FRASE

"Quem escolhe a desonra a fim de evitar o confronto, a conseguirá de pronto, e terá o confronto na sequência."
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segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

Guerra Eletrônica - O Espectro Eletromagnético *189



Guerra Eletrônica - Generalidades

Denomina-se espectro eletromagnético (EEM) ao conjunto de frequências de radiação eletromagnética, utilizáveis ou não, que compõem o universo desta importante componente física. É utilizado militarmente na transmissão de informações e endereçamento de armas através de enlaces de rádio, na construção de armas de pulso eletromagnético e nas operações de sensoriamento de todos os tipos como a operação de radares e dispositivos MAGE, sendo o elemento principal na coleta de informações de combate, marcação de alvos e comunicações militares entre outros, e seu uso é vital aos sistemas de guerra modernos. Devido a sua velocidade de propagação (próxima aos 300.000 km/s – velocidade da luz) se presta a conexão instantânea ou próximo disto, aos enlaces de transmissão de informações de todos os tipos nas distâncias terrestres, e com atrasos crescentes nas distâncias extraterrestres. É o campo de batalha das operações de guerra eletrônica (EW).

Antes do advento dos “tempos modernos”, marcados pela tecnologia mais recentemente dominada nos últimos séculos, a parte do espectro utilizada pelo homem sempre foi a luz visível, embora sem se dar conta que ela era componente de um conjunto de radiações bem mais amplo. A radiação infravermelha (IR) também foi utilizada intensamente pelos séculos de forma primária, pois é através que o calor se propaga. Os gregos antigos fizeram os primeiros estudos do comportamento da luz visível e registraram as primeiras teorias, incluindo os fenômenos da refração e reflexão, comum a todos os tipos de ondas. William Herschel fez as primeiras descobertas em 1800 além da luz visível, teorizando que “raios caloríficos” não visíveis eram um tipo de luz além da luz, descobrindo a radiação infravermelha (IR) em um extremo do espectro visível. A radiação ultravioleta (UV) foi descoberta por Johann Ritter em seguida, como uma forma de “radiação química”, que induzia certas reações químicas, no outro extremo do espectro visível.

Em 1845 Michael Faraday relacionou radiação eletromagnética com eletromagnetismo, e em 1860 James Maxwell desenvolveu equações relacionais, percebendo que a radiação deslocava-se em velocidades próximas à da luz e sugerindo que a própria luz é uma forma desta radiação. Maxwell previu um número infinito de frequências e sua inserção em um coletivo maior que foi denominado espectro eletromagnético. Por volta de 1886 Heinrich Hertz descreveu as ondas de baixa frequência (rádio) e as micro-ondas situando-as abaixo do IR, e em 1895 Wilhelm Rontgen descobriu os raios-X no outro extremo do espectro, e em 1900 Paul Villard identificou os raios gama em altíssima frequência, com Willian Henry Bragg demonstrando em 1910 estes também serem radiação eletromagnética e não partículas, como sugerido.

A radiação eletromagnética viaja pelo meio através de ondas e todas estas ondas são basicamente a mesma forma de radiação. Todas elas podem transpor o espaço vazio ao contrário das ondas sonoras que são mecânicas, e deslocam-se à velocidade da luz no vácuo do espaço cósmico. A diferença básica entre os tipos de radiação são as diferentes frequências. Cada frequência tem um comprimento de onda associado. À medida que a frequência aumenta em todo o espectro, o comprimento de onda diminui. A energia transportada também aumenta com a frequência. Por esse motivo, frequências mais altas penetram na matéria mais rapidamente. A frequência é inversamente proporcional ao comprimento de onda, e qualquer forma desta radiação também pode ser representada por sua faixa de comprimentos de onda.

As ondas eletromagnéticas podem variar de comprimentos de muitos quilômetros ou até anos-luz, a tamanhos subatômicos. Quanto maior a frequência de uma onda, menor é seu comprimento e mais tecnologia é necessária para que seja utilizada e manipulada. Cada faixa de frequências é vocacionada para um conjunto de aplicações específicas, podendo estas se sobreporem com suas vantagens e desvantagens, e nominadas em 7 grandes grupos distintos, sendo que estes grupos se sobrepõem em seus extremos, que possuem características de ambos os grupos, o que torna dificílimo estabelecer um limite claro entre eles.

Estes grupos são:

1. Ondas de rádio,
2. Micro-ondas,
3. Infravermelho (IR),
4. Luz visível,
5. Ultravioleta (UV),
6. Raios X
7. Raios gama.

Ondas de Rádio

As faixas de menor frequência do espectro são as denominadas “ondas de rádio”, que podem ser recebidas e emitidas por antenas comuns, sendo a parte mais facilmente manipulável. A atmosfera é transparente a estas ondas de forma relativa, pois permite que elas viajem de uma antena a outra, porém camadas da ionosfera podem refleti-las dependendo da frequência. Esta reflexão permite que estas ondas tenham um longo alcance à custa de interferência atmosférica mais pesadas nas frequências de maior alcance, e permite transmissões como a dos radares OTH e rádio de ondas médias. Acima das ondas de rádio vem a faixa de micro-ondas que não tem a propriedade de reflexão atmosférica e viajam como a luz visível.

A faixa de frequências mais baixa do EEM é a de Ultra Baixa Frequência (ULF), que vai de 300 Hz a 3 kHz e podem viajar tanto pela atmosfera quanto pela água sem grande atenuação, penetrando inclusive camadas de terra sólida. É usada na comunicação com submarinos e dispositivos subaquáticos, na exploração de minas e possui a desvantagem de carregar pouca informação como por exemplo o código morse, sendo a largura da banda muito estreita. Antenas inseridas no solo podem ser usadas para conectar receptores em alcances limitados, como já experimentado por radioamadores, e sistemas mais modernos pode fazer o papel de “GPS” para localização e orientação dentro de ambientes confinados. Suas ondas são muito longas e exigem grandes antenas. Observou-se que grandes terremotos são precedidos por picos de emissões ULF, sendo que esta frequência poderá vir a ser utilizada também para este fim, assim que o fenômeno for melhor compreendido.

Na faixa de 3 kHz até os 30 kHz temos as chamadas Muito Baixa Frequência (VLF), também muito limitada na transmissão de informações porém com bandas mais largas, e utilizada em sistemas de navegação e comunicação submarinas com penetração de 10 a 40 m dependendo da frequência e salinidade, mas ainda muito estreita para carregar sinais de áudio, prestando-se como a anterior à transmissão de códigos. É refletida pela ionosfera e pode ser usada para conexões de grandes distâncias, em sinais de navegação e nas aplicações citadas na banda anterior como a conexão em minas e radioamadores.

