FRASE

"Quem escolhe a desonra a fim de evitar o confronto, a conseguirá de pronto, e terá o confronto na sequência."

terça-feira, 25 de maio de 2021

Operações Anfíbias - Uma opção estratégica *214

 

CC(FN) JOSÉ EMÍLIO DE OLIVEIRA RODRIGUES

O primeiro passo no processo de análise da evolução de qualquer operação militar é saber o que foi dito sobre a mesma no passado. Entretanto, a História dificilmente se repete, pois as circunstâncias são sempre diferentes. Assim, não se deve buscar um modelo estereotipado para ser imposto, mas fatos isolados positivos ou negativos que constituam uma rica fonte de inspiração para análise. Desde a 1ª Guerra Mundial, as Operações Anfíbias têm sido questionadas quanto à sua viabilidade e utilidade mesmo com alguns acontecimentos históricos demonstrando sua importância para a estratégia naval. Desta forma, é importante analisar a evolução das Operações Anfíbias por meio da História para o entendimento dos motivos que provocaram os questionamentos a respeito da sua importância, verificando a veracidade e validade dessas indagações para os dias atuais.

A Guerra do Peloponeso (431 a.C.-404 a.C.) entre Atenas e Esparta, ilustra a complexidade das Operações Anfíbias. Em 425 a.C., Atenas tinha a superioridade no mar e Esparta o domínio em terra. Nenhuma das 2 Cidades-Estado conseguia obter uma vantagem estratégica sobre a outra até que Atenas capturou a Ilha de Pylos em frente à costa espartana bloqueando o seu comércio marítimo. Enquanto esperava pelo contra-ataque espartano, o General Demóstenes gritou para suas tropas “Vois sois atenienses e sabem por experiência própria como é difícil desembarcar na presença do inimigo”. Os espartanos realizaram uma série de Operações Anfíbias para retirar os atenienses da ilha, mas todas falharam até que um armistício foi acertado e as tropas retiraram-se da Ilha.

Durante os 100 anos que antecederam a Revolução Francesa (1789-1799), a Grã-Bretanha esteve em guerra contra a França. Nesse período, 17 Operações Anfíbias foram realizadas contra a França e suas colônias sendo que somente 7 atingiram seus objetivos. Nos 20 anos dos quais 7 seguiram à Revolução, 12 Operações Anfíbias foram realizadas, mas somente 4 obtiveram sucesso. Conclui-se que os registros históricos das Operações Anfíbias realizadas antes da 1ª Guerra Mundial demonstram que elas sempre foram consideradas operações militares complexas, de difícil execução e de resultados imprevisíveis, sendo, em sua grande maioria, desfavoráveis.

Embora essas operações tenham uma história tão antiga quanto à própria estratégia da guerra em si, apenas no século XX sua conduta foi verdadeiramente profissionalizada, por meio de um estudo sistemático, visando a elaboração de uma doutrina formal que contemplasse seu planejamento, treinamento, aquisição de equipamentos especializados e a designação de algumas forças para serem especificamente anfíbias em seu foco tático e operacional.

Os registros históricos das Operações Anfíbias na 1ª Guerra Mundial foram bastante desapontadores. Após a decisão britânica de reforçar diretamente a França em operações terrestres, poucas Operações Anfíbias foram realizadas em comparação com os números das guerras anteriores. Mesmo assim, os poucos desembarques anfíbios realizados não preencheram as expectativas; pelo contrário, provocaram um grande e prolongado descrédito sobre sua viabilidade frente às defesas de costa.

Ignorando alguns sucessos obtidos pelos aliados em desembarques como em Zeebrugge (1918) e pelos alemães no golfo de Riga (1917), os analistas militares que estudaram a 1ª Guerra Mundial focaram sua atenção na mal sucedida campanha anfíbia realizada na Península de Galípoli (1915) que acabou tornando-se um trauma militar. Entretanto, seu fracasso não foi conceitual, mas sim o resultado de uma série de problemas de execução. Não existiam, na época, meios apropriados nem tropas treinadas para a realização de desembarques anfíbios. Se a operação tivesse obtido êxito, todo o plano de campanha dos alemães em 1915 teria sido ameaçado.

A campanha em Galípoli transmitiu a equivocada ideia de que as Operações Anfíbias tornaram-se obsoletas pelos avanços tecnológicos da época, principalmente, nos sistemas de armas, tais como o aperfeiçoamento da artilharia e das metralhadoras. Além disso, os avanços nos meios de transporte, com a construção de ferrovias e a invenção dos motores de combustão interna, fizeram com que uma potência continental transferisse rapidamente suas forças à parte da costa objetivada pelo invasor, atacando-o antes dele construir seu poder de combate em terra.

Analisando a campanha em Galípoli, detectou-se que Operações Anfíbias em praias defendidas eram quase impossíveis, considerando-as uma das operações militares mais difíceis da guerra. Estudos da época depreciaram a importância das Operações Anfíbias fazendo com que a Grã-Bretanha abandonasse sua estratégia anfíbia concentrando-se prioritariamente em campanhas terrestres. Os resultados decepcionantes da campanha em Galípoli exerceram forte influência negativa na percepção dos analistas militares da época sobre as Operações Anfíbias, corroborando com as já mencionadas ideias do historiador grego Thucydides sobre a complexidade da execução dos desembarques anfíbios.

Cerca de 600 Operações Anfíbias foram realizadas durante a 2ª Guerra Mundial, variando em tamanho e complexidade. Desde pequenas incursões até assaltos de grupos de exércitos inteiros, quase todas obtiveram êxito, exceto casos como: a desastrosa tentativa de retomar a Noruega invadida pelos alemães em 1940 e o desembarque anfíbio em Dieppe em 1942, na costa da França. A partir de 1942, a realização de Operações Anfíbias começou a guinar para resultados mais favoráveis quando forças britânicas e dos EUA realizaram desembarques com êxito em Madagascar, Guadalcanal e na África do Norte, rompendo com o pessimismo oriundo das experiências em Galípoli.

Em meados de 1944, o poder de choque resultante da combinação dos sistemas de apoio de fogo da época com os meios de desembarque, que evoluíam rapidamente, como as viaturas blindadas de assalto, inverteu completamente o pensamento pós 1ª Guerra Mundial sobre as Operações Anfíbias. Os assaltos anfíbios tornaram-se impossíveis de serem impedidos. O mundo testemunhava o que os historiadores navais chamaram de “a época de ouro das Operações Anfíbias”. No ocidente, esse período culminou com a Operação Overlord (1944) na Normandia, onde 4.000 navios transportaram 176.000 homens através do canal da mancha, escoltados por 600 navios de guerra provendo apoio de fogo naval durante a invasão aliada. No oriente, o sucesso do grande assalto anfíbio à Ilha de Iwo Jima (1944), tornou-se um símbolo da vitória dessa época, registrado nos anais da História.

As Operações Anfíbias têm sido descritas como as mais difíceis de todas as ações militares. Historicamente, grande parte dessa percepção deveu-se à concepção inicial de emprego contra áreas fortemente defendidas. Consequentemente, o início da evolução da guerra anfíbia foi baseado nas lições de combate adquiridas durante a 2ª Guerra Mundial a um preço muito alto em termos de vidas. Apesar das operações no Pacífico muitas vezes não terem apresentado alternativa ao desembarque, sempre que possível as praias óbvias e bem defendidas foram rejeitadas em favor de pequenas marchas por terra a partir de praias não defendidas como em Tinian (1944). A técnica anfíbia evoluía e atingia uma grande eficácia.

