luz vermelha. Estas ondas podem ser usadas de forma análoga às ondas de radar, embora seu alcance seja bem mais curto. No entanto elas apresentam uma grande vantagem: tudo ao seu redor está extremamente quente, mesmo não parecendo a nossa percepção pessoal, se comparados ao zero absoluto (-273 graus Celcius) e emite radiação IR. Qualquer sistema baseado em radiação IR atua de forma passiva e não revela sua posição (como os sensores IRST dos caças modernos) e apenas capta os sinais existentes, tal qual os nossos olhos, só que num comprimento de onda inferior. Sua característica negativa é que estas ondas (IR) são fortemente atenuadas pela atmosfera, com esta atenuação crescendo com o aumento da umidade atmosférica. Em alguns comprimentos de onda a transmissão IR é próxima do zero, mas com tempo bom é um sensor altamente eficiente.

Para reduzir-se o custo criaram-se sistemas de módulo comum, com partes padrão na construção destes sensores usadas por vários usuários que hoje equipam aviões, helicópteros, navios, carro de combate e outros. Aeronaves de combate utilizam o “Sensores Infravermelhos de visão frontal” FLIR, mas as aeronaves de reconhecimento empregam o “Explorador de IR” IRLS. Todos os sensores de IR se utilizam de um detector muito sensível a todas as temperaturas, com maior eficiência nas temperaturas mais frias pois maximizam o contraste com corpos mais ”quentes”. A radiação de entrada é focalizada da mesma forma que uma câmera ótica, e seu sistema tem que fazer foco da mesma forma, com espelhos ou prismas giratórios, alimentando o sensor a 360 graus no plano vertical, girando em volta de um eixo paralelo a fuselagem. Como a aeronaves se desloca continuamente, o sensor faz a varredura de uma sequência de faixa no solo, sempre cobrindo uma nova área.

Para não deixar lacunas entre as faixas, e não haver sobreposição exagerada entre os frames, os IRLS são ajustados de acordo com a velocidade da aeronave, com a razão V/h continuamente mantendo a sobreposição correta, não importando se a velocidade é de 900 ou 600 Km/h, ou se a altura é de 60 ou 600 m. Mas como isso funciona? O detector sensível é invariavelmente um fio fotocondutivo feito de material semicondutor como o CMT (telureto de mercúrio e cádmio) ou sulfeto de chumbo, que se torna muito mais condutivo logo que a radiação IR é focalizada nele. Alguns modelos usam o antimonieto de índio (InSb) sensível à radiação de 3-5 microns. As lentes e prismas usados não são de vidro, o qual é uma barreira para o calor, mas de material vítreo especial, com alto índice de transparência para comprimento de onda IR. Logo que o sistema é ligado a refrigeração começa a atuar usando de métodos como o nitrogênio líquido ou outros. Os sensores passam a se “alimentar” de faixas do terreno como o foco ajustado para onde o usuário avalie ser um alvo mais vantajoso. O campo de visão é tanto mais estreito quanto mais baixo a aeronave voar, sendo os sensores giro-estabilizados para não prejudicar as imagens no caso de manobras bruscas. Estes sensores respondem rapidamente a variações de alvos como passando de terreno gramado para um lago frio, estruturas de concreto e telhados, chaminés de usinas e altos-fornos. Um lago frio causaria uma pequena corrente no sensor, enquanto que uma chaminé quente uma corrente bem maior. Esta variação forma uma imagem, que pode ser digital ou analógica, dependendo da geração do equipamento, que pode ainda ser gravado em fita magnética, filme, digitalmente em um HD ou memória flash, ou ainda ser transmitido em tempo real para uma estação de terra ou outra aeronave ou navio, e ser processada ou analisada em seguida. A imagem aparece como uma negativa de uma fotografia, com as partes mais quentes se mostrando como mais claras. Estas imagens podem prover mais informação que imagens óticas, podendo-se visualizar, por exemplo, os motores de um jato que foram acionados por apenas alguns segundos. Uma aeronave que tenha pousado há pouco terá seus bordos de ataque da fuselagem em tons mais claros, podendo-se ainda, por processamento digital, se atribuir cores aos diferentes tons. Outro exemplo é o combustível congelado por estar em altitude e o contorno de uma aeronave no solo que acabou de abandonar aquela posição, causada pela sombra que até então se projetava da fuselagem.

Uma plataforma de reconhecimento deve trazer de suas surtidas tanta informação quanto possível puder coletar, incluído dos sensores inimigos. Estações de rádio, radares, retransmissoras de dados, fixas ou móveis, devem ser todas investigadas. Esta prática é denominada “Elint” (inteligência eletrônica) para radares e dispositivos relacionados e “Comint” (inteligência de comunicações) para mensagens de rádiotransmissão. O desafio em cada situação é achar em que frequência o inimigo está transmitindo, que poderá ser por equipamento de salto de frequência, gravar a transmissões e plotar o local em que foi detectada, usando técnicas como a triangulação entre outras. O inimigo se valerá do salto de frequência da ordem de milionésimos de segundo, da criptografia e do “espectro espalhado”, outras técnicas. É um jogo de gato e rato.

Qualquer sensor de reconhecimento pode ser instalado em uma aeronave de destinação específica, limitado apenas pela capacidade de fornecimento de energia da aeronave, que no caso de sensores não apresentam grande demanda. Algumas aeronaves derivadas de modelos de caça e bombardeio ainda podem carregar armamentos, porém é pouco comum. Aeronaves dedicadas como os antigos Tupolev Tu-95 soviéticos, U-2 e SR-71 da USAF, não eram capazes de qualquer outro tipo de missão e possuíam configurações que não poderiam ser instaladas em aviões de combate convencionais. Porém sensores mais modernos possuem tamanho reduzido e podem ser portados até por pequenos drones ou pods aerodinâmicos pendurados em cabides de caças normais, destinado ao armamento.


Assim enquanto forças de primeira linha como a USAF ainda usem aeronaves dedicadas, tarefa quem vem ao longo do tempo sendo absorvida pelos satélites de sensoriamento muito mais difíceis de serem interceptados, as demais forças aéreas, incluindo a RAF e a Armée de l’Air não mais as possuem. Aeronaves dedicadas obviamente tem maior capacidade, mas as constantes restrições orçamentárias, a maior capacidade tecnológicas dos sensores modernos e o advento dos satélites “espiões” as substituem satisfatoriamente. A tendência moderna é a construção de modelos não tripulados, capazes de transmitir informação em tempo real e com capacidades de comunicações, EW e sensoriamento em todas as faixas do espectro. A informação de reconhecimento é provavelmente o artigo mais perecível que existe. Já em 1916 as aeronaves de reconhecimento soltavam pilhas cuidadosamente empacotadas de fotografias de placa de vidro, além de anotações escritas a mão sobre os seus HQs, antes de pousarem de volta em sua própria base aérea, com tripulações em terra recolhendo os grandes invólucros de câmeras e correndo para uma bicicleta ou carro à sua espera. O RF-4C da USAF introduziu a capacidade de processamento do filme em voo, totalmente a parte de sua conexão com dados por rádio. No seu tempo, a plataforma mais avançada do mundo era o RA-5C Vigilant da US Navy, que podia voar a Mach 2 e 18.000 m, enquanto colhia informações em uma bateria de câmeras, um grande SLAR e uma estação Elint principal (uma estória conta que um analista de fotos mediu um campo de futebol e descobriu que era 1,5 m mais curto do que deveria). O grande avanço do RA-5C foi ele ter introduzido uma retransmissão de dados segura para o porta-aviões ou outros navios receptores reduzindo o tempo de coleta e transporte da informação. Informação que demora a ser processada pode se tornar inútil.

