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quarta-feira, 27 de outubro de 2021

Perdendo a Superioridade Aérea *224



Um estudo de caso da Segunda Guerra Mundial


Dr. Richard R. Muller

O que ocorre quando uma força aérea perde a capacidade de conquistar e manter a superioridade aérea? Como pode uma força aérea capaz e engenhosa lidar com essa situação? 

À medida que os Estados Unidos preparam-se para enfrentar os adversários do Século XXI, é altamente improvável que eles encontrem uma força aérea que possa igualar-se à Força Aérea dos EUA em termos de tecnologia, adestramento, efetivo e poder de combate. Entretanto, os Estados Unidos podem vir a ter de lidar com oponentes que empreguem estratégias assimétricas para tentar travar uma “guerra aérea de pobres.”

Um estudo dos esforços da Luftwaffe em lidar com a perda da superioridade aérea diurna em 1944-45 é mais do que de interesse histórico. Serve como um estudo de caso de como uma organização militar, diante da neutralização de grande parte de seu arsenal e da crescente inadequação de sua doutrina, pode tentar prolongar sua vida útil. 

Uma vez que os Estados Unidos podem vir no futuro a enfrentar um adversário deste feitio, um exame de como um inimigo do passado lidou com esse estado de coisas pode servir de subsídio aos planejadores aéreos e espaciais contemporâneos.





A perda da superioridade aérea sobre o território nacional

Quando o bombardeio ofensivo anglo-americano começou a ameaçar seriamente o controle, pela Alemanha, de seu espaço aéreo, a liderança da Luftwaffe respondeu vigorosamente. 

O Gen Günther Korten, Chefe de Estado-Maior da Luftwaffe, deu início à tarefa de criação de uma “cobertura de aeronaves de caça sobre o Reich”. Korten pertencia ao “círculo dos defensivos”, que incluía o Cel Adolf Galland – inspetor geral das aeronaves de caça – e o Marechal de Campo Erhard Milch – chefe do armamento aéreo. Korten robusteceu a organização da defesa aérea do território nacional por meio da criação da Esquadra Aérea do Reich – equivalente a uma força aérea numerada — a qual centralizou todo o armamento antiaéreo, aeronaves de caça e funções de comando e controle.

Ao mesmo tempo, e em conformidade com a doutrina básica da Luftwaffe, a reforma de Korten também preconizou poderosas forças de bombardeiros para os teatros de operações leste e oeste a fim de permitir à Luftwaffe desempenhar suas operações estratégicas. Desta forma, o programa de Korten trouxe um incremento ao poder e à eficácia das defesas aéreas alemãs.

As reformas organizacionais de Korten foram igualadas por Milch na produção de caças. Em parceria com Albert Speer, o ministro de armamentos, Milch minimizou a ineficiência da indústria aeronáutica alemã. Por meio de ações rigorosas ele foi capaz de incrementar a produção de aeronaves, sem aumentar o consumo de matérias-primas.

Em junho de 1943, as fábricas alemãs estavam produzindo mais de 1.100 caças por mês. Em março de 1944, Milch e Speer estabeleceram um “Estado-Maior de Caça” combinado, com ampla autoridade sobre a produção, dispersão das indústrias, construção de fábricas resistentes a bombardeios, matéria-prima e recursos humanos. A despeito de meses de ataques aéreos dos Aliados, em setembro de 1944, a produção alemã de aeronaves atingiu o máximo de pouco mais de 3.700 unidades.

Esse esforço de produção reflete a tensão subjacente entre a necessidade de reforçar as forças de defesa do território nacional e o anseio de manter uma capacidade ofensiva, já que entre 1943 e 1944 os alemães também produziram milhares de bombardeiros (cuja produção consumiu muito mais matéria-prima e capacidade industrial do que a produção das aeronaves de caça). A busca do poder ofensivo contribuiu para a perda definitiva da superioridade aérea.

A resposta operacional da Luftwaffe a essa crise não foi menos vigorosa, pautada na capacidade de seus interceptadores, o Messerschmitt (Me) Bf 109G e o Focke-Wulf Fw 190A. Essas aeronaves, inicialmente, careciam do armamento necessário para ações contra os bombardeiros pesados aliados.

Versões posteriores, entretanto, foram dotadas de metralhadoras de 13 mm e canhões de 30 mm em substituição aos de 7.9 mm e 20 mm, respectivamente. Ambas aeronaves podiam, ainda, ser armadas com foguetes de 210 mm dotados com ogiva similar a um morteiro com o propósito de desestruturar formações de bombardeiros inimigas — esses foguetes podiam ser lançados de fora do perímetro defensivo dessas formações. Com isso, os caças alemães podiam, então, atacar livremente as aeronaves dispersas.

A despeito dessas inovações introduzidas, as modificações acabaram por acelerar a perda da superioridade aérea quando os caças de escolta de longo alcance americanos entraram em cena. As aeronaves 109 e 190, excessivamente pesadas, enfrentaram grande desvantagem em combate contra as aeronaves americanas, mais leves – um problema que o comando da Luftwaffe nunca resolveu. Uma tentativa de remediar essa situação compreendeu o desenvolvimento de caças desprovidos de armamento pesado com vistas à obtenção tanto de desempenho superior a elevadas altitudes quanto de maior capacidade de combate ar-ar. 

Tais desenvolvimentos incluíram os caças Bf 109G e K com supercarregadores especiais e injeção com óxido nitroso e metanol, assim como o Fw 190D “de nariz longo” e o Ta 152. Esses interceptadores amplamente aperfeiçoados foram produzidos em pequeno número; a coordenação entre aeronaves “leves” e “pesadas” mostrou-se extremamente difícil e, na prática, taticamente ineficaz.

Outra proposta que tem atraído atenção no período pós-Guerra foi a sugestão de Galland de concentrar de 2.000 a 3.000 caças alemães para um golpe decisivo. Seu propósito era engajar essas forças contra as formações de bombardeiros americanos, a fim de “derrubar um total aproximado de 400 a 500 bombardeiros quadrimotores, contra uma perda estimada de cerca de 400 aeronaves e aproximadamente 100 a 150 pilotos”. Uma vitória nessa escala levaria os americanos a cessarem suas incursões diurnas, restabelecendo, em um único golpe, a superioridade aérea. Na visão de Galland, Hitler descartou essa ação potencialmente decisiva ao alocar sua zelosamente preservada reserva de caças no apoio à contraofensiva nas Ardenas, em dezembro de 1944.

Há razões para duvidar da potencial eficácia desse “Grande Golpe”. Enquanto a operação estava em seus estágios de planejamento, considerável parcela da reserva de caças travou combate com formações americanas; mesmo em condições favoráveis, contudo, os alemães não conseguiram abater um número significativo de aeronaves americanas. No outono de 1944, os padrões de treinamento dos pilotos de caça alemães estavam tão baixos que o grosso dos mais de 2.000 pilotos que participariam da operação proposta seriam incapazes de operar efetivamente. Além disso, a tarefa de agrupar e controlar tão grande número de aeronaves, em uma única operação, estava, provavelmente, muito além da capacidade da Luftwaffe no final daquele ano.



Com as táticas convencionais alemãs evidenciando-se cada vez mais ineficazes, surgiram expedientes desesperados. No verão de 1944, o comando da Luftwaffe criou os “grupos de caças de assalto”. Aeronaves Fw 190 modificadas, dotadas de revestimento blindado reforçado e armamento pesado, compuseram “cunhas voadoras “ de 48 unidades cada. Essa força maciça potencial, fortemente escoltada por caças convencionais, aproximar-se-ia de uma formação de combate composta por B-17 diretamente pela retaguarda. 

A lógica era simples: assegurar o maior número possível de aeronaves abatidas, abalar o moral inimigo e quebrar a disciplina da formação. Conforme um dos pilotos desse grupo recorda, “nós nos posicionávamos cerca de 100 jardas à retaguarda dos bombardeiros antes de abrir fogo. Nós dificilmente errávamos dessa distância e quando os projetis explosivos de 30 mm atingiam o alvo, podíamos ver os bombardeiros inimigos literalmente destroçando-se à nossa frente”.

Caso tudo mais falhasse, os pilotos desse grupo deveriam colidir com seus alvos. De acordo com as instruções oficiais do Alto-Comando da Luftwaffe, “a diretriz de ação para o grupo de caças de assalto é: a certeza de uma aeronave destruída para cada caça de assalto que entrar em combate com o inimigo.” Essas unidades especiais alcançaram algum sucesso digno de reconhecimento, mas o custo total acabou sendo elevado – especialmente quando os caças de escolta americanos engajavam a formação ainda na fase de reunião.