Acima dos 30 kHz até os 300 kHz temos a Baixa Frequência (LF) ou “ondas longas”, banda esta que tem a propriedade de poder se propagar na atmosfera em torno do globo, por reflexão na ionosfera ou na própria superfície, assim como as VLF, podendo ser usadas nas comunicações de longa distância por transpor montanhas e seguir os contornos do globo. Está sujeita no entanto, a interferência atmosférica de forma intensa como todas aquelas que são refletidas, carregando consigo muito estática que deteriora em muito a qualidade das transmissões. Foi usada em radiofaróis (LORAN-C 100 kHz, Decca 70 e 129 kHz) e possuem a propriedade, como as bandas inferiores, de penetração submarina nas frequências abaixo dos 50 kHz, são usadas ainda pelos rádio-amadores e telemetria de GPS nos 283 e 325 kHz. Propaga-se por até 2000 km pelo solo.

Acima dos 300 kHz até os 3 MHz temos a Média Frequência (MF) ou “ondas médias” que são refletidas pela ionosfera de forma mais acanhada que as LF, porém no período noturno permite que estações de rádio (rádio AM) alcancem centenas e até milhares de km. É usada na radiodifusão AM, sinais de rádio de navegação , comunicação marítima navio-terra e controle de tráfego aéreo transoceânico. Permite a transmissão digital com qualidade semelhante ao VHF (FM).

Entre os 3 MHz até os 30 MHz temos a Alta Frequência (HF), banda também conhecida como “ondas curtas”, usada para o radiocontrole devido a possibilidade de codificar mais informações a medida que a frequência sobe. Assim como as LF e MF também são usadas na comunicação de longa distância por sua propriedade de reflexão na ionosfera.

Acima dos 30 MHz até os 300 MHz temos a Muito Alta Frequência (VHF), usadas na transmissão de rádio FM e canais de TV, comunicações militares táticas e comunicação e navegação aérea (VOR e ILS). Apresenta boa qualidade de transmissão e baixa interferência atmosférica, capaz de realizar transmissões digitais. Não pode ser refletida pela ionosfera e propaga-se em distâncias livres de obstáculos, não tendo por este motivo alcances muito longos.

Logo após temos dos 300 MHz aos 3 GHz a Ultra Alta Frequência (UHF) com as mesmas aplicações do VHF, porém com um número de canais muito maior devido à largura da banda. Usado em transmissões de rádio e TV, comunicações militares e aeronáuticas, GPS, telefonia celular entre outras.

Micro-ondas

As faixas subsequentes são as “microondas”, assim denominadas devido ao seu pequeno comprimento em relação às da primeira faixa, embora é claro, existam frequências da primeira faixa localizadas próximas a estas e que partilham de características semelhantes. Medem de 100 mm a 1 mm de comprimento são ondas de rádio muito curtas, e se propagam pela linha de visão com alcance máximo de 64 km em uma extremidade e não mais que 1 km na extremidade superior, não sendo capaz de se refletir na ionosfera, transpor montanhas ou se propagar pelo solo, sendo muito atenuadas pela umidade atmosférica e pela chuva. Convencionadas como as integrantes das faixas SHF e EHF.

SHF Super Alta Frequência (super high frequency) que comporta as bandas NATO F, G, H, I, J e K (esta última ondas milimétricas) no intervalo de 3 até 30 GHz, usadas na comunicação terrestre e com satélites, radares de todos os tipos e comunicação omnidirecional.

EHF Extra Alta Frequência (extremely high frequency) também conhecidas como “ondas milimétricas” (acima dos 20 GHz) que comporta as bandas NATO L e M no intervalo entre 30 e 300 Ghz, sendo a faixa mais altas das radiofrequências. Possuem alcance muito curto por serem altamente atenuadas pela umidade atmosférica, o que permite que sejam reutilizadas. Permite a produção de antenas muito pequenas que podem produzir feixes muito estreitos, difíceis de monitorar e com alta resolução de sinais. Existem janelas de 35, 94, 140 e 220 GHz que permitem alcances maiores.

As micro-ondas não podem ser manipuladas por antenas comuns, tendo as suas próprias, e necessitando de dispositivos denominados válvulas (válvulas termoiônicas) Krystron e Magnetron para sua utilização, que aquecem muito e demandam por consequente mais energia. Como as ondas de rádio de menores frequências podem penetrar as superfícies, embora com menor poder. Não podem ser conduzidas por fios tradicionais e utilizam dispositivos denominados guias de ondas para seu manejo. As frequências EHF ainda não são muito usadas para comunicação via rádio, devido à dificuldade tecnológica de codificar e decodificar amplitude e modulação de frequência tão altas.

Infravermelho (IR)

A faixa subsequente do espectro (infravermelho – IR) cobre as frequências de 300 GHz a 400 THz ( 1mm a 750 nm) e é separada em 3 sub-faixas: O infravermelho (IR) distante de 300 GHz a 30 THz que ainda se confunde com as micro-ondas. É uma faixa de radiação denominada terahertz ou sub-milimétrica na faixa de 100 GHz a 30 THz que engloba uma porção da faixa anterior, até então pouco utilizada, e que está sendo estudada na construção de dispositivos de incapacitação de meios eletrônicos inimigos. Esta região do espectro é fortemente atenuada pela atmosfera (que fica opaca) não se prestando a aplicações de longa distância. Algumas pequenas janelas nesta faixa permitem aplicações na astronomia por possibilitarem alguma forma de transmissão. O IR médio vai de 30 THz a 120 THz e é usada pelos irradiadores de calor, que é fortemente absorvida pelos corpos em geral e usada nos mísseis guiados pelo calor mais antigos, por exemplo. O IR próximo vai de 120 THz a 400 THz e se comporta de modo semelhante a luz visível. É usada para sensoriamento de imagens de estado sólido e na guiagem dos mísseis IR mais recentes (IIR), que trabalham com formação de imagens. Uma aplicação mais recente são os sensores IRST, que se comportam como radares passivos, já muito empregado na aviação de caça. Os FLIR trabalham com a elaboração de imagens e também atuam nesta faixa do IR.

Espectro Visível (luz)

Ocupando a próxima faixa do espectro vem a luz visível imediatamente acima da radiação IR, onde o sol atua no seu pico de potência, que também emite radiação IR em grande quantidade, entre outras. É a faixa do espectro que pode ser captada pelo olho humano, limitada em seu extremo inferior pela radiação vermelha e no superior pela radiação violeta, e ocupa a faixa dos 400 THz até os 790 THz. Como o olho humano capta toda esta faixa ao mesmo tempo, sua combinação resulta na luz branca, que é uma combinação de várias frequências luminosas. As guias de fibra ótica podem utilizar esta radiação, mas comumente usam as do IR próximo.

