FRASE

"Quem escolhe a desonra a fim de evitar o confronto, a conseguirá de pronto, e terá o confronto na sequência."

sábado, 18 de agosto de 2018

Controle do fogo de infantaria *152




O Combate de infantaria é um empreitada dinâmica, perigosa e violenta, e o combatente deve reagir a ele de forma a preservar a integridade física sua e de seus companheiros, e ao mesmo tempo saber aplicar sobre o inimigo a fração de poder militar que lhe compete em tempo real. O poder militar é aplicado em combate através do fogo, que deve ser desencadeado pelo indivíduo obedecendo a critérios internalizados na mente do soldado através de seu treinamento, maximizando seus efeitos e evitando colocar-se em situação de vulnerabilidade, através de regras pré-definidas, consagradas pela doutrina, porém sem tolher a iniciativa de cada um que deve ser incentivada. O treinamento constante e adequado elucidará, na mente do combatente, a diferença entre a desejável iniciativa e o excesso dela que pode resultar em imprudência.

Ao empregar seu poder de fogo, o infante deverá procurar fazê-lo seguindo as diretrizes de seu comandante imediato, tendo consciência de onde estão ou estarão seus companheiros e minimizando sua exposição, maximizando a segurança de todos. A prioridade de fogo deverá visar a ameaça mais imediata e perigosa, através do emprego da arma mais adequada à situação e sem dispensar excesso de munição sobre um alvo inutilmente. O emprego combinado de 2 ou mais armas sobre um mesmo alvo poderá ser o mais adequado em determinadas situações, onde a massificação dos disparos trará efeitos superiores e resultados mais satisfatórios. Deve-se ter ainda em mente a disponibilidade de munição e um plano de contingência para o caso desta escassear. Cabe a todos e especialmente ao líder zelar por estas práticas em observação aos princípios da massa, proteção e economia de meios. 

O líder controlará os fogos de seus subordinados, seja através de diretrizes temporárias, que podem ser de ordem tática, técnica ou legal, sempre dentro das Regras de Engajamento da situação. Algumas razões para este controle são a quantidade limitada de munição, a disciplina de segurança do local em questão e a disciplina de sigilo da operação, entre outros.

Os fogos podem ser de efeito massificado ou de precisão, e a situação tática ditará qual deles usar. A metralhadora e as granadas são os responsáveis pelo maior volume dos fogos, a aos fuzis caberá a função de cobertura. Aos alvos mais “difíceis” reserva-se o fogo dos lança-rojões, e quando assim o exigir a complexidade da situação ou pela insuficiência das armas orgânicas, solicita-se o apoio dos morteiros, artilharia de campanha e naval, carros de combate e aviação de apoio. Os fogos de precisão são geralmente reservados aos atiradores com fuzis especiais e seus aparelhos de pontaria mais apurados, e na ausência destes aos fuzileiros com fuzis padrão. Um grupamento qualquer, operando no terreno, tem um ganho significativo em sua segurança se cobertos pelo fogo de 1 ou 2 atiradores de precisão posicionados em um lugar elevado a retaguarda deles.

O combate requer superioridade de fogos, que é obtida através da massificação deles em pontos críticos, através do emprego combinado dos meios disponíveis, na busca de resultados decisivos. Ao entrar em combate, deve-se fazê-lo com violência e objetivo, a fim de se alcançar resultados decisivos em tempo mínimo, poupando meios e reduzindo os riscos. Os fogos devem ser aplicados sempre em parceria com a manobra, atirando para poder manobrar e manobrando para posicionar-se nos melhores locais para fazer fogo. Na busca da superioridade de fogos os fuzileiros atiram em setores predefinidos para cada um, com campos de tiro sobrepostos, apoiando-se mutuamente, combinando armas de tiro tenso e curvo, sempre focando em pontos mais vulneráveis, com munição de natureza variada de acordo com a situação tática. Alvos podem ser pontuais ou de área, com cada um demandando a arma e munição mais adequadas.