As Operações Anfíbias da 2ª Guerra Mundial transformaram a natureza de como as guerras eram travadas. Em verdade, o desembarque anfíbio foi a chave da vitória dos aliados, uma vez que cada passo em direção ao objetivo começava com um desembarque anfíbio. A 2ª Guerra Mundial inverteu completamente a imagem negativa dessas operações. Apesar do elevado número de baixas na operação, o avanço tecnológico dos meios utilizados em desembarques e o aprimoramento das suas concepções de emprego tornaram essas operações uma valiosa ferramenta, sendo largamente utilizada pelos aliados para derrotarem as potências do eixo Roma-Berlim-Tóquio.

Entretanto, após a conclusão da 2ª Guerra Mundial, muitos analistas acharam que as Operações Anfíbias eram válidas apenas para as circunstâncias peculiares daquele conflito, considerando-as obsoletas nos campos de batalha dominados por armas nucleares. Desde a adoção das teorias de Alfred Thayer Mahan na virada do século XIX para o século XX, as marinhas existiam para derrotar outras marinhas. No período entre 1945 e 1950, a própria necessidade da existência de uma marinha de guerra, e, consequentemente das Operações Anfíbias passou a ser questionada.

Em julho de 1946, testes nucleares realizados no atol de Bikini, no Oceano Pacífico, simularam um ataque a uma Força-Tarefa Anfíbia, alarmando as marinhas por suas implicações relativas à execução de uma Operação Anfíbia, exigindo uma revisão com o objetivo de desenvolver novas técnicas para conduzi-las na era nuclear. As análises focaram a vulnerabilidade do movimento navio para terra e as possibilidades inerentes ao emprego de helicópteros.

Em 1949 o Chefe do Estado-Maior Conjunto dos EUA, General Omar Nelson Bradley (1893-1981), fez uma alarmante declaração de sua convicção acerca da não realização de Operações Anfíbias em larga escala na era nuclear. Em 1950, o Secretário de Defesa dos EUA Louis Arthur Johnson (1891-1966) afirmou que as Operações Anfíbias pertenciam ao passado, tornando desnecessária a existência do United States Marine Corps. Continuando suas ideias, anunciou que a USAF sozinha poderia cumprir qualquer uma das tarefas que a marinha e o Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA realizava. Posteriormente, as restrições impostas ao uso de armas nucleares e a inexistência de uma proliferação nuclear generalizada reduziu significativamente a probabilidade da ocorrência dessa ameaça.

De qualquer forma, ao final da 2ª Guerra Mundial, uma redução na capacidade anfíbia das principais marinhas do mundo era inevitável. A maioria dos navios anfíbios foi vendida ou doada para estados menos desenvolvidos ou usados como alvos. No período de 1945 a 1950, dos 610 navios anfíbios da US Navy, apenas 91 permaneceram em atividade, fruto da prematura fixação nos artefatos nucleares como solução final para os conflitos armados.

Os entusiastas do poder aéreo, ao acreditarem precipitadamente que a aviação pode ganhar uma guerra sozinha, equivocaram-se. Esse excesso de valorização das possibilidades da aviação obscureceu sua verdadeira eficiência e suas diversas limitações, gerando conclusões fora de contexto. Assim, embora as Operações Anfíbias tenham demonstrado toda sua importância durante a 2ª Guerra Mundial, as indagações quanto às suas viabilidade e utilidade voltaram a ganhar força, relegando o potencial real de um desembarque anfíbio a um segundo plano.

Na Guerra da Coréia(1950-1953), foi realizada uma Operação anfíbia em Inchon, fundamental para o seu resultado final. As condições das praias eram bastante desfavoráveis ao desembarque tradicional. Muralhas de pedras cercavam toda a costa, obrigando o uso de escadas para o desembarque. Apesar das dificuldades, o assalto anfíbio em Inchon foi um sucesso. Ao desembarcar em um local inesperado, essa operação inverteu decisivamente o resultado da guerra em favor dos EUA, que estavam isolados realizando uma defensiva no perímetro de Pusan. Os norte-coreanos entraram em colapso ao terem seu fluxo logístico cortado por tropas posicionadas em sua retaguarda, a US Navy, retraindo de forma desorganizada para tentar enfrentar a nova ameaça.

Com isso, as Operações Anfíbias ganharam novo fôlego ao provarem sua utilidade, diminuindo a pressão das discussões acerca de sua eficácia na era nuclear. Inchon confirmou a evolução da concepção do emprego em praias não defendidas iniciada na 2ª Guerra Mundial, visando evitar o elevado número de baixas e demonstrando a importância estratégica dessas operações para o resultado final de um conflito.

Ao contrário do ocorrido durante a 2ª Guerra Mundial, no início da Guerra Fria (1945-1991) houve um enfraquecimento da percepção da “época de ouro das Operações Anfíbias”. Nesse período, operações em águas azuis profundas e guerra anti-submarina dominaram os investimentos e pensamentos estratégicos da US Navy focando a atenção nas formas de lidar com a ex-URSS. A capacidade de realizar desembarques anfíbios era inútil nesse contexto e de pouca utilidade prática dentro dessa concepção estratégica. Além disso, a vulnerabilidade dos navios ao se aproximarem da costa aumentou consideravelmente nesse período, particularmente, devido à evolução tecnológica dos mísseis.

Diante desse cenário, os questionamentos a respeito do futuro da guerra anfíbia ganharam novamente força durante a Guerra do Vietnã (1959-1975), quando foram realizadas 73 incursões anfíbias em missões de busca e destruição visando a interdição do fluxo logístico norte-vietnamita. Nenhuma destas operações provocou elevadas baixas no inimigo, o que na época era um indicador de eficiência na guerra. Assim, com resultados pouco significativos, a doutrina anfíbia subestimada e mal compreendida, ficou fora de moda entre os pensadores militares da época.

O foco da estratégia naval das grandes potências marítimas em uma guerra naval travada nos oceanos provocou a atribuição de uma baixa prioridade às Operações Anfíbias. Tais aspectos, aliados às inovações tecnológicas em prol das defesas de costa, contribuíram para que os questionamentos contra essas operações ganhassem força novamente, ofuscando sua importância que já havia sido constatada nos anos finais da 2ª Guerra Mundial e na Guerra da Coréia.

Em 1976, o Brookings Institute publicou o estudo criticando o USMC por priorizar a missão anfíbia, considerada por eles como apenas um peculiar tipo de combate. Nesse estudo, foi afirmado que a “época de ouro das Operações Anfíbias” pertencia ao passado e que o USMC não precisava mais de uma única missão para justificar sua existência.

O período pós-guerra do Vietnã foi uma época de restabelecimento da credibilidade das Operações Anfíbias. EUA e ex-URSS visualizaram a importância das águas rasas e da captura antecipada dos estreitos estratégicos do mundo para facilitar a passagem das suas esquadras ou para proteger um flanco de uma guerra terrestre. Entretanto, significantes e antigas dificuldades continuavam: capacidade de transporte de tropa, construção de novos navios e meios anfíbios, vulnerabilidades de uma Força Tarefa Anfíbia aos ataques de mísseis nucleares e anti-navio, além do lançamento de minas.

Para superar esses obstáculos, chegou-se à conclusão que as Operações Anfíbias deveriam ser lançadas além do horizonte. O único meio existente após a Guerra do Vietnã que permitia tal intento era o helicóptero. No entanto, o emprego exclusivo de helicópteros realizando um assalto vertical era inexequível, principalmente, pela inexistência de espaços a bordo dos navios. Mesmo assim, o emprego do helicóptero revolucionou a guerra anfíbia capacitando uma Força de Desembarque a ultrapassar praias antes consideradas intransponíveis e inabordáveis para as Embarcações de Desembarque (ED) e Viaturas Anfíbias (VtrAnf), conferindo maior impulsão ao assalto anfíbio.