Radiação Ultravioleta (UV)

Acima do espetro visível a aplicação militar é pouco significativa, vem a radiação ultravioleta (UV) e que tem o poder de ionizar átomos, usada na manipulação de reações químicas. Juntamente com a radiação de raios-X e raios gama é chamada de radiação ionizante, e sua exposição pode danificar o tecido vivo. Juntamente com a luz visível provoca o fenômeno da fluorescência. A faixa intermediária da radiação UV não tem poder de ionização, mas pode quebrar ligações químicas, tornando as moléculas extraordinariamente reativas. As queimaduras solares, por exemplo, são causadas pelos efeitos perturbadores da radiação UV de médio alcance nas células da pele, que é a principal causa do câncer de pele. Os raios UV na faixa intermediária podem danificar irreparavelmente as complexas moléculas do DNA.

O Sol emite radiação UV significativa, incluindo radiação UV extremamente curta que pode potencialmente destruir a maior parte da vida. No entanto, a maioria dos comprimentos de onda UV prejudiciais do Sol é absorvida pela atmosfera antes de atingir a superfície. As faixas mais altas de energia (menor comprimento de onda) de UV (chamadas de "UV a vácuo") são absorvidas pelo nitrogênio e, em comprimentos de onda mais longos, pelo simples oxigênio diatômico no ar. A maior parte dos raios UV na faixa intermediária de energia é bloqueada pela camada de ozônio, que absorve fortemente na faixa importante de 200–315 nm, cuja parte de energia mais baixa é muito longa para o CO2 atmosférico absorver. Isso deixa menos de 3% da radiação solar ao nível do mar em UV, com tudo isso nas energias mais baixas. O restante é UV-A, junto com alguns UV-B. A faixa mais baixa de energia UV entre 315 nm e luz visível (chamada UV-A) não é bem bloqueada pela atmosfera, mas não causa queimaduras solares e menores danos biológicos. No entanto, não é inofensivo e cria radicais de oxigênio, mutações e danos à pele. 

Raios X

Acima da faixa UV temos os raios-X que podem atravessar corpos com pouca absorção, permitindo a formação de imagens, muito usados na medicina e astronomia. A atmosfera é opaca aos raios-X, devendo os telescópios que utilizam esta radiação serem colocados fora dela. Uma camada de 10 m de água é suficiente para bloquear a maior parte dos raios-X astronômicos.

Raios Gama

E na camada superior do espectro temos os raios gama (radiação ionizante), com alta capacidade de penetração e muito nocivos ao tecido vivo a aos circuitos eletrônicos. São usados na medicina e agricultura nas funções de esterilização, como por exemplo a radioterapia de tratamento do câncer. São resultantes do decaimento radiativos dos núcleos atômicos, e sub-produto de reatores nucleares e armas que utilizam a divisão do átomo, podendo ser bloqueados de forma criteriosa por materiais densos como chumbo e concreto. No campo de batalha terrestre também estão presentes de forma indesejável nas munições APFSDS feitas de urânio empobrecido, causando danos a saúde dos combatentes, e como subproduto indesejável de explosões nucleares.

sábado, 31 de agosto de 2019

A Guerra das Falklands/Malvinas sob o enfoque da Guerra Eletrônica *175



Ensinamentos para a FAB

Cap Av Luciano Barbosa Magalhães


Resumo:

O estudo objetivou analisar como os recursos de Guerra Eletrônica (GE) utilizados na Guerra das Malvinas/Falklands contribuíram para o resultado do conflito. Para isso, realizou-se uma pesquisa explicativa, baseada na técnica de coleta de dados secundários e posterior análise estatística dos resultados, visando identificar os princípios mais importantes de GE envolvidos. Também foi utilizado o instrumento do estudo de caso para estabelecer um paralelo entre os recursos de GE utilizados durante a Guerra das Malvinas/Falklands e os atuais recursos da FAB. A pesquisa iniciou-se com a análise da utilização de mísseis ar-ar infravermelhos de 3ª geração nos combates aéreos. Após isso, verificou-se a suscetibilidade das aeronaves argentinas em função dos equipamentos de autodefesa existentes nelas. Em seguida, analisou-se a influência do conhecimento prévio das características do míssil Exocet argentino por parte da Inglaterra. Após isso, verificou-se o impacto da utilização do Míssil Anti-Radiação (MAR) contra os radares argentinos nas Ilhas Malvinas. Finalmente, este artigo estabeleceu um paralelo entre os recursos de GE utilizados durante a Guerra das Malvinas e os atuais recursos de GE da Força Aérea Brasileira (FAB). Dessa forma, foi possível extrair alguns ensinamentos que podem melhorar não só a utilização desses equipamentos e conceitos, mas também a alocação dos recursos financeiros na aquisição de equipamentos de GE essenciais para a FAB.


INTRODUÇÃO

Nos últimos dez anos, a Força Aérea Brasileira (FAB) tem adquirido diversos equipamentos de Guerra Eletrônica (GE), a fim de renovar a sua frota e de manter-se pronta para a defesa da soberania da pátria. Os parcos recursos financeiros disponíveis possibilitaram a aquisição de alguns equipamentos de GE, em detrimento de outros. Cumpre ressaltar que a escolha, em tempo de paz, de quais equipamentos adquirir pode ser primordial no momento de um conflito.

Como a última vez que a FAB participou de um conflito armado foi durante a II Guerra Mundial, utilizar as lições aprendidas com a Guerra das Malvinas poderá fornecer subsídios que, em tese, contribuirão para uma melhor alocação dos recursos financeiros na aquisição dos equipamentos de GE julgados necessários.

Dessa forma, na presente pesquisa, procura-se medir a influência dos recursos de GE, utilizados durante a Guerra das Malvinas, que contribuíram para o resultado do conflito, e extrair os ensinamentos deixados, visando estabelecer um parâmetro de comparação com os atuais recursos de GE existentes na FAB.

De que maneira os recursos de GE utilizados pela Argentina e pela Inglaterra nas Malvinas contribuíram para o resultado do conflito?

Visando solucionar esse problema, este trabalho tem como objetivo geral analisar como os recursos de Guerra Eletrônica, utilizados pelos dois países envolvidos na Guerra das Malvinas, contribuíram para o resultado do conflito.


Para que o objetivo geral seja alcançado, serão adotados cinco objetivos específicos:

  1. analisar a influência da utilização de míssil ar-ar infravermelho, de 3ª geração (“all aspect”), pelas aeronaves inglesas, contra as aeronaves argentinas, durante os combates aéreos;
  2. analisar o impacto dos equipamentos de autodefesa, utilizados nas aeronaves argentinas, durante a execução das missões de ataque à frota da Marinha Inglesa;
  3. analisar a influência do conhecimento prévio das características do radar do míssil antinavio argentino (Exocet) por parte dos ingleses;
  4. verificar o impacto da utilização de Míssil Anti-Radiação (MAR) contra os radares argentinos instalados nas Ilhas Malvinas;
  5. estabelecer um paralelo entre os recursos de GE utilizados durante a Guerra das Malvinas e os atuais recursos de GE da FAB.