Ao líder de infantaria caberá a avaliação dos fogos de preparação, que devem ser requisitados sempre que disponíveis e adequados, de forma a oferecer ao infante um alvo já debilitado. A artilharia de campanha, os morteiros orgânicos, os carros de combate e a aviação tática estão ali para isso, e devem ser usados. Seja no ataque ou na defesa, estes fogos de apoio contribuem significativamente par reduzir os riscos e facilitar a sua manobra e eficácia.

Os fogos de apoio devem ser inicialmente intensos, prontamente ajustados e cronometrados para que cessem no tempo previsto. Seus efeitos tendem a diminuir com o tempo pois o inimigo adapta-se a eles. Grandes volumes entregues em tempo curto causam danos e choque máximos. Fogos longos retardam o avanço e podem permitir ao inimigo reposicionar-se, recuperar-se e reagir.

Os primeiros fogos devem ser concentrados de forma a permitir o movimento, e para tal são definidos setores de fogo e corredores de manobra, sempre procurando o centro de gravidade tático do momento. Neste momento procura-se alcançar posições ocultas e cobertas, maximizando a proteção da tropa, e ao mesmo tempo permitindo a instalação de boas bases de fogo. A avaliação feita a partir daí definem as capacidades e intenções inimigas, a partir da observação própria e de elementos de vigilância e reconhecimento. Por fim, empenha-se junto ao inimigo o esforço decisivo com ações sincronizadas entre os meios orgânicos e de apoio para aplicar o poder de combate necessário a um desfecho favorável, rápido e procurando manter a integridade da tropa. Uma unidade que sofreu pouco atrito estará pronta para o próximo embate antes de outra mais "cansada".

Toda manobra, seja qual for seu porte contará com um plano de fogo que levará em conta a situação tática e a natureza dos alvos, a munição e os meios disponíveis, a necessidade de fogos não orgânicos e sua duração, o uso de fumígenos e munição especial e os meios de comunicação. Prioriza-se os alvos que representem maior ameaça e os mais próximos, levando em conta o alcance útil de cada uma das armas disponíveis. Fogos excessivos desperdiçam munição que pode fazer falta mais tarde. O uso de marcadores de alvo (eletrônicos, IR, traçantes) é útil em situações de visibilidade limitada.

Os líderes e os operadores devem conhecer as possibilidades e efeitos de cada tipo de arma e munição, de forma a melhor avaliar seus efeitos sobre o alvo. Por exemplo: um ATGW com ogiva HEAT não pode perfurar a blindagem frontal de um MBT moderno, mas pode sim danificar seu trem de rolamento e imobilizar o veículo; metralhadoras médias são efetivas contras veículos não blindados até 1000 m e lança-rojões até 450 m. O fogo deve ser desencadeado o mais cedo possível, com as armas de maior alcance disparando primeiro e forçando o inimigo a reagir o quanto antes, desembarcando e impedindo que sigam seus planos. Deve-se usar cada sistema de armas dentro de seu alcance efetivo, escalonando a profundidade do fogo, debilitando o inimigo a medida que se aproxima, evitando que o combate aproximado seja contra um oponente organizado.



Ao fazer fogo os combatentes devem procurar manter o mínimo de exposição, e quando o fizerem procurar os momentos em que o fogo de cobertura estiver ativo, sempre fazendo com fogo efetivo, sem hesitações. Dobras do terreno, sejam naturais ou preparadas, oferecem abrigo natural; e engajamento pelos flancos e retaguarda, disparo de múltiplas posições e disparos curtos e inesperados reduzem a exposição.

Saber onde está seu companheiro, sua tropa amiga, evita o fogo amigo, bem como conhecer os planos de ataque e manter comunicações constantes. Aos líderes cabe esta tarefa de coordenar seus comandados a fim de evitar acidentes, orientando-os e sabendo onde estão cada uma de suas subunidades. O campo de batalha moderno é multidimensional e muitas vezes não existe “front” definido, exigindo uma coordenação espacial mais apurada de cada elemento. 

Durante progressões sob condições de visibilidade limitada pode-se usar marcações térmicas ou por IR para sinalizar o progresso de cada fração, evitando que frações adjacentes disparem umas contra as outras. Luzes químicas podem ser ligadas em seqüência para marcar um corredor já percorrido, porém deve-se assegurar que estas marcações não possam ser vistas pelo inimigo, por exemplo, se ele dispuser de capacidade de visão noturna infravermelha.