Não importa se são usados drones, helicópteros, aeronaves adaptadas ou dedicadas ou ainda satélites; os objetivos nos tempos atuais é ter um reconhecimento em tempo real. Uma informação obtida neste momento é talvez 10x mais valiosa do que daqui em 30 minutos, e em 1 hora pode não ter mais valor. Por usarem satélites como estações retransmissoras, as plataformas de reconhecimento nunca podem estar fora do alcance LOS da estação base de forma a processar a informação e enviá-la de volta a quem interessar. Porém os problemas existem, como a degradação da transmissão por ECM do inimigo. A transmissão digital, com salto de frequência, com feixe estreito e dirigido, devidamente codificada e compactada ameniza estas perturbações. Outro fator que afeta a todos os aviões de reconhecimento é sua capacidade de sobrevivência, pois a plataforma deve completar sua missão sem ser derrubada, vulnerabilidade esta que está aos poucos chegando também aos satélites de órbita baixa.

Talvez o maior problema seja o de que é necessário usar não só o radar ou o IR, mas os sensores óticos para uma melhor resolução, o que é afetado pela distância do sensor e pelas condições meteorológicas e de período. No passado isto envolvia inevitavelmente passar carreteis de filme através de um processo de desenvolvimento “molhado”, com secagem rápida e produção de cópias, o que era inconveniente, principalmente quanto a fidelidade de cores. Além disso, era necessário além das cópias de boa qualidade, evitar distorções para que fosse possível medir os objetos e distâncias no terreno. A escala, em se tratando de sensores óticos, pode variar enormemente em ângulos mais acentuados. Um centímetro de imagem vista de cima para baixo pode representar alguns poucos metros no terreno, enquanto que esta mesma medida no horizonte pode representar alguns quilômetros. Atualmente pode-se usar de algoritmos digitais para compensar estas distorções.

Os EUA são o país que mais investem nestes sistemas e os torna públicos, pois aqueles desenvolvidos fora do mundo ocidental são pouco visíveis. Desde os anos oitenta tem-se dedicado crescentes esforços na utilização de aeronaves não tripuladas (VANTs/AUVs/RPVs/Drones) e satélites para realizar este tipo de missão, como o MQ-9 Reaper armado. Desde o início dos anos 2000, esses meios remotos são equipados com câmeras muito compactas, alguns capazes de serem colocados na palma da mão, e ler um manuscrito de altitudes de 15 mil metros. O veterano U-2 foi repetidamente considerado para ser substituído pelos drones. Em 2011, a USAF tornou pública sua intenção de substituir o U-2 pelo RQ-4 Global Hawk, porém em janeiro de 2012, foi decidido estender a vida útil do U-2. Foi colocado que as câmeras e sensores do RQ-4 são menos capazes e não possuem capacidade operacional em condições climáticas adversas; no entanto, alguns dos sensores do U-2 podem ser instalados no RQ-4. No final de 2014, a Lockheed Martin propôs converter a frota U-2 tripulada em aeronaves não tripuladas, o que aumentaria sua carga útil sem os sistemas de suporte ao piloto; entretanto, a USAF recusou uma conversão tão extensa. Durante a década de 2010, esta empresa promoveu sua proposta de desenvolver um UAV hipersônico, que designou de SR-72, em alusão ao inativo SR-71 Blackbird. A empresa também desenvolveu outras aeronaves de reconhecimento não tripuladas, como o RQ-170 Sentinel.



domingo, 13 de maio de 2018

Apoio Aéreo Aproximado (Close Air Support - CAS) *147



Relativamente desconhecida do público em geral antes das guerras do Iraque e do Afeganistão, esta missão existe desde dos primórdios da aviação. Mas o que é o CAS? como é vista pelos pilotos e por aqueles que se beneficiam dela, as forças terrestres? Estas perguntas ajudam a entender o que realmente é esta missão e ajudam a dissipar alguns mitos que a cercam.


O apoio aéreo aproximado (close air support - CAS) é o nome dado à missão ar-terra executada por aeronaves que estão próximas à forças terrestres amigas, geralmente a pedido e em proveito destas, e com integração detalhada a cada movimento com o fogo e a manobras destas forças. Qualquer aeronave que possa empregar munições pode prover apoio a forças no solo, sejam balões de ar quente na Primeira Guerra Mundial aos atuais vetores estratégicos como os B-1Bs dos EUA, se puderem prover artilharia de qualquer tipo à tropa no solo esta missão caracteriza-se como CAS.


Esta afirmação se faz importante porque muitos pensam que somente aeronaves como os Thunderbold A-10 e seus semelhantes são capazes de executar este tipo de missão. Enquanto estas aeronaves tenham sido concebidas para esta missão e a desempenhem com proficiência, não são as únicas capazes de fazê-lo, e sua atuação representa um pequeno número nas missões desta natureza que acontecem nos dias de hoje.


O CAS é uma das poucas missões igualmente executadas por todas as forças. A instrução JP 3-09.3 é a bíblia do CAS paras as forças dos EUA. Apesar da US Navy e a USAF, de forma anacrônica, divergirem tanto na forma como veem a tática, provavelmente aquecidos numa fogueira de vaidades, quando se trata do CAS os pensamentos convergem para um mesmo objetivo comum. Os helicópteros do US Army não são considerados como atores de CAS, e sim com elementos de manobra, assim como um carro de combate ou uma peça de artilharia, embora em última análise o sejam, mas como são tripulados por integrantes da tropa apoiada e pensam como esta, não precisam de controladores qualificados para realizar seus fogos.

Existem três elementos chave em uma missão de CAS: o comandante da tropa em terra, o controlador aéreo avançado (FAC nos US Marines e JTAC nos US Army/ Navy/ Air Force) e os elementos aéreos de apoio (aeronaves). O comandante terrestre é o responsável pela manobra das forças no solo e determinante dos movimentos e objetivos desta, sendo a sua intenção o objetivo dos fogos de CAS, e estes executados a partir de sua determinação. O FAC é o representante deste comandante junto aos pilotos, aquele que entende as duas linguagens, e sua função é traduzir as intenções deste comandante terrestre nos procedimentos de fogo aéreo praticado pelas aeronaves de apoio.




Os FACs atuam integrados com as unidades terrestres, em terra ou em aeronaves de observação e fazem a ligação entre estes "dois mundos", transformando demandas táticas em fogos de apoio, tal qual um observador de artilharia de campanha, guardadas as proporções. Cabe aos FACs coordenar a chamada "pilha", quando várias aeronaves CAS estão presentes acima da área de operações em altitudes desconectadas, e em condições de executarem a mesma missão, através da marcação de alvos e autorizando aos elementos aéreos liberarem suas "warheads" e fogos de rajada, sempre em estreita sincronização com o comandante da manobra (comandante terrestre).


O CAS é uma missão dinâmica e de ocasião, geralmente desempenhado por aeronaves que estão sobrevoando a área de operações com esta finalidade, mas sem nada planejado especificamente. Não se sabe quais alvos aparecerão, nem se tem rotas específicas de entrada e saída, apenas aguardando-se o chamado do FAC. É a missão aérea mais fácil de se planejar, apenas sabendo qual os prováveis tipos de munição que se irá utilizar e as regras de engajamento do momento.


Esta missão se apresenta de duas formas básicas: Por demanda ou pré-planejada. Em uma missão pré-planejada a aeronave decola já sabendo quais serão seus alvos, como por exemplo um comboio a cavaleiro de uma via de importância tática e que tem relação com a manobra amiga. Nestas missões se está apoiando uma operação específica e não se decola com a garantia de que as armas serão usadas, apenas se está lá para ser usado conforme a conveniência desta missão. 

Nas missões por demanda as aeronaves aguardam em um aeródromo próximo ou sobrevoam a área de operações ou suas adjacências, nada específico existe e se faz parte da "pilha", atuando como uma força de reação rápida com seus fogos endereçados a alvos que forem convenientes ao comandante da manobra, que poderão ser alterados de forma dinâmica.




Por fazerem uso de armas genéricas, as missões de CAS demandam planejamento mínimo, são as missões aéreas mais fáceis de serem planejadas e podem ser executadas por qualquer aeronave, desdo os vetores mais especializados como o A-10 Thunderbolt II e o Su-25, até os bombardeiros estratégicos como os poderosos B-1B, dada a sofisticação de suas suítes eletrônicas. As armas mais usadas são as bombas guiadas por GPS ou laser, as de emprego geral e os mísseis ar-superfície, além dos canhões orgânicos. A seleção das armas a serem empregadas é resultado da experiência do FAC e a disponibilidades destas para serem empregadas nos cabides das aeronaves.