Novos meios para a execução dessa técnica de desembarque que ficou conhecida como Over The Horizon (OTH) começaram a ser desenvolvidos, tais como: a Landing Craft Air Cushion (LCAC), o Expeditionary Fighting Vehicle (EFV), um Carro Lagarta Anfíbio (CLAnf) avançado, capaz de ser lançado além do horizonte para atuar como ponta de lança em um assalto por superfície e o versátil MV-22 Osprey que combina as características de uma aeronave de asa fixa com as de um helicóptero. Esses vetores em desenvolvimento constituíam uma tríade de mobilidade que tornaria exequível a OTH.

Embora o desenvolvimento tecnológico desses vetores tenha sido muito importante, foram as novas concepções de emprego das Operações Anfíbias que efetivamente provocaram a evolução. Novos conceitos estratégicos, operacionais e táticos, combinados com os meios disponíveis ou em desenvolvimento, proporcionaram a necessária flexibilidade para que os aperfeiçoamentos das defesas de costa fossem superados, mantendo assim a viabilidade dos desembarques anfíbios.

O desenvolvimento da doutrina OTH foi uma profunda revolução no tradicional modo de conduzir a guerra anfíbia. Além de proporcionar uma surpresa tática à operação, acabava com os sangrentos desembarques frontais realizados em praias fortemente defendidas; evitando o indesejável efeito político adverso, oriundo do afundamento de um grande navio com sua lotação completa de marinheiros e fuzileiros navais.

Em 1981, o periódico britânico The Times publicou um artigo dizendo que as Operações Anfíbias eram um conceito militar ultrapassado que não requeria nenhuma expertise particular. Um ano depois, um conflito armado permitiu que os analistas tivessem uma visão da guerra anfíbia em plena era dos mísseis sob condições reais de laboratório: a Guerra das Falklands/Malvinas (1982), que reafirmou a importância, a viabilidade e a utilidade dessas operações, revalidando velhas lições aprendidas e apresentando novas concepções de a serem analisadas.

Diversos conceitos doutrinários considerados clássicos não foram seguidos pelos britânicos, tais como: a operação foi realizada sem a obtenção da superioridadeaérea local, resultando no afundamento de vários navios; meios de defesa antiaérea foram desembarcados antes das unidades de assalto, para prover segurança contra a aviação; a superioridade numérica mínima exigida para um assalto anfíbio não foi respeitada e a descarga geral não foi realizada ininterruptamente, sendo executada somente durante o período noturno para evitar ataques aéreos.

Apesar dos questionamentos contrários às Operações Anfíbias terem atingido seu auge durante a Guerra Fria, no mesmo período, surgiram novas concepções de emprego e meios de desembarque, tais como: o helicóptero, a LCAC, o EFV e o MV-22 que garantiram a sua exequibilidade, permitindo que os avanços das defesas de costa fossem superados.

Na Operação Desert Storm (1990-1991), as Operações Anfíbias demonstraram mais uma vez sua importância. Uma Força Tarefa Anfíbia posicionada nas proximidades da costa do Kuwait constituiu um trunfo para as forças da coalizão liderada pelos EUA. A simples ameaça da realização de um grande assalto anfíbio, em local e momento desconhecidos, fez com que o Iraque empregasse ¼ das suas forças na defesa da costa, enfraquecendo a frente terrestre na fronteira entre Arábia Saudita e o Kuwait.

Em 1992, o General Colin Powell dos EUA apresentou uma perspectiva própria sobre as Operações Anfíbias. ”Não pode haver mais debate sobre a importância relativa do controle do mar, da projeção de poder sobre terra ou da capacidade de transportar pessoal e equipamentos por navios – nós vimos claramente que precisamos de todos os 3 agora. Não pode haver mais debate sobre a estratégia marítima versus guerra continental, pois os serviços do mar demonstraram claramente sua integração com ambos. E não pode haver mais debate sobre a utilidade das Operações Anfíbias, pois elas provaram seu valor de uma vez por todas”.

Com o fim da Guerra Fria, não tinha sentido continuar expressando o poder naval de acordo com os princípios Mahanianos de que as marinhas existiam para combater outras marinhas. Assim, uma especial atenção foi dedicada à capacidade de projeção de poder sobre terra, resultando no lançamento pela US Navy de novas concepções estratégicas navais: o From the Sea: a new direction for the Naval Services e o Forward...From the Sea . Estas novas percepções provocaram um impacto direto nas principais marinhas do mundo que passaram a atribuir um maior grau de prioridade e importância às suas capacidades anfíbias.

Detalhando doutrinariamente essas novas concepções, o USMC lançou os conceitos derivados “Operational Maneuver From The Sea”  (OMFTS) e o “Ship To Object Maneuver” (STOM). O OMFTS não é simplesmente uma operação além do horizonte, mas uma projeção de poder que utiliza o mar como espaço de manobra para aplicar força contra as fraquezas do oponente com ênfase sobre a inteligência, a surpresa e a flexibilidade. Já o STOM é a aplicação tática do OMFTS. Abandonando a ideia de que as Operações Anfíbias deveriam assegurar uma cabeça de praia a partir da qual partiriam operações terrestres subsequentes, a manobra deveria ser dirigida diretamente até o objetivo operacional, combatendo inteligentemente e procurando desarticular o defensor com fogos de precisão, elevado ritmo, surpresa e simultaneidade das ações. Ao maximizar a surpresa, imprimindo velocidade e ritmo às Operações Anfíbias, o OMFTS e o STOM tornaram a tarefa do defensor bem mais difícil.

Na Operação Iraqi Freedom (2003), foi realizado um assalto anfíbio vertical pela 3ª Royal Marines Brigade britânica para conquistar o porto de Umn Qasr, essencial para a abertura do fluxo logístico da coalizão liderada pelos EUA. Apesar do pequeno vulto e do fraco poder de combate do oponente, mais uma vez um desembarque anfíbio obteve êxito na era dos mísseis, atingindo plenamente seus propósitos.

O fim da Guerra Fria provocou uma mudança no foco da estratégia naval das grandes potências marítimas para o litoral, onde as Operações Anfíbias têm uma relevante importância. Da mesma forma que Inchon, a Guerra das Falklands/Malvinas, a Guerra do Golfo e a Guerra do Iraque (2003) mostraram que essas operações são exequíveis e têm um papel relevante para as marinhas na atualidade.

Os princípios e os procedimentos doutrinários existem para serem adaptados e adequarem-se às circunstâncias particulares. Foi exatamente isso que aconteceu com a doutrina anfíbia. Como suas circunstâncias são sempre mutáveis, as Operações Anfíbias evoluíram ao longo do tempo, adaptando-se à realidade das ameaças que foram surgindo com os desenvolvimentos tecnológicos. Empregando a tecnologia a seu favor, táticas, técnicas, conceitos e sistemas inovadores foram desenvolvidos para atender às exigências da guerra anfíbia moderna, demonstrando que a utilidade das Operações Anfíbias ainda é uma realidade.

As novas concepções de emprego desenvolvidas durante o final da Guerra Fria e detalhadas a partir da década de 1990 foram viabilizadas com o surgimento dos novos vetores, tornando as Operações Anfíbias exequíveis em plena era dos mísseis. Portanto, os desembarques anfíbios não tornaram-se operações militares ultrapassadas ao longo do tempo, pelo contrário, foram evoluindo permanentemente, buscando superar os obstáculos que impediam sua realização..