A inovação tecnológica alemã objeto da maior parte da análise levada a efeito no período pós-Guerra foi o desenvolvimento dos interceptadores turbojato e propulsionados por foguete. Não causa surpresa que o estudo das “armas maravilha” alemãs tenha se transformado em objeto de crescente interesse porque o poder aéreo e a superioridade aérea vêm-se tornando crescentemente dependentes da tecnologia desde 1945.

Muitos especialistas consideram que a gestão indevida do potencial dessas armas foi uma das razões fundamentais da derrota da Luftwaffe. Sem dúvida, o Me 262, com velocidade máxima de 540 nós e fortemente armado com 4 canhões de 30 mm (e, ao final, lançadores de foguetes ar-ar) era uma arma impressionante. Galland, e muitos outros autores lhe fazem eco no que a isso se refere, atribui o atraso da estreia dessa aeronave à inapropriada intromissão de Hitler em assuntos da força aérea. O Führer, de acordo com o argumento, teria determinado que o Me 262 fosse configurado como um bombardeiro de alta velocidade; essa decisão evitou que essa aeronave fosse alocada a unidades operacionais em tempo hábil para mudar o curso dos acontecimentos.

A percepção do Me 262 como uma “arma maravilha” potencialmente decisiva é um dos mitos mais duradouros na história do poder aéreo. A frequentemente citada ordem de Hitler proibindo o emprego dessa aeronave como caça data de maio de 1944, época em que nenhum Me 262 estava em serviço. Uma vez que falhas de projeto e técnicas ainda persistiam nessa aeronave, seu emprego em qualquer tipo de missão — bem como o treinamento de um número suficiente de pilotos, muitos dos quais achavam difícil dominar o interceptador “temperamental” — teria de aguardar a solução delas. 

É improvável que esse jato pudesse ter entrado em combate muito antes do que o fez, mesmo sem a interferência de Hitler. O 262, embora uma aeronave mortífera nas mãos do piloto certo, permaneceu, essencialmente, um protótipo colocado em operação de forma apressada. Ao longo de sua curta vida em serviço, essa aeronave foi objeto de uma taxa enormemente elevada de acidentes e alcançou somente um número muito reduzido de vitórias em combate.

No último ano da Guerra, a indústria alemã produziu outras armas avançadas menos importantes. Embora essas armas causassem alguma preocupação ao Serviço de Inteligência Aliada, nenhuma delas teve um impacto notável no combate pela superioridade aérea. Durante os anos vitoriosos de 1939-41, a indústria aeronáutica alemã deixou de impor um ritmo acelerado ao desenvolvimento dos sucessores dos tipos básicos de aeronaves com que a Alemanha tinha iniciado a Guerra. Uma estratégia de produção mais racional teria poupado a Luftwaffe do dilema de ter de combater em 1944 com aeronaves ou obsoletas, ou de fabricação incompleta.

Um indício inequívoco da decrescente eficácia dos caças foi o ressurgimento das unidades de artilharia antiaérea como o principal elemento de defesa antiaérea territorial. A concentração de unidades antiaéreas alemãs ao redor de alvos chaves aumentou de forma dramática. A espinha dorsal dessa força era o canhão antiaéreo 36 de 88 mm; por volta de 1944, outros canhões aperfeiçoados de 105 e 128 mm foram incorporados. Embora as unidades antiaéreas tivessem sido de fato mais eficazes do que muitas análises pós-Guerra nos levariam a crer, o colapso da defesa aérea levou a uma dependência maior – e, em 1945, completa — das unidades antiaéreas.

Antes de janeiro de 1944, os caças reivindicaram para si a responsabilidade pelos bombardeiros da Força Aérea do Exército dos Estados Unidos [US Army Air Forces – AAF] abatidos; entretanto, só no mês de junho de 1944, a antiaérea derrubou 201 aeronaves pesadas da 8ª Força Aérea – enquanto os caças abateram apenas 80. As instruções para as unidades antiaéreas enfatizavam que elas estavam autorizadas a abrir fogo em todas as altitudes do espaço aéreo, sem levar em consideração a possibilidade da existência de aeronaves de caça amigas na área. 

O princípio da doutrina do poder aéreo alemão do período anterior à Guerra, o qual atribuía aos canhões antiaéreos o papel dominante na defesa antiaérea, acabou por ser posto em execução tendo em vista o fato de os caças não terem atendido às expectativas.

Mesmo que a engenhosidade alemã fosse capaz de prover à Luftwaffe um grande número de aeronaves, ela não ofereceu uma solução ao problema da formação de um número suficiente de pilotos qualificados para essas aeronaves. Em 1939, a Luftwaffe detinha o que provavelmente seriam os mais altos padrões de treinamento de tripulações de aeronaves da Europa. Como resultado da experiência auferida em combates na Espanha em 1936-39, os pilotos alemães, em 1940, eram os melhores do mundo. Não obstante, a começar com a Batalha da Inglaterra, o aumento nas perdas de tripulações trouxe consigo um declínio no período e no rigor dos programas de formação.

Os instrutores das escolas de aviação eram constantemente convocados para servirem como pilotos de combate. Em julho de 1944, quando a crise geral de combustível atingiu a Alemanha, os pilotos de caça em formação alemães estavam voando menos de 25 horas em aeronaves de caça, em comparação com as mais de 150 horas que os pilotos americanos voavam.

Em termos claros, em meados de 1944, o piloto de caça mediano alemão era muito mais uma preocupação do que uma vantagem, demasiadamente propenso a acidentar-se em sua primeira surtida. Qualificações especiais, tais como voo noturno ou em condições atmosféricas adversas e navegação em longa distância inexistiam na Luftwaffe naquele período. 

Na tentativa de dar uma solução a essa problemática, o comando da Luftwaffe tomou diversas decisões drásticas em termos de políticas de pessoal. As escolas de formação de pilotos, já com efetivo incompleto, foram obrigadas a abrir mão de mais instrutores, e todos os pilotos de caça fisicamente capazes, servindo em postos de estado-maior, foram convocados para missões de combate. 

Galland vasculhou unidades de combate noturno, de ataque ao solo e a frente russa em busca de pilotos treinados. O curso da guerra aérea sobre o Reich impôs enormes exigências a uma organização já sobrecarregada.

Em abril e maio de 1944, a seção de operações do estado-maior observou um alarmante aumento de perdas de aeronaves de treinamento, correio e transporte que operavam em áreas consideradas seguras nas regiões leste e sul da Alemanha. Operando livremente sobre todo o território do Reich, os caças aliados reduziram drasticamente a capacidade da Luftwaffe de treinar novos pilotos para substituir as baixas sofridas nos meses anteriores. 

Muitos filmes gravados pelas câmaras acopladas às metralhadoras dos Mustangs e Thunderbolts da AAF mostram ataques efetuados a aeronaves, com frequência equivocadamente identificadas como “Me-109”, que eram, de fato, aeronaves de treinamento Arado 96 – normalmente com um atordoado piloto em formação no controle. Para fazer frente a essa situação, a Seção de Treinamento emitiu novas instruções enfatizando vigilância redobrada por parte dos pilotos (“sonhar acordado leva à morte”).




Os vôos que não envolvessem o combate deveriam ser realizados tão somente ao amanhecer e ao anoitecer. A Luftwaffe expandiu seu sistema de alerta contra aeronaves incursoras e concebeu uma série de códigos visuais e rádio. Mesmo as aeronaves dedicadas a missões de correio foram armadas. Se atacadas, as aeronaves deveriam adotar medidas evasivas de defesa e mergulhar rapidamente para o nível mais próximo do solo. Se necessário, a tripulação deveria executar um pouso sem trem (pouso de barriga) e buscar cobertura para evitar ser metralhada.

O início desse tipo de “guerra de guerrilha aérea” pelos caças de escolta da AAF implicava que não somente as instalações de treinamento, mas toda a infraestrutura de apoio da Luftwaffe estava correndo perigo. Os caças de escolta americanos, de início isoladamente, porém depois atuando em conjunto, começaram a metralhar pistas de pouso e instalações terrestres quando retornavam a suas respectivas bases.