É comum  a ideia de que CAS é uma missão de cenários de baixa ameaça, como as campanhas na Síria, Iraque e Afeganistão; onde os meios aéreos circulam livremente sem se preocuparem com complexas malhas de SAMs de médio e longo alcance e baterias de alto desempenho, onde predominam os MANPADS e as armas leves. Porém nem sempre esta situação se materializa e as tropas estão operando em "zonas quentes", onde missões SEAD e táticas especiais se fazem necessárias.


CAS em áreas de alta ameaça é um negócio de risco, como em hipotéticos conflitos envolvendo a OTAN, o Japão, a China, as Coreias do Norte e do Sul e a Rússia, entre outras. Sejam quais forem as dificuldades ou o cenário, no entanto os atores tendem a se adaptar, e os vetores engajados nestas missões certamente não serão deixados em seus aeródromos, principalmente àqueles mais especializados.




Fazendo Fogo


Uma missão CAS começa no seu centro de operações de apoio aéreo, onde os pilotos tomam ciência sobre a missão ou prováveis missões, a situação e as unidades que apoiarão. Informações sobre o voo e outras aeronaves na área poderão ser passadas. A medidas que as aeronaves se aproximam do objetivo trocarão a frequência do controle de voo para a frequência dos FACs e passarão a fazer um "check-in" junto a estes. Os FACs estabelecerão as regras de engajamento e orientarão os pilotos a se integrarem a "pilha" de aeronaves que estão disponíveis na área, determinando uma altitude de espera se for o caso e um circuíto a cumprir, ou autorizarão que se entre em ação imediatamente.

Em cenários movimentados poderá haver uma grande quantidade de aeronaves na área de operações em condições de prestar apoio CAS, que podem ser desde RPVs, passando por aeronaves de ataque ao solo especializadas e de apoio aproximado, até bombardeiros estratégicos e aeronaves singulares como o AC-130.

O piloto ao aproximar-se da zona de combate passa ao FAC um "briefing" onde informa seu número de missão, número e tipo de aeronave, posição e altitude, munição e sensores disponíveis, tempo que pode permanecer a disposição e o indispensável código de aborto. Este código permite ao FAC interromper de forma rápida e eficaz um bombardeio iminente e autorizado quando se constata que não deve acontecer.

O FAC por sua vez passará aos pilotos sua informações como a situação geral, os alvos presentes e os objetivos pelos quais as forças em terra estão operando, os tipos de ameaças e seus locais prováveis ou conhecidos, como MANPADS, baterias de tubo e SAMs de maior porte e suas altitudes de segurança, as posições amigas e outras informações e restrições vigentes.

De todas elas a informação mais relevante são as posições das forças amigas, as quais as aeronaves devem apoiar, e garantir sua segurança é fundamental. Todo piloto de CAS deve, sempre que o tempo permitir, fazer um sobrevoo visual sobre elas para certificar-se que seus fogos serão endereçados para longe delas. A noite esta tarefa é ainda mais fácil para aqueles que dispões de NVGs, especialmente se as tropas estiverem empregando marcadores infravermelhos estroboscópicos para marcarem sua posição. Se esta checagem não for possível os pilotos irão proceder a marcação destas posições em seus mapas e tentar obter confirmação visual através dos sensores da aeronave.

Em cenários tanto de alta ameaça como de baixa, os pilotos irão obedecer pontos de retenção longe do alvo, sendo que na maioria das operações modernas as aeronaves orbitam sobre o alvo em altitudes de segurança. O tipo de órbita depende do tipo de aeronave: Os F-16 da USAF, por exemplo, orbitam a direita porque seus pods Litening estão montados no queixo direito desta aeronave, enquanto nos Hornet da US NAVY a órbita se dá no sentido inverso devido a disposição de seu sensor ATFLIR. As distâncias ainda são variáveis de acordo com a velocidade e as características da aeronave, com uma ou cinco milhas, por exemplo, e as altitudes dependem dos limites de segurança e da "pilha" existente.

Um grande mito das missões CAS é que suas aeronaves devem voar baixo e serem lentas para serem eficazes. Com os sensores modernos os pilotos podem estar muito longe e muito altos e mesmo assim serem eficazes. Pode-se lançar um bombardeio, mesmo estando acima de vetores mais lentos como UAVs e helicópteros, com eficácia e segurança. Acima dos três mil metros as aeronaves ficam foram da zona de engajamento da maioria dos MANPADS e das armas leves, além de chamar menos atenção em missões que envolvem o sigilo. Evidente que este perfil de missão só é possível a aeronaves e "warheads" de alta tecnologia, que sejam seguramente precisas e não coloquem em risco as tropas amigas.

Uma vez dentro do circuito, o líder e seu ala se separarão, com o líder concentrado na manutenção do circuito e o ala no objetivo de solo, geralmente em altitudes levemente diferentes, usando o rádio ou mais recentemente o datalink para desengajar. 


O FAC dispõem de 3 modos de controle, sendo que no primeiro ele vê tanto a aeronave quanto o alvo durante todo o ataque para assegurar-se que os fogos estão sendo endereçados ao objetivo correto; no segundo modo ele visualiza somente o alvo ou o piloto, e depois que o piloto transmitir seu "pronto", o FAC replicará com a indicação de que o alvo está frente e o fogo está liberado. No terceiro modo o FAC não visualiza nenhum deles e o usa para bombardeiros longe das forças amigas e transmite ao piloto que a área está livre para engajamento. 





O piloto por sua vez conta com 2 modos de ação indicados pelo FAC: no primeiro o FAC passa coordenadas precisas ao piloto, que as alimenta em seus sistema de fogo para liberar armas de precisão nestas coordenadas. No outro modo as coordenadas não são precisas e o piloto deve conferir visualmente ou por sensores onde soltará suas bombas.



Informações poderão ser trabalhadas de várias formas, conforme a doutrina de cada força. Um conjunto normalmente usado são o ponto inicial (PI) para a corrida, o indicativo do alvo, a distância de algum ponto de referência que pode ser a própria aeronave, a direção a ser tomada, as coordenadas na forma de latitude e longitude, a altitude do alvo, a posição do alvo plotada em um sistema de referência militar, a forma de marcação (fumaça por exemplo), a distância mínima a partir da tropa amiga, o ponto de regresso (onde deverá estar após o ataque) de onde retornará ao aeródromo ou ao circuíto de espera.

O FAC é a autoridade máxima durante o ataque e será responsabilidade dele a segurança da tropa amiga, cabendo-lhe estabelecer a linha de segurança a partir da qual o bombardeio poderá se dar, bem como as restrições que devem ser observadas, como armas autorizadas, tempo de ataque e horários-limite. O alvo também poderá ser usado como referência, como a pista de um aeródromo por exemplo, onde a cabeceira da pista serve de ponto de partida para cálculo do ponto de impacto. Se sistema inteligentes estiverem disponíveis a introdução das coordenadas do alvo no sistema, facilita em muito o trabalho dos bombardeiros. Sistemas com Datalink pode dar a visão do piloto ao FAC, e se este estiver usando designadores laser ou IR será como se fosse um tiro direto. Palavras chave como ""contato" ou "visual" também podem ser usadas, deixando claro o status da operação naquele momento, evitando confusão entre o que é alvo e o que é tropa amiga.


Uma vez o ataque definido caberá ao lider (piloto) determinar as regras entre as aeronaves da esquadrilha (ou com o ala). As comunicações passam a ser entre estes, o lider se assegura que seus parceiros estão em sintonia com a missão que foi definida, passando a regras do ataque. Os dois (ou mais) bombardearão ou um bombardeará e o outro proverá cobertura mantendo-se em órbita? que armas usarão e que métodos (provavelmente já definidos), bombardearão juntos ou em intervalo de quantos segundos? de que forma desengajarão para evitar colisão ou ameaças em terra?