Com relação aos quatro primeiros objetivos específicos supracitados, existem quatro hipóteses a serem analisadas:

  1. a utilização de um míssil ar-ar infravermelho, de 3ª geração (“all aspect”), pelas aeronaves inglesas, nos combates aéreos contra as aeronaves argentinas, permitiu maior exploração do espectro eletromagnético na faixa do infravermelho, o que resultou num grande número de aeronaves abatidas e, conseqüentemente, na diminuição da capacidade de combate dos argentinos;
  2. os equipamentos de autodefesa, utilizados nas aeronaves argentinas, por possuírem diminuta capacidade de perceber e de se contrapor aos diversos armamentos enfrentados durante as missões de ataque aos navios ingleses, resultaram num grande número de aeronaves abatidas e, conseqüentemente, na diminuição da capacidade de combate;
  3. o conhecimento prévio das características dos radares dos mísseis antinavio (Exocet) pode ter propiciado contramedidas eletrônicas pela frota inglesa, diminuindo a efetividade dos mísseis e, conseqüentemente, reduzindo a capacidade de destruição dos argentinos; e 
  4. o emprego de MAR contra os radares argentinos pode ter, mesmo que temporariamente, restringido o alarme antecipado, aumentando a suscetibilidade das aeronaves argentinas.

Visando atingir os objetivos estabelecidos, será realizada uma pesquisa explicativa, baseada na técnica de coleta de dados secundários.
Posteriormente, será realizada a análise estatística dos resultados e a identificação dos principais princípios de GE envolvidos.
Por último, será realizado um estudo de caso, como instrumento metodológico para se estabelecer um paralelo entre os recursos de GE utilizados durante a Guerra das Malvinas e os atuais recursos da FAB.


REFERENCIAL TEÓRICO

Schleher (1999) define Guerra Eletrônica (GE) como qualquer ação militar envolvendo o uso de ondas eletromagnéticas e energia direcionada, para controlar o espectro eletromagnético ou atacar o inimigo.

Ao analisar as ações militares dos países envolvidos no conflito, percebe-se que utilizaram diversos recursos de GE para obter, conforme definiu Schleher (1999), o controle do espectro eletromagnético e o sucesso no ataque ao inimigo.

Estudando o uso do espectro eletromagnético, pelos dois países, talvez seja possível verificar como os recursos de GE foram significativos no resultado do conflito.



O AIM-9L SIDEWINDER

A Argentina possuía um acervo de aproximadamente 110 caças ou caças-bombardeiros, distribuídos da seguinte forma: 11 Mirage III, 05 Super Etendard, 57 A-4 Skyhawk e 34 Dagger (ETHELL, 1983).

Ao longo do conflito, a Força Tarefa Britânica utilizou 28 aeronaves Sea Harrier e 10 aeronaves Harrier embarcadas nos porta-aviões Hermes e Invincible, (UDEMI,1989).

Uma visão geral das principais aeronaves e seus armamentos ar-ar associados, utilizados no conflito, pode ser observada na Tabela 1.


A maior ameaça aérea para os ingleses vinha dos Mirage III, em função dos mísseis que os equipavam (UDEMI, 1989). Visando contrapor-se aos mísseis argentinos, foram instalados sistemas de lançamento de chaff e flare do tipo ALE-40 (BRAYBROOK, 1984). Além disso, todos os Harrier e Sea Harrier foram equipados com mísseis ar-ar AIM-9L, ou seja, com mísseis infravermelhos de terceira geração.

O míssil infravermelho, de terceira geração, possuía a vantagem de detectar o alvo num comprimento de onda que era possível identificar, não só as partes quentes da tubeira, mas também os gases de exaustão da aeronave, isso graças a um novo material empregado no detector, o Antimoneto de Índio (InSb), e à refrigeração (SCHLEHER, 1999). Isso permitia que o míssil fosse lançado em qualquer ângulo de apresentação da aeronave alvo, diferentemente dos mísseis de gerações mais antigas, como o Matra Magic R550 e o Shafrir, os quais detectavam apenas as partes quentes da tubeira, só permitindo o lançamento pelo setor traseiro do alvo (JANE’S, 2003).

Segundo Arcangelis (1985), era necessário conceber um detector que reagisse em comprimentos de onda próximos a 5  m, correspondente aos gases de exaustão do motor, enquanto que os mísseis de primeira e segunda gerações tinham sensores que reagiam próximos de 2,5  m, correspondendo não só às emissões do metal incandescente da tubeira, mas também às dos raios de sol refletidos pelas nuvens.

Dessa forma, percebe-se que os mísseis da terceira geração, em relação às duas gerações anteriores, pareciam explorar melhor a faixa do espectro eletromagnético, pois conseguiam captar uma gama maior de emissões geradas pelo alvo, propiciando uma solução de tiro em qualquer ângulo de apresentação da aeronave oponente.

Entre os mísseis ar-ar utilizados no conflito, apenas o Matra R530 era do tipo radar semi-ativo, ou seja, o radar da aeronave lançadora iluminava o alvo e o míssil se guiava pelas ondas que eram refletidas de volta pelo alvo (SHAW, 1986).



Segundo Arcangelis (1985), todos os Harrier e Sea Harrier eram equipados com Radar Warning Receiver (RWR) e lançadores de chaff e flare. Isso fazia com que os pilotos britânicos pudessem saber quando o míssil Matra R530 havia sido lançado, bem como efetuar o lançamento de chaff, resultando na perda de acoplamento do radar inimigo.

Das aeronaves argentinas, apenas os Super Etendard e os Dagger eram equipados com RWR (ARCANGELIS, 1985). Algumas receberam chaff e flare próximo ao final da guerra (ETHELL, 1983). O flare pode ser efetivo contra os mísseis infravermelhos das primeiras gerações, pois esses se fixam nos pontos mais quentes, na faixa de 1 a 3 m, ou seja, em temperaturas compreendidas entre 1300 e 2000 Kelvin (SCHLERER, 1999).

Segundo Ethell (1983), no dia 1º de maio de 1982, a Argentina possuía 256 aeronaves disponíveis para combate. No entanto, 17 delas foram abatidas exclusivamente por mísseis AIM-9L. Portanto, ao término do conflito, pode-se constatar que 6,64% das aeronaves argentinas foram abatidas por um AIM-9L.

O total de aeronaves argentinas de caça, caça-bombardeio, bombardeio e ataque era de 146 (ETHELL, 1983). 

Considerando que esses vetores constituíam as aeronaves de combate, uma vez que ofereciam um risco direto à frota e às aeronaves inglesas, pode-se dizer que os AIM-9L foram responsáveis por abater 11,64% desse total.