Os comandantes das bases da Luftwaffe adotaram diversas medidas de defesa passiva, incluindo a construção de barreiras de proteção e o aumento do uso de camuflagem visual e cortinas de fumaça, além de enterrar cabos elétricos e de comunicação importantes que atendiam aos postos de comando e instalações radar. Trincheiras estreitas e profundas foram construídas nos aeródromos e o combustível e a munição armazenados em túneis. Postos adicionais de vigilância visual e uma reorganização do serviço de informações sobre aeronaves incursoras propiciaram uma capacidade crucial de alerta antecipado. No último mês da guerra, algumas unidades aéreas operaram a partir de trechos das vias expressas alemãs, abrigando suas aeronaves sob viadutos.

A contramedida mais efetiva levada a efeito pela Luftwaffe foi equipar os aeródromos com proteção antiaérea adicional. As diretrizes operacionais da Luftwaffe salientavam que o fogo concentrado de todo o armamento disponível – até mesmo metralhadoras e canhões removidos de aeronaves estacionadas – poderia tornar os aeródromos verdadeiras “armadilhas antiaéreas” contra aeronaves voando a baixa altura. 

A seção de operações do estado-maior da Luftwaffe observou, com satisfação, o depoimento de pilotos da AAF capturados sobre os perigos associados ao metralhamento de alvos. De fato, em 1944 a AAF perdeu 1.293 caças no teatro de operações europeu em ação contra caças inimigos, tendo perdido 1.611 face à artilharia antiaérea – em sua maioria durante missões a baixa altura.

Durante os últimos 5 meses da guerra, os abates de caças da AAF pelo fogo antiaéreo excederam, a uma razão de quase 4 contra 1, os provocados por caças da Luftwaffe.

A última alternativa para o dilema da superioridade aérea merece menção: o emprego de pilotos voluntários em missões suicidas. A literatura popular está repleta de referências wagnerianas às tentativas de última hora de emular as táticas dos kamikazes japoneses. Embora a realidade seja de alguma maneira menos dramática (somente em raras ocasiões tais ataques realmente tiveram lugar), essa opção permanece de interesse: esses expedientes raramente ocorrem de forma organizada em guerras entre estados, embora atores não-estatais, tais como grupos terroristas, não se esquivem de empregá-las.

A situação militar desesperadora em 1944-45 é responsável pela consideração desses esforços extraordinários. Conforme observado pelo historiador Omer Bartov em seu estudo sobre motivações para o combate na Frente Oriental, os reveses militares dos últimos anos da guerra, conjugados com a intensificação do doutrinamento nazista, geraram um novo nível de fanatismo entre os soldados alemães. 

Publicações oficiais da Luftwaffe, incluindo periódicos de ciência militar e mesmo diretrizes operacionais, as quais, até 1944, possuíam relativamente pouco conteúdo político explícito, começaram a referir-se à luta em termos ideológicos. Algumas diretrizes afirmavam que somente “a cosmovisão nacional socialista” poderia prover a “força interior” necessária para vencer o inimigo. As fontes primárias dessas “armas espirituais” foram a Divisão Militar da Liderança Nacional Socialista, que contava com “oficiais políticos” (semelhantes aos comissários do Exército Vermelho) nas unidades da Luftwaffe e do exército, e a Seção de Ciência Militar do Estado-Maior Geral da Luftwaffe

Embora essa seção tenha produzido análises operacionais valiosas e estudos históricos tradicionais de campanhas recentes, em 1944, ela estava mais preocupada em inculcar na oficialidade da Luftwaffe uma apropriada postura nacional socialista. Tomaram-se as medidas mais extremadas para retomar dos Aliados a superioridade aérea nesse ambiente ideologicamente carregado.

Os programas da Luftwaffe nessa direção encaixaram-se em 2 amplas categorias. A primeira compreendia missões de risco extremamente elevado (embora teoricamente com possibilidade de sobrevivência) contra alvos aéreos e terrestres inimigos. As táticas dos grupos de caças de assalto enquadram-se nessa categoria, já que mesmo ataques de colisão contra aeronaves inimigas não impediam o piloto de ejetar-se. Mais desesperada ainda foi a proposta de rapidamente treinar rapazes integrantes da Juventude Hitlerista no uso de planadores e, imediatamente, enviá-los para combate nos “caças populares” Heinkel 162– uma versão aérea da Volkssturm, a “milícia popular”, com a qual a Alemanha esperava criar uma versão nazista do “levee en masse.” Somente o final da Guerra poupou adolescentes de pilotarem essas aeronaves perigosas e destituídas de confiabilidade.

A segunda (e muito mais rara) categoria eram as chamadas missões de Compromisso Total, explicitamente caracterizadas como operações suicidas. Com as batalhas aéreas sobre o Reich sendo consideradas a maior ameaça contra a sobrevivência nacional alemã, surgiram diversas propostas no final de 1944 para o uso de pilotos voluntários em ataques suicidas contra formações de bombardeiros americanos ou contra outros alvos compensadores. Korten determinou a formação do Esquadrão Leônidas, que deveria operar velhos bombardeiros, planadores de ataque e bombas voadoras tripuladas dentro desse conceito. 

A unidade foi finalmente dispersa depois de extenso treinamento e doutrinamento político. Não obstante, as propostas e os programas para ataques de colisão contra formações de bombardeiros persistiram durante toda a guerra, culminando em um desesperado ataque de colisão em massa pela unidade Schulungslehrgang Elbe, rapidamente formada, em 7 de abril de 1945. 120 Bf-109 engajaram uma formação da AAF, destruindo, no máximo, 13 bombardeiros a um custo de 53 caças alemães. Muitos dos pilotos alemães insuficientemente treinados nunca chegaram a engajar a formação da AAF.

A despeito desse desperdício de sangue e recursos financeiros, a Luftwaffe nunca foi capaz de retomar a superioridade aérea sobre o Reich. A despeito dos indícios de um “golpe final” tecnológico de última hora, a Luftwaffe de 1944-45 era uma força ineficaz, incapaz de controlar a dinâmica temporal das operações ou mesmo de causar uma inconveniência mais do que ocasional à AAF. A partir de junho de 1944, a maioria dos seus pilotos eram mais um perigo para si mesmos do que para seus inimigos, e suas unidades operacionais, que já se achavam sobrecarregadas, empregavam aeronaves obsoletas e mal fabricadas. 

Durante o último ano da guerra na Europa, os caças alemães de emprego diurno destruíram 703 bombardeiros pesados da AAF; de junho de 1943 a maio de 1944, uma força muito menor havia destruído 1.579 aeronaves. Todas as medidas vigorosas estabelecidas pelo comando da Luftwaffe para combater a ofensiva de bombardeio diurno fracassaram. 




Lidando com a superioridade aérea aliada: as frentes de combate

A despeito do enorme número de perdas sofridas por suas unidades de caça nos primeiros meses de 1944, o comando da Luftwaffe acreditava que seria capaz de prover uma resposta aérea bem-sucedida à iminente invasão aliada da Europa Ocidental: “A defesa contra essa tentativa de desembarque é decisiva para o desfecho da guerra”.

Luftwaffe desenvolveu um complexo esquema para reforçar o setor de invasão assim que os Aliados iniciassem a Operação Overlord. Ao receber a frase-código Drohende Gefahr West (Perigo Iminente a Oeste), esquadrões das forças de defesa do Reich deveriam deslocar-se para aeródromos previamente identificados no norte da França. O maior número possível de aeronaves de combate deveriam ser dotadas de pilones para bombas de modo a poderem participar diretamente na batalha terrestre.

Luftwaffe aproveitou-se de sua experiência adquirida nos meses que precederam a invasão para preparar-se para o combate. No início de 1944, unidades posicionadas na França relataram um aumento dos ataques por caças e caças-bombardeiros inimigos – incrementados por ataques conduzidos por bombardeiros médios e pesados – contra aeródromos, centros de transporte, malha ferroviária, e instalações radar e de comunicações.

As unidades de terra desenvolveram técnicas sofisticadas de camuflagem, dissimulação, dispersão e mobilidade como meios de redução de perdas de material e pessoal por ataques aéreos. Baseada em sua experiência no território alemão, a Luftwaffe deslocou baterias antiaéreas móveis, em especial o canhão quádruplo antiaéreo de 20 mm. Essa arma útil, frequentemente montada em reboques, caminhões, meia-lagartas ou mesmo chassis de carro de combate, prestaram apoio de fogo concentrado e altamente flexível a alvos importantes, incluindo aeródromos, pontes e ferrovias.

Para proteger as unidades terrestres, os alemães concentraram suas baterias antiaéreas, com suas armas aprestadas, à frente e à retaguarda das colunas. Os comandantes alemães conceberam procedimentos de resposta rápida a alarmes aéreos; quando uma aeronave inimiga era avistada, a coluna interrompia seu avanço e as viaturas portadoras das armas antiaéreas eram dispostas nas laterais das rodovias, provendo fogo antiaéreo concentrado contra as aeronaves aliadas “Jabos” que voavam a baixa altura.