Nevoeiro denso, chuva, tempestades de areia e o uso de fumígenos pelo inimigo podem reduzir significativamente a capacidade do líder de controlar os fogos diretos dos seus. Nesta condições deve-se fazer o uso máximo do equipamento disponível como miras térmicas e sistemas de visão noturna que permitem aos esquadrões manterem o contato com o inimigo como se o engajamento fosse em dia claro.

Nada se faz sem um plano, e nele se considera todos os ativos disponíveis, sempre com medidas alternativas para o caso de equipamento ou pessoal ter sido colocado fora de combate. Capacidades redundantes e ocorrências mais prováveis devem ser a diretriz principal, como por exemplo, setores de fogo alternativos para o caso de elementos ficarem incapacitados.

O combate se vence pelo fogo bem administrado e efetivo, quebrando o poder de combate do inimigo e preservando a integridade dos meios a disposição e do pessoal que integra a tropa própria e aliada.



domingo, 12 de agosto de 2018

O Míssil Antirradiação (ARM) #151




O Míssil antirradiação (ARM) é um projétil destinado a neutralizar sistemas emissores de radiação como radares de vigilância e diretores de tiro a fim de inviabilizar a operacionalidade de baterias antiaéreas, através da busca da radiação emitida pelo alvo, operando desta forma sensores passivos de busca. É um equipamento complexo e difícil de desenvolver, porém de altíssimo valor militar e tecnicamente destina-se a realizar as missões de supressão de defesas (SEAD).

Contrapor a ameaça aérea é uma das grandes prioridades de qualquer força armada, pois ela representa a ponta de lança de qualquer ação militar e seu poder de destruição é verdadeiramente devastador. Na guerra moderna as forças em combate tem como missão inicial a conquista da supremacia aérea, que nada mais é que o domínio do espaço aéreo para que os meios aéreos próprios ou aliados possam voar suas missões de combate em relativa segurança (superioridade aérea) ou mesmo em segurança absoluta (supremacia aérea).

A campanha inicia-se com ações aéreas suportadas por intenso apoio de EW a fim de neutralizar a aviação de defesa aérea inimiga, seja em combates ar-ar abatendo os caças no ar, ou bombardeando bases aéreas com sua infraestrutura de alerta e detecção, bem como a aviação que se encontra em terra. Esta ação inicial pode se dar de duas formas: a primeira em condição de surpresa total com a maioria das aeronaves em terra e cujo protagonista será o bombardeio das bases e suas defesas de ponto, ou uma condição em que o inimigo esteja esperando o ataque, e neste caso, com uma parcela significativa de seu elemento de alerta voando em patrulhas de combate aéreo (CAP). Um exemplo clássico da primeira condição foi materializado na Guerra dos Seis Dias em 1967, onde a aviação de Israel destruiu em terra a quase totalidade da aviação egípcia.

Uma vez alcançada esta condição de liberdade operacional, onde a aviação de defesa aérea do inimigo não representa mais uma ameaça significativa, ou mesmo quando o alerta aéreo inimigo está relaxado e a defesa baseada em terra é o meio de reação mais imediato, os atacantes aéreos tem que se preocupar com os sistemas de defesa aérea localizados em torno das bases aéreas em momentos iniciais, e posteriormente numa segunda fase da campanha em pontos sensíveis como parques industriais, bases militares, usinas de energia e outros alvos ganham importância, e estão cobertos por redes antiaéreas baseada em terra.

Estes sistemas de defesa antiaérea, geralmente baseados em SAMs de médio e longo alcance e canhões de tiro rápido, tem seus disparos endereçados por sistema de radar. Sejam radares de vigilância e alerta antecipado ou diretores de tiro, neutralizar a capacidade destes sistemas significa colocar as armas propriamente ditas (SAMs) em condição de “cegueira” operacional, impedindo que sejam disparadas com efetividade.