OS IMPACTOS DA TECNOLOGIA NAS OPERAÇÕES ANFÍBIAS

Cada vez que surge um novo sistema de armas, logo depois aparece uma resposta com capacidade para enfrentar essa ameaça. Essa espécie de antídoto continuará assim. Desde o início do século XX, a tecnologia sempre foi a responsável pela dúvida e pela resposta sobre a utilidade e a viabilidade das Operações Anfíbias. A evolução das defesas de costa foi enfrentada pelo desenvolvimento tecnológico de novos meios de desembarque, princípios e conceitos de emprego que proporcionaram a necessária flexibilidade para que uma Força Tarefa Anfíbia cumprisse sua missão.

A tecnologia contra as operações anfíbias

O ruído ambiente elevado das águas costeiras, sua pouca profundidade e seus complicados níveis de salinidade e temperatura ampliam as vantagens do emprego de submarinos defendendo uma costa. Cada vez mais inteligentes, velozes e poderosos, os torpedos constituem um tipo de ameaça difícil de ser enfrentada nas águas congestionadas e pouco protegidas dos litorais.

Reforçando a defensiva turca contra os desembarques anfíbios realizados em Galípoli na 1ª Guerra Mundial, submarinos alemães afundaram os encouraçados britânicos HMS Triumph e HMS Majestic provocando a retirada de todos os navios capitais do teatro de operações, com consequências desastrosas para o exército expedicionário britânico que já se encontrava em terra. O submarino e o torpedo aumentaram significativamente as vantagens das defesas de costa contra as Operações Anfíbias, demonstrando a importância da necessidade de uma capacidade anti-submarina apoiando essas operações.

As minas são o tradicional obstáculo da projeção de poder sobre terra, reforçando significativamente as vantagens de uma defesa de costa. Na Guerra da Coréia, se a Coréia do Norte tivesse minado o porto de Inchon, o desfecho da Operações Anfíbias poderia ter sido desastroso. Uma outra operação desse tipo em Wonson foi atrasada significativamente por causa da minagem feita na área de desembarque. A varredura durou 16 longos dias, sendo que 3 navios-varredores afundaram. Quando a Força de Desembarque estava pronta para realizar a operação, as tropas norte-coreanas já haviam se retirado, perdendo-se a oportunidade de interditá-las. A capacidade de varredura de minas da US Navy cresceu menos que a sua eficácia anfíbia nos anos que se seguiram ao final da 2ª Guerra Mundial. Esse fato teve consequências para o curto prazo, quando a fé nas Operações Anfíbias perdia sua força.

4 décadas depois da Guerra da Coréia, o Almirante Frank Benton Kelso, Comandante de Operações Navais da US Navy durante a Operação Desert Storm (ODS), admitiu que foram reaprendidas algumas duras lições do passado. Dentre elas, ele destacou que as minas podem frustrar a mais poderosa das forças navais, classificando-as como as verdadeiras armas invisíveis da atualidade. Durante os preparativos para a planejada e não executada Operação Desert Sabre, um assalto anfíbio noturno para capturar o porto de Ash Shuabah no Kuwait, vários navios sofreram sérios danos provocados por minas iraquianas.

A ODS demonstrou como um estado sem um poder naval relevante pode ainda constituir uma séria ameaça para as Operações Anfíbias. Barcos pesqueiros iraquianos lançaram um complexo sistema de 1200 minas de contato e de influência que inibiram um assalto anfíbio em larga escala. Após a guerra, o Almirante John Baptiste LaPlante, Comandante da Força Tarefa Anfíbia afirmou que a deficiência em varredura de minas é um dos maiores desafios que a US Navy precisaria resolver no futuro. As marinhas e suas forças anfíbias deverão prestar cada vez mais atenção a esse óbvio meio de negação de acesso ao litoral.

A capacidade de varredura de minas é essencial para o sucesso das Operações Anfíbias. As minas são baratas, fáceis de serem lançadas e capazes de provocar sérios danos aos navios de uma Força Tarefa Anfíbia. Hoje em dia, qualquer Estado pode comprar e estocar minas facilmente. Existe uma tendência de exagerar nas capacidades quando um novo sistema de armas é desenvolvido. Logo após a 1ª Guerra Mundial, começaram a surgir os defensores do poder aéreo que visualizavam exageradamente que a aviação decidiria sozinha as guerras do futuro. O mais famoso deles foi o italiano Giulio Douhet que desenvolveu um conceito de destruição de indústrias e cidades a partir do ar que posteriormente entrou para a História com o nome de Strategic Bombing . Em 1921, o General William Lendrum Mitchell do US Army, discípulo de Douhet, previu que o poder aéreo dominaria conflitos sobre a terra e o mar, afirmando que os navios de guerra seriam inúteis.

Após a 2ª Guerra Mundial, foram realizados diversos debates acerca da utilidade dos excessivamente vulneráveis e caros grandes navios frente ao poder aéreo em forte desenvolvimento. O Strategic Bombing proporcionava a profundidade necessária para evitar a exposição dos navios às crescentes ameaças oriundas da costa. Não havia alvo mais atrativo para uma força aérea do que uma Força Tarefa Anfíbia navegando vagarosamente pelo litoral.

O advento do laser para designação de alvos contribuiu significativamente para o aumento da eficiência do poder aéreo, representando o começo de uma nova era, cujo mantra era o termo Precision Strike. Durante a ODS, o desempenho das armas de precisão parecia tornar as demais operações de guerra obsoletas. Nessa época, analistas militares afirmaram que o poder aéreo estava substituindo as forças em terra. A guerra estava se transformando em um vídeo game. Novos entusiastas do poder aéreo surgiram como o General Michael Dugan, Chefe do Estado-Maior da USAF, que foi demitido após suas declarações à imprensa nas quais afirmava que a aviação sozinha poderia ganhar a Guerra do Golfo.

Assim, surgia no final do século XX um novo estilo de guerra moderna no qual a aversão às baixas, a relutância em colocar tropas no terreno, a confiança no poder aéreo e a pressão da mídia foram suas principais características. O mesmo cenário de precisão e entusiasmo com o poder aéreo repetiu-se com as ações da OTAN contra as forças sérvias na Península dos Balcãs, em 1995, na Bósnia e, em 1999, em Kosovo, onde 35% das armas utilizadas empregaram munições de precisão. Segundo John Desmond Patrick Keegan, renomado historiador militar britânico, o poder aéreo deu a vitória aos aliados nessas duas guerras, tornando-se uma excelente opção para evitar o combate terrestre.

A Operação Iraqi Freedom (OIF) demonstrou que a notável evolução experimentada no Precision Strike continuava. Nesta operação, 90% das munições empregadas foram de precisão, enquanto que o efetivo de forças terrestres empregadas foi reduzido pela metade quando comparado com a ODS. Conclui-se que a aviação ao invés de potencializar o poder de combate de uma Força de Desembarque apoiando uma Operação Anfíbia, passou a vislumbrar a possibilidade de substituí-las, baseando-se na eficiência das armas de precisão e na aversão da opinião pública mundial às baixas. Essa percepção criou uma espécie de rivalidade muito desfavorável para os desembarques anfíbios.

Em verdade, grande parte dos créditos do poder aéreo pertence aos mísseis que podem ser lançados, também, a partir de plataformas navais e terrestres, constituindo uma grande ameaça às Operações Anfíbias. Os navios que transportam as tropas, historicamente o “Calcanhar de Aquiles” da guerra anfíbia, seriam alvos de oportunidade prontos para serem destruídos por esses sistemas. Assim, as baterias fixas de canhões das defesas de uma costa foram substituídas por plataformas móveis lançadoras de mísseis. Com capacidade para detectar e engajar alvos cada vez mais afastados do litoral, rapidamente esses sistemas podem ser movimentados de um ponto a outro da costa. Como recebem informações sobre os alvos a partir de centrais de comando afastadas da sua posição, essas plataformas são difíceis de serem detectadas antes do momento do lançamento do míssil.