Apesar de parecer um processo complicado, e é, tripulações treinadas executam rapidamente, sendo treinamento e prática constante essenciais, estando os pilotos especializados mais capacitados (como os de A-10 e AC-130) a este tipo de operação. Sistemas montados no capacete (HMD) são especialmente úteis neste tipo de missão.


Uma vez completa esta fase de designação o piloto iniciaria sua corrida, transmitindo ao FAC uma mensagem com seu codinome, a designação do alvo, o modo de ataque e se tem as tropa amigas no visual ou não, por exemplo. O FAC responderia para que ele se mantivesse na corrida (não liberado) ou que o "fogo está liberado", geralmente em jargão próprio, o que dá segurança às mensagens. As coisa então acontece rapidamente, e neste momento palavras-chave são "mágicas". Ao iniciar a recuperação, o FAC procurará observar se alguma ameaça tipo MANPADS não foi disparada, alertando o piloto. Informará também se necessário uma segunda passagem ou se pode retornar ao "circuíto" e próximo alvo. A sequencia se repete até que a aeronave fique sem munição ou combustível, ou ainda atinja um horário determinado. O fator psicológico é alto, pois o piloto pode ouvir pela fonia do FAC o fogo sendo trocado, e sente que seu apoio é importante, desejando fazer o que está ao seu alcance para aliviar a ameaça inimiga.


Finalizada a missão, o FAC transmite todos os detalhes possíveis (debriefing) para que os pilotos levem a informação de volta à base. Os pilotos, sabendo que as tropas vão continuar lá lutando, farão o máximo para voltarem o quanto antes para dar continuidade ao apoio. As missões de CAS são muito variadas e dinâmicas, nenhuma sendo igual a outra.





Missões Complementares

O CAS, no entanto, não é só bombardeio puro e simples, e pode envolver, por exemplo, voo de intimidação. As vezes o bombardeio não é alternativa como numa área povoada e a realização de voos rasantes podem fazer o inimigo a "sentir a morte" vinda de cima,  desistindo de lutar ali. Esta prática também pode servir para reforçar a moral das tropas amigas, potencializando sua vontade de lutar. Não requer interação com o FAC.


O passo seguinte é a demonstração de força, que deve ser coordenado entre o piloto e o FAC, e consiste no disparo de armas em alvos visíveis, no intuito de forçar a desistência inimiga. É usado em shows aéreos e pode funcionar como forte fator psicológico junto a insurgentes. Pode ser muito arriscado se houver a possibilidade da presença de MANPADS na área.


Outra missão que pode ser necessária é o CAS improvisado, onde alguém em terra solicitou apoio aéreo através de seu rádio sem ter as devidas qualificações para tal. É uma prática perigosa e a possibilidade de fratricídio está presente em alto nível, porém pode ser a única alternativa. Neste caso os pilotos procuram fazer acontecer de uma forma mais lenta, passo a passo, porém sem deixar o pessoal no terreno sem apoio, de forma a mitigar o risco de atingi-los involuntariamente.


Mais recentemente temos as missões CAS digitais onde todo o processo se dá via software e datalink, com coordenadas precisas e liberação de armas pelo sistema. Os FACs podem visualizar o que o piloto vê, armas podem ser lançadas de grande altitudes, com mau tempo em em terreno cobertos. O risco ainda existe, pois pode-se por exemplo inserir um coordenada imprecisa e chamar o fogo para cima de si, pois nenhum sistema é perfeito. Neste caso, como nos outros, o treinamento é chave do sucesso.


Qualquer aeronave pode fazer CAS, e a eficiência de cada uma estará diretamente relacionada a quem as opera. Aeronaves especializas em CAS são operadas por tripulações (pilotos e FACs) igualmente especializados, e estes farão a diferença. Então tanto faz seu temos um A-10 ou um F-35, as pessoas e seu treinamento ditarão a eficiência de cada missão. 



Veja também: CAS: Qual a aeronave certa?



sábado, 8 de fevereiro de 2014

Aviação do Exército - Possibilidades #088


A não linearidade dos combates modernos veio a enaltecer o papel da aviação orgânica das forças terrestres, que desempenham um papel de grande importância na atualidade, seja como burros de carga, plataformas de fogo, olhos de tudo veem ou táxis de campo de batalha. Seja apoiando operações com linhas de contato definidas ou totalmente dispersas, a flexibilidade proporcionada pela aviação do exército constitui fator imprescindível aos comandantes modernos.

A aviação orgânica dos exércitos permite as estes a ampliação da área de interesse para a manobra terrestre, sem depender da disponibilidade dos meios da força aérea, nem sempre presentes. Possuir meios aéreos próprios permite aos exércitos flexibilidade e prontidão em suas respostas a demanda dos combates modernos.



Os meios aéreos de um exército constituem-se em fator multiplicador do poder de combate, podendo atuar em profundidade dentro de área de operações, possibilitando um grande número de opções táticas aos comandantes militares, desembarcando tropas e as recolhendo em pontos capitais afastados, efetuando bloqueios e combatendo em pontos chave inacessíveis a forças que se deslocam por terra, antecipando sua ocupação ao inimigo. Áreas com características restritivas de mobilidade como selvas tropicais, áreas montanhosas ou regiões com grande extensões alagadiças demandam o apoio de meios aéreos para o rápido deslocamento de tropas e outros meios e recursos. A infiltração e exfiltração de forças especiais e pequenos contingente cumprindo missões especiais de grande importância são missões especialmente adequadas a aviação do exército.

Outra possibilidade tática dos meios aéreos de grande valor para a força terrestre é a capacidade de observação a partir do alto, dispensando a necessidade de posse de elevações que podem estar em poder do inimigo, permitindo a avaliação da situação tática em tempo real, e a constate vigilância dos meios aéreos os torna aptos a prover alerta antecipado ao esforço principal do inimigo, com grande antecedência. Comandar do alto é de grande valia para qualquer comandante militar e a capacidade se estabelecer postos de comando aeromóveis traz grandes facilidades a esta função, fazendo com que os comandantes possam deslocar-se enquanto dirigem uma manobra, simplificando as ligações de combate e inteligência eletrônica.



De posse de uma mobilidade sem igual, as forças aéreas de um exército podem de uma forma rápida redirecionar a pressão sobre o inimigo a partir de uma nova possibilidade tática decorrente da evolução do combate, aproveitando os erros do inimigo ou corrigindo os reveses da própria força, flexibilizando a manobra.  Atuando como artilharia aérea pode prover apoio de fogo a tropas em dificuldades ou que solicitem seu apoio a fim de facilitar o cumprimento de sua missão, bem como engajar forças inimigas a partir do alto, como colunas blindadas ou não em avanço.

Outra função muito útil é a capacidade de reorganizar rapidamente os meios de apoio ao combate, como morteiros e artilharia, radares de vigilância e equipamentos leves de engenharia. Auxiliar na transposição de grandes cursos d`água, transpondo tropas para a outra margem para assegurar a cabeça de ponte necessária a esta operação, que de outra forma teria que ser feita pelo vulnerável método de transposição com barcos. Além destas tarefas pode ainda atuar na suplementação do apoio logístico a forças mais afastadas e de paraquedistas por exemplo, que podem estar isoladas em território inimigo, e ainda reforçando eixos de suprimento interrompidos pelo inimigo até que possam atuar por conta própria. Pode ainda prover ressuprimento imediato a tropas sob pressão e que necessitem de munição urgente.


quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Combate SAR (CSAR) #062



Combate SAR*

Uma Análise Mais Cuidadosa 

Coronel RR Darrel Whitcomb, USAF 

Como bem demonstrado pelos últimos acontecimentos na Sérvia, as missões de Combate-SAR (CSAR)* continuam a ocorrer. O êxito alcançado nos resgates de dois pilotos que tiveram seus aviões atingidos em território inimigo, o primeiro voando um F-117 (código de chamada, Vega-31) e o outro um F-16 (Hammer-34), poderia ter-se tornado tema de uma história empolgante.