O míssil antirradiação (ARM) visa alcançar estas antenas de sistemas RADAR e colocá-los foram de combate antes que qualquer ação de defesa aérea possa ser implementada, uma vez que é guiado através da radiação emitida por estas antenas, não alertando o inimigo sobre sua aproximação, salvo de for captado pelo próprio RADAR. São utilizados por aeronaves que voam a frente dos escalões de bombardeio propriamente ditos, e disparados a fim de criar um corredor livre de alerta aéreo para que o “grosso” destes possam alcançar em relativa segurança seus alvos no solo, que poderão inclusive ser as próprias baterias antiaéreas.

Estes mísseis são construídos para seguir a radiação inimiga, e portanto não são eficazes contra qualquer outro tipo de alvo. As antenas deste sistemas-ameaça são alvos pouco resistentes, de forma que os mísseis não precisam carregar uma carga explosiva muito potente, sendo que até um impacto sem explosão pode ser suficiente para colocar o sistema inoperante. Aeronaves que portam ARMs geralmente levam também outros petardos para destruir fisicamente o restante do sistema, depois da antena do alerta estar neutralizada.

Muitas vezes os operadores dos sistemas de alerta ao simplesmente "desconfiarem" da aproximação destes mísseis, os desligam para evitar “impacto”, cegando seus “seekers”, fazendo com que o sistema de defesa fique inoperante e míssil mesmo assim cumpra sua missão, pois neutralizou o sistema. Outra forma de contramedida é a instalação de chamarizes (mais de uma) nas imediações do radar atacado que transmitam na mesma RF do RADAR-alvo. Os chamarizes emitem pulsos em intermitência com o radar verdadeiro, fazendo com que o foco do míssil comece a vagar não selecionando qualquer um deles. Modelos mais sofisticados tem a capacidade de “memorizar” a posição do alvo captada antes de seu desligamento, fazendo que voo se dê a um ponto provável.

Os primeiros ARMs como o AGM-45 Shrike usado na Guerra das Falklands/Malvinas não possuíam a capacidade de acertar seu alvos se o RADAR desligasse suas antenas. Modelos posteriores com o AGM-78 Standard e AGM-88 Harm passaram a contar com sistemas INS que permitem a memorização da posição do alvo e seu curso até lá. O modelo europeu ALARM possui um paraquedas que permite que desça lentamente até que o RADAR volte a ser ligado, quando volta a acender seu motor.

Possuem modos diversos de operação, podendo ter seu alvo designado por “travamento” através do RWR da aeronave, por inserção de coordenadas em sua memória de forma manual valendo-se de seu GPS e INS. Podem ainda ser lançados sem alvo definido esperando-se que o adquiria durante o voo num engajamento de oportunidade (Stand-Alone).

Na década de 2010 A FAB solicitou aos EUA a compra de um lote de mísseis AGM-88 Harm, o qual foi negado sob a alegação de que não era interessante (para eles) a introdução deste tipo de arma no cenário latino-americano. Em resposta o DCTA partiu para o desenvolvimento de um modelo nacional, hoje denominado MAR-1 e já operacional. É um projeto ainda envolto em mistério mas sabe-se que é capaz de detectar radares de baixa potência como o Skyguard a 500 km de distância, possui um ogiva de 90 Kg e alcance desconhecido, especulado em torno de 60 km. Sua velocidade é próxima a do som e dimensões similares ao ALARM, porém menor que este, pesando 266 kg.



domingo, 5 de agosto de 2018

Os Soldados de "Omaha Beach" *150




No dia 06 de junho de 1944, 34 mil soldados norte-americanos embarcaram em uma missão decisiva. Em média eles tinham 22 anos e muitos acreditavam que não conseguiriam voltar. A Europa estava ocupada pelos nazistas, e os Exércitos Aliados lançaram a maior operação anfíbia da história, visando a reconquista deste território, contra um litoral fortemente defendido pelas forças alemãs. A "Operação Overlord" iniciou-se com um lançamento em massa de cerca de 3 divisões aeroterrestres e o assalto anfíbio à 5 praias denominadas "Utah", "Omaha", "Sword", "Gold" e "Juno", nome este código para efeito militar. Aos paraquedistas cabia proteger os anfíbios quanto a chegada de reforços, e aos anfíbios a consolidação de uma cabeça de praia para possibilitar que o "grosso" das tropas aliadas pudessem desembarcar em segurança. Era uma chance única e não podia dar errado.