O efeito da superioridade aérea aliada foi muito pior do que até mesmo os mais pessimistas planejadores da Luftwaffe haviam previsto. Um oficial da Luftwaffe declarou que a atividade aérea inimiga tornou impossível o tráfego de comboios durante o dia, com exceção de unidades totalmente blindadas.

As comunicações por cabos terrestres na zona de invasão foram desorganizadas do dia-D em diante em virtude tanto dos ataques aéreos quanto das atividades da Resistência Francesa. Os alemães responderam por meio do aumento de comunicações via rádio, se bem que, por serem tão dependentes da máquina de cifrar Enigma, tais medidas tornassem as intenções alemãs ainda mais transparentes à inteligência Aliada.

A superioridade aérea aliada tornou a transferência organizada de unidades da Luftwaffe para o teatro de operações uma empreitada extremamente difícil.

A resposta imediata da Luftwaffe aos desembarques foi “quase que imperceptível.” De fato, o esforço aéreo alemão durante as primeiras 24 horas somaram apenas 319 surtidas, frustrando, assim, a expectativa inicial de deter a invasão durante as primeiras horas cruciais. Mesmo assim, o desdobramento das unidades de caça defensivas do Reich tiveram algum sucesso com a chegada de 200 aeronaves nas primeiras 36 horas. No dia-D+7, mais de 1.000 aeronaves alemãs estavam diretamente fazendo frente ao desembarque. Além de terem de prover suas próprias defesas, elas tinham ainda de escoltar trimotores de transporte lentos que conduziam pessoal e peças de reposição.

Os verdadeiros problemas para essas aeronaves iniciavam com sua chegada à cena de ação, já que os ataques aéreos aliados tinham danificado muitos de seus aeródromos. A força de caça alemã foi atraída para uma batalha perdida para manter seus índices de disponibilidade em face de intensa atividade aérea inimiga.

Os comandantes alemães logo perceberam que seus métodos destinados a confrontar a superioridade aérea aliada não se revelaram à altura das tarefas que tiveram à frente na Normandia. As organizações de terra tinham de lidar com condições muito mais difíceis do que as enfrentadas no território do Reich. Como resultado, o Alto-Comando da Luftwaffe enfatizou que “as forças de ar e as organizações de terra são uma única arma” e buscou incutir o “comportamento guerreiro” até mesmo entre o pessoal de apoio que operava os aeródromos.

Os alemães reforçaram fortemente seus sistemas de alarme contra incursões aéreas, já que os ataques levados a efeito pelos caças-bombardeiros aliados frequentemente ocorriam com pouco ou sem aviso. Camuflagem e dispersão tornaram-se quase que uma arte, com as aeronaves sendo descobertas imediatamente antes de uma surtida e rapidamente cobertas depois que suas hélices paravam de girar. As forças antiaéreas eram subordinadas a um comandante da defesa da base, responsável por treinar, implementar novas medidas defensivas e, com efeito, dirigir as operações no caso de a base ser atacada. 

Os comandantes de artilharia antiaérea tomaram proveito do fato de os caças-bombardeiros aliados atacarem tudo que se movia nas estradas da Normandia e criaram engenhosas “armadilhas para aeronaves que voassem a baixa altura”. Desdobraram simulacros de lona móveis equipados com painéis de vidro para simularem o reflexo de pára-brisas de veículos. Quando os caças-bombardeiros mergulhavam para atacar, um conjunto emassado de canhões de artilharia antiaérea (AAA), costumeiramente camuflados como arbustos, abriam fogo.

Nos estágios iniciais da invasão de verão, os alemães experimentaram deslocar aeronaves para longe dos aeródromos ameaçados e dispersá-las em pistas de pouso de emergência. Os “vôos de evacuação” logo cessaram. Em primeiro lugar, esses deslocamentos consumiam os parcos estoques de combustível de aviação; em segundo lugar, o espaço aéreo sobre a Normandia revelou-se muito mais perigoso do que seu terreno. 

No início de agosto de 1944, a Luftwaffe teve que retirar suas unidades de caça dos aeródromos avançados, já que, como relembra um comandante, seus caças estavam “presos ao solo” pelas aeronaves aliadas. Essas novas bases – localizadas a sudoeste de Paris – embora um pouco menos vulneráveis a ataques diretos pela aviação aliada, obrigavam a Luftwafe a percorrer grandes distâncias, utilizando, dessa forma, combustível precioso e diminuindo o tempo sobre os alvos. A esperança de utilizar caças em “tarefas-alternadas” de aeronaves de ataque ao solo mostrou-se fútil: os pilones para bombas eram rapidamente alijados à medida que os caças se concentravam sobre unidades alemãs selecionadas para proverem um mínimo de cobertura aérea.

Eles também tentaram abater aeronaves de observação aérea aliadas, as quais corrigiam o tiro de artilharia convencional e naval contra as forças terrestres alemãs sob grande pressão.

Claramente, a força de caça não podia criar um impacto apreciável, e as forças de ataque ao solo achavam-se em situação ainda mais precária. Aeronaves Fw 190s carregadas de bombas eram ainda menos capazes do que os caças alemães de penetrarem as formações avançadas de caças aliados. 



Luftwaffe limitou suas missões de ataque ao solo ao amanhecer e ao anoitecer – ou às condições atmosféricas adversas. O Estado-Maior Geral da Luftwaffe concluiu que “aeronaves de ataque ao solo . . . não mais prestavam qualquer apoio decisivo às forças de terra, e as pesadas perdas sofridas elevaram-se, ao final, a um nível desproporcional aos êxitos alcançados”.

Luftwaffe pelo menos tinha poucas ilusões de que sua força de bombardeiros, uma vez considerada seu principal vetor ofensivo, teria um papel significativo a desempenhar nos combates diurnos da Normandia.

Afastada até mesmo dos céus noturnos da Europa Ocidental, a força ofensiva da Luftwaffe dependia cada vez mais de armas sem pilotos – as “bombas voadoras” Fieseler Fi 103 (V-1). Como um substituto para a capacidade de bombardeio convencional, as V-1 tinham várias deficiências, especialmente sua falta de precisão. 

Não obstante, o bombardeio levado a efeito por essas bombas voadoras, iniciado em 13 de junho de 1944, comprometeu o emprego de um grande número de aeronaves de caça aliadas e baterias antiaéreas aliadas que, de outra forma, teriam sido empregadas na Normandia.

O estado-maior da Luftwaffe chamou a atenção especialmente para esse benefício colateral em seus memorandos táticos. Mais tarde, na invasão de verão, os mísseis balísticos A-4 (V-2) do Exército entraram em cena. Embora há muito alardeado pelo Programa de Armamentos de Foguetes do Exército como um potencial substituto para o bombardeio estratégico, os V-2 possuíam ainda menos precisão do que as V-1 e (já que nenhuma defesa era possível) não causaram qualquer remanejamento de forças de caça ou antiaéreas aliadas.

Foi somente na área de apoio ao reconhecimento que as contramedidas da Luftwaffe efetivamente produziram alguma melhora significativa. A incapacidade da Luftwaffe em conduzir até mesmo o reconhecimento aéreo mais básico tornava as forças alemãs praticamente cegas, uma situação que contribuiu enormemente para a operação de despistamento Aliada (Fortitude) anterior à invasão, assim como propiciou um nível sem precedentes de liberdade operacional às formações aliadas combatendo na Normandia.

Embora a superioridade aérea aliada parecesse ter condenado as forças de reconhecimento da Luftwaffe à mesma irrelevância de suas unidades de combate, neste caso novas tecnologias radicais fizeram surgir uma melhora notável. Embora o interceptador a jato ME 262 não tivesse alterado de forma apreciável o equilíbrio na luta pela superioridade aérea sobre a Alemanha, seu equivalente menos festejado – o bombardeiro/aeronave de reconhecimento a jato Arado Ar 234 – aumentou dramaticamente as possibilidades de sucesso das operações de reconhecimento. 





No final de julho e início de agosto de 1944, 2 protótipos do Ar 234 chegaram na área costeira da invasão. O Ar 234 não era armado, levava apenas 2 câmeras panorâmicas de alta resolução e confiava em sua tremenda velocidade e capacidade de operação em elevadas altitudes para evadir-se de interceptações.