Nenhum bônus foi creditado aos mísseis ar-ar utilizados pela Argentina, bem como nenhum Sea Harrier foi perdido em combate aéreo (NORDEEN, 2002).

Dessa forma, pode-se constatar que a utilização do míssil ar-ar infravermelho  de 3ª geração permitiu maior exploração do espectro eletromagnético na faixa do infravermelho, o que resultou num grande número de aeronaves abatidas e, conseqüentemente, na diminuição da capacidade de combate dos argentinos, havendo indícios de que a primeira hipótese foi corroborada.



OS EQUIPAMENTOS DE AUTODEFESA ARGENTINOS

Segundo Ball (1985), a sobrevivência de uma aeronave é definida como a capacidade de ela resistir às hostilidades ambientais feitas pelo homem ou de evitá-las. A incapacidade de uma aeronave evitar os radares, mísseis guiados, explosões das cabeças de guerra, armamentos de cano e demais elementos de um ambiente hostil é definida como suscetibilidade. 

Portanto, para que se possa aumentar a sobrevivência da aeronave em combate é preciso diminuir a sua suscetibilidade. Para reduzir a suscetibilidade podem ser utilizados diferentes tipos de contramedidas eletrônicas, agrupadas nos seguintes conceitos (BALL,1985):

  1. alarme de ameaça (RWR);
  2. bloqueadores e despistadores;
  3. redução de assinatura;
  4. descartáveis (chaff e flare);
  5. supressão da ameaça; e
  6. táticas.

A aplicação específica de cada uma delas tem se dado por faixas importantes do espectro eletromagnético, tais como a radar, a infravermelha e a visual.

Em muitas situações de combate elas são combinadas para degradar o sistema de defesa aéreo inimigo (BALL, 1985).

Dessa forma, analisando as aeronaves argentinas, percebe-se que a escassez de equipamentos de GE pode ter contribuído para as perdas sofridas durante os ataques aéreos à frota da Marinha Britânica. 



De acordo com a Tabela 2, apenas dois tipos de aeronaves utilizaram o conceito de alarme de ameaça, possuem um RWR para localizar e identificar as ameaças nas vizinhanças da aeronave, o que permite ao piloto identificar a aproximação de mísseis e perceber que a aeronave estava, sendo iluminada por algum radar (BALL, 1985).

Segundo Ball (1985), as duas técnicas de emissão de radiação mais empregadas para reduzir a suscetibilidade de uma aeronave são obtidas por meio da utilização de bloqueadores e despistadores.

O bloqueador pode ser utilizado para mascarar o eco da aeronave, ao passo que o despistador transmite sinais para enganar ou confundir o sistema inimigo. A utilização desses equipamentos evitaria que os radares detectassem, identificassem e rastreassem o alvo, impedindo a utilização de míssil radar ou de artilharia de cano. Se as aeronaves argentinas tivessem a capacidade de bloquear os radares dos armamentos ingleses, eles poderiam ter tido uma maior taxa de sobrevivência (GREEN, 2005).

Com relação à redução de assinatura pelas aeronaves argentinas, nenhum registro foi encontrado. É possível que não tenha sido explorada.

Os descartáveis (chaff e flare) são materiais ou dispositivos projetados para serem ejetados de uma aeronave, com o propósito de despistar o sistema de acoplamento de uma ameaça por um determinado período de tempo (BALL, 1985).

Conforme a Tabela 2, apenas algumas aeronaves, no final do conflito, receberam esses tipos de contramedidas (ETHELL, 1983). O treinamento não preparou adequadamente os pilotos argentinos para efetuarem o lançamento de chaff e flare, pois não os utilizaram corretamente diante da ameaça inimiga (GREEN, 2005).

De acordo com Ball (1985), a supressão de ameaças consiste em ações tomadas pelas forças amigas com a intenção de danificar, ou destruir fisicamente, um sistema de ameaça. Entretanto, esse conceito não será abordado, uma vez que a Argentina não possuía MAR.

Os argentinos exploraram o conceito de tática de forma simples e inteligente, pois se dirigiam simultaneamente a um mesmo alvo, visam saturar os radares e outras defesas antiaéreas dos navios, além de voarem quase no nível do mar, com todos os seus radares e demais equipamentos emissores de ondas eletromagnéticas desligados. Dessa forma, não havia quase nenhuma radiação eletromagnética para ser detectada (ARCANGELIS, 1985).

Desconsiderando-se a atuação dos Harrier e Sea Harrier no conflito, uma vez que já foi comentada anteriormente, a defesa aérea da frota britânica era provida por 52 navios (CHANT, 2001). Além dos armamentos embarcados nos navios, utilizados para prover a defesa antiaérea, serão abordados também os empregados em superfície, pois foram destinados a apoiar os navios e tropas durante o desembarque nas ilhas.

Entre os navios britânicos, sete eram armados com o míssil Sea Dart, dezessete com o Sea Cat e dois com o Sea Wolf. Muitos eram equipados com canhões de 4.5 polegadas, 20 mm e 40 mm (NORDEEN, 2002).



O míssil Blowpipe, além de empregado no desembarque, também foi utilizado dos conveses dos navios, enquanto os mísseis Rapier protegiam as áreas de pouso. O míssil Stinger, utilizado pelas tropas de comandos britânicas, também foi utilizado para apoiar o desembarque nas Ilhas Malvinas (NORDEEN, 2002).



A Tabela 3 apresenta um resumo das principais características dos sistemas de mísseis utilizados pela frota inglesa. A falta de equipamentos de GE, para impedir o uso do espectro eletromagnético pelos sistemas de armas da frota inglesa, pode ter aumentado a suscetibilidade das aeronaves argentinas e, conseqüentemente, diminuído o seu percentual de sobrevivência, já que 27 delas foram destruídas por esses sistemas (MORO, 2003). 

A frota britânica abateu 10,54% das aeronaves argentinas empregadas. Além disso, pode-se dizer que a Força Tarefa Britânica foi responsável por abater 18,49% das aeronaves de combate argentinas.

Portanto, analisando os equipamentos de autodefesa utilizados nas aeronaves argentinas, por possuírem diminuta capacidade de perceber e de se contrapor aos diversos armamentos enfrentados durante as missões de ataque aos navios ingleses, pode-se inferir que tenham sido responsáveis pelo grande número de aeronaves abatidas e,conseqüentemente, tenham contribuído para a diminuição da capacidade de combate, corroborando-se a segunda hipótese.



AS DEFESAS CONTRA O EXOCET

O sistema de armas composto pelo Super Etendard e pelo míssil anti-navio Exocet havia sido recentemente incorporado pela Armada Argentina, apenas cinco unidades de cada um desses equipamentos foram entregues pela França
(MORO, 2003).