Mas para cada um dos soldados americanos que desembarcou em "Omaha Beach", só o fato de chegar em terra já era uma conquista, pois foi uma corrida pela sobrevivência. Esta batalha épica de 12 horas pelas conquista de uma cabeça de praia na mais "difícil" das 5 escolhidas, marcou esta grande operação de retomada da Europa Ocidental, que mesmo minuciosamente planejada apresentou muitas falhas, tal sua magnitude e a dificuldade de se implementar um assalto sem precedentes.

Fatores surpreendentes e artimanhas extraordinárias marcaram esta operação que tantas vidas custaram aos exércitos envolvidos. Não foram apenas homens e armas, mas truques de ilusionismo e invenções bizarras como carros de combate adaptados como viaturas anfíbias de forma improvisada, paraquedistas falsos que explodiam e mensagens passadas através de pombos-correio. Fatores como a previsão do tempo ou a fivela do arnês dos paraquedas influenciaram significativamente o que estava por vir. Mesmo em um episódio onde defesas engenhosas a estratégias clássicas de defesa espalhadas ao largo de 300 metros de areia exposta, o desfecho dependeu de liderança e bravura, onde a determinação de homens, que vendo seus colegas tombarem sob o incessante fogos de morteiros e automáticas alemães, lograram por conquistar seu objetivo a duras penas.

Após 5 anos do início da 2ª Guerra Mundial o futuro da Europa estava ameaçado. O Nazistas de Hitler ocuparam todo o continente e os Estados Unidos e a Inglaterra encabeçavam uma luta de oposição aos invasores, juntamente com seus aliados. Eram 06:00 AM ao largo do litoral norte francês, e uma primeira onda de 8 companhias do US Army posicionava-se para desembarcar em “Omaha Beach” e iniciar uma das mais memoráveis batalhas de todos os tempos. Centenas de homens apreensivos aguardavam, cientes de enfrentariam uma empreitada difícil e que muitos não voltariam. Era o batismo de fogo da maioria e o silêncio imperava dentro dos lanchões de desembarque, pois todos sabiam o que iriam enfrentar.



Um contingente de 1.200 militares alemães defendiam esta praia, equipados com a mais rápida metralhadora do mundo, a excepcional MG 42, que possuía uma cadência 2x maior que a Browning dos assaltantes.  Seus tiros não podem ser ouvidos individualmente e seu som assemelha-se a um tecido sendo rasgado. Seu ferrolho dotado de cilindros deslizantes lhe proporcionava uma cadência de 1.500 tpm a 880 m/s, disparando 50 tiros em 2,5 s e requerendo troca de cano a cada 400 disparos para evitar superaquecimento. 5 destas armas começaram a atingir incessantemente os lanchões, antes que qualquer soldado saísse deles, com 125 projéteis chegando a cada segundo. O sucesso do desembarque dependia do silenciamento delas, o mais rápido possível. Este foi um grave erro de planejamento: um veículo blindado e especialmente adaptado para o desembarque, para neutralizar as MG 42 deveria fazer a ponta de lança do assalto, e ainda deveria ter acontecido intensa preparação por parte da artilharia naval, o que não aconteceu, pois confiou-se nos bombardeios aéreos. Esqueceram que nuvens não estão nem aí para planos militares. Mergulhadores de combate poderiam ter minado os obstáculos anti-desembarque, para que os carros de combate pudessem fazer a vanguarda.