Durante uma única missão, em 2 de agosto, um piloto de Ar 234, voando a única aeronave operacional, “alcançou o que havia estado além do alcance de toda a força de reconhecimento da Luftwaffe no decorrer das 8 semanas precedentes: ele fotografou quase toda a área de ocupação dos Aliados na Normandia.” De fato, no restante da guerra, unidades de reconhecimento equipadas com Ar 234 puderam operar praticamente sem interferência a oeste, na Itália, e mesmo sobre as Ilhas Britânicas. Embora as forças armadas alemãs não mais dispusessem da capacidade para tomar ações efetivas baseadas em um melhor fluxo de dados de inteligência, a carreira operacional do Ar 234 indica as possibilidades conferidas por um simples item de nova tecnologia até mesmo a uma força aérea irremediavelmente inferiorizada.

À exceção de pequenos êxitos, as contramedidas da Luftwaffe à superioridade aérea aliada na Normandia não prolongaram significativamente o embate. O apoio aéreo às contra-ofensivas alemãs como o ataque a Mortain em agosto foi deficiente, e as organizações de terra da Luftwaffe foram apanhadas na retirada generalizada que se seguiu na França. Comentava-se na Alemanha que o prefixo “WL” nas placas dos veículos da Luftwaffe, de fato, significavam “estamos de saída [we´re leaving!]”. 

O apoio tático prestado pela Luftwaffe às operações terrestres permaneceu esporádico e ineficaz durante o resto da campanha. Mesmo os raros ataques em massa desencadeados pelos caças da Luftwaffe, como ocorreu na Operação Bodenplatte – o ataque surpresa a bases aéreas aliadas no dia de Ano Novo de 1945 — dificilmente compensaram as perdas sofridas.

A perda da superioridade aérea na frente russa, embora não tão extensa, nem tão dramática como no oeste, também gerou problemas consideráveis. Embora a Luftwaffe pudesse concentrar suas forças e arrebatar a superioridade aérea local da Força Aérea Vermelha até mesmo no início do último ano da guerra, ela ainda tinha de lidar com o fato de que podia formar uma resistência aérea tão somente bastante limitada ou inexistente sobre largos setores da frente de combate.

Nessas regiões, os alemães lançaram mão de algumas das mesmas práticas de camuflagem, dissimulação e técnicas antiaéreas utilizadas no oeste, mas muitas das contramedidas foram de emprego exclusivo no teatro de operações oriental. Uma dessas “soluções de baixa tecnologia” mais interessantes e de uso mais generalizado para o problema da superioridade aérea foi o emprego de aeronaves em missões noturnas de inquietação.

Desde os primeiros dias da campanha no oriente, mesmo quando os alemães ainda dispunham de uma superioridade aérea geral, as unidades da frente de combate do Exército tornavam-se inquietas com o surgimento de biplanos obsoletos soviéticos, operando à noite e frequentemente pilotados por mulheres (as chamadas Feiticeiras da Noite). Embora o efeito material desses ataques fosse mínimo, ataques noturnos com bombas de fragmentação erodiam o moral da tropa, privavam os soldados do sono, ocasionalmente destruíam depósitos de suprimentos e infligiam baixas.

Os comandantes aéreos alemães inspiraram-se nesses acontecimentos. Nas áreas de retaguarda da Luftwaffe havia uma multiplicidade de aeronaves de treinamento e reconhecimento obsoletas, assim como muitas aeronaves capturadas. Essas aeronaves desempenharam papel limitado nas operações aéreas de envergadura, mas – dada a dimensão do TO e a dispersão das alas aéreas de bombardeiros e caças da Luftwaffe – muitos comandantes aderiram à filosofia de que “uma aeronave não utilizada está auxiliando o inimigo.” 

Luftwaffe explorou extensamente essas aeronaves obsoletas, agrupando-as em unidades de ataque noturno e de ataque ao solo. Virtualmente não detectáveis por radar ou outros meios, essas aeronaves atacaram depósitos de suprimentos soviéticos, acampamentos de tropas irregulares, aeródromos inimigos e outros alvos vulneráveis com bombas leves de fragmentação e o fogo de metralhadoras.

Não é de causar surpresa que essas simples aeronaves pudessem operar de forma tão efetiva; mesmo 60 anos depois, em certas circunstâncias, aeronaves leves podem penetrar até mesmo sofisticados sistemas de defesa antiaérea. No outono de 1944, mais de 500 dessas aeronaves estavam em operação, a maioria na Rússia; entretanto, os Aliados também depararam-se com unidades de ataque ao solo de emprego noturno equipadas com aeronaves mais modernas na frente italiana e na frente ocidental.

Tal como muitas improvisações observadas ao largo da história militar alemã, esse expediente de baixo custo surgiu dos escalões inferiores da Força. Foi somente no início de 1944 que uma doutrina oficial sobre o uso desse tipo de arma foi publicada; e a maior parte do trabalho de desenvolvimento e experimentação do conceito ocorreu no escalão unidade. A fixação da seção de operações do Estado-Maior da Luftwaffe pela retomada da superioridade aérea, por meios convencionais, provavelmente impediu uma dependência mais ampla em tais improvisos de baixa tecnologia.




Conclusão

O poder aéreo fez sua maior contribuição à vitória aliada na Segunda Guerra Mundial ao destruir a Luftwaffe e conquistar a superioridade aérea sobre toda a área de combate. A Força Aérea alemã respondeu a essa ameaça com engenhosidade e determinação. Muitas das medidas por ela tomadas conduziram a um sucesso temporário; outras não tiveram um efeito identificável sobre o rumo dos eventos.

É possível avaliar a eficácia dessas medidas em vários níveis. Ao criar uma organização para a defesa do território nacional, diante de muitos compromissos onerosos em 3 frentes de combate amplamente separadas, o Alto-Comando da Luftwaffe fez, realmente, um trabalho digno de crédito; de fato, no final de 1943, ele estivera prestes a tornar demasiado cara a continuação das operações de incursão em profundidade da AAF. A indústria aeronáutica alemã certamente elevou-se à dimensão do desafio ao aumentar significativamente a produção de caças – tanto que até o final a Luftwaffe não sofreu da carência de aeronaves desse tipo.

Mesmo sob intensos ataques por bombardeio, os dirigentes da indústria de armamentos da Alemanha Nazista conseguiram operar “um milagre de produção.” O êxito dessas medidas sublinha o nível de resiliência de um estado moderno, mesmo diante das circunstâncias mais adversas.

A despeito de notáveis desenvolvimentos tecnológicos, tal como o interceptador Me 262, as soluções de alta tecnologia alemãs para o problema da superioridade aérea, em larga medida, fracassaram. Por mais convincente que possa ter sido a visão de novas tecnologias confrontando a superioridade numérica aliada, os desenvolvimentos alemães no final da guerra não podiam justificar as exageradas expectativas a seu respeito. É um fato que as tripulações e o pessoal de terra da Luftwaffe obtiveram seus poucos êxitos defensivos já próximo do final da guerra por meio do emprego de armas convencionais ou mesmo em estado de obsolescência.

Que lições o empenho da Luftwaffe em reconquistar a superioridade aérea sugere? Claramente, com a vantagem da perspectiva auferida pelos conhecimentos no início do século XXI, muitos aspectos tornam os eventos ocorridos apenas de interesse histórico. O ritmo das operações de combate na Segunda Guerra Mundial foi bastante lento e incremental. A ofensiva aérea aliada levou anos para desenvolver-se, somente provocando danos reais à economia alemã no último ano da guerra.

Mesmo após os desembarques na Normandia, a estratégia de “frente ampla” dos Aliados Ocidentais permitiu que as forças alemãs – a despeito da derrota decisiva sofrida na França – se reorganizassem e não só derrotassem a Operação Arnhem (Market-Garden), em setembro de 1944 mas, também, lançassem uma grande ofensiva nas Ardenas. É improvável que conflitos futuros propiciem a um adversário pausa semelhante para se recompor, durante a qual os alemães implementaram reformas organizacionais e na produção de aeronaves.

Tampouco pode um futuro adversário fiar-se em dispor de tempo para aprestar novas tecnologias, mesmo para limitadas ações de combate. Além do mais, as contramedidas alemãs foram projetadas para infligir uma derrota decisiva às forças aéreas de seus inimigos. Por mais vã que aquela esperança tenha sido, é ainda mais improvável que, no futuro previsível, um adversário venha a engajar a Força Aérea dos EUA em combate semelhante pela superioridade aérea.