Contudo, pouco foi publicado sobre essas duas operações. Não há dúvida de que, nestes casos, a discrição tornava-se prudente, considerando-se que as operações estavam em andamento naquele Teatro de Operações. Entretanto, quando, ao final, essas histórias forem narradas, os leitores nelas encontrarão muitos aspectos em comum com as missões realizadas pelo SAR e pelo CSAR em conflitos anteriores. Esses relatos acharão lugar na rica saga de operações de resgate, que remonta ao início dos primeiros vôos tripulados e dignificam os homens que se expõem ao perigo “para que outros possam viver”.
*CSAR (Combate-SAR) significa a busca, o resgate e o salvamento de equipagens de aeronaves abatidas, ou de militares combatentes, que se encontrem isolados em território inimigo. 
Do ponto de vista histórico, essas ações de resgate parecem enquadrar-se em padrões de longo prazo, dos quais podemos extrair importantes lições para emprego em futuras operações. Winston Churchill, um dedicado estudioso da história, disse uma vez: “Quanto mais distante pudermos olhar o passado, mais distante poderemos antever o futuro”.

A história da aviação é plena de relatos sobre as experiências de busca e salvamento. É provável que parte dessa história contribua para estimular discussões e debates que nos ajudem a levar a efeito uma análise mais demorada sobre este assunto. A razão para isso parece bem óbvia. Afinal, existe unanimidade no propósito de se resgatar nossos combatentes quando abatidos. Entretanto, como veremos, este assunto poderá ser bem mais complexo do que possa parecer à primeira vista.

Em qualquer operação militar precisamos estar preparados para realizar missões CSAR para resgatar equipagens de vôo, grupos militares ou mesmo equipes de forças de superfície que se encontrem isolados à retaguarda das linhas inimigas, podendo, por exemplo, vir a ser um piloto de caça, uma equipagem completa de uma aeronave AWACS (Airborne Warning and Control System), ou mesmo uma equipe de Forças Especiais, além de outras mais. (Os três soldados americanos que não puderam ser resgatados na Sérvia, durante os recentes conflitos nos Bálcãs, encontravam-se em uma patrulha terrestre de rotina).

O principal ponto a se considerar é o de que as missões CSAR são em si, pura e simplesmente, operações de guerra, constituindo-se apenas em uma outra forma de batalha, na qual princípios de guerra, como os princípios de massa, economia de meios e surpresa, através de operações diversionárias (dependendo da situação) são empregados. 

Outros mais assumem singular importância como a unidade de comando, tornando-se essencial na concentração de esforços. O princípio da segurança torna-se crítico, negando ao inimigo informações que possam denunciar as diversas ações que devem ser realizadas, a tempo certo, concorrendo para a consecução do mesmo objetivo.

Em um Teatro de Operações, no qual muitas ações, batalhas e campanhas acontecem, as operações CSAR somam-se à neblina e ao caos da guerra. Entretanto, ao contrário de outros tipos de operações, cujos propósitos não são bem definidos ou naturalmente compreendidos, o objetivo do CSAR é sempre claro, bem entendido por todos e facilmente mensurável. Além do mais, o CSAR nos toca no nível fundamentalmente humano – uma característica que talvez seja perigosa porque nos pode desviar de outros esforços. Ou seja, torna-se fácil desviar meios destinados a outras operações para serem empregados em operações CSAR. Estamos dispostos a resgatar alguém independentemente dos custos? Aparentemente, a fórmula mágica de hoje diz que “a guerra deverá parar para que as operações CSAR sejam realizadas”. Será que isso é prudente?

Não é necessário dizer que as operações CSAR exigem precisão absoluta. Em um grande teatro de operações, onde muitas ações ocorrem ao mesmo tempo, temos de literalmente penetrar no domínio do caos organizado com o claro propósito de retirar uma ou mais pessoas específicas.

A experiência mostra que o tempo corre contra nós a partir do momento em que uma tripulação é abatida. Os inimigos sabem que faremos todo o esforço possível para resgatar o nosso pessoal. É preciso, portanto, supor que eles estão cientes dos nossos esforços e que provavelmente possuem, ainda, um certo conhecimento sobre nossas técnicas de resgate. Em teste recente realizado na Base Aérea Nellis, no estado de Nevada, constatou-se que após decorridas as duas primeiras horas a partir de uma ejeção sobre território inimigo, a probabilidade de um resgate bem-sucedido começa a diminuir.

A atividade CSAR parece incluir duas linhas de entendimento: por falta de melhores termos, as palavras logos ou lógica e pathos ou emoção serão suficientes. Ambas possuem o seu particular papel neste processo.


Logos

Analisando tudo isso do ponto de vista histórico, conclui-se que a adequada administração de 5 fatores principais contribui de forma decisiva para o êxito de um resgate. Naturalmente, ninguém pode assegurar o êxito da missão, considerando-se que, afinal, as operações ocorrem no domínio do conflito e da sorte.

Onde está o sobrevivente a ser resgatado?

O primeiro denomina-se posição — é preciso encontrar o(s) sobrevivente(s). Isso parece excessivamente elementar, mas é disso que se trata. É absolutamente fundamental para todo o processo. Conforme afirmou um recente relatório CSAR, “[C]oordenadas precisas são essenciais” para o resgate. (Note-se que o “S” de CSAR significa search [busca]). 

Na época da Campanha no Sudeste Asiático [Guerra do Vietnã], costumávamos enviar uma patrulha de aeronaves A-1 para sobrevoar e “varrer” a área, em busca de sobreviventes. Hoje, com o advento de radares, armamentos antiaéreos de cano e mísseis superfície-ar sofisticados, essa prática está se tornando mais difícil de ser realizada. Devemos estar preparados para empregar todos os meios disponíveis, quer localizados no teatro de operações, quer no próprio país, para localizar o(s) sobrevivente(s).

Este aspecto torna-se crítico porque não podemos começar a reunir nossas forças para um resgate sem que tenhamos conhecimento de sua localização. Colocamos ênfase, também, na importância de se evitar que o inimigo descubra a localização do(s) sobrevivente(s).

O fator posição parece ser valioso no que se refere a quatro aspectos:
  1. Aspecto Estratégico. A localização do sobrevivente em relação às fronteiras de cada país pode causar um impacto substancial no relacionamento das nações, nas regras de engajamento, bem como em vários outros assuntos como, por exemplo, os acordos de autorização para sobrevôo de territórios. No Sudeste Asiático, tínhamos diferentes regras de operação para cada país: Vietnã do Sul, Vietnã do Norte, Laos e Camboja. Não realizamos nenhuma operação para resgate de tripulações perdidas sobre o território chinês.
  2. Aspecto Operacional. É preciso que determinemos se o local onde se encontra(m) o(s) sobrevivente(s) irá interferir em outras operações em curso no conflito mais amplo. Será que uma operação CSAR, em um determinado horário e lugar, irá interferir em alguma outra operação? Ou será que poderemos possivelmente tirar proveito de algum aspecto de outra operação em curso, para auxiliar o esforço de resgate?
  3. Aspecto Tático - O que precisamos fazer para chegar, de imediato, à área e local para realizar o resgate? Isso dependerá de uma clássica avaliação do setor de inteligência, sobre as forças adversárias, para que possamos decidir que ações tomar a fim de nos contrapormos ao esforço do inimigo em obstruir a nossa operação CSAR.
  4. Aspecto da Precisão - O que teremos de fazer para tornar o mais seguro e preciso possível o embarque (ou içamento) do(s) sobrevivente(s) no veículo de resgate — o evento mais crítico de toda a operação? Uma vez em ação, o veículo de resgate precisa manobrar rapidamente para recolher o(s) sobrevivente(s) e abandonar a área.


Estabelecendo contato

O segundo fator são as comunicações. É preciso estabelecermos comunicações com o(s) sobrevivente(s) e com os órgãos necessários para planejar, coordenar, comandar e executar o resgate. 

A Guerra da Coréia nos mostrou que era preciso prover as nossas equipagens com rádios de sobrevivência. O planejamento realizado com antecedência pode-se mostrar bastante eficaz ao determinar como diferentes unidades e elementos trabalharão em conjunto para executar uma operação CSAR de caráter imediato. 