A vulnerabilidade de uma Força Tarefa Anfíbia aos mísseis constitui a maior ameaça para as Operações Anfíbias do futuro. Os mísseis anti-navio não podem ser desconsiderados por uma força naval operando próxima de uma costa. Várias marinhas de recursos escassos possuem esses mísseis instalados, inclusive, em embarcações de médio porte, como nos navios-patrulha. Na Guerra das Falklands/Malvinas, a fragata britânica HMS Glamourgan quase foi afundada por um míssil Exocet lançado pelas forças de defesa argentinas em Porto Argentino. Depois desse episódio, muitos Estados intensificaram o desenvolvimento de mísseis de cruzeiro para a defesa de seus litorais. A proliferação de armas para negar o acesso litorâneo nas mãos de atores não estatais complica ainda mais a realização de Operações Anfíbias. Mesmo em missões não bélicas, a vulnerabilidade dos navios operando próximo à costa é um fato. Na crise do Líbano em 2006, o Hezbollah empregou mísseis de superfície contra navios israelenses, provocando uma preocupação constante para as operações de evacuação de não combatentes. Da mesma forma, o ataque assimétrico realizado por uma pequena embarcação ao USS Cole, em 2000, em um porto do Iêmen, demonstrou a vulnerabilidade dos navios quando operam em águas rasas.

A ascensão repentina dos mísseis antiaéreos colocou em dúvida a questão da viabilidade dos helicópteros como meio de transporte de tropas e de apoio aéreo aproximado às Operações Anfíbias. Na Guerra pelo canal de Suez (1956), devido à possibilidade de existirem armas de defesa antiaérea na zona de desembarque planejada, o assalto por helicópteros foi realizado nas proximidades da praia em locais já reconhecidos pelas forças que desembarcaram por superfície. A performance tecnológica dos sistemas de armas são assuntos extremamente complexos. É válido observar que os assuntos nem sempre atingem em ação os resultados que seus propagandistas proclamam e não importa quão complexo é um sistema, ele ainda estará subordinado ao erro humano. Na atualidade, os mísseis de superfície e antiaéreos representam uma grande ameaça às Operações Anfíbias, entretanto, não existem registros históricos de que os mesmos as inviabilizem como operação militar, apesar dos grandes danos que podem provocar. Da mesma forma, até o presente momento, os mísseis potencializaram significativamente o poder aéreo, mas ainda não estão tão avançados tecnologicamente a ponto de permitir que a aviação substitua as Operações Anfíbias tornando-as ultrapassadas e desnecessárias.

A tecnologia a favor das operações anfíbias

O reconhecimento das Operações Anfíbias tem oscilado positiva e negativamente, apesar da sua importância ser evidente em todos os níveis de condução dos conflitos, desde o político até o tático. Como ação bélica, esse tipo de operação tem sobrevivido aos saltos da tecnologia que por algum tempo pareceram ameaçar sua praticabilidade militar. O sucesso das operações aéreas na Península dos Balcãs, durante as guerras da Bósnia (1994) e de Kosovo (1999), também serviram para demonstrar as limitações do poder aéreo. Nuvens, vegetação e ambientes urbanos, além de questões ambientais e leis são obstáculos para o emprego do poder aéreo. A tecnologia ainda está imatura e incapaz de lidar adequadamente com as mudanças climáticas. Além disso, ficou claro que simples medidas de contra-reconhecimento de baixo custo, tais como: camuflagem, emprego de artefatos, dispersão e frequente movimentação de forças são muito eficientes contra os ataques de precisão do poder aéreo.

Cabe ainda ressaltar que o poder aéreo foi incapaz de impedir a trágica limpeza étnica ocorrida nos Balcãs nesse período. Para minimizar as baixas civis, é necessário empregar tropas em terra. Manter uma incerteza na mente do adversário é uma peça chave da estratégia moderna e isso frequentemente exigirá preparo para ir além dos limites do poder aéreo. Existem tarefas simples que podem ser executadas pelo poder aéreo, mas forças terrestres são decisivas a longo prazo. Portanto, o poder aéreo não cumpre todas as tarefas que uma Força de desembarque realiza em terra, não podendo substituí-la. Bombardeios aéreos de precisão não tornaram as Operações Anfíbias obsoletas. Pelo contrário, o poder aéreo é incapaz de resolver decisivamente todas as questões dos conflitos em terra, tornando a projeção do poder naval por meio do emprego de tropas anfíbias uma ferramenta valiosa e de grande utilidade na guerra moderna.

Os helicópteros causaram um grande impacto tecnológico nas Operações Anfíbias. Seu emprego revolucionou a guerra anfíbia ao dar uma nova dimensão espaço de batalha, permitindo o rápido desembarque de tropas sem as restrições normalmente enfrentadas pelos assaltos por superfície, tais como: recifes, gradientes, condições de trafegabilidade e defesas de costa. Assim, o helicóptero tornou-se um eficaz vetor de projeção de poder sobre terra que muito contribuiu para a viabilidade das Operações Anfíbias. A LCAC com sua velocidade, alcance e capacidade de transporte de carga foi outra inovação tecnológica que impactou positivamente as Operações Anfíbias. Apesar da falta de uma blindagem, sua capacidade de superar obstáculos naturais e artificiais reduziu significativamente a vulnerabilidade. As ED só abicam em 17% das praias do mundo. Por sua vez, as LCAC abicam em 73% delas, complicando significativamente as tarefas do defensor. As aeronaves STOVL como o AV-8B Harrier e o F-35 foram tão revolucionárias para as Operações Anfíbias quanto o helicóptero. Com capacidade de pouso e decolagem em áreas remotas como uma simples estrada, estas aeronaves podem ser lançadas a partir de convoos simples, descartando a necessidade de um Navio-Aeródromo. Na Guerra das Falklands/Malvinas, os Harriers mostraram sua versatilidade ao serem lançados de navios mercantes com convoos adaptados. O MV-22 Osprey e o EFV são os meios de desembarque mais avançados da atualidade. A tecnologia Tiltrotor permite que o Osprey decole e pouse como um helicóptero e voe como um avião. O EFV é o carro-lagarta anfíbio mais avançado tecnologicamente, combinando velocidade e alcance na água com blindagem e mobilidade tática nas operações em terra. Apesar das dificuldades e dos custos envolvidos em seus projetos, ambos estão em avaliação operacional. Da mesma forma que o helicóptero e a LCAC, o MV-22 e o EFV são lançados além do horizonte, diminuindo a concentração de navios próximos à costa, oferecendo poucos alvos para seus defensores. O Litoral Combat Ship (LCS) e o Joint High Speed Vessel (JHSV) são os mais recentes projetos em desenvolvimento em prol das Operações Anfíbias. Além das suas velocidade e manobrabilidade, o LCS pode receber módulos intercambiáveis que garantem uma grande versatilidade para desempenhar uma ampla gama de tarefas: varredura de minas, apoio de fogo, comando e controle e, até mesmo, transporte de tropas apoiando o desembarque e o reembarque de fuzileiros navais. O JHSV provê rapidez no transporte de pessoal e material em locais onde as condições portuárias são precárias ou estão deterioradas. O valor destes últimos tem sido questionado nos últimos anos.