A despeito do evidente hiato entre a experiência da Luftwaffe e qualquer cenário futuro, esse estudo de caso histórico apresenta lições relevantes. Uma das conclusões mais notáveis refere-se à relutância por parte das forças aéreas de efetuarem amplas mudanças em suas doutrinas operacionais.

Sugerir que a fixação da Luftwaffe por operações ofensivas foi a única – ou principal – causa de sua derrota é simplificar em demasia a situação; contudo, sua aderência a princípios, que lhe eram caros, relativos ao emprego apropriado do poder aéreo certamente retardou e prejudicou sua resposta à perda da superioridade aérea. Os custos de manutenção de uma capacidade ofensiva mostraram-se enormes e, para a Luftwaffe, isso foi, em grande medida, um ferimento infligido a si mesma.

Nada obstante, em certa medida a Luftwaffe libertou-se dos grilhões da doutrina anterior à guerra, e as medidas resultantes por ela tomadas são de enorme interesse para os atuais profissionais do poder aéreo. Embora o desempenho passivo da Força Aérea iraquiana em 1991 e 2003 frente ao domínio do ar por parte da Coalizão seja reconfortante, a experiência da Luftwaffe – assim como o desempenho da aviação argentina durante a Guerra das Malvinas em 1982 – sugere que uma força aérea bem adestrada continuará a operar mesmo diante de desvantagens esmagadoras.

Além disso, os mais relevantes, embora transitórios, êxitos defensivos alemães resultaram do emprego astuto e determinado de aeronaves convencionais, a despeito da fixação por “armas maravilha” no período pós-Guerra. 

Ironicamente, a lição mais importante da experiência da Luftwaffe pode ser o emprego de biplanos obsoletos de baixa detectabilidade por radar em missões noturnas de inquietação, do que a incorporação tardia do caça mais rápido do mundo. Recentes experiências de combate americanas ao redor do globo sugerem várias possibilidades de emprego de armamentos menos sofisticados.

A dependência em defesas baseadas em terra também oferece um grande número de lições. Em meados de 1944, as unidades antiaéreas alemãs podiam reivindicar para si a responsabilidade pela maioria das aeronaves aliadas destruídas pelas forças alemãs. Embora a concentração de canhões AAA pesados em torno de alvos importantes possa parecer uma ação ineficaz em relação ao custo, a proteção de alvos táticos com armas de pequeno calibre concentradas mostrou ser outra história.

Uma vez que as aeronaves aliadas atacavam imediatamente qualquer veículo em movimento, tornou-se fácil atraí-las para armadilhas anti-aéreas bem dissimuladas. Mesmo medidas mais simples como camuflagem, dissimulação, cortinas de fumaça, construção de abrigos antiaéreos e evacuação de áreas críticas não devem passar desapercebidas. Seu efeito cumulativo complicou enormemente a tarefa dos planejadores aéreos aliados. Conforme Milch sumarizou, “Se a última guerra nos ensinou a a cavar trincheiras, essa guerra nos tem ensinado a camuflar.” Baratos e exigindo pouco treinamento e preparação, tais métodos prestam-se rapidamente ao repertório de qualquer nação que venha a confrontar um inimigo que mantenha o domínio do ar.

Além disso, dissimulação e mobilidade podem evidenciar-se como contramedidas efetivas diante de munições guiadas de precisão, já que esses armamentos freqüentemente possuem uma pequena ogiva e dependem de precisão para serem eficazes. Um futuro adversário bem faria em estudar o exemplo alemão.

Ao falhar em deter os Aliados, até mesmo as mais astutas contramedidas alemãs assumiram um ar de total futilidade. Era improvável que o aumento no número de baixas infligidas por algumas dessas medidas demovesse os Aliados do seu objetivo enunciado de rendição incondicional. Não obstante, em um contexto político-social diferente, a capacidade de prolongar um conflito ou de aumentar o número de baixas pode ser suficiente para forçar uma potência a repensar seus comprometimentos. Por mais infrutíferas que tenham sido as medidas alemãs em uma guerra total entre estados-nação, a capacidade de infligir baixas inesperadas à Força Aérea dos EUA, a seus parceiros de coalizão, ou populações amigas, pode render lucros desproporcionais a futuros adversários.


quinta-feira, 12 de setembro de 2019

Superioridade e Supremacia Aérea *179



A primeira ação efetiva de uma campanha militar moderna é a busca da Supremacia Aérea, condição em que se tem o completo domínio de todo o espaço aéreo de interesse, com a força oponente logrando de uma capacidade operativa neste espaço extremamente limitada ou mesmo nula. Qualquer tentativa do inimigo de operar seus meios aéreos pode resultar em sua perda, de forma que este evita usá-los, preservando-os, perdendo dessa forma a capacidade de defesa aérea, ataque às forças dominantes no solo, reconhecimento aéreo e suporte logístico. A impossibilidade de operar meios aéreos em um teatro de operações, significa uma brutal perda na capacidade operacional de qualquer força, e quase que invariavelmente resulta na perda da campanha.

Quando opera na condição de supremacia aérea, forças aéreas e de superfície aliadas podem manobrar e atuar sem temer a ameaça vinda do ar, seja em cenários de crise e guerra aberta. Os elementos que atuam na manutenção da superioridade aérea são elementos-chave da capacidade de defesa e dissuasão de uma nação em tempos de paz, bem como são os garantidores da flexibilidade tática e liberdade de ação em uma campanha. A melhor maneira de evitar a guerra é demonstrar aos adversários que se tem a capacidade e a vontade de derrotá-los, e uma força aérea capaz e reconhecida detém um poder dissuasório ímpar.




Manter o controle do espaço aéreo onde opera é então a primeira ação de qualquer comandante militar, pois acima de tudo significa a segurança relativa das forças de superfície. Porém nem sempre é possível se chegar a tal condição, e uma situação mais realista é a obtenção da Superioridade Aérea, condição em que se detém o controle da maior fatia do espaço aéreo, através de uma situação de poder aéreo mais favorável que a do oponente.

Num teatro de operações moderno o espaço aéreo tende a fragmentar-se em áreas com diferentes níveis de segurança. É vital que se controle aquele espaço imediatamente acima das forças amigas, pois deste controle depende a segurança destas. A medida que nos afastamos de nossas bases aéreas em direção às bases inimigas, o espaço aéreo tende a ficar mais hostil e a balança do poder aéreo tende a pender para o lado do inimigo. Este equilíbrio, é claro, depende em muito do poderio das forças envolvidas. Neste caso, onde se controla apenas o espaço aéreo amigo a situação é dita de Paridade Aérea.

Evidentemente dependendo dos recursos que se tem a disposição, a forma mais convencional de busca da dominação do espaço aéreo é iniciar-se com o emprego de medidas de guerra eletrônica visando impedir ou minimizar os sistemas de comunicação do inimigo a fim de impedir o acionamento e vetoração dos elementos de caça e interceptação hostis até as esquadrilhas amigas, que por sua vez visam destruir a aviação inimiga ainda no solo, se possível, quando estão mais vulneráveis. As medidas de apoio eletrônico também atuam de forma a deteriorar e impedir a operação de sítios-radar e outros meios de alerta aéreo antecipado, de forma a não permitir ao inimigo a "visualização" do quadro tático do espaço aéreo e a localização dos meios aéreos amigos.

A defesa do espaço aéreo, seja na “eterna vigilância” que garante a paz ou nas operações de combate em proveito de uma campanha militar, se inicia nos serviços de informações. A inteligência militar é a primeira responsável pelas diretrizes operacionais dos esforços de defesa. Um dos pontos-chave para se determinar as capacidades necessárias de ativos de superioridade aérea é ter consciência situacional das funções operacionais do poder aéreo e das missões a serem executadas.

Uma vez que o inimigo não possa estabelecer um quadro tático efetivo da situação, e seja obrigado a lançar sua aviação de forma dispersa e desordenada e sem a efetividade necessária, os sistemas de controle aéreo podem vetorar suas próprias aeronaves de caça e interceptação para abertura de corredores aéreos às forças de ataque, que visarão a neutralização dos dispositivos de artilharia antiaérea e de estações de radar e C2 de meios aéreos (missões SEAD- Supressão de Defesas), a interdição do uso de bases aéreas e pistas de pouso e decolagem, o bombardeio de aeronaves estacionadas nestas bases e seus depósitos de combustível, assim como outros elementos que contribuam para a efetividade da defesa aérea inimiga. Estes interceptadores atuarão ainda na caça e destruição dos interceptadores inimigos em voo, procurando "limpar" o espaço aéreo destas ameaças, permitindo sua livre utilização pelas forças amigas.