No dia 04 de maio de 1982, duas aeronaves Super Etendard, cada uma equipada com um míssil Exocet, decolaram para atacar dois navios, localizados a cerca de 70 NM das Malvinas. Elas eram equipadas com o Agave, um radar monopulso, que operava na banda I (8 a 10 Ghz) (ARCANGELIS, 1985).

As aeronaves navegaram a baixa altura, para evitar a detecção radar. A 25 NM de distância dos navios, os Super Etendard subiram para 500 ft, ligaram seus radares para localizar a frota, programaram os computadores dos mísseis Exocet, depois desligaram os radares e voltaram novamente para a altura de vôo inicial. 

A 23 NM efetuaram o lançamento e retornaram para a base (ARCANGELIS, 1985). Durante o breve momento em que as aeronaves argentinas ligaram seus radares, um navio britânico interceptou as emissões e alertou o restante da frota. O Controle de defesa aérea do Hermes identificou as emissões como sendo do Mirage III, jamais imaginaram que fossem do Super Etendard. Os ingleses achavam que os argentinos ainda não estivessem treinados para efetuar o emprego dos mísseis Exocet de suas aeronaves. Por essas razões, os britânicos não deram a devida importância para as emissões radar (ARCANGELIS, 1985).

Naquele exato momento, o HMS Sheffield estava transmitindo e recebendo mensagens via satélite, uma operação que requeria a desativação de todos os outros equipamentos transmissores de energia eletromagnética, razão pela qual os radares do navio não detectaram nem os aviões, nem os mísseis. 

Além disso, o sistema de Medida de Apoio a Guerra Eletrônica (MAGE) do Sheffield também não recebeu as emissões do Exocet, mas deve-se considerar que o ambiente era eletromagneticamente denso, com emissões provenientes de inúmeros equipamentos de comunicação, Identification Friend or Foe (IFF) e radares (ARCANGELIS, 1985).



Um dos mísseis atingiu o casco do HMS Sheffield, mas não explodiu. O navio, entretanto, afundou após seis dias (ARCANGELIS, 1985). O segundo Exocet apenas passou perto do HMS Yarmouth (CHANT, 2001).

Com relação aos armamentos ofensivos do HMS Sheffield, pode-se dizer que o Sea Dart tinha capacidade antimíssil, mas seu alcance era inferior ao do Exocet. Além disso, a Grã-Bretanha não tinha nenhuma aeronave de Alarme Aéreo Antecipado (AEW) que pudesse operar embarcada, portanto, os avisos de ataques eram limitados à detecção pelos radares dos navios. Isso significava que o Super Etendard poderia lançar seus mísseis fora do alcance dos Sea Dart, pois, uma vez lançados, os mísseis navegariam a 30 ft do nível do mar (ARCANGELIS, 1985).

A única possibilidade de defesa que o Sheffield realmente poderia tentar era o canhão de 20 mm, que poderia não ser efetivo contra um alvo de área tão pequena, quando aproado com o navio (ARCANGELIS, 1985).

Pela análise dos armamentos defensivos, pode-se constatar que o Sheffield possuía o UAA-1 Abbey Hill, um equipamento de Suporte Eletrônico destinado a fornecer aviso antecipado de transmissões radar e de vigilância do espectro eletromagnético, na faixa compreendida entre 1 a 18 Ghz, o que permite, inclusive, o azimute de chegada. 

Esse sistema era capaz de fornecer aviso automático de ameaças, caso os parâmetros armazenados fossem interceptados. No entanto, esse equipamento não forneceu nenhum alarme, ou por causa da interferência eletrônica, ou porque os parâmetros do míssil não estavam armazenados como ameaça, já que a Marinha Britânica tinha a versão superfície-superfície do Exocet, o MM-38, instalada em alguns de seus navios (ARCANGELIS, 1985).

O HMS Sheffield era equipado com dois sistemas lançadores de chaff do tipo Corvus e, provavelmente, também possuísse o Bexley 669, um despistador, e o Bexley 667/668, um bloqueador, mas nenhum foi utilizado (ARCANGELIS, 1985).



O Exocet, após lançado, navegava por um sistema inercial, que era imune aos ataques eletrônicos. A seis milhas do alvo ligava o seu radar automaticamente, acoplava o alvo e navegava em sua direção. Era equipado com o Adac, um radar monopulso, que operava na banda X (8,5 a 12,5 Ghz), possuía sofisticados sistemas de Proteção Eletrônica, o que lhe tornava resistente aos despistadores e bloqueadores existentes (ARCANGELIS, 1985).

Apesar de a faixa de freqüência de recepção do Abbey Hill abranger as faixas de freqüência dos radares do Super Etendard e do Exocet, aquele não possuía capacidade de distinguir e interpretar, instantaneamente, os sinais eletromagnéticos, em virtude das suas limitações internas (ARCANGELIS, 1985).

Portanto, como forma de compensar as suas deficiências de GE frente à ameaça do Exocet, a Marinha Britânica providenciou grandes quantidades de chaff, para que fossem usados durante os ataques aéreos (ARCANGELIS, 1985).

No dia 25 de maio, dois Super Etendard, armados com dois mísseis Exocet, efetuaram o ataque a um grande alvo, mas, assim que os aviões subiram, foram detectados pela frota inglesa, que efetuou grande quantidade de lançamentos de chaff , mostrando-se efetivos em confundir e desviar os mísseis. 

Entretanto, um dos mísseis atingiu e afundou o Atlantic Conveyor, um navio mercante, que não tinha nenhum sistema de autodefesa eletrônico. O último Exocet da Armada Argentina foi empregado no dia 30 de maio, mas nenhum navio foi acertado, pois novamente a frota se protegeu com o uso de chaff.  (ARCANGELIS, 1985).

Em 11 de junho, uma peça de artilharia costeira efetuou o lançamento de um Exocet através de dados de posição fornecidos pelo radar de superfície AN/TPS-43, localizado nas Malvinas. O míssil atingiu o HMS Glamorgan (ARCANGELIS, 1985).

Portanto, dos seis Exocet disparados, três atingiram o alvo, o que resulta em 50% de acerto. Mesmo após identificarem as ameaças e utilizarem as contramedidas eletrônicas disponíveis, os mísseis continuaram acertando o alvo. Segundo Arcangelis (1985), como a Marinha Britânica tinha esses mísseis no seu acervo, eles já tinham o conhecimento prévio das características do radar do míssil. Além disso, como o presidente francês possibilitou o treinamento dos ingleses com os aviões Mirage III e Super Etendard franceses, provavelmente os ingleses também já conheciam as características do radar Agave (MORO, 2003).

Dessa forma, o conhecimento prévio das características dos radares dos mísseis anti-navio (Exocet) não propiciou contramedidas eletrônicas eficazes pela frota inglesa, o que pode ter aumentado a efetividade dos mísseis e, conseqüentemente, aumentado a capacidade de destruição dos argentinos, que anula a terceira hipótese proposta.