O mar estava desfavorável, com forte balanço e água entrado no interior dos lanchões. A US Navy, no intuito de aumentar o moral dos soldados, lhes serviu uma refeição pesada algumas horas antes. Esta refeição aliada ao balanço constante da embarcação, dentro da qual os soldados tiveram que esperar alguma horas, acabou por enausear boa parte da tropa, debilitando sua capacidade de combate. Às 06:40 AM os soldados já desembarcavam. Com frio, molhados, enuseados, carregando cerca de 50 kg de equipamento e sob o assédio da MG 42. Assim que a rampa abaixava o fogo alemão era para ali dirigido, abatendo os assaltantes como que num matadouro. Para fugirem do fogo mortal que ali se abatera muitos soldados começaram a pular pela lateral, caindo dentro da água com cerca de 3 m de profundidade, prática esta que foi advertida para que não fosse implementada. Sua carga de equipamentos e a profundidade fez com que muitos se afogassem. Muito entraram na guerra para não disparar um único tiro, morrendo ali mesmo. Muitos se livraram do equipamento, da jaqueta molhada e da munição e conseguiram voltar a superfície. Aqueles que voltavam a superfície reencontravam a saraivada de projéteis de 7,92 mm, que eram mortais até 30 cm sob a água. A resistência da água é tão grande que um projétil destes para totalmente em menos de um metros de trajetória subaquática. Manter esta distância vital pode ter, involuntariamente, salvado a vida de muitos. Dos cerca de 1.450 homens da primeira leva, estima-se que cerca de 450 morreram nos primeiros momentos. Toda esta carnificina ocorreu ainda dentro da água, sem que os homens sequer chegassem a praia, a parte mais difícil. Atravessar os 300 metros de praia repleta de obstáculos e sob o fogo incessante era o desafio que estava por vir. Cavalos de frisa e estacas, arame farpado e campos minados eram os principais meios de retardamento, expondo as vítimas para as MG 42 e os obuses. Após estes obstáculos vinham as dunas e seria a partir daí que a luta ficaria mais equilibrada.



Colocar carros de combate na praia antes da infantaria teria evitado o desastre inicial, porém os estrategistas consideraram que as embarcações que os transportariam eram muito vulneráveis. Blindados Sherman denominados “tanques DD” foram construídos especialmente, e nada mais eram que este carro de combate montado dentro de uma saia de lona que o fazia flutuar e com propulsores, e seria abaixada assim que chegasse a praia. Era uma adaptação de tempos de guerra e não um veículo dedicado, porém apresentou-se promissora nos testes realizados. O plano era colocar um “tanque DD” a cada 45 metros, apoiando a infantaria, totalizando 32 veículos. O problema é que eles foram testados em lagos e não em um mar revolto e agitado. As ondas no Canal da Mancha tinham quase 2 m de altura, e o tempo mostrava-se adverso já há dias. Porém a concentração no sul da Grã-Bretanha para o desembarque era difícil de ser ocultada, e os aliados não podiam esperar mais, sob o risco de serem descobertos. A 3.200 km dalí, dias antes, navios meteorológicos indicaram o dia 06 como climaticamente mais favorável, e este dia seria único e não poderia ser adiado. A decisão foi tomada, o tempo melhorou, mas o mar continuou agitado. A 5 km da praia a embarcação dedicada lançou seus “tanques DD” e as ondas altas e a pressão da água cobraram seu preço. Os blindados começaram a afundar e dos 29 lançados, 27 não chegaram a praia, deixando a infantaria por conta própria. Alguns soldados, principalmente motoristas afundaram com seus veículos.

No topo das dunas 14 “bankers” de concreto infernizavam a vida dos norte-americanos que chegavam a praia, com suas automáticas. As guarnições de defesa estavam ali há meses e tanto soldados quanto oficiais não acreditavam que o assalto ocorresse na Normandia, tal qual o alto comando. Eram instalações confortáveis e com boa comida. Esta sensação de que o ataque não seria ali deveu-se a um bem orquestrado plano de engodo e dissimulação. Foi criado uma força de invasão falsa próximo à Pas de Calais, no ponto onde o Canal da Mancha é mais estreito, fazendo com que os alemães concentrassem suas forças neste ponto, a cerca de 300 km do intencionado. Depois de 2 semanas do desembarque os nazistas ainda acreditavam em um desembarque em Calais. Infláveis simulando veículos e aeronaves, instalações falsas, pesado tráfego de comunicações e a participação do Gen George Patton deram credibilidade ao embuste, arquitetado por um ilusionista profissional. O Marechal de Campo Erwin Rommel, no entanto, não negligenciou as defesas deste setor e reforçou as defesas. Na manhã do dia D os defensores alemães, habituados a uma rotina de um dia depois do outro, depararam-se com uma frota monumental na linha do horizonte.