A Ordem de Operações e demais instruções especiais, bem como termos comuns e bem entendidos por todos os envolvidos, muito contribuem, também, para este fim. De forma oposta, palavras codificadas, entendidas por apenas uma parte dos participantes da operação CSAR, podem gerar confusão em momentos críticos. Todos nós concordamos com o significado da palavra bingo? Quantos pilotos de caça conhecem o significado da expressão spider route? Quantos pilotos de helicóptero sabem o que significa a palavra magnum? Além do mais, no transcurso de uma intensa operação CSAR, precisamos excluir aqueles que não possam contribuir para a consecução do objetivo da missão. Informação inútil ou “conversa fiada” nada mais é do que ruído e interferência nas comunicações.



Quais meios empregar

O terceiro fator são os veículos de resgate. Precisamos sempre contar com um veículo de resgate. Ele simplesmente não aparecerá por acaso. Sempre pensamos nos helicópteros de grande porte – como os que nós denominamos Jolly Greens – como sendo os veículos, mas devemos pensar muito além disto. Veículos navais, veículos terrestres, ou mesmo, talvez, uma equipe de resgate de solo pode bem executar a tarefa. Não importa que insígnia o veículo venha a usar. Ele será, afinal, apenas um meio. O resgate, sim, será sempre o objetivo fim de toda a operação.



Sobreviventes devem estar preparados para ser resgatados

O quarto fator são a habilidade e a astúcia dos sobreviventes. Conforme enunciado em um recente relatório CSAR, “as ações praticadas pelo(s) sobrevivente(s) constituem parte integrante do êxito ou fracasso de qualquer operação de resgate”.A história dos resgates está repleta dessa temática.



É preciso ter superioridade circunstancial

O quinto fator é a superioridade circunstancial na área do resgate. Temos de ser capazes de manter, na área e no espaço circunvizinhos ao local em que se encontra(m) o(s) sobrevivente(s), uma superioridade circunstancial, em grau suficiente e por tempo adequado, para permitir que tenhamos o controle e a liberdade de execução das ações de resgate. Uma das lições que tiramos da Guerra da Coréia foi que a superioridade aérea é um fator essencial para o êxito das operações de uma Força-Tarefa de Resgate.

A necessidade de superioridade circunstancial, contudo, é tri-dimensional, considerando-se que algumas das mais sérias ameaças encontram-se, hoje em dia, baseadas no solo. Isso aplica-se exclusivamente às operações CSAR, diferenciando-as das operações SAR. Já os quatro primeiros fatores apresentados aplicam-se a praticamente qualquer tipo de Operação de Busca e Salvamento. 

Renovamos a afirmação de que em combate o inimigo fará oposição às nossas ações. Precisamos, portanto, impor a nossa vontade, mantendo controle sobre as ações em curso por tempo suficiente de modo a permitir que o veículo de resgate apanhe o(s) sobrevivente(s) e abandone a área. Estas ações são desenroladas em território inimigo, sob a oposição de suas forças, constituindo-se, portanto, em situações de combate e em operações de guerra. Vamos rever alguns exemplos históricos dos quais poderemos extrair determinadas lições.



Segunda Guerra Mundial

Em fevereiro de 1944, uma Força-Tarefa de Navios-aeródromos da Marinha Americana atacou as Forças Japonesas no Atol de Truk. Durante a batalha, um avião Grumman F-6F do USS Essex foi atingido. O piloto conseguiu fazer uma amerissagem forçada em uma das lagoas formadas por corais que envolviam as ilhas. O líder da esquadrilha viu quando o seu ala tocou a água, constatando que ele sobrevivera e que conseguira subir em seu bote. 

Chamou em seguida o Essex e, informando a posição do sobrevivente, pediu uma missão de resgate aeronaval. O Essex acionou outro navio da Força-Tarefa, o USS Baltimore, que lançou um avião anfíbio OS2U-3 Kingfisher para resgatar o piloto abatido. Entretanto, antes que a aeronave de salvamento chegasse, o líder da esquadrilha notou que um destróier japonês entrava na lagoa para, aparentemente, capturar o piloto americano. A seguir, o ás e suas aeronaves remanescentes na esquadrilha, passaram a atacar repetidas vezes o destróier, desviando-o de seu curso e provendo suficiente superioridade circunstancial para proteger e facilitar o resgate em curso.

Procedimento similar, com pequena diferença, repetiu-se dois meses depois. À medida que a Força-Tarefa continuava a atacar os japoneses no Atol de Truk, mais aviões da Marinha foram abatidos. Em um incidente, outro Kingfisher, desta vez do navio North Carolina, amerrissou e recolheu dez tripulantes em uma lagoa de corais. Porém, como estivesse muito pesado para decolar, com os sobreviventes literalmente acampados sobre suas asas, “taxiou” para o mar aberto, enquanto os caças executavam uma cobertura para protegê-lo, até que os sobreviventes fossem transferidos, em mar aberto, para o submarino USS Tang, que os aguardava.



Guerra da Coréia

Em junho de 1951, um piloto pousou forçado o seu Mustang, atingido pela antiaérea, nas águas do Rio Taedong, 50 milhas a nordeste de Pyongyang. Seus companheiros de esquadrilha o viram nadando e pediram um avião de resgate. Um SA-16 Albatroz, pilotado pelo Primeiro-Tenente John Najarian voou para o local. 

Outros Mustangs se juntaram à primeira esquadrilha e suprimiram as metralhadoras inimigas em ambas as margens, enquanto o SA-16 pousava nas águas frias do rio e resgatava o piloto do Mustang. Naquele momento, o sol já havia se posto e a correnteza havia levado o avião em direção a uma rede elétrica de alta tensão, que cruzava o rio. Para ajudar o Ten Najarian a ver os cabos, os Mustangs sobrevoavam a rede, com seus faróis de pouso acesos, permitindo que ele decolasse, em segurança, executando uma trajetória que passava por baixo dos cabos da rede.



Guerra do Vietnã

Um bom número de histórias sobre o Sudeste Asiático merecem ser contadas. Uma delas refere-se ao Oyester 01Bravo. Em maio de 1972, um F-4 Phantom foi abatido a noroeste de Hanói. O Primeiro-Tenente Roger Locher, operador do sistema de armas (WSO), evadiu-se em território inimigo e após 23 dias de fuga, conseguiu estabelecer comunicações com forças amigas que conseguiram localizá-lo. 

As Forças de Resgate no Teatro de Operações foram acionadas mas, inicialmente, foram rechaçadas pelo inimigo. O General John Vogt, Comandante da Sétima Força Aérea, determinou que todo o esforço aéreo do dia seguinte fosse dedicado a manter uma suficiente superioridade aérea no local para apoiar a operação de resgate, que finalmente resultou em sucesso.

A Operação Bat-21Bravo/Nail-38Bravo, uma imensa operação SAR, a maior deste tipo realizada na Guerra do Vietnã, ocorreu em abril de 1972. Nossas forças estabeleceram comunicações com os sobreviventes e facilmente os localizaram. Embora tivéssemos forças de resgate disponíveis, não pudemos manter uma superioridade circunstancial no local e, em conseqüência, nenhum helicóptero de resgate conseguiu retirá-los de onde estavam. 

De fato, no esforço para cumprir esta missão, vários helicópteros vieram a ser abatidos. Foi então que uma pequena equipe de solo, fazendo uso de técnicas furtivas e apoiada por fogo preciso, conseguiu, finalmente, resgatar os dois tripulantes.

Uma tentativa de resgate que resultou em insucesso, Owl 14 Bravo, é, não obstante, instrutiva. Outro F-4 foi abatido sobre o Vietnã do Norte, logo ao norte da zona desmilitarizada, em maio de 1972. 

Apenas um sobrevivente (o Capitão Ray Bean, WSO) fez contacto rádio com as forças de cobertura, que o localizaram. Os meios de resgate encontravam-se disponíveis, mas a área estava repleta de unidades de defesa antiaérea. 