A UTILIZAÇÃO DO MÍSSIL ANTI-RADIAÇÃO (MAR)

A Argentina montou um sistema de alarme antecipado nas Ilhas Malvinas, o qual era composto pelos radares AN/TPS-43F e pelo AN/TPS-44, aquele era tridimensional, utilizado para vigilância de longo alcance, enquanto esse era empregado para vigilância tática (UDEMI, 1989).

Para defender a Ilha de ataques aéreos, a Argentina deslocou vários tipos de sistemas de armas antiaéreas controladas por radar. Entre eles, destacam-se os mísseis Roland, Tigercat e o Blowpipe, bem como alguns sistemas de Artilharia Antiaérea (AAAe), tal como o canhão Oerlinkon de 35 mm, direcionado pelo radar Skyguard (UDEMI, 1989).

Também foram empregados os canhões Rheinmetall de 20 mm, que eram controlados pelo radar ELTA (NORDEEN, 2002).

Como os ingleses haviam abandonado a utilização do Alarme Aéreo Antecipado (AEW) em 1978, tiveram que utilizar os Sea Harrier para voar missões de defesa de frota, algo para o qual não haviam sido projetados, tentando compensar a falta de um AEW para a força tarefa inglesa (HEWSON, 2001).



Para os ingleses defenderem a frota era necessário que ficassem a uma determinada distância dos navios, realizando uma Patrulha Aérea de Combate (PAC). Entretanto, para que não fossem detectados pelos radares da ilha, deveriam ficar restritos a níveis de vôo mais baixos, reduzindo o tempo de permanência na PAC.

Mesmo assim, os argentinos ainda conseguiam detectar as rotas de recolhimento das PAC e, como normalmente convergiam para um determinado
ponto, era possível estimar a localização dos porta-aviões (GREEN, 2005).

Com o intuito de destruir os radares de vigilância argentinos, foram utilizados os Vulcan, bombardeiros de longo alcance, equipados para realizarem a missão de Supressão de Defesa Aérea Inimiga (SDAI) com o AGM-45 Shrike, um Míssil Anti-Radiação (ARCANGELIS, 1985).

A primeira missão realizada foi a Black Buck 5, ocorrida no dia 31 de maio, na qual um Vulcan, carregado com dois mísseis Shrike, se aproximou a baixa altura, subiu, entretanto, a 16.000 ft, para se encaixar nos parâmetros de ataque. Ao ingressar na área de detecção dos radares, dois diretores de tiro acoplaram a aeronave, embora estivesse fora do alcance do armamento. 

Após a identificação do alvo, os dois mísseis foram lançados, mas o controlador argentino foi mais rápido e desligou o radar antes que ele fosse atingido, não houve dano (ETHELL, 1983). 

O procedimento do operador radar pode ter sido correto, pois uma estratégia que pode ser utilizada pelo radar quando ele for alvejado por um MAR é parar com a emissão de ondas eletromagnéticas, de maneira que o míssil perca a informação de guiamento (SCHLEHER, 1999).

O princípio da SDAI é que o inimigo se sentirá inibido de usar integralmente os seus sistemas de detecção, pela presença de uma arma que seja capaz de destruir as fontes de radiação (SCHLEHER, 1999). Naquele dia, após o ataque, houve pouca atividade aérea argentina durante o dia (ETHELL, 1983).

A segunda e última missão realizada foi a Black Buck 6, efetuada no dia 03 de junho. Desta vez, a aeronave estava armada com quatro mísseis. Os argentinos já sabiam o que deveriam esperar de uma aeronave que se comportasse daquela maneira, portanto, toda vez que o Vulcan se aproximava de Puerto Stanley, os radares eram desligados. Na última tentativa, o Vulcan desceu para 10.000ft, de forma a incitar os argentinos a ligarem os radares.

De repente, um radar foi ligado, e fez com que a tripulação efetuasse o disparo de dois mísseis. Apenas um radar Skyguard foi danificado (ETHELL,1983).

Portanto, dos quatro mísseis utilizados, apenas um conseguiu lograr êxito ao atingir o Skyguard, mas o objetivo principal da missão, que era destruir os dois radares de vigilância, não foi atingido, ou seja, o AN/TPS-43F e o AN/TPS-44 permaneceram em funcionamento até o final da guerra (UDEMI, 1989).

Dessa forma, o emprego de MAR contra os radares argentinos pode ter restringido, instantaneamente, o alarme antecipado nas Ilhas Malvinas, mas provavelmente pode não ter aumentando a suscetibilidade das aeronaves, pois como voavam essencialmente no período diurno, não ficavam sem o apoio da cobertura radar, havendo indícios de que a quarta hipótese foi refutada.



A GE DAS MALVINAS E A FAB EM 2006

Estabelecendo um paralelo entre os recursos de GE utilizados pelas aeronaves inglesas e argentinas durante a Guerra das Malvinas e os da FAB em 2006, pode-se extrair as lições apreendidas durante o conflito e aplicá-las dentro do contexto atual, com vistas ao domínio do espectro eletromagnético.

Com base na Tabela 1, pode-se observar que a capacidade ofensiva das aeronaves de combate inglesas baseou-se no domínio da faixa do infravermelho, através da utilização de um míssil de 3ª geração, que explorava melhor essa faixa do espectro eletromagnético.

Apesar de os ingleses não utilizarem mísseis radar semi-ativos na faixa de microondas, não permitiam que os argentinos a dominassem, pois possuíam meios de detecção, através do RWR, e de contramedidas, por meio de lançamento de chaff, negando aos argentinos a exploração efetiva dessa outra faixa do espectro eletromagnético, conforme visto anteriormente.

Outro aspecto a ser observado foi a preparação inicial dos pilotos ingleses, pois realizaram treinamento de combate dissimilar com os pilotos franceses de Mirage III e Super Etendard (MORO, 2003).

De acordo com Santos (2004), os mísseis infravermelhos são, estatisticamente, as armas mais efetivas usadas contra aeronaves.

Os mísseis infravermelhos já estão na 5ª geração, como é o caso do Python 5 e do AIM-9X. As inovações incorporadas por esses mísseis são resultantes de vários fatores, tais como os novos tipos de detectores infravermelhos, que, arranjados em forma de matriz, conseguem montar uma imagem infravermelha do alvo, sendo capazes de rejeitar flares convencionais (SANTOS, 2004).



Observando a Tabela 4, que enumera quantitativamente os armamentos ar-ar das principais aeronaves de caça da FAB, e para os ensinamentos obtidos da Guerra das Malvinas, pode-se extrair as principais vantagens e deficiências da exploração do espectro eletromagnético por parte dos armamentos utilizados pela Força Aérea Brasileira.