Para os soldados assaltantes não havia outra alternativa senão enfrentar o fogo das metralhadoras, morteiros e artilharia. Mas os comandantes aliados sabiam o tipo de apoio de fogo de que os alemães dispunham, e foi planejado neutralizar estas armas antes do assalto. Haviam cerca de 30 armas anticarro, 17 morteiros e mais de 20 obuseiros, dispostos dentro de abrigos (“bunkers”) de concreto em “Omaha”. Cerca de 4 horas antes do assalto, bombardeiros aliados decolaram para neutralizar estas ameaças, com mais de 400 aeronaves carregando seus mais de 13.000 petardos, que seriam lançados sobre as defesas na maior missão de preparação de campo de batalha da guerra com bombardeio de precisão, dentro do possível com a tecnológica da época. A USAAF acreditava na capacidade e precisão apurada de seus meios. Porém as nuvens estavam densas e os bombardeiros dependiam do radar, uma novidade na época com sua confiabilidade pouco testada. A Marinha não confiava no radar e temia que as bombas atingissem seus próprios navios. Por conseqüência os bombardeiros receberam ordens para atrasar em até 30 segundos a liberação de suas cargas. Voando a 3.000 m de altura e 240 km/h um atraso de alguns segundos pode mudar tudo. Apenas 5 s significa que a bomba em queda livre cairá 400 m depois do programado, e 30 s o impacto se dará 2,5 km depois. De forma inacreditável a totalidade do bombardeio atingiu o “nada”, deixando as posições alemãs intactas, constituindo uma das maiores falhas de C2 nos plano aliados.

Os soldados perceberam que a paralisia onde estavam, a despeito do fogo inclemente, era uma sentença de morte e começaram a progredir em direção às dunas. Depois de uma hora de desembarque a operação parecia um desastre. A 6 km dali Rangers implementavam a missão mais perigosa do dia. Neutralizar algumas bocas de fogo posicionadas no alto de rochedos, que ameaçavam diretamente os navios ao largo, repletos de soldados. Por todo o litoral haviam armas de grosso calibre posicionadas, constituindo ameaça direta tanto a praia como à frota. Neste rochedo denominado Poinet Du Hoc de 45 m, onde 5 grandes bocas de fogo de 155 mm Skoda, capturadas aos tchecos, ameaçavam tudo num raio de 24 km, incluindo “Omaha”, “Utah” e os meios de desembarque. O ataque a uma colina íngreme, fazendo uso da escalada por cordas, é uma das mais difíceis empreitadas que um infante pode enfrentar. Durante meses este assalto foi praticado, com ganchos lançados por morteiros, porém nos exercícios não havia o fogo das metralhadoras e as cordas estavam secas. Ao desembarcarem, os Rangers tinham que atravessar a praia e chegar ao pé do rochedo sob fogo intenso. Ao alcançarem o rochedo, devolveram o fogo e prepararam seus ganchos-morteiros, cujo lançamento da maioria não atingiu o topo devido ao peso extra das cordas molhadas. Alguns ganchos foram lançados com sucesso, devido a suas cordas secas, permitiram que a escalada fosse realizada. Os soldados que conseguiram subir deram continuidade a batalha, com alguns perecendo e outros logrando avanços. Ao chegar no objetivo, os soldados descobriram que ao canhões não estavam lá, e eram apenas postes telegráficos adequadamente dispostos, simulando uma posição de armas. Frustrados descobriram que se prepararam por meses para nada. Na verdade os canhões foram removidos para posições mais a retaguarda 2 dias antes, por ordem de Rommel, e destruídos na sequência dos acontecimentos, de forma que mesmo assim eles estavam lá.