Antes que pudéssemos suprimi-las o suficiente para que um helicóptero pudesse executar a penetração, o inimigo capturou o sobrevivente, que foi libertado em Hanói, um ano depois. O Cap Bean disse que as forças inimigas no local eram tão concentradas que certamente teriam destruído qualquer helicóptero que houvesse tentado penetrar na área.



Guerra do Golfo

Em 21 de janeiro de 1991, um míssil iraquiano atingiu um F-14, Slate-46. Estabelecemos intermitentes contatos rádio com o piloto, mas tínhamos apenas uma ideia geral de sua posição. O inimigo havia capturado o segundo tripulante, um oficial encarregado de interceptar as comunicações-rádio iraquianas. 

Um helicóptero MH-53, pilotado pelo Cap Tom Trask, penetrou fundo no território iraquiano. Nas proximidades da posição do sobrevivente, um elemento de A-10 (2 aviões) juntou-se ao helicóptero. Os aviões manobraram então para localizar a posição do piloto no solo e vetorar o helicóptero em direção a ele. 

Porém, as tropas inimigas encontravam-se na área, incluindo alguns caminhões que, evidentemente, procuravam identificar a posição do radiotransmissor do sobrevivente. O Cap Paul Johnson, que liderava os A-10, atacou as tropas e veículos inimigos, a apenas 150 metros de distância do piloto da Marinha, permitindo que ele fosse apanhado e resgatado pelo helicóptero do Cap Trask.


Guerra dos Bálcãs

Também é útil conhecer a fracassada tentativa de resgate da equipagem de um Mirage da Força Aérea Francesa (Ebro-33), abatido no final de agosto de 1995, durante a Operação Deliberate Force da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Nunca conseguimos estabelecer contacto rádio com os possíveis sobreviventes e nem determinar a posição em que se encontravam. 

Muito embora nossas forças de resgate estivessem disponíveis e possuíssemos também suficientes meios para manter uma adequada superioridade circunstancial no local, nunca os encontramos. Em realidade, forças amigas chegaram ser feridas no esforço de busca.



Pathos

Voltamo-nos agora para pathos, o “porquê” emocional de tudo isto. Novamente, a resposta nos parece bastante óbvia. O sobrevivente será sempre um de nós e jamais viremos a abandonar um companheiro.

Os pilotos de combate, entretanto, não aceitaram submeter-se a correr os riscos de perdas e de morte no campo de batalha? Eles não recebem uma gratificação adicional de risco, que se soma a seus soldos?

Conforme disse um general da Força Aérea em 1972, no auge das ações da Operação SAR Bat 21Bravo, “Na qualidade de aviador, soldado ou marinheiro, nós devemos entender que haverá momentos em que nós, como indivíduos, deveremos ser sacrificados em benefício do objetivo maior [da missão]”.

Sim, aceitamos o risco, mas não concordamos em que a vida de cada companheiro seja facilmente considerada descartável, especialmente em uma guerra que não pareçamos ter a intenção de vencer. 

Assim, por que tanto esforço a despender por um único indivíduo? Vários motivos nos vêm à mente:




Ninguem gosta ou admite deixar um companheiro para trás

O primeiro é a natureza humana. As histórias dos resgates encontram-se entre as mais heróicas. As pessoas sempre se apresentam para ajudar aqueles em perigo. O fato de que o inimigo sistematicamente se opõe às operações CSAR nos motiva a redobrar nossos esforços.


É possível fazer. por quê não fazer?

O segundo é o fato de que podemos. Temos desenvolvido equipamentos e instrumentos para resgatar qualquer pessoa de praticamente qualquer lugar. Além disso, não hesitamos em usar qualquer tipo de tecnologia em benefício deste processo. Aprendemos, também, a organizar nossas forças para conquistar o necessário nível de superioridade circunstancial, para que as forças de resgate possam cumprir sua missão.

Para os viciados no Joint Vision 2010, chamamos isso de manobra dominante e engajamento de precisão.



Faz bem para o moral dos companheiros

O terceiro é o moral das tropas. As operações de resgate afetam o moral de nossas tropas. O General Hap Arnold já havia notado esta correlação na Segunda Guerra Mundial. Ele dirigiu a criação das forças de resgate americanas, a exemplo do que fizeram britânicos e alemães, que teriam por missão resgatar tripulações abatidas. 

Sua idéia era em parte pragmática, já que são necessários muitos recursos para formar e treinar suas equipagens, especializando-as em missões de resgate. Em termos humanistas, isto não significa que as equipagens de resgate venham a ter maior valor do que outras americanas. 

Substituí-las, porém, torna-se uma tarefa bem mais difícil. O General Hugh Shelton, Presidente da Junta de Chefes de Estado-Maior, tocou neste assunto quando afirmou: “Ao nos comprometermos a empenhar todo e qualquer esforço em resgatar nosso [pessoal] altamente treinado, transmitimos uma mensagem poderosa sobre a importância que possuem e, ao mesmo tempo, os incentivamos a manter a força e a coragem em meio à tensão do combate”.



Os sobreviventes podem ter alto valor para o inimigo

O quarto é a negação de recursos. Resgatando o nosso pessoal, estaremos negando valiosos recursos ao inimigo. Informações e o valor da propaganda são questões bastante óbvias neste caso. Considere-se o incidente de Mogadíscio ou o episódio em que o Cap Scott O’Grady foi atingido, em vôo, pelos sérvios-bósnios. Durante a Guerra do Golfo, Saddam Hussein tentou explorar as tripulações capturadas e não há dúvida de que o fará novamente, se ocorrer, por acaso, uma perda de equipagem sobre o Iraque, durante a Operação Northern Watch ou Southern Watch.



Todo combatente desempenha melhor se tiver certeza que será resgatado

O último é o pacto ou liame que une a irmandade dos homens da Força Aérea. Uma vez mais, o General Hap Arnold observou que as tripulações cumpriam suas missões de forma mais eficiente quando tinham certeza de que, caso viessem a ser abatidas no cumprimento da missão, todo esforço seria feito para resgatá-las.

Os combatentes de terra chamam este liame de coesão de unidade, observando que, com o passar do tempo, os soldados deverão crer naquilo que fazem e acreditar que a causa, pela qual lutam, vale o sacrifício que lhes é imposto. 

Na ausência desses valores, nossos soldados deverão continuar a ter a consciência de que sempre estarão, pelo menos, lutando uns pelos outros. Stephen Ambrose tem, de forma convincente, documentado a ocorrência deste fenômeno entre os americanos que lutaram na Segunda Guerra Mundial.

Nosso pacto não é tanto específico das unidades em si, como o é da raça – a raça de homens do ar. É o fio condutor comum que se alonga desde a gênese do vôo até os recentes resgates realizados na Sérvia. Que liame é esse? A resposta é simples: sempre que possível, não abandonaremos os nossos companheiros que forem abatidos sem que tenhamos empreendido uma tentativa de resgatá-los.


Isto não significa que não sejamos realistas sobre a guerra. Os homens da Força Aérea entendem, aceitam e supõem que sofreremos baixas. Entretanto, não as sofreremos levianamente. Contamos com que qualquer que seja o pedido que nos façam, que ele seja suficientemente valioso para valer o respectivo sacrifício — que não sejamos eliminados por uma missão ilusória ou inútil, e que nossos soldados não terão morrido em vão”, como bem disse o Presidente Lincoln em Gettysburg.

Minha proposta, contudo, é que nossa propensão para as missões CSAR se apresente numa escala variável inversamente proporcional ao nível de esforço que estejamos dispostos a despender em qualquer conflito. Em outras palavras, em um conflito total, em que a sobrevivência nacional venha a estar em jogo, a nação pagará qualquer preço. 

Eu me lembro, claramente, que, quando piloto de A-10, em 1980, ouvi um general da OTAN dizer que ele “cobriria toda a margem ocidental do Rio Elba com carcaças de aviões A-10, para evitar que as forças do Pacto de Varsóvia atravessassem o rio”. Fiquei estarrecido com aquele pronunciamento, até entender o real significado de suas palavras. Aquela situação teria ocorrido no decorrer de um conflito generalizado, em que a própria sobrevivência dos EUA teria estado em jogo. 