Os meios navais e de fuzileiros navais que estão sendo desenvolvidos para serem empregados em Operações Anfíbias são uma resposta à evolução tecnológica dos sistemas que integram as defesas de costa. Esses meios viabilizam as novas concepções de emprego, tais como a OTH, a OMFTS e a STOM, capacitando uma Força de Desembarque a superar as ameaças oriundas de terra, tornando a tarefa do defensor muito mais difícil. As forças navais mais sofisticadas da atualidade têm conseguido enfrentar a ameaça dos mísseis sem dificuldade, embora quanto mais relativamente evoluído seja o oponente, maior será o desafio. A ressurreição da Jeune École (navios menores fortemente armados para enfrentar navios maiores – Séc XIX) é uma ilusão. Além de não serem navios com capacidade para operar em condições adversas de mar, embarcações de pequeno porte são bastante vulneráveis aos ataques aéreos e de submarinos. Na ODS, a superioridade aérea local permitiu que forças navais da coalizão utilizassem helicópteros contra as lanchas rápidas da Marinha do Iraque com efeitos devastadores. Até agora, o avanço tecnológico sempre tem falhado em confirmar as pretensões mais extravagantes dos estrategistas navais que visualizam a defesa de uma costa por meio de esquadras de pequeno porte.

A construção atual dos navios é compartimentada de um modo tal que um dano em uma área, não necessariamente leva ao colapso de todo o conjunto. Além disso, os avanços tecnológicos das armas e sensores instalados a bordo dos navios reduzem sua vulnerabilidade frente aos ataques oriundos de terra. O Aegis é considerado o sistema de combate naval mais avançado do mundo, sendo capaz de engajar mísseis antinavio ainda na sua trajetória ascendente em velocidades subsônica ou supersônica e em quaisquer condições climáticas.

Os mísseis também atuam em prol das Operações Anfíbias. Os mísseis de cruzeiro como o Tomahawk têm tido um êxito operacional muito grande desde o início da década de 1990, sendo extremamente eficientes na incapacitação das defesas antiaéreas e dos meios de comando e controle do oponente nas etapas iniciais de um conflito. Na década de 80, quatro encouraçados da classe Iowa dos EUA foram modernizados, recebendo vários lançadores de mísseis como o Harpoon, o Tomahawk e o Sea Sparrow. Estes navios foram capazes de despejar 800 toneladas de munição de precisão em menos de meia hora. O equivalente ao poder de destruição de 17 destroyers. Ainda que por pouco tempo, esses mísseis e os canhões de 16 polegadas deram uma sobrevida aos velhos encouraçados da 2ª Guerra Mundial, constituindo uma perigosa ameaça para os iraquianos durante a ODS. A tecnologia de ponta do apoio de fogo naval também está evoluindo para evitar expor os navios às ameaças da costa. Os EUA desenvolveram o Advanced Gun System (AGS), canhões navais de 155mm totalmente automatizados, cuja munição atinge 180 km, por meio de um projétil assistido por foguete. Atualmente estão inativos devido ao custo da munição.

Por último, o advento do Global Positioning System (GPS) revolucionou o controle do teatro. Estando presente em todos os meios de desembarque, o GPS pôs um fim à “parada” de vagas de ED em linha da 2ª Guerra Mundial. Além disso, dificilmente acontecerá eventos semelhantes ao ocorrido na Operação Torch (1942), o assalto anfíbio noturno aliado no norte da África, onde as ED foram parar a mais de 10 milhas da praia de desembarque.

Assim, os impactos da tecnologia nas Operações Anfíbias têm mantido um equilíbrio entre os sistemas de armas e meios que estão à disposição dos atacantes e defensores em uma área de desembarque. Atualmente esses sistemas, apesar do seu impressionante aperfeiçoamento, não são suficientes para impedir um desembarque anfíbio, pelo contrário, eles significam que a projeção de forças anfíbias em terra ainda é uma possibilidade. Os avanços tecnológicos fortaleceram as defesas de um litoral ao permitir o desenvolvimento de sistemas de armas cada vez mais eficazes contra um desembarque anfíbio. Entretanto, essa mesma tecnologia forneceu as respostas em termos de concepções de emprego e meios de desembarque que permitiram que as novas ameaças fossem superadas. Até o presente momento, o resultado desse confronto tem sido favorável às forças que desembarcam.

Inovações tecnológicas podem refinar ou modificar o curso e a natureza do pensamento estratégico. Os recentes avanços tecnológicos não apagam três realidades: as armas de precisão não são perfeitas, o engajamento de tropas no solo ainda é necessário e a ênfase na tecnologia faz esquecer considerações estratégicas também muito importantes.

UMA OPÇÃO ESTRATÉGICA VALIOSA

 O homem utiliza o mar, mas não vive nele, estando sempre apegado à terra onde se encontram seus bens materiais e espirituais. Assim, as grandes questões bélicas entre os estados são decididas, exceto em casos excepcionais, a partir do que os exércitos são capazes de fazer contra o território inimigo ou pelo que as marinhas permitem aos exércitos realizarem. As forças armadas devem atuar de forma conjunta a fim de realizar operações ao longo dos litorais, visualizando a guerra de uma forma essencialmente anfíbia. Um exército pode conquistar territórios ultramar, operando conjuntamente com a marinha que flanquearia com Operações Anfíbias seus adversários em terra, golpeando os pontos mais débeis da costa inimiga. O domínio do mar não ganha as guerras nem decide seus resultados políticos, mas a realização de desembarques é uma opção estratégica para as grandes potências marítimas, capacitando-as a influenciar decisivamente no resultado final dos conflitos. Uma Operação Anfíbia tem um efeito estratégico desproporcional às suas dimensões, exercendo um poder de fixação que influencia a estratégia continental. Napoleão Bonaparte, durante sua campanha na Aústria, afirmou que o exército britânico embarcado em Dover com apenas 30.000 homens era capaz de paralisar os 300.000 soldados do seu exército e, tal capacidade, reduzia a França a uma potência de 2ª classe. Há muito tempo as Operações Anfíbias são uma opção estratégica valiosa para líderes políticos e militares, sendo capazes de influenciar diretamente o resultado final dos conflitos. A ameaça representada pela iminência desse tipo de operação exerce um poder de atração sobre as forças terrestres oponentes, criando oportunidades ímpares.

No final do século XIX e início do século XX houve uma explosão repentina de interesse pelas Operações Anfíbias. A Grã-Bretanha debatia sobre o emprego de suas forças armadas em uma estratégia terrestre focada em um envolvimento de grande escala no continente europeu ou em uma estratégia naval baseada em desembarques anfíbios contra posições vulneráveis nos litorais dos territórios inimigos. Para o Almirante John Arbuthnot Fisher, First Sea Lord, famoso pelos programas de reaparelhamento que conduziu na Royal Navy, o exército britânico deveria permanecer como um projétil a ser disparado pela marinha por meio de desembarques anfíbios. As terríveis experiências da frente ocidental da 1ª Guerra Mundial confirmaram o erro do abandono dessa estratégia pela Grã-Bretanha. Enquanto formulava sua estratégia da aproximação indireta que o deixaria famoso, Liddlell Hart acreditava que a Grã-Bretanha poderia derrotar um adversário continental, evitando um confronto direto em território europeu. Muito se questionou sobre a importância estratégica e decisiva das Operações Anfíbias por críticos que acreditavam que os avanços tecnológicos estavam tornando sua realização cada vez mais difícil. Os resultados da campanha em Galípoli e suas duras experiências e frustrações, a evolução das técnicas empregadas nos sucessivos desembarques que foram realizados mostrou que essas operações eram exequíveis, constituindo um conjunto de oportunidades passíveis de serem exploradas. Galípoli fracassou por falta de planejamento e preparo adequado, inexistindo forças e equipamentos especializados. Foi uma inteligente opção estratégica que poderia ter separado a Turquia dos seus aliados, levando a guerra à retaguarda alemã. Após Galípoli, os aliados abandonaram os desembarques anfíbios. Se não tivessem cometido esse erro, a Alemanha continuaria tendo que conviver com o dilema de dividir seus esforços entre as frentes terrestres e a proteção de seus flancos contra a realização de Operações Anfíbias. Enquanto fosse mantida uma capacidade anfíbia pelos aliados, os alemães teriam que levá-la em consideração no seu dispositivo defensivo e nos seus movimentos ofensivos.