Uma vez que a atividade aérea do inimigo atinja um nível de frustração desejado, deve-se estabelecer um padrão de controle de espaço através da implementação de patrulhas de combate aéreo para evitar que o inimigo retorne, proporcionando segurança às forças na superfície, e estabelecimento de escoltas às forças de ataque ao solo e bombardeio estratégico, que darão sequência aos planos de combate. Esta atividade, evidentemente, se dará com o constante apoio de elementos de controle de espaço aéreo e AEW, EW e outros meios afins. Deve-se monitorar e evitar o esforço do inimigo em reestabelecer a condição operacional com a substituição dos meios destruídos, assediando-os constantemente até que entrem em uma condição de colapso irreversível.

A história nos mostra que nenhuma guerra moderna foi ganha sem que a condição de superioridade aérea fosse estabelecida, bem como nenhuma ofensiva teve sucesso e nenhuma defesa se sustentou contra um inimigo que a detinha, sendo esta condição de suma importância, senão vital, ao sucesso de qualquer empreitada militar.



Conceitos Operacionais

O domínio do espaço aéreo pode ser abordado tanto sob uma ótica defensiva, doutrina esta mais conservadora e atualmente adequada apenas a tempos de não-guerra (paz ou crise), ou de forma mais moderna e agressiva quando se procura definir este domínio logo nas primeiras horas de um conflito.

A abordagem de Superioridade Aérea Defensiva (DAS) com as missões de Patrulha Aérea de Combate (CAP) e Interceptação a partir do alerta é o conceito operacional convencional mais comum para os operadores de defesa aérea, para alcançar e manter o controle aéreo sobre o espaço aéreo de interesse e interceptar as aeronaves hostis que estejam invadindo o espaço defendido. 

O objetivo da missão é combater a atividade aérea inimiga sobre o campo de batalha e/ou impedir ataques aéreos dentro da área de interesse. A DAS envolve uma abordagem passiva para operações de combate aéreo, e deixa o benefício da iniciativa para o inimigo, aceitando pelo menos algum grau de dano pela ação hostil. É reativo. Por outro lado, os objetivos limitados de missões DAS e o fato de que os caças interceptadores operam relativamente próximos de suas bases, tornam essas missões relativamente mais simples. No entanto, para ser capaz de interceptar intrusos imediatamente na zona avançada, as missões de defesa da área exigem muitas aeronaves posicionadas em muitas bases espalhadas. Este requisito é contrário à tendência no mundo ocidental de diminuir a quantidade de bases aéreas ativas e aeronaves de combate por razões financeiras. 

Como conseqüência, os caças de defesa aérea precisam contar com maior alcance e velocidade para interceptar aeronaves hostis a uma distância segura de seus alvos. Um vetor teoricamente adaptado para o DAS pode ser um tipo leve e de alcance relativamente curto, tendo assim um melhor desempenho de combate ar-ar. Mas, também deve ter uma fuselagem grande o suficiente para transportar um número adequado de armas ar-ar e combustível interno suficiente para uma longa resistência de combate. Além disso, é necessário um número mínimo de aeronaves para garantir as Patrulhas Aéreas de Combate (CAPs), Voos em horários específicos, em áreas previamente designadas também devem ser considerados. 

Por outro lado, o conceito de DAS é menos prático e viável devido à ampla disponibilidade de armas e mísseis de cruzeiro de longo alcance. Para evitar essas ameaças, os combatentes da defesa aérea devem envolver intrusos a longas distâncias, iguais ou maiores do que o alcance de armas isoladas, talvez a mais de 250 km de seus alvos. As exigências do caso tornam o DAS quase impossível, especialmente com um número escasso de caças operando a partir de poucas bases.

A abordagem da Superioridade Aérea Ofensiva (OEA) e com missões de varredura e escolta é a alternativa operacional mais indicada, sendo completamente diferente para o combate aéreo. Consiste em operações ofensivas dentro do território inimigo, executadas não apenas por aeronaves de ataque contra alvos terrestres, mas também por caças de superioridade aérea que buscam investigar, engajar e destruir vetores da defesa aérea inimiga. 

Assim, força-se o inimigo a assumir a defensiva em seu próprio espaço aéreo. Quando as defesas aéreas adversárias estiverem destruídas, o espaço aéreo inimigo torna-se disponível e relativamente seguro para a aviação tática. A OEA obriga o adversário a concentrar a maior parte de seus recursos, incluindo vetores dedicados à defesa aérea e caças-bombardeiro multifunção para defender pontos estratégicos, como usinas de produção de energia e infraestrutura de transporte, bem como as forças militares. Ao limitar uma quantidade substancial de recursos do inimigo para implementar suas próprias operações ofensivas, a OEA também é uma espécie de defesa ativa. Além disso, os vetores da OEA devem ser capazes de operar de forma independente de recursos de suporte, como as plataformas AEW & C2 e EW, além de não depender de nenhuma unidade de controle de solo. Assim, eles precisam de sensores avançados de bordo e sistemas defensivos. Vetores projetados para missões da OEA também cumprirão muitos dos requisitos necessários quando designados em funções de DAS. Por exemplo, uma CAP significativamente longa poderá ser mantida com carga total de combustível, enquanto missões de interceptação de curto alcance seriam realizadas com uma porcentagem de combustível reduzida. A OEA é uma moderna ferramenta de defesa contra qualquer situação que exija demonstração de força e é caracterizada pela velocidade, flexibilidade e eficácia.

O poder aéreo baseado no conceito da OEA pode atingir centros vitais com eficácia, o que potencializa outros instrumentos de combate, sendo a OEA é uma espécie de defesa ativa. Os vetores de superioridade aérea que possuem capacidades como baixa detectabilidade (características furtivas), alta manobrabilidade, velocidade superior, persistência de combate, enlace de dados tático (data-link), sistemas avançados de armas e autoproteção, garantem o acesso, a sobrevivência e a obtenção dos efeitos necessários para vencer um desempenho superior nesta missão.



Vetores de Superioridade Aérea (Caças-Interceptadores)

Aeronaves de combate existem com características das mais variadas, porém nem todas se prestam ao papel de caça e interceptação. As missões afins com a superioridade aérea requerem desempenho superior, pois o interceptador deverá ter a capacidade de enfrentar qualquer outro tipo de aeronave, e em tempo reduzido, a fim de prevenir qualquer ação de aeronaves hostis..

Para sobreviver com sucesso nesse ambiente e cumprir sua missão de proporcionar segurança efetiva a toda uma força e/ou terreno abaixo de seu espaço aéreo, além das outras aeronaves aliadas em vôo, o caça-interceptador dispõem de 7 características que o tornarão mais ou menos efetivo, dependendo da tecnologia disponível e da realidade que enfrentará. Um interceptador será tão mais efetivo quanto mais apuradas forem suas características de baixa detectabilidade (capacidade furtiva), maneabilidade (capacidade de manobra), velocidade (supersônica), persistência em combate, consciência situacional, sistemas de armas e capacidade de sobrevivência frente a ameaças.

A baixa detectabilidade (LO) é a característica que permite à aeronave não ser percebida ou só ser quando for tarde demais. O modelo mais conhecido no ocidente que possui estas características acentuadas (5ª geração) é o F-22 Raptor, e agora mais recentemente o F-35, ambos norte-americanos. Eles possuem características LOs superiores, sem comprometer o alto desempenho de vôo, desejável para o papel principal de superioridade aérea. Em comparação com o F-22, o caça russo Sukhoi-57 (PAK-FA) parece ter uma abordagem mais moderada. Devem estar presentes nestas aeronaves as seguintes características: forma geral projetada visando o desempenho de LO (ausência de cantos, saliências e angulações), sem comprometer o desempenho de vôo; alinhamento da forma da estrutura ao longo de linhas de referência limitadas (ou seja, bordas de ataque e de fuga dos estabilizadores de asa e horizontais), levando em consideração a aerodinâmica; material absorvente de radiação eletromagnética (radar); sensores e antenas integrados com a fuselagem; exaustores vetorados; capacidade de transporte interno das armas; desempenho de supercruzeiro, que reduz a assinatura IR. O controle por vetorização de empuxo permite a redução de dimensões e completa exclusão ou redução dos estabilizadores verticais e horizontais, reduzindo dessa forma a observabilidade do radar também. Outras escolhas de projeto para reduzir ainda mais o RCS podem ser implementadas, porém estas tecnologias agregam alto custo e maior peso. 