As 08:30 AM a situação projetava um desastre total nesta praia. Na retaguarda alemã, no entanto, a resistência francesa dava sua cota de apoio ao desembarque. Nos meses que antecederam o desembarque os franceses envidaram um serviço de espionagem, enviado a Londres por vários meios suas observações sobre o dispositivo defensivo alemão. Era um trabalho arriscado e perigoso. Foram usados inclusive os serviços de pombos-correio. Próximos ao dia D os franceses intensificaram ações de sabotagem como a interrupção de linhas de comunicações por fio alemãs e a explosão de composições ferroviárias. Os alemães passaram a atiram em pombos, e membros da resistência foram capturados e executados. Porém os estragos foram feitos e as tropas alemãs na praia encontraram dificuldades em pedir reforços. Já faziam 3 horas que o desembarque havia começado e os sobreviventes estavam presos a um quebra-mar 240 m praia adentro, não haviam mais oficiais e sargentos suficientes e a liderança estava prejudicada, com cada indivíduo cuidando de sobreviver. A sua retaguarda a maré começa a subir.

Na madrugada do desembarque, 8 horas antes do início, um grande número de paraquedistas foi lançado à retaguarda das áreas de desembarque a fim de protegê-los contra a chegada de reforços. Paraquedistas falsos foram lançados em locais afastados para atrair tropas alemãs. O Marechal de Campo Erwin Rommel ordenou a inundação de uma grande área a retaguarda das praias, onde muitos paraquedistas saltaram. Muitos caíram na água e o drama dos anfíbios aconteceu ali também. A dificuldade de soltar o arnês rapidamente fez com que muitos se afogassem. Os arnês britânicos eram de fácil operação, mas os americanos requeriam um trabalho maior. Livrar-se rapidamente do paraquedas para alguém que está dentro da água, com 50 kg de equipamento e cujo velame podia cair por cima era vital. Dos 13.000 paraquedistas, centenas se afogaram.

Para retomar a liderança alguns oficiais ainda embarcados, dentre ele um general, assumiram o papel de capitães e tenentes postos fora de combate e passaram a liderar os soldados retidos no quebra-mar. O general de brigada Normam Cota estava embarcado observando o desastroso avanço da primeira “onda” de soldados na praia e decidiu acompanhar a segunda “onda” de soldados, e ao chegar na praia liderou pelo exemplo, abrindo caminho a frente e ditando palavras de motivação e de comando às tropas que lá estavam. Era o oficial mais velho em terra. Sua liderança surpreendeu aqueles que já estavam na praia, inclusive outros oficiais, e deu ímpeto ao ataque neste local.

A partir do quebra-mar e das dunas começaram a ser transpostos o arame farpado e os campos minados, obstáculos este vencidos com o auxílio dos “Torpedos Bangalore”, tubos de metal contendo explosivos que eram introduzidos na área e abriam brechas por onde os homens passavam. Os soldados estavam exaustos e feridos, porém seus líderes os levaram adiante mostrando a importância do comando competente e motivador. Ao largo, os comandantes navais não tinham autorização para apoiar com fogo o desembarque, pois tinham que proteger os navios, ainda repleto de soldados. Considerou-se desviar estes soldados para desembarcar em outra praia, mas notícias de que as primeiras brechas haviam sido abertas os fez repensar. Após algumas horas de suplício veio o alívio para a infantaria, quando a Marinha autorizou que alguns contratorpedeiros posicionassem-se mais próximos à praia e apoiassem o desembarque com artilharia naval. As situação começou a pender para o lado dos assaltantes.

Este relato mostra um pouco da realidade que os soldados assaltantes enfrentaram no Dia D na praia de “Omaha”, e de como pequenos detalhes podem ter grande influência em uma operação militar. Mostra como um plano deve descer a detalhes aparentemente irrelevantes e que na hora da ação podem fazer toda a diferença. Cordas molhadas ou não, atraso no tempo de lançamento de bombas aéreas e o projeto do arnês dos paraquedas são alguns deles. Enfatiza também o valor da liderança em combate, onde oficiais e sargentos mais experientes podem fazer a diferença quando lideram com determinação e competência. 

Calcula-se que 2.000 americanos morreram naquele dia, com outro tanto de feridos. Ao todo, nas 5 praias 10.000 aliados perderam a vida, cerca de 4.000 alemães e 3.000 civis franceses. Foi o início da retomada da Europa pela frente ocidental.