Se os Estados aliados da 1ª Guerra Mundial tivessem desenvolvido uma capacidade anfíbia com tropas treinadas e meios especializados, a mesma poderia ter sido empregada como uma alternativa à estacionária campanha terrestre que resultou nas famosas guerras de trincheiras caracterizadas pelo desgaste e equilíbrio de poder. Portanto, possuir a capacidade para projetar poder sobre terra por meio de Operações Anfíbias tem uma importância estratégica valiosa e decisiva para as grandes potências marítimas. No início da 2ª Guerra Mundial, a história se repetiu. Diversas oportunidades foram desperdiçadas porque os aliados não tinham inicialmente a opção estratégica naval de realizar desembarques. Essa deficiência permitiu que a Noruega fosse conquistada sem a possibilidade de uma retomada por forças anfíbias. Posteriormente, após desenvolverem essa capacidade, os aliados puderam escolher onde e quando seria mais vantajoso retomar a iniciativa, projetando seu poder sobre terra por meio de Operações Anfíbias. Assim foi feito na África, na Itália, na Noruega e na Riviera Francesa, mudando o resultado da guerra a seu favor.

A capacidade de realizar Operações Anfíbias proporcionou aos aliados da 2ª Guerra Mundial uma grande influência sobre os eventos em terra, embora a guerra na Europa tenha sido essencialmente terrestre. A ameaça anglo-americana de invadir a Europa pelo mar demonstrou um efeito estratégico significativo, provocando a dispersão das forças lideradas pela Alemanha. O poder anfíbio aliado atraiu 45% (133 divisões) das forças alemãs para se oporem à invasão do continente europeu, deixando 55% (165 divisões) na frente oriental contendo o crescente aumento da pressão russa. A possível realização de um desembarque aliado em local desconhecido do litoral europeu dispersou o poder de combate alemão pelas áreas de desembarque potencialmente favoráveis para uma invasão pelo mar. 32 divisões (10%) foram atraídas para o norte da França para impedir a travessia do Canal da Mancha, 18 divisões (6%) foram posicionadas ao sul da Itália, 18 divisões (6%) na Noruega e na Dinamarca, 10 divisões no sudeste da França, 10 divisões no norte da Itália, 9 divisões na Holanda, 8 divisões no sudoeste da França, além de outras 28 divisões espalhadas pelo sudeste da Europa. Cabe ressaltar, que esse efeito estratégico diversionário reduz-se rapidamente após o desembarque, o que requer grande rapidez na construção de um poder de combate em terra que constitua uma efetiva ameaça.

As Operações Anfíbias da 2ª Guerra Mundial foram as grandes responsáveis pela derrota das potências do eixo. Não foram exploradas todas as suas possibilidades porque era um conceito praticamente novo, mas o primeiro passo ao seu desenvolvimento foi dado. A regra fundamental para o emprego estratégico de uma força anfíbia é que ela não deve ser desperdiçada em operações terrestres. Uma vez estabelecida uma força em terra, a tropa anfíbia deve retornar aos navios para voltar a constituir-se como opção estratégica capaz de formar uma nova ameaça para os defensores inimigos em terra. Para o autor, os resultados da campanha anfíbia realizada na Europa durante a 2ª Guerra Mundial reforçam as ideias de Napoleão sobre o poder de atração exercido pela ameaça da realização de uma Operação Anfíbia. Ao ameaçar suas linhas de abastecimento, a Operações Anfíbias realizada em Inchon desarticulou totalmente o exército norte-vietnamita forçando-o a uma retirada desorganizada, transformando completamente o cenário operacional em terra. Essa Operação enfatizou o efeito estratégico provocado por um desembarque anfíbio realizado em momento e local inesperados. A alternativa para o assalto anfíbio era um ataque frontal que só poderia resultar em uma árdua e prolongada campanha com elevado número de baixas. A Guerra da Coréia mostrou que mesmo na era nuclear, as Operações Anfíbias ainda tinham seu lugar, representando um poderoso golpe estratégico para as potências marítimas que possuem tal capacidade.

As Operações Anfíbias representam um trunfo nas mãos dos líderes políticos e militares que, utilizado corretamente, pode contribuir significativamente para o resultado final de um conflito. Desta forma, seu emprego em local e momento não esperados pelo oponente proporciona um efeito surpresa capaz de desarticular suas forças. Alguns analistas dos EUA concluíram que o plano de redução da capacidade anfíbia da Royal Navy anunciado pelo Secretário de Defesa John William Frederic Nott, às vésperas da Guerra das Falklands/Malvinas, diminuiu a efetividade da sua dissuasão estratégica, motivando os argentinos a invadirem as ilhas em 1982. Além disso, a Grã-Bretanha sem uma capacidade anfíbia não teria conseguido retomar as ilhas, mesmo obtendo o controle do mar e conquistando a superioridade aérea local. Para tentar impedir uma retomada britânica das Falklands/Malvinas, os argentinos foram obrigados a dispersar suas forças pelas duas principais ilhas do arquipélago a fim de defender as potenciais áreas mais favoráveis para a realização de desembarques.

Durante a ODS, a simulação de um desembarque anfíbio desempenhou um papel estratégico crucial na guerra. A ameaça de uma invasão pelo mar provocou o deslocamento de 5 divisões da Guarda Republicana iraquiana da região da fronteira do Kuwait com a Arábia Saudita para o litoral a fim de tentar deter o suposto assalto anfíbio, enfraquecendo, consequentemente, a frente terrestre. Analisando esse conflito, Liddell Hart deduziu que a flexibilidade proporcionada por uma capacidade anfíbia é a maior opção estratégica que um poder naval possui, criando uma ameaça para a concentração das forças oponentes que é desproporcionalmente vantajosa aos recursos empregados. Uma marinha sem capacidade anfíbia tem a credibilidade e a dissuasão do seu poder naval significativamente reduzidas. As marinhas que realizam Operações Anfíbias apresentam um maior poder dissuasório capaz de influenciar as decisões, os movimentos ofensivos e o posicionamento defensivo das tropas terrestres do Estado oponente. A Guerra do Golfo impactou bastante a estratégia naval dos EUA. Não houve força naval inimiga, submarinos ou batalhas navais em mar aberto para as quais a US Navy havia preparado-se durante os 20 anos que a antecederam. Em seu lugar, dominaram as ações de menor vulto da guerra no litoral. Assim, a estratégia naval pelo controle do mar deslocou-se para a estratégia naval que enfatiza as influências do poder naval nos sucessos em terra.