A capacidade de sustentar manobras de até 9g e alcançar ângulos extremos de ataque vem sendo priorizada no projeto de novas aeronaves, em detrimento da velocidade. Estas capacidades são importantes como contraponto aos letais AAMs contemporâneos de curto alcance com buscadores de IIR, capazes de envolver alvos fora de sua linha de visada (off-boresight), especialmente quando associados com um HMD. A alta capacidade de manobra é instintivamente relacionada ao combate tipo “dogfight”, mas tem um papel importante como uma última opção de defesa no combate BVR e para evitar AAMs de médio alcance, que possuem energia terminal necessária para envolver alvos em manobra, mesmo no final de sua trajetória, quando os caças em fuga devem ter alto desempenho para esquivar-se de seus perseguidores.

Por outro lado, afirma-se que uma alta taxa de manobrabilidade é eficaz quando se visa a sobrevivência contra sistemas SAMs de geração anterior e mísseis BVR, mas tem pouca valia contra ameaças de última geração. Além disso, afirma-se que os AAMs de curto alcance de alto desempenho integrados ao sistema HMD são mais valiosos que as capacidades aerodinâmicas. Para combinar a vantagem da velocidade e manobrabilidade no ataque, uma aeronave que implementar um rápido desvio do alvo que pode ser executado em velocidade supersônica depois de lançar um míssil, aumenta consideravelmente a distância que um eventual (muito provável) míssil adversário deverá cobrir para atingi-la. A velocidade também reduz o tempo entre as bases aéreas e as áreas de CAP e, assim, aumenta o n[úmero de surtidas possíveis. Além disso, para ser capaz de engajar-se e escoltar uma força de ataque novamente depois de se envolver e derrotar caças inimigos da defesa aérea que podem colocar em risco esta força, a alta velocidade é uma necessidade para os pilotos da superioridade aérea. 

Outro fator importante a um caça de superioridade aérea é sua persistência em combate. Esta característica pode ser descrita na prática como o número de aeronaves hostis que podem potencialmente ser engajadas em uma única surtida. Assim, existem dois parâmetros relacionados à persistência de combate. Um deles é o número e a diversidade das armas transportadas em uma configuração típica de combate aéreo. O outro é o raio de combate determinado pelo combustível disponível. As aeronaves precisam se livrar dos tanques de combustível externos assim que chegarem à área de combate esperada, já que eles causam um “Downgrade” na capacidade de manobra, velocidade e LO. O raio de combate parece ser um critério de desempenho subvalorizado, especialmente em modelos de caça europeus. As equipes de aviação européias aceitaram um conceito de DAS no qual os caças amigos só decolariam quando o adversário estivesse logo além da fronteira de ataque, enquanto a OAS nunca foi considerada. Consequentemente, os últimos três caças europeus - o EF2000, o RAFALE e o GRIPEN - possuem um raio de combate curto, apesar de serem muito bem projetados por outras medidas. A disponibilidade de aeronaves para reabastecimento aéreo potencializa sobremaneira o combustível disponível e reduz em muito o tempo de retorno ao combate, desde que existam ainda armas disponíveis.

O uso de tanques de combustível externos pode ser uma solução para o alcance, mas induz um arrasto adicional que consome até 20-25% de combustível adicional. Este arrasto afeta a velocidade máxima, teto de serviço, aceleração e manobrabilidade negativamente. Além disso, o número de estações disponíveis que transportam armas diminui ao carregar tanques externos, que poderiam ser usados por elas. Estas limitações tornam os tanques de combustível conformais (CFT) muito mais atraentes. Embora uma diminuição no desempenho de manobra tenha que ser aceita, o índice de arrasto é quase o mesmo que para a aeronave “limpa”. Assim, eles impõem uma pequena penalidade ao desempenho total da aeronave. A Lockheed Martin apresentou-os para os últimos F-16, e CFTs similares estão prontos para serem usados ??pelos Rafales, e provavelmente pelos EF-2000 e Gripen também estão sendo projetados. 



Nas operações aéreas, os vários atores que participam de uma determinada missão precisam compartilhar informações sobre a situação tática e as possíveis ameaças em tempo real. Os modernos sistemas dedicados para esse fim são conhecidos como data-link (enlace de dados) e são realmente essenciais para as missões DAS e OEA (é a versão militar do wi-fi que temos em nossa casa). Estes sistemas compõem a suíte eletrônica da maioria das aeronaves de combate modernas e essa capacidade configura-se como um recurso multiplicador de força. Potencializando a funcionalidade do data-link, os MFDs (Multifunction Displays - Monitores Multifuncionais) e HMDs (helmet-mounted display – visor montado no capacete) são usados para apresentar aos pilotos o cenário tático e a demais informações de vôo de forma mais dinâmica, e são capacidades operacionais significativas pois evitam que o piloto tenha que abaixar a cabeça ou ficar procurando a informação dentre muitos mostradores, particularmente no combate ar-ar. 

Por exemplo, um comandante de missão pode gerenciar e controlar seu pacote de força analisando o quadro geral da área de combate e alocando os ativos adequados para o engajamento em alvos específicos, enquanto voa no banco de trás de um caça. Considerando sua contribuição em um nível mais alto, o processamento e a fusão de dados de sensores recebidos via data-link de várias aeronaves em diferentes posições geográficas fornecem a capacidade de identificação positiva e engajamento de alvos em intervalos muito longos. O data-Link também é usado entre a aeronave de lançamento e seus mísseis BVR, para atualizar os dados de posição de destino durante a fase de orientação inercial do míssil. Além disso, mísseis como AIM-120 e METEOR estão sendo projetados para confirmar a aquisição de alvos com seus buscadores de radar ativos. Isso significa que data-links de mísseis bidirecionais estarão em uso em futuro previsível.

Os sistemas de armas disponíveis ainda são objeto de considerações. Se uma aeronave de interceptação realmente precisa de sistemas de armas orgânicos (canhão interno) ou não, tem sido discutido há muito tempo. No entanto, considerando alguns fatores, avalia-se que a arma interna é uma conveniência necessária. Qualquer míssil, incluindo o mais capaz, terá sempre um alcance mínimo de engajamento no qual um piloto não será capaz de lançá-lo. Além disso, não é possível usar um AAM como um tiro de aviso, embora a arma possa ser usada como um sinal de alerta. Também um AAM não pode ser usado contra alvos ar-solo, enquanto o canhão oferece essa versatilidade. No entanto, poucas aeronaves hostis tem sido abatidas por ataques de armas orgânicas em combates aéreos desde a Guerra do Vietnã, com apenas 5% dos abates ar-ar realizadas durante as Operações “Desert Tempest” e e “Iraq Freedom” foram realizados usando estas armas. 


Os HMDs compatíveis com os AAMs de curto alcance mais recentes, associados aos canhões orgânicos são considerados tão letais quanto os mísseis e podem ser mais eficazes do que eles no Combate tipo “Dogfight” (CIC Close-in Combat). Embora alguns especialistas em combate aéreo afirmem que a "era do duelo" acabou, a probabilidade de encontrar uma aeronave inimiga a curta distância não pode ser descartada. Na verdade, esse risco de encontro se tornará mais alto entre aeronaves similares com características de LO, devido à quantidade substancial de redução em sua capacidade de busca e rastreamento de sensores.

O desenvolvimento de motores de foguete de múltiplos estágios para mísseis BVR estende a faixa de engajamento e, mais importante, proporciona alta capacidade de manobra ao longo de sua trajetória, mesmo na etapa final para o alvo. Esse recurso permite que um caça execute efetivamente um engajamento de precisão de longo alcance. Mas enquanto os problemas de alcance e manobrabilidade dos AAMs estão sendo resolvidos, a identificação positiva de alvos (IFF) a longas distâncias antes do engajamento continua sendo um grande problema para os combatentes da superioridade aérea. 

O aumento contínuo, tanto do alcance efetivo, quanto da orientação precisa dos AAMs de última geração é uma ameaça crucial que precisa ser considerada ao se analisar os combates ar-ar BVR e WVR. Contramedidas atuais tomadas para evitar o “lock-on” e desviar o míssil que se aproxima, geralmente consistem em sistemas de FLARES / IR, CHAFFs e chamarizes de radar rebocados (TRD) . Além disso, um RWR de cauda foi instalado na parte traseira de alguns caças russos, como o SU-32FN e o SU-34, para cobrir o hemisfério traseiro. Embora sistemas conceitualmente similares não sejam atualmente práticos para lutadores devido a preocupações com tamanho, peso e resistência aerodinâmica, ele permanece como um requisito vital.


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