Ali, a intensidade dos combates nos teria imposto aquele sacrifício final. A nossa nação tem aceito tais perdas, em altos níveis, em tempos de grandes crises como a Guerra de Secessão ou a Segunda Guerra Mundial. 

Em conflitos limitados, contudo, esperamos pagar apenas um preço limitado. Por quê?

Estou bem lembrado do velho provérbio que afirma: “São as nações, e não as forças militares, que fazem as guerras”. E as nações sempre lutam por objetivos políticos. 

Carl von Clausewitz explanou este conceito, muitos anos atrás, quando disse: “O objetivo político é a meta, a guerra é um meio de conquistá-lo, e os meios nunca podem ser considerados de forma divorciada de seus propósitos”.

Assim, a meta ou objetivo determina a necessidade e o grau de importância da guerra, contra o qual a população irá comparar o preço e os custos da guerra, avaliando e determinando o apoio popular à guerra. A sociedade mede estes custos em termos de impostos e, mais importante ainda, dos riscos de vida a que serão submetidos seus filhos e filhas. 

Novamente Clausewitz explica: “Quando os gastos com o esforço de guerra excederem o valor do objetivo político, a nação deverá abdicar deste objetivo e evitar a guerra.”

Por conseguinte, as operações CSAR serão limitadas em um conflito total, mas não em engajamentos limitados, em que nos condicionamos a somente pagar um preço limitado para conquistar um objetivo também limitado. 

Atualmente, parece que o Poder Aéreo é a arma preferida para esta missão. De fato, nossos líderes políticos sentem — com base no que escutam de seus eleitores — que o público tem pouca tolerância por perdas. O fato de que as tripulações de aeronaves são, no momento, os únicos combatentes a serem submetidos a risco, confere uma real importância ao CSAR, acentuando, assim, o pacto. Fui testemunha ocular disso como jovem tenente no Sudeste Asiático.

Por volta de 1969, meu país havia começado a voltar-se contra a guerra. O objetivo, qualquer que fosse, não mais valia o alto preço que estávamos pagando. Os Estados Unidos queriam retirar-se. O Presidente Nixon chamou isso de “paz com honra”. Recordo-me, contudo, de ouvir meu comandante de esquadrão nos dizer: “Não há nada aqui que valha uma vida americana — exceto outro americano”.

Aquilo nos levou a refletir, considerando o fato de que estávamos lutando ao lado de nossos aliados.

Em 1972, depois de oito anos de guerra, continuávamos lá, ainda lutando, sem qualquer dedicação real a uma causa, exceto a retirada. De maneira semelhante aos guerreiros de conflitos anteriores, lutávamos uns pelos outros. Nós tínhamos como artigo de fé que se fôssemos abatidos, o Jolly viria nos buscar. De fato, o helicóptero de resgate [Jolly] tornou-se o símbolo daquele liame ou pacto. Para as tripulações de resgate, o termo Jolly tornou-se um código de chamada-rádio. Para nós outros, era uma prece. Para muitos, a salvação. Era o liame.

Hoje em dia, o registro desses sentimentos não tem sido um traço de excelência nosso, dos homens do ar. Reflita, porém, sobre as palavras de um marujo de um barco-patrulha da Marinha, que considerou este assunto de forma diferente. Quando, reunidos, lamentavam o fracasso de uma tentativa de encontrar e resgatar companheiros perdidos no mar durante uma batalha noturna, ele disse: “A vantagem de voltar para buscar é a mensagem que isso transmite. Ainda que você tenha desaparecido envolto em uma bola de fogo, seus amigos voltarão, e lá haverão de estar, procurando você”.

Recentemente, o General Shelton tornou a acentuar essa determinação ao dizer que “Este liame entre guerreiros encerra o compromisso de não abandonar um companheiro no campo de batalha, um compromisso que se estende ao marinheiro, no mar, ou a um ala que seja atingido em profundidade à retaguarda das linhas inimigas”.

Porém aqui vai um alerta: é preciso que não façamos isso às custas das forças de terra. As operações de resgate devem ser realizadas, de forma proporcional, como parte integrante da batalha maior. Qual é o limite? Não sei. Novamente, Churchill nos deixa uma orientação bastante prática: em 1940, os exércitos alemães “varreram” os países do Oeste Europeu, empurrando o exército britânico de volta a um enclave no porto francês de Dunquerque.



A Real Marinha Inglesa e marinheiros em suas embarcações particulares acorreram para transportar uma grande parte da força de volta à Grã-Bretanha, mesmo sem suficientes equipamentos ou mesmo uma organização adequada. Depois de uma primavera de constantes notícias desagradáveis e humilhação, o povo inglês celebrou esse acontecimento como uma grande vitória. Churchill, porém, dirigiu-se ao Parlamento para lembrá-los de que “É preciso que sejamos bastante cuidadosos para não atribuirmos a esta libertação as características de uma vitória”. 

As guerras não são ganhas por meio de evacuações”. Pode-se argumentar, também, que elas tampouco são ganhas por operações CSAR. Entretanto, a capacidade e a determinação para se realizar missões CSAR são fatores chaves para manter o moral das equipagens de combate, em especial nas ocasiões em que seus integrantes são os únicos combatentes a correrem risco de vida. O General Vogt entendia isto muito bem quando enviou uma grande força-tarefa para as imediações de Hanói para executar o resgate de Roger Locher em 1972.

Nunca deveremos resgatar nosso pessoal às custas de nossos aliados. Na guerra de coalizão, o relacionamento entre aliados é um centro de gravidade que um inimigo habilidoso poderá tentar desestabilizar. Hitler tentou fazer isto com a grande coalizão na Segunda Guerra Mundial. 

Os norte-vietnamitas foram deveras habilidosos ao inserirem uma cunha entre os americanos e os nossos aliados, os sul-vietnamitas. Precisamos assegurar-nos de que estamos dispostos a realizar as operações CSAR em favor de todos os nossos aliados, da mesma forma como o fizemos em busca do Ebro-33.

Assim, isso é pathos. Estas são forças poderosas que ocasionalmente nos são trazidas à lembrança por acontecimentos que, parecendo pequenos, são muito significativos. Em novembro de 1997, nós nos reunimos, em várias centenas, no Cemitério Nacional de Arlington para enterrar a tripulação do helicóptero Jolly Green-67, perdida no esforço de resgate do Bat-21Bravo em 1972. 

Foi um lindo e memorável dia. Ninguém seria capaz de contar todos os veteranos daquela época, que lá se reuniam para dar, aos nossos companheiros, as boas-vindas e o último adeus no regresso ao lar. De fato, a cor azul dos uniformes, usados pelos veteranos, com suas condecorações, cobriram toda a área e parte da colina adjacente.

Dois helicópteros MH-53, descendentes dos antigos Jolly Greens, realizaram um magnífico sobrevôo. O Ten Gen Dave Vesely, representando o Chefe de Estado-Maior da Força Aérea dos EUA, disse: “Todos nós, que temos voado em situações de risco, sabemos muito bem a diferença que faz termos a plena consciência de que todo e qualquer esforço será feito para nos resgatar, caso venhamos a ser abatidos...

Hoje, enquanto contabilizamos o alto custo destas operações, devemos, também, nos considerar afortunados por termos nos tornado os beneficiários destes, os melhores dos homens – homens que souberam dar suas próprias vidas, ‘para que outros possam viver’”.

Finda a cerimônia, muitos dos velhos veteranos daqueles tempos, missões e combates aproximaram-se do caixão. Alguns depositaram suas boinas marrons, outros depositaram rosas ou deixaram simples adesivos. Alguns fizeram-lhes continência ou os tocaram. Em tudo isso havia uma mensagem. Aqueles veteranos, ainda orgulhosos, tinham ido atrás do Jolly porque eles bem se lembravam do tempo em que, se necessário, o Jolly teria ido atrás deles.