Entre as principais deficiências encontradas, cita-se a ausência de mísseis ar-ar nas aeronaves A-1, não explorando a faixa do infravermelho para obter um maior alcance do poder de fogo, uma vez que só dispõem de canhões de 30 mm. As mesmas considerações podem ser feitas para as demais aeronaves de caça sem míssil ar-ar.

Umas das vantagens encontradas pode ser a utilização de mísseis infravermelhos de 4ª geração, pois assim como os de 5ª, também possuem a
capacidade de rejeitar o flare convencional, negando o uso da contramedida ao inimigo (SANTOS, 2004). 

Outra vantagem pode ser o emprego do míssil Beyond Visual Range (BVR), ou seja, um míssil que é lançado além do alcance visual do alvo, aumentando o alcance do poder de fogo amigo, através da exploração da faixa das microondas.

Com relação à capacidade defensiva das aeronaves de combate, vê-se, a partir da Tabela 2, que a inexistência de sistemas de detecção e contramedidas eletrônicas pode ter contribuído para a diminuição da sobrevivência delas durante as missões de ataque à frota da Marinha Britânica, já que essa, conforme visto anteriormente, chegou a abater 18,49% das aeronaves de combate.

Analisando os equipamentos de GE existentes em algumas aeronaves da FAB, conforme a Tabela 5, percebe-se que ainda existem muitas delas sem nenhuma capacidade de contramedidas eletrônicas, como por exemplo, o R-99A/B, o F-5E/F, o A-29 e o Xavante. 

Observa-se ainda a deficiência quanto à existência de bloqueadores e despistadores, o que aumenta a suscetibilidade dessas aeronaves. Segundo Green (2005), se os argentinos tivessem a capacidade de bloquear os radares inimigos, poderiam ter tido maiores taxas de sobrevivência durante os ataques. Além disso, a falta de treinamento dos pilotos argentinos para manusearem o chaff e o flare fez com que eles não os utilizassem corretamente. Portanto, a FAB precisa treinar os seus recursos humanos disponíveis.

A Força Tarefa Britânica não tinha, nos seus navios, uma aeronave AEW, com capacidade de operar embarcada, deixando as aeronaves que voassem a baixa altura fora do alcance dos seus radares (UDEMI, 1989).

Tiram-se, daí, dois ensinamentos. O primeiro é a necessidade de se ter uma aeronave AEW para prover o alarme antecipado. No caso da FAB, já se utiliza o R-99A. O segundo é que o vôo a baixa altura contra uma força sem capacidade AEW pode ser eficiente, na medida em que a aeronave incursora fica fora da cobertura radar do inimigo.

Segundo Ethell (1983), nenhuma aeronave Super Etendard foi abatida durante o conflito. Analisando o emprego dessa aeronave, em conjunto com o Exocet, percebe-se que a associação da tática de penetração a baixa altura, com um míssil que pudesse ser lançado fora do alcance dos Sea Dart, pode ter contribuído para esse resultado.

Apesar de os navios britânicos ainda conseguirem detectar as emissões das aeronaves argentinas no momento em que essas subiam para acoplar seus radares neles, nada poderia ser feito, pois nenhum armamento teria alcance para atingi-las, uma vez que, após efetuarem o lançamento do míssil, retornavam para as suas bases.

Talvez o maior aprendizado dessas missões para a FAB seja a adoção de armamentos com capacidade de lançamento fora do alcance inimigo, ou seja, capacidade stand-off, principalmente contra ameaças navais.

Apesar de o emprego do MAR pelos ingleses não ter impedido o uso constante dos radares, nem ter destruído o sistema de vigilância argentino na ilha (talvez pela pequena quantidade de missões), constata-se que durante o período da ameaça não houve utilização dos radares.

Finalmente, quanto ao emprego do MAR pela FAB, pode-se dizer que só a ameaça da sua utilização pode negar o uso parcial do espectro eletromagnético pelo inimigo, ou, caso seja utilizado, destruir definitivamente o radar. Por outro lado, deve-se dar mais atenção à formação e ao treinamento do operador radar, na medida em que é fundamental para reconhecer a ameaça e como combatê-la, visando ao emprego eficiente de todos os recursos de GE disponíveis.

CONCLUSÃO

Procurou-se medir, neste artigo, como a influência dos recursos de GE, utilizados durante a Guerra das Malvinas, contribuiu para o resultado do conflito, realizou uma pesquisa explicativa, baseada na técnica de coleta de dados secundários.

Foi feita uma análise estatística dos resultados e a identificação dos princípios de GE envolvidos. Além desses procedimentos, utilizou-se o instrumento metodológico do estudo de caso para estabelecer um paralelo entre os recursos de GE utilizados nas Malvinas e os atuais recursos da FAB.

Dessa forma, pode-se constatar que a utilização do míssil ar-ar infravermelho, de 3ª geração, pelas aeronaves inglesas, permitiu maior exploração do espectro eletromagnético na faixa do infravermelho, resultando num grande número de aeronaves abatidas e, conseqüentemente, na diminuição da capacidade de combate dos argentinos, dando indício de que a primeira hipótese foi corroborada. 

Analisando os equipamentos de autodefesa utilizados nas aeronaves argentinas, por possuírem diminuta capacidade de perceber e de se contrapor aos diversos armamentos enfrentados durante as missões de ataque aos navios ingleses, pode-se inferir que tenham sido responsáveis pelo grande número de aeronaves abatidas e, conseqüentemente, tenham contribuído para a diminuição da capacidade de combate, o que corrobora a segunda hipótese.

Também foi constatado que o conhecimento prévio das características dos radares dos mísseis anti-navio (Exocet) não propiciaram contramedidas eletrônicas eficazes pela frota inglesa, o que pode ter aumentado a efetividade dos mísseis e, conseqüentemente, aumentado a capacidade de destruição dos argentinos, refuta-se, assim, a terceira hipótese proposta.

Além dessa, o emprego de MAR contra os radares argentinos pode ter restringido, instantaneamente, o alarme antecipado nas Ilhas Malvinas, mas, provavelmente, pode não ter aumentado a vulnerabilidade das aeronaves, pois como voavam essencialmente no período diurno, não ficavam sem o apoio da cobertura radar, oferecendo indícios que refutam a quarta hipótese.

Os fatos verificados estão diretamente relacionados com o referencial teórico adotado, na medida em que foi constatado, em todo o trabalho, o uso das ondas eletromagnéticas para controlar o espectro eletromagnético e atacar o inimigo.

Portanto, baseado nas lições de GE aprendidas com a Guerra das Malvinas/Falklands, foi possível estabelecer parâmetro de comparação com os
atuais recursos de GE existentes na FAB, fornecendo ensinamentos que podem melhorar não só a utilização desses equipamentos e conceitos, mas também a alocação dos recursos financeiros na aquisição de equipamentos essenciais, evidenciando as conquistas alcançadas com esse estudo.