Sendo assim, as faixas litorâneas dos estados tendem a tornarem-se os campos de batalha do século XXI, onde o mar é um espaço de manobra para a projeção de poder sobre terra. Essa tendência demonstra que as Operações Anfíbias são agora parte fundamental das concepções estratégicas das grandes potências navais de várias marinhas do mundo, reconhecendo sua importância e utilidade para os dias atuais. Hoje, ao lado dos submarinos e navios-aeródromo, a capacidade de realizar Operações Anfíbias representa uma das 3 principais competências de uma marinha. As Operações Anfíbias são para as guerras navais o que a Blitzkrieg e o Strategic Bombing foram para as guerras terrestre e aérea, respectivamente. Uma importante opção estratégica para qualquer Estado que clama ser uma potência marítima. A projeção de poder sobre terra é a maneira mais eficaz de introduzir poder de combate em uma região, compulsando o inimigo a conviver com a incerteza quanto ao momento e local de aplicação da força, obrigando-o a imobilizar parte substancial das suas tropas para fazer frente a esse tipo de ameaça.

A OIF, apesar de não ter sido uma guerra essencialmente naval, confirmou a tendência atual de que o foco da estratégia naval está nas ações próximas ao litoral, controlando áreas marítimas ou projetando poder sobre terra em conjunto com outras operações terrestres. Uma das principais operações navais desencadeadas na OIF foi o desembarque anfíbio realizado na Península de Al-Faw a fim de assegurar as principais instalações petrolíferas de Rumaylah e garantir o acesso ao Porto de Umm Qasr. Este, tinha uma importância estratégica para as operações futuras, pois seria por meio dele que fluiria grande parte do apoio logístico às forças da coalizão em terra. A mudança da concepção estratégica adotada pelas principais marinhas do mundo, que passaram a focar as águas litorâneas, reforça a importância das Operações Anfíbias para a estratégia naval no mundo pós-Guerra Fria. Neste contexto, a capacidade anfíbia das marinhas passa a exercer relevante papel dentro das possibilidades de emprego de um poder naval de credibilidade. No final do século XX, mudanças significativas ocorreram nas principais esquadras do mundo. A tarefa de projeção de poder sobre terra passou a receber uma grande prioridade. Novos meios e técnicas para o bombardeio aeronaval foram desenvolvidos e diversos tipos de navios anfíbios foram projetados, dando um grande impulso para a construção naval.

A capacidade de realizar Operações Anfíbias deixou de ser um privilégio de poucas potências. Muitos Estados não só estão mantendo suas capacidades anfíbias, mas também ampliando-as e, analisando seus programas de construção naval, aparentam estar convencidos de que essa competência tem um futuro garantido, no qual as forças anfíbias continuarão a constituir uma flexível, útil e valiosa ferramenta para seus comandantes operacionais. Um poder naval estático possui muito pouco valor estratégico. A capacidade de realizar Operações Anfíbias confere uma maior credibilidade para que sua habilidade de intervir seja convincente, aumentando seu poder de dissuasão. Assim, os estados com essa capacidade usam-na para ameaçar um oponente ou obter uma vantagem política em crises. De uma situação de expectativa, através da simples presença de uma Força Tarefa Anfíbia ao largo de uma costa, pode-se evoluir até o extremo estágio de intervenção direta por meio de um assalto anfíbio. Desta forma, uma capacidade anfíbia não está limitada ao emprego no extremo do espectro dos conflitos. Elas se aplicam a uma variedade de situações e circunstâncias, desde operações de paz e de ajuda humanitária até a guerra convencional propriamente dita. Tropas treinadas nas especificidades da guerra anfíbia configuram uma importante capacidade para as marinhas da atualidade, constituindo uma excelente ferramenta de credibilidade internacional.

CONCLUSÃO

Desde a 1ª Guerra Mundial até os dias atuais, as Operações Anfíbias vem sendo frequentemente questionadas a respeito da sua importância, utilidade e viabilidade como operação militar. Imagens negativas de operações fracassadas como em Galípoli ou de navios afundados por bombas e mísseis revezaram-se ao longo da segunda metade do século XX com cenas de desembarques anfíbios triunfais como em Iwo Jima, Inchon e Falklands/Malvinas. Analisar a evolução das Operações Anfíbias por meio de fatos reais que ocorreram em guerras passadas permite compreender os motivos que provocaram tais indagações, assim como sua validade para os dias atuais. Os desembarques anfíbios foram impactados pelos avanços tecnológicos dos sistemas de armas empregados nas defesas de costa que supostamente inviabilizariam sua realização, principalmente, pelas prováveis elevadas perdas de pessoal e material. Além disso, essa evolução potencializou outras operações militares, como os bombardeios aéreos, induzindo muitos analistas a acreditarem precipitadamente que as mesmas seriam capazes de cumprir as mesmas tarefas executadas pelas Operações Anfíbias, tornando a projeção de forças anfíbias sobre terra ultrapassada e desnecessária.

Assim, as vantagens das defesas de costa foram superestimadas e a aviação, por sua vez, ao invés de apoiar uma Força de Desembarque, passou a vislumbrar a possibilidade de substituí-las, criando uma rivalidade muito desfavorável para as Operações Anfíbias. Durante a Guerra Fria, a crença das potências marítimas da época na ocorrência de grandes batalhas em alto mar entre esquadras poderosas, depreciou ainda mais as Operações Anfíbias. Neste período, as indagações contrárias aos desembarques atingiram seu auge, ofuscando resultados positivos como os obtidos nas Guerras da Coréia e das Falklands/Malvinas, nas quais essas operações tiveram uma participação decisiva no resultado final de ambos os conflitos. Mesmo desacreditadas, novas concepções de emprego foram desenvolvidas ainda durante a Guerra Fria, tais como: a técnica de desembarque OTH e as concepções de emprego OMFTS e STOM. Tais ideias, somadas ao desenvolvimento de novos meios de desembarque, como o helicóptero, a LCAC, o EFV e o MV-22, tornaram os desembarques anfíbios capazes de superar as defesas de costa mesmo na era dos mísseis. Assim, esses vetores viabilizaram as novas concepções, tornando a tarefa do defensor mais difícil. A mesma tecnologia, que impactou negativamente as Operações Anfíbias, forneceu as ferramentas que permitiram minimizar os efeitos contrários à sua realização. Atualmente, o resultado dessa contradição tem sido favorável aos desembarques anfíbios, tornando possível sua execução. Com a mudança do foco das principais marinhas do mundo para as águas litorâneas, as Operações Anfíbias recuperaram seu prestígio dentro da estratégia naval, enfraquecendo significativamente os argumentos contrários à sua utilidade como operação militar. Sendo assim, as esquadras dotadas de uma capacidade anfíbia apresentam um poder dissuasório com maior credibilidade, podendo exercer uma considerável influência nas decisões, nos movimentos ofensivos e no posicionamento defensivo de um Estado oponente. A ameaça de um desembarque anfíbio é capaz de fixar parcela significativa de uma força oponente, criando oportunidades que podem ser estrategicamente exploradas em terra. Seu emprego em local e momento não esperados proporciona um efeito surpresa capaz de desarticulá-lo, obrigando-o a dispersar suas forças para tentar impedir o desembarque, enfraquecendo toda a costa a ser defendida e o interior do seu território. Assim, as Operações Anfíbias são de grande utilidade para a estratégia naval, representando uma opção valiosa que empregada corretamente pode contribuir decisivamente para o resultado final de um conflito. Portanto, analisando-se a evolução dessas operações até os dias atuais, conclui-se que as inovações tecnológicas dos sistemas de armas empregados nas defesas de costa e nos bombardeios aéreos não inviabilizaram nem tornaram a projeção de forças anfíbias sobre terra ultrapassada. Versatéis e aptas a serem empregadas em uma ampla gama de situações belicosas ou não, tal competência constitui um importante trunfo de grande valor estratégico para as marinhas nesse